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60 Observações Medicas Doutrinaes. elle de industria atàra fortemente o braço para impedir o movimento das arterias ; porque se naõ podia esperar que hum homem moço , robusto , caluroso , hirsuto , & vivaz, naõ tivesse pulso , ( estando vivo ; ) mas antes se devia crer o tivesse mui grande , pois tinha grande respiração ; & como esta , & o pulso guardem a mesma igualdade , sendo esta grande , grande devia tambem ser aquelle . Finalmente como naõ lhe achasse pulso no lugar aonde todos o costumaõ ter, presumi que a mesma natureza por travessura da faculdade formatrice puzera as arterias pulsantes na parte exterior dos pulsos : & naõ me enganei ; porque na costa da mão tinha as arterias taõ fortes , & vigurosas , como se tivesse huma grande febre . 8 . Perguntaraõ aqui os curiosos , porque causa em algumas pessoas ( aindaque sejão muito robustas ) se occultão as arterias dos pulsos de tal sorte , que nem apertandose muito com os dedos, as percebe o tacto mais subtil ; & em outras , (ainda que sejão muito fracas ) com qualquer leve compressaõ se achão. 9 . Respondo que o perceberemse as arterias difficultosamente em huns , & facilmente em outros , procede de cinco cousas . A primeira he a muita gordura & quantidade de carnes, que comprimindo as arterias, as suffoca, & aperta tanto, que não as deixa apparecer. A segunda he alguma ferida grande, ou cicatriz do braço, que apertando a carne com o callo da ferida , não dà lugar a que as arterias se alarguem, & pulsem como convem . A terceira he a grande bebedice ; porque como o vinho tem propriedade narcotica , & estupefactiva , ( quando he muito ) faz effeitos semelhantes aos do opio, adormecendo , & fazendo esquecer as faculdades , & movimentos naturaes. A quarta he o grande enchimento do estomago , que tambem suffoca , & aperta as arterias do mesmo modo , que as aperta a excessiva gordura . Aquinta he algum affecto inflammatorio , obstrucção , ou fraqueza do coraçaõ , & arterias . E pelo contrario nos muito magros se percebem facilmente as arterias ; porque como
60 Observações Medicas Doutrinaes. elle de industria atàra fortemente o braço para im- pedir o movimento das arterias ; porque fe nao podia . : efperar que hum homem moço, robufto, calurofo, hirfuto, & vivaz, não tiveffe pulfo, ( eftando vivo; ) mas antes fe devia crer o tiveffe mui grande, pois ti- nha grande refpiracao ; & como efta, & o pulfo guar- dem a mefma igualdade, fendo efta grande, grande devia tambem fer aquelle. Finalmente como naõ lhe achoffe pulfo no lugar aonde todos o coftumaõ ter, prefumi que a mefma natureza por traveffura da fas · culdade formatrice puzera as arterias pulfantes na parte exterior dos pulfos : & nao me enganei ; porque . na cofta da mão tinha as arterias tao fortes , & viguro -. fas, como fe tiveffe huma grande febre. 8. Perguntaráo aqui os curiofos , porque canfa em algumas peffoas ( aindaque fejão muito robuftas) fe occultão as arterias dos pulfos de tal forte , que nem apertandofe muito com os dedos, as percebe o'tacto mais fubtil ; & em outras, (ainda que fejao muito fra- cas ) com qualquer leve compreffaõ fe achão. 9. Refpondo que o perceberemfe as arterias dif- ficultofamente em huns , & facilmente em outros, procede de cinco coufas. A primeira he a muita gor- dura, & quantidade de carnes , que comprimindo as arterias , as fuffoca, & aperta tanto, que não as deixa apparecer. A fegunda he alguma ferida grande, ou ci- catriz do braço, que apertando a carne com o callo da ferida, não da lugar a que as arterias fe alarguem, & pulfem como convem. A terceira he a grande be- bedice; porque como o vinho tem propriedade nar- cotica, & eftupefactiva, (quando he muito ) faz ef- feitos femelhantes aos do opio, adormecendo, & fa- zendo efquecer as faculdades, & movimentos natu- . raes. A quarta he o grande enchimento do eftomago, que tambem fuffoca, & aperta as arterias do mefmo modo, que as aperta a exceffiva gordura. Aquinta he algum affecto inflammatorio, obftrucção, ou fraque- za do coração, & arterias. E pelo contrario nos mui- to magros fe percebem facilmente as arterias ; porque como 3 1
6o Obfervacoes Medicas Doutrinaes. elle. de induftria atara fortemente obraco para im- pediromovimento das arterias, porgue fe na podia : efperar que hum homem mogo, robufto, calurofo; hirfuto, &vivaz, nao tiveffe pulfo,( eftando vivo; mas antes fe devia crer o tiveffe mui grande, pois ti- nha grande refpiraca ; & como efta, & o pulfo guar- dem a mefma igualdade, fendo efta grande,grande deviatambem fer aquelle. Finalmente como na lhe achaffe pulfo no lugar aonde todos.o coftuma ter, prefuimi que a mefma natureza por traveffura dafa- culdade formatrice puzera as arterias pulfantes na parte éxterior dos pulfos : & na meenganei ; porque na cofta da mao'tinha as arterias ta fortes , & viguro- fas , como fe tiveffe huma grandé febre. 8... Perguntará aqui as curiofos , porque caufa em algumas peffoas ( aindaque fejao muito robuftas) fe occultao'as arterias dos pulfos de tal forte , que nain apertandofe muito com os dedos, as.percebeo tacto : mais fubtil ; & emoutras, (ainda que fejao muito fra- cas ) com qualquer leve compreffa fe achao Refpondo que o perceberemfe as arterias dif- 9. ficultofamente em huns , & facilmente em outros, procede de cinco coufas. A primeira he a muita gor- dura,& quantidade decarnes , que comprimindo as arterias, as fuffoca, & aperta tanto,que nao as deixa apparecer. A fegunda he alguma ferida grande, ou ci-: da ferida, nao da lugar aque as arterias fealarguem, & pulfem comoconvem. A terceira he a grande be- bedice; porque como ovinhotem propriedade nar cotica, & eftupefastiva, (quando he muito) faz ef- feitos femelhantes aos do opio , adormecendo , & fa- . zendo efquecer as faculdades, & movimentos.natu- .que tambem fuffoca, & aperta as arterias do imefm6 medo, que as aperta a exceffiva gordura.: Aquinta he algum affecto inflammatorio, obftruccao, ou fraque- za docoraca, & arterias. E pelo contrario. nos mui-- to magros fe percebem facilmente as arterias ; porque coma
* . e so Obfervações Medicas Doutrinaes. * - elle de induftria atàra fortemente obraço pára im- , pediromovimento das arterias; porque fe naó podia . « elperar que hum homem moço, robufto, calurofo; hirfuto, & vivaz , não tivefle pulfo , ( eltando vivo; ) mas antes fe devia crer o ivere mui grande 5 pois tiz. nha grande refpiraçaó ; & como efta , & o pulío guar-* dem a mefíma igualdade, fendo efta grande, grande devia tambem fer aquelle. Finalmente como naó lhe achaíle pulfo no lugar aonde todos o coftumaõ ter, prefumi que a melma natureza por traveílura da faz * culdade formatrice puzera as arterias pulfantes na parte exterior dos pulfos : & naô me enganei ; porque . nacoíta da mão tinha asartegias ta fortes , & Viguro- fas , como fe tivefle huma grande febre. | : 8. Perguntaráõ aqui os curiofos , porque canfa emalgumas pefloas ( aindaque fejão muito robufítas) “feocceultão as arterias dos pulfos de tal forte, quenem apertandofe muito com os dedos, as percebe o ta&o * Thais fubtil ; & em outras , (ainda que fejão muito fra- cas ) com qualquer leve compreflaô fe achão. 9. Relpondoqueo perceberemfe as arterias dif- ficultofamente em huns , & facilmente em outros, procede de cinco coufas. A primeira he a muita gor- dura , & quantidade decarnes , que comprimindo as arterias , as fuffoca, & aperta tanto, que não as deixa apparecer. A fegunda he alguma ferida grande, ouci- - catriz do braço, que apertando acarne como callo da ferida, não dà lugar a que as arterias fe alarguem, & pulfem comoconvem. À terceira he a grande be- bedice; porque como ovinhotem propriedade nar- cotica, & eftupefa&iva, (quando he muito ) faz ef. feitos femelhantes aos do opio, adormecendo, & fa- . .zendo efquecer as faculdades, & movimentos natu- . raes. A quárta he o grande enchimmengo do eftomago, que tambem fuffoca, & aperta asarterias do memo medo, que as aperta a excefliva gordura.. Aquinta he algum affecto inlammatorio , obftrucção, ou fraque. za docoraçaõ, & arterias. E pelo contrario nos mui- to magros fe percebem facilmente as arterias ; porque ' . ! : como
60 Observaçones Medicas Doutrinaes. elle de industria atàra fortemente o braço para im- pedir o movimento das arterias; porque se naon podia esperar que hum homem moço, robusto, caluròso hirsuto, & vivaz, namo tivesse pulso, (estando vivo; mas antes se devia crer o tivesse mui grande, pois ti¬ nha grande respiraçaon; & como esta , & o pulso guar- dem a mesma igualdade, sendo esta grande, grande devia tambem ser aquelle. Finalmente como naon lhe achasse pulso no lugar aonde todos o costumao ter presumi que a mesma natureza por travessura da fa¬ culdade formatrice puzera as arterias pulsantes na parte exterior dos pulsos: & naon me enganei; porque na costa da mano tinha as arterias taon fortes, & viguro¬ sas, como se tivesse huma grande febre. Perguntaraon aqui os curiosos, porque causa em algumas pessoas (aindaque sejano muito robustas se occultamo as arterias dos pulsos de tal sorte, que nem apertandose muito com os dedos, as percebe o tacto mais subtil; & em outras, (ainda que sejano muito fra¬ cas) com qualquer leve compressaon se achamo. 9. Respondo que o perceberemse as arterias dif¬ ficultosamente em huns, & facilmente em outros. procede de cinco cousas. A primeira he a muita gor- dura, & quantidade de carnes, que comprimindo as arterias, as suffoca, & aperta tanto, que namo as deixa apparecer. A segunda he alguma ferida grande, ou ci- catriz do braço, que apertando a carne com o callo da ferida, nano dà lugar a que as arterias se alarguem, & pulsem como convem. A terceira he a grande be¬ bedice; porque como ovinho tem propriedade nar- cotica, & estupefactiva, (quando he muito) faz ef¬ feitos semelhantes aos do opio, adormecendo, & fa- zendo esquecer as faculdades, & movimentos natu¬ raes. A quarta he o grande enchimento do estomago, que tambem suffoca, & aperta as arterias do mesmó modo, que as aperta a excessiva gordura. Aquinta he algum affecto inflammatorio, obstrucęamo, ou fraque¬ za do coraçaon, & arterias. E pelo contrario nos mui¬ to magros se percebem facilmente as arterias; porque como
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Observaçaõ IX. 61 como estejaõ na superficie da carne , se percebem com qualquer levissimo contacto da maõ . OBSERVAÇAM IX De huma lepra bastarda , que certa senhora padeceo quatro annos , tendo por causa os alimentos grosseiros que comia , & a vida sedentaria , & penitente em que estava , de que se seguio obstruiremse as veas , & faltaremlhe as purgações mensaes ; & naõ achando os humores porta franca para se descarregarem , se espalhàraõ pela superficie do corpo , & o enchèraõ de pustulas , & comichões taõ insoportaveis , que se achou a doente obrigada a fazer mil remedios ; & como nenhũs lhe aproveitassem , recorreo aos meus segredos especificos , & tomando-os muitos dias , cobrou perfeita saude. 1. COm muita razaõ se queixa sentidamente Jaquino , (1.) dizendo que nos nossos tempos já se naõ curaõ as grandes enfermidades , porque os Medicos de hoje usaõ sómente de remedios leves , & pouco continuados , & se alguma hora lançaõ maõ dos mais efficazes , naõ tem animo para repetillos muitas vezes , temendo que a frequencia delles seja prejudicial aos enfermos ; jà se na segunda , ou terceira applicaçaõ de qualquer medicamento naõ vem a doença curada , ou muito diminuida , desprezaõ logo ao tal medicamento , por mais conveniente que seja , appellando para outros , sem se lembrarem que he conselho de Galeno , (2.) que todas as vezes , que os remedios se applicarem conforme pede a razaõ, & a doença , aindaque naõ obrem logo conforme o desejo , nem por isso se haõ de desprezar , nem appellar para outros ; mayormente se a doença permanecer do mesmo modo que dantes era . Confesso que tenho grande lastima , & grande compaixaõ de algũs doentes , que
Obfervação IX. 6₸ como eftejao na fuperficie da carne , fe percebem com qualquer Jeviffimo contacto da maõ. OBSERVAÇAM IX. De huma lepra baftarda , que certa fenhora padeces quatro annos , tendo por caufa os alimentos grofeiros que comia , & a vida fedentaria , & penitente em que eftava, de que fe feguio obstruiremfe as veas, & fal- taremthe as purgações menfaes ; & nao achando os humores porta franta para fe defcarregarem, fe ef- palharao pela Superficie do corpo, & o encherao de puflulas, & comichões tao infoportaveis , que fe achou a doente obrigada a fazer mil remedios ; & como ne- nhus lhe aproveitafem, recorreo aos meus fegredos especificos, & tomando-os muitos dias , cobrou perfei- - ta faude. İ: Om muita razao fe queixa fentidamente Jaquino,(1.) dizendo que nos noffos tem- pos já fe naô curaõ as grandes enfermidades , porque os Medicos de hoje ufao fómente de remedios leves, & pouco continuados , & fe alguma hora lançaõ mao dos mais eficazes , nao tem animo para repetillos muitas vezes, temendo que a frequencia delles feja prejudicial aos enfermos ; jà fe na fegunda, ou tercei- ra applicaçaõ de qualquer medicamento naõ vem a doença curada, ou muito diminuida, defprezaõlo- go ao tal medicamento, por mais conveniente que fe- ja, appellando para outros , fem fe lembrarem que he confelho de Galeno; (2. ) que todas as vezes , que os remedios fe applicarem conforme pedè a razao, & a doença, aindaque naõ obrem logo conforme o defe- jo, nem por iffo fe hao de defprezar, nem appellar para outros ; mayormente fe a doença permanecer do mefmo modo que dantes era. Confeffo que tenho grande laftima,& grande compaixao de algus doentes, que - )
Obfervacao 1X. comq efteja na fuperficie da carne , fe percebem com qualquer leviffimo contacto.da ma: .OBSERV.ACAM IX. De hima lepra baftarda, que certa fenbora padece quatro annos , tendo por caufa os alimentos groffeiros que comia, d.a vida fedcntaria, penitente em qus eftava, de quefefeguio obftruiremfe as veas, fal- taremlbe as purgases menfaes ; na achando os bumo:es portafranta para fe defcarrcgaren; fe ef- -palbara pelafuperfcie do corpo, enchera de puftulas, & comithocs ta in/oportavcis , que fe achou a doente obrigada afazer mil rcmedios; d como ne- nbus. lhe aproveitaf/em, recorrco aos meus fegredos efpecificos, tomando-os muitos dias, cobrou perfei- tafaude: m muitaraza fe queixa fentidamente . Jaquino,(1. dizendoque nos noffos tein- pos já fe na cura as grandes enfermidades , porque os Medicos de hoje ufao foinente de remedios leves , & pouco continuados , & fe algumahora lancaö ma dos.mais efficazes , na tem animo para repetillos imuitas :vezes, temendo que a frequencia delles feja prejudicial aös enfermos ; ja fe na fegunda , ou tércei- ra applicaša de qualquer medicamento na vem a doenca curada, ou muito diminuida, defprezalo- go ao tal medicamento , por mais conveniente quc fe- ja , appellando para öutros , fem fe lembraremque he confelho deGaleno, (.) que todas as vezes,que os remedios fapplicarem conforme pede araza, & a doenca , aindaque na obrem 1ogo conforme ö defe- jo, nem por iffo fe ha de defprezar, nem appellar para outros ; mayormente fe'a doenga permanecer do mefmo modo que dantes.era. Confeffo que tenho grande-laftima,& grande compaixa de algús doentes, gut
comg eftejaô na fuperfície da cárne , fe percebem = , . com qualquer Jeviflimo eonta&o da maô. ! OBSERVAÇAM IX. De huma lepra baftarda , que cevta fenhora padeicô ' quatro annos, tendo por caufa os alimentos groffeiros que comiá , & a vida fedentaria , & penttente em que eftava , de que fe feguio obftruiremf[e as veas, & fal- taremlhe as purgações menfaes; & nao achando os humores porta frandhk para fe defearregarem, fe ef- palharao LU fuperfíiciê do corpo, & o encherao de pultúlas, & comichoes tao infoportaves , que fe achou a doente obrigada a fazer mil remedios; & como ne- nhis lhe aproveitaflem, recorreo aos meus fêgredos efbecificos , & tomando-os muitos dias , cobrou perfei- ta faude. í; % Óm muita ráraõ fe queixa fentidamtnte Nu Jaquino,(1.) dizendo que nos noffos tem- pos já fe naô curão as grandes enfermidades , porque os Medicos de hoje nfão fómente de remedios leves, & pouco continuados ; & fe alguma hora lançaô maõ dos mais efficazes , naó tem animo para repetillos inuitas ivezes , temendo que ?% frequencia delles feja prejudicial aós enfermos ; jà fe na fegunda , ou têrcei- ra applicaçaô de qualquer medicamento naó vem a doença curagdá, ou muito diminuída, defprezáõilo- * go ao tal medicamento, por mãis conveniente que fe- [EM appellando para outros ; fem fe lembrarem que he confelho de Galeno ; (2.) que todas as vezes , que os remedios fê applicarem conforme pedê arazaó, & a doença, ain aque naô obrem logo conforme 6 defe- jo, nem por iflo fe haô de defprezar, nemappellar para outros ; mayormente fe a doença permanecer do melmo modo que dantes era. Confeflo que tenho : : grande laftima,& grande compaixaõ de algãs docentes, . | - A . . x É Ss qe o. F) ? <
Observaçao IX. 61 como estejaon na superficie da carne, se percebem com qualquer Jevissimo contacto da maon. OBSERVAQAM IX. De huma lepra bastarda, que certa senhora padeces quatro annos, tendo por causa os alimentos grosseiros que comia, & a vida sedentaria , & penitente em que estava, de que se seguio obstruiremse as veas, & fal¬ taremlhe as purgaçones mensaes; & naon achando os humo: es porta franta para se descarregarem, se es¬ palharao pela superficie do corpo, & o encherao de pustulas, & comichones tao insoportaveis, que se achou a doente obrigada a fazer mil remedios; & como ne¬ nbums lhe aproveitassem, recorreo aos meus segredos especificos, & tomando-os muitos dias, cobrou perfei¬ ta saude. 1. Om muita razaon se queixa sentidamente „Jaquino, (1.) dizendo que nos nossos tem- pos já se naô curaon as grandes enfermidades, porque os Medicos de hoje usao somente de remedios leves, & pouco continuados, & se alguma hora lançaon maon dos mais efficazes, nao tem animo para repetillos muitas vezes, temendo que à frequencia delles seja prejudicial aos enfermos; jà se na segunda , ou tercei- ra applicaçaon de qualquer medicamento naon vem a doença curadâ, ou muito diminuida, desprezao lo¬ go ao tal medicamento, por mais conveniente que se ja, appellando para outros , sem se lembrarem que he conselho de Galeno, (2.) que todas as vezes, que os remedios se applicarem conforme pedè a razaôn, & a doença, aindaque nao obrem logo conforme ò dese¬ jo, nem por isso se hao de desprezar, nem appellar para outros; mayormente se a doença permanecer do mesmo modo que dantes era. Confesso que tenho grande lastima, & grande compaixaon de alguns doentes, que
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62 Observações Medicas Doutrinaes. (3.) que podendo viver muitos annos , & conseguir a saude que pertendem , a naõ conseguem , porque largaõ os remedios convenientes , tanto que nos primeiros dias naõ tiraõ a enfermidade. 2. Porèm como neste tempo querem muitos enfermos ser curados com melindre , (4.) & tambem ajaõ alguns Medicos lisongeiros , que naõ consideraõ o que he mais conveniente à saude , mas o que he mais agradavel ao doente ; daqui procede , que tanto que este repugna a tomar segunda vez a mesma medicina , logo se despreza , & deita fóra ; de que resultaõ dous graves damnos dignos de serem chorados com lagrimas de sangue . O primeiro he ; perder o doente a vida : O segundo he , ficar a Arte infamada , porque se despreza , & condemna como falida , & pobre de remedios , sendo fertilissima delles. 3. Mas oh ditosos enfermos , os que de tal sorte obedeceis aos preceitos dos Medicos , como se fossem divinos ! E outra vez mais ditosos , os que para curarvos , alcançastes hum Medico douto , & taõ constante , que a nenhumas petições injustas se move ; nem se dobra aos appetites dos soberanos , nem se ensurdece aos rogos dos humildes , mas pesa em igual balança o sayal , & a purpura , o cajado , & a coroa , mandando fazer com liberdade o que he melhor para a saude do enfermo , que fiou delle a sua vida ! pois costuma Deos favorecer aos intentos dos que desta maneira curaõ : Em confirmaçaõ do que aqui digo , me seja licito referir o seguinte caso , que observei em seis de Abril de 1670. na illustre senhora Dona Paula Pacheco . 4. Depois que esta senhora teve o estado de viuva , se entregou de sorte aos jejuns , orações , penitencias , mortificações , silencio , & clausura ; que mais parecia moradora do Ceo , que habitadora da terra ; porèm , ou pelo continuo trabalho do espirito , ou pelo pouco exercicio do corpo , ou pela grossaria dos alimentos , de que (por mortificaçaõ) usava , ou pelas grandes penitencias que fazia , gèrou tantas cruezas,
62 Observações Medicas Doutrinaes. (3.) que podendo viver muitos annos, & confeguir a faude que pertendem, a nao confeguem , porque largaõ os remedios convenientes, tanto que nos pri- meiros dias nao tiraõ a enfermidade. 2. Porem como nefte'tempo querem muitos en- fermos fer curados com melindre, (4.) & tambem ajaõ alguns Medicos lifongeiros, que naõ confideraõ o que he mais conveniente à faude, mas o que hệ mạis agradavel ao doente ; daqui procede, que tanto que efte repugna a tomar fegunda vez a mefma medicina, logo fe defpreza, & deita fóra ; de que refultao dous graves damnos dignos de ferem chorados com lagri- mas de fangue. O primeiro he , perder o doente a vi- da : O fegundo he, ficar a Arte infamada, porque fe defpreza, & condemna como falida, & pobre de re- medios , fendo fertiliffima delles. 3. Mas oh ditofos enfermos, os que de tal forte obedeceis aos preceitos dos Medicos , como le foffem divinos ! E outra vez mais ditofos, os que para curar- vos , alcançaftes hum Medico douto, & tao conftan- te, que a nenhumas petições injuftas fe move ; nem fe dobra aos appetites dos foberanos, nem fe enfurdece aos rogos dos humildes, mas pefa em igual balança o fayal , & a purpura, o cajado, & a coroa, mandando fazer com liberdade o que he melhor para a faude do enfermo, que fiou delle a fua vida ! pois coftuma Deos favorecer aos intentos dos que defta maneira curao: Em confirmação do que aquidigo, me feja li- .cito referir o feguinte cafo, que obfervei em feis de Abril de 1670. na illuftre fenhora Dona Paula Pa- checo. 4. Depois que efta fenhora teve o eftado de viu- va, fe entregou de forte aos jejuns , orações, peniten- cias , mortificações, filencio, & claufura; que mais parecia moradora do Ceo, que habitadora da terra ; porem , ou pelo continuo trabalho do efpirito, ou pe- lo pouco exercicio do corpo, ou pela groffaria dos alimentos, de que ( por mortificação )-ufava, ou pe- las grandes penitencias que fazia, gerou tantas crue- zas,
62. Obfervacoes Medicas Doutrinaes. (3.) que podendo viver muitos annos, & confeguir afaude que pertendem, a nao confeguem , porque larga os remedios convenientes , tanto que nos pri- meiros dias na tira a enfermidade. 2. Porem como nefte tempo querem muitos en- fermos. fer curados com melindre, (4.) & tambem aja alguns Medicos lifongeiros, que na confidera o que he mais conveniente a faude, mas o.que he mais agradavel ao doente; daqui procede, que tantoque efte repugna a tomar fegunda vez a mefma medicina, logofe defpreza,& deitaf6ra; de que refulta dous graves damnos dignos de ferem chorados com lagri- mas de fangue. O primeiro he perder o docnte a vi- da: Ofegundohe,ficar a Arteinfamada, porque fe defpreza, & condémna comofalida, & pobre de re- medios , fendo fertiliffima delles. 3. Mas oh ditofos enfermos, os que de tal forte obedeceis aos preceitos dos Medicos , como fe foffen divinos! E outra vez mais ditofos, os que paracurar- vos, alcancaftes hum Medico douto,& ta& conftan- te , que a nenhumas peticoes injuftas fe move ; nem fe dobra aos appetites des foberanos, nem fe enfurdece aos rogos dos humildes, mas pefaem igual balanca o fayal,& a purpura, ocajado, & acoroa, mandando fazer com liberdade o que he melhor para a faude doenfermo, que fou delle afua vida! pois coftuma Deos favorecer aos intentos dos que defta maneira cura: Em confirmagaö doque aqurdigo, me feja li-. .cito referir o feguinte cafo, que obfervei em feis de Abril de 1670. na illuftre fenhora Dona Paula Pa- checo. 4. : Depois que efta fenhora teveoeftado de viu- va, fe entregou de forteaos jejuns, oracöes , peniten- cias ,mortificagöes, filencio, & claufura, que mais parecia moradora do Ceo, que habitadora da terra ; porem , ou pelo continuo trabalho do efpirito, ou pe- lo pouco exercicio do corpo, ou pela groffaria dos alimentos, de que ( por mortificacaö )-ufava, ou pe- las grandes penitencias que fazia, gerou tantas crue. zas,
62. Oblervações Medicas Doutrinaes. (3.) que podendo viver muitos annos, & confeguit a faude que pertendem, a naô confeguem , porque largaô os remedios convenientes , tanto quê nos pri- Imeiros dias naó tiraô a enfermidade. oo 2. Porêmcomo nefte tempo querem muitos en- fermos fer curados com melindre, (4.) & tambem ajaô alguns Medicos lifongeiros , que naô confideraõô o que he mais conveniente à faude, mas o que hê mais agradavel ao doente; daqui procede, que tanto que efte repugna a tomar fegunda vez a melma medicina, logo fe defpreza , & deita fóra ; de que refultao dous graves damnos dignos de ferem chorados com lagri- mas de fangue. O primeiro he fMperder o docate a vi- da: O fegundo he , ficar a Arteinfamada, porque fe defpreza, & condemna como falida, & pobre dere- medios , fendo fertiliflima delles. 3. Masohditofos enfermos, os que de tal forte obedeceis aos preceitos dos Medicos , como fe foflfem . divinos! E outra vez mais ditofos , os que para curar- vos , alcançaftes hum Medico douto, & taaú conftan- : 4 te,que a nenhumas petições injuítas fe move ; nem fe Co. dobraaosappetites des foberanos, nem fe enfurdece aos rogos dos humildes, mas pefa em igual balança o fayal, & a purpurá, o cajado, & a coroa, mandando fazer com liberdade o que he melhor para a faude do enfermo, que fiou delle a fua vida! pois coftuma, | Deos favorecer aos intêntos dos que defta maneira * To — “euraó: Emconfirmaçaõ do que aqurdigo, me feja li=.. : «cito referir o feguinte cafo, que obfervei em feis de - . Abril de 1670. na illuíftre fenhora Dona Paula Pa- : checo. e” Ú . 4. . Depois que efta fenhora teve o efítado de tiu- va, fe entregou de forte aos jejuns , orações , peniten- cias ,mortificações , filencio, & claufura3 que mais parecià moradora do Ceo, que habitadora da terra ; porêm , ou pelo continuo trabalho do efpirito, ou pe- « — lo pouco exercicio do corpo, ou pela groffaria dos | | alimentos, de que ( por mortificaçaõ )-ulava, ou pe-- cs SUS . lasgrandes penitencias que fazia, gêrou tantas crue- ' : ' Zas,
62 Observaçones Medicas Doutrinaes. (3.) que podendo viver muitos annos, & conseguir a saude que pertendem, a naô conseguem, porque largaon os remedios convenientes, tanto què nos pri- meiros dias naon tiraon a enfermidade. 2. Porèm como neste tempo querem muitos en¬ fermos ser curados com melindre, (4.) & tambem ajaon alguns Medicos lisongeiros, que naon consideraon o que he mais conveniente à saude, mas o que hę mais agradavel ao doente; daqui procede, que tanto que este repugna a tomar segunda vez a mesma medicina, logo se despreza, & deita fóra; de que resultao dous graves damnos dignos de serem chorados com lagri¬ mas de sangue. O primeiro he pperder o doente a vi- da: O segundo he, ficar a Arte infamada, porque se despreza, & condemna como falida , & pobre de re- medios, sendo fertilissima delles. Mas oh ditosos enfermos, os que de tal sorte obedeceis aos preceitos dos Medicos , como se fossem divinos! E outra vez mais ditosos, os que para curar¬ vos, alcançastes hum Medico douto , & tao constan- te, que a nenhumas petiçones injustas se move; nem se dobra aos appetites dos soberanos, nem se ensurdece aos rogos dos humildes, mas pesa em igual balança o sayal, & a purpura, o cajado , & a coroa , mandando fazer com liberdade o que he melhor para a saude do enfermo, que fiou delle a sua vida! pois costuma Deos favorecer aos intentos dos que desta maneira curaon: Em confirmaçaon do que aqurdigo, me seja li¬ cito referir o seguinte caso, que observei em seis de Abril de 1670. na illustre senhora Dona Paula Pa¬ checo. 4. Depois que esta senhora teve o estado de viu- va, se entregou de sorte aos jejuns , oraçones, peniten- cias, mortificaçones, silencio, & clausura, que mais parecià moradora do Ceo, que habitadora da terra; porèm , ou pelo continuo trabalho do espirito , ou pe- lo pouco exercicio do corpo, ou pela grossaria dos alimentos, de que (por mortificaçaon ) usava, ou pe- las grandes penitencias que fazia, gèrou tantas crue- zas,
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Observaçaõ IX. 63 zas, & humores tão grossos , que se obstruiraõ as veas uterinas , & por esta causa lhe faltàraõ as evacuações mensaes ; & como hum erro he causa de outro erro , da falta desta costumada descarga crescèrão , & tresbordáraõ os humores excrementicios de maneira , que obrigárão a natureza a deitallos para a superficie do corpo , aonde por estarem reprezados adquiriraõ muita salsugem , & mordicàraõ todas as partes cutaneas com tanto excesso , que sendo poucas as unhas das mãos para satisfazer à comichão , ainda era mais pouca a paciencia para a sofrer ; porque podendo esta senhora soportar os jejuns , os cílicios , as disciplinas , as clausuras , os silencios , & outras penitencias , & mortificações , não lhe era possivel tolerar aquelle pruido , porque era taõ implacavel , que quasi a deseperava. 5. Como pois eu fosse chamado para curar esta doença , entendi que toda procedia dos acidos salinos exaltados , que misturados com o sangue , o coalhavão , & engrossavaõ do mesmo modo , que o vinagre coalha o leite , se o misturaõ com elle ; & por esta razão coalhado , & engrossado o sangue , não podendo passar pelas veas , se retinha dentro no corpo , & fazia naõ só as obstrucções , mas as comichoes ; & que o seu remedio avião de ser os absorbentes alcalicos , porque retundidos , & dulcificados os acidos coagulantes , se adelgaçarião os humores , & se circulariaõ , & buscariaõ o verdadeiro caminho para sahirem do corpo , & logo se tirariaõ as obstrucções , & as comichões , & as mais queixas. 6. Comecei pois a cura , dando primeiro que tudo duas ajudas feitas de meyo quartilho de caldo de frangão cozido com farelos lavados , ajuntandolhe seis onças de assucar mascavado, sem levar outra cousa ; & para o seguinte dia ordenei quatro sangrias no braço : porque nas faltas antigas dos meses mandaõ gravissimos Doutores (5.) sangrar primeiro em cima , dando depois cinco , ou seis sangrias nos pès. Feita esta primeira diligencia , lhe receitei para beber agua co
Obfervação IX. zas , & humores tão groffos , que fe obftruirao as , veas uterinas, & por efta caufa lhe faltarao as eva- cuações menfaes ; & como hum erro he caufa de ou+ tro erro , da falta defta coftumada defcarga crefcè- rão, & tresbordarao os humores excrementicios de maneira, que obrigarão a natureza a deitallos para a fuperficie do corpo , aonde por eftarem reprezados adquirirao muita falfugem , & mordicàrao todas as partes cutaneas com tanto exceffo, que fendo pou- casas unhas das mãos para fatisfazer à comichão,ain- da era mais pouca a paciencia para a fofrer ; porque podendo efta fenhora foportar os jejuns, os cilicios, as difciplinas, as claufuras, os filencios , & outras pe- nitencias, & mortificações, não lhe era poffivel tole- rar aquelle pruido, porque era tao implacavel, que quafi a defefperava. 5. Como pois eu foffe chamado para curar efta doença , entendi que toda procedia dos acidos fali- nos exaltados , que mifturados com o fangue , o coa- lhavão, & engroffavao do mefmo modo, que o vina- gre coalha o leite, fe o mifturao com elle; & por efta razão coalhado, & engroffado o langue, não poden- do paflar pelas veas, fe retinha dentro no corpo, & fazia nao fó as obftrucções , mas as comichoes; & que o feu remedio avião de fer os abforbentes alcalicos, porque retundidos , & dulcificados os acidos coagu- lantes , fe adelgaçarião os humores, & fecirculariao, & bufcariaõ o verdadeiro caminho para fahirem do corpo, & logo fe tirariao as obftrucções, & as comi- chões, & as mais queixas. .. 6. Comecei pois a cura, dando primeiro que tu- do duas ajudas feitas de meyo quartilho de caldo de frangão cozido com farelos lavados , ajuntandolhe feis onças de affucar mafcavado, fem levar outra cou- fa ; & para o feguinte dia ordenei quatro fangrias no: braço: porque nas faltas antigas dos mefes manda graviffimos Doutores (5.) fangrar primeiro em cima, dando depois cinco, ou feis fangrias nos pes. Feita. efta primeira diligencia , lhe receitei para beber agua . - 63 :
Oblervacaa ..IX. 63 zas , & humores tao groffos , que fe obftruira as . cuacoes menfaes ; &como hum erro he caufa deou* tro erro ., da falta defta coftumada defcarga crefcé- rao, & tresbordara os hamores excremnticios de. maneira,queobrigarao a natureza adeitallos para a fuperficie do corpo , aonde por eftarem reprezados adquirira muita falfugem , & mordicara todas as parte's cutaneas com tanto exceffo, qae fendo pou- cas as unhas das maos para fatisfazer a comichao,ain- da era mais pouca a paciencia paraafofrer ; porque podetdo.efta fenhora foportar os jejuns, os cilicios, as difciplinas , as claufuras , os filencios , &.outras pe- nitencias,& mortificaces , nao.lhe era poffivel tole rar aquelie pruido, porque era taimplacavel, que quafi a defefperava. 5. Como pois eu foffe chamado para curar efta doenca , entendi que toda procedia dos acidos fali- nosexaltados, que mifturados com ofangue , o coa- lhavao, & engroffavaodo mefmo modo, que o vina- gre coalhaleire, feo miftura com elle; & por efta razao coalhado, & engroffado o fangue, nao poden- dopaflar pelas veas, fe retinha dentro no. corpo, & fazia na f6 as obftrucces , mas as coinichos; & que ofeu remedio aviao de fer os abforbentes alcalicos, porque retundidos,& dulcificados os acidos coagu- lantes, fe adelgagariaoos humores, & fecircularia, & bufcaria o verdadeiro.caminho para fahirem do corpo,& logofe tiraria as obftruccoes, & as comi- choes, & as mais queixas. 6.. Comecei pois a cura, dandoprimeiro que tu- doduas ajudas feitas de meyo quartilho de caldo de frangao cozido com farelos lavados , ajuntandolhe feis oncas de affucar mafcavado, fem tevar outra teu- fa ; & para o feguinte dia ordenei quatro .fangrias no: braco: porque nas faltas antigas..dos mefes mandaö graviffimos Doutores (5.) fangrar primeiro em cima, dando depois cinco, ou feis fangrias nos pes. Feita. efta primtira diligencia., lhe receitei para beber agua c0-
* Obfervaçãóá IX. = é = 21as , & humores tão groffos , que fe obftruiraô as — Neas uterinas , & por efta caufa lhe faltãraõ as evas - cuações menfaes ; & como hum erro hecaufa de ou* tro erro , da falta defta coftumada defcarga crefcês rão, & tresbordáraô os humores excrementicios de maneira , que obrigárão a natureza adeitallos para a ' fuperfície do corpo , aonde por eftarem reprezados adquiriraó muita falfugem , & mordicàâraó todasas — + Nr partes cutaneas com tanto exceflo, que fendo pouz casas unhásdas mãos para fatisfazer à comichão,ain- da era mais pouca a paciencia para a fofrer ; porque podendo efta fenhora foportar os jejuns , os cilicios, as difciplinas, as claufuras , os filencios ,“8& outras pe- nitencias, & mortificações , não lhe era poffivel tole. rar aquelle pruido, porque era taGimplacavel, que quafi a defefperava. . Dodo : 5- “Como pois eu fofle chamado para curarefta - : - “doença , entendi que toda procedia dos acidos fali- : ! nosexaltados, que mifturados com o fangue ,'0 coa- lhavão, & engroflavaô do mefmo modo, queo vina-s : gre coalha e leire, fe o mifturaô comelle; & porefta razão coalhado , & engroflado 'ofangue , não poden- ! e. do paflár pelas veas., fe retinha dentro no corpo, & fazia naó FA as obftrucções , mas as comichoês; & que ofeu remedio avião de fer os abforbentes alcalicos, SN porque retundidos , & dulcificados os acidos apagu- Jantes , feadelgaçarião os humores , & fecirculariaõ,. & búfcariaó o verdadeiro caminho para fahirem do 'córpo, & logo fe tirariaô as obftrucções , & as comi- chões, & as mais queixas: Na . 6 Comeceipois acura, dando primeiro que tu- doduas ajudas feitas de meyo quartilho de caldo de frangão cozido com farelos lavados , ajuntandolhe feis onças de aflucar mafcavado , fem levar outra ceu- fa ; & para o feguinte dia ordenei quatro fangrias no: braço: porque nas faltas afitigas. dos meles mándaó graviflimos Doutores (5.) fangrar primeiro em cima, “dando depois cinco, ou feis-fangrias nos .pês. Feita, 'elta primeira diligencia , lhereceitei para beber agua “Co . ES E mi i Ho *
63 Observaçaon IX. zas, & humores tamo grossos, que se obstruiraon as veas uterinas, & por esta causa lhe faltàraon as eva¬ cuaçones mensaes; & como hum erro he causa de ou¬ tro erro, da falta desta costumada descarga crescè¬ ramò, & tresbordárao os humores excrementicios de maneira, que obrigaramo a natureza a deitallos para a superficie do corpo, aonde por estarem reprezados adquiriraon muita salsugem, & mordicàraon todas as partes cutaneas com tanto excesso, que sendo pou¬ cas as unhas das maos para satisfazer à comichamo, ain¬ da era mais pouca a paciencia para a sofrer; porque podendo esta senhora soportar os jejuns, os cilicios, as disciplinas, as clausuras, os silencios, & outras pe¬ nitencias, & mortificaçones, namo lhe era possivel tole¬ rar aquelle pruido, porque era taon implacavel, que quasi a desesperava. 5. Como pois eu fosse chamado para curar esta doença, entendi quo toda procedia dos acidos sali- nos exaltados, que misturados com o sangue, o coa¬ lhavamo, & engrossavaon do mesmo modo, que o vina- gre coalha o leite , se o misturaon com elle ; & por esta razamo coalhado, & engrossado o sangue, nano poden¬ do passar pelas veas, se retinha dentro no corpo, & fazia naon so as obstrucçones, mas as comichoes; & que o seu remedio aviao de ser os absorbentes alcalicos, porque retundidos, & dulcificados os acidos coagu¬ lantes, se adelgaçariamo os humores, & se circulariao, & buscariaon o verdadeiro caminho para sahirem do corpo, & logo se tirariaon as obstrucçones, & as comi¬ choes, & as mais queixas. 6. Comecei pois a cura, dando primeiro que tu¬ do duas ajudas feitas de meyo quartilho dę caldo de frangamo cozido com farelos lavados, ajuntandolhe seis onçàs de assucar mascavado, sem levar outra cou¬ sa; & para o seguinte dia ordenei quatro sangrias no braço: porque nas faltas antigas dos meses mandaon gravissimos Doutores (5.) sangrar primeiro em cima, dando depois cinco, ou seis sangrias nos pès. Feita esta primeira diligencia, lhe receitei para beber agua co¬
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64 Observações Medicas Doutrinaes. cozida com avenca , & pimpinela , soltando em duas camadas della meya onça das minhas pilulas Alcalicas , que saõ o melhor absorbente , & dulcificante que tem a Medicina : (& nas terras onde não se acharem as ditas pilulas , podem servir , ainda que com virtude muito inferior ; os olhos dos caranguejos preparados ) paraque deste modo se fossem dulcificando os acidos congelantes , & consequentemente se fossem soltando , & circulando os humores , que por congelados , & reteudos pelos acidos , eraõ a causa das queixas que padecia . Tambem lhe receitei , para tomar em jejum , & ao sol posto , os oito xaropes seguintes . Tomai de cascas de raizes de salsa das hortas , de lingua de vacca , & de angelica , de cada cousa destas huma onça ; de erva molarinha , luparos , avenca , & cerfolio , de cada cousa destas huma maõ cheya ; de polypodio de carvalho bem machucado huma onça , tudo se coza (conforme os preceitos da Arte) em panela de barro com seis quartilhos de agua commua , até se gastar ametade ; & neste cozimento coado mandei deitar de insusaõ huma onça de folhas de seno de Lapata , (que he melhor que o de Tripoli , porque este he bravio , & faz dores no ventre ,) & passadas doze horas , se torne a coar o tal licor , & a cinco onças delle mandei ajuntar huma onça de xarope Sapor Regis , & dous escropulos de cremores de tartaro verdadeiros ; com estes xaropes naõ só se foraõ purgando suavemente os humores viscosos , & acido-salinos , mas foraõse juntamente abrindo as obstrucções ; & o q mais he, se forão excitando os rins , paraque fizessem bem o officio , que tem , de repurgar pela ourina a massa sanguinaria dos soros salgados , & picantes , que abundavaõ na doente ; porque , como diz Poterio , (6.) pela froxidaõ , & debilidade , ou obstrucções , que os rins contrahem por varias causas , hũa das quaes saõ os alimentos grosseiros , terrestres , ou salgados , succede muitas vezes naõ poderem attrahir os soros , q estaõ misturados com o sangue , & ficando este impuro , & salgado , necessariamente ha de remear , & sahir para fóra à superfície
Obfervações Medicas Doutrinaes. cozida com avenca, & pimpinela, foltando em duas canadas della meya onça das minhas pilulas Alcali- cas, que fao o melhor abforbente, & dulcificante que tem a Medicina : (& nas terras onde não fe acharem as ditas pilulas, podem fervir, aindaque com virtude mais to inferior ; os olhos dos caranguejos preparados ) pa- raque defte modo fe foftem dulcificando os acidos congelantes, & confequentemente fe foffem foltan- do, & circulando os humores, que por congelados, & reteudos pelos acidos, erao a caufa das queixas que padecia. Tambem lhe receitei, para tomar em jejum,. & 20 fol pofto, os oito xaropes feguintes. Tomai de cafcas de raizes de falfa das hortas, de lingua de vac- ca, & de angelica, de cada coufa deftas huma onça; de erva molarinha, luparos, avenca, & cerfolio, de cada coufa deftas huma mao cheya; de polypodio de carvalho bem machucado huma onça, tudofe coza (conforme os preceitos da Arte ) em panela de bar- ro com feis quartilhos de agua commua, até fe gaf- tar ametade; & nefte cozimento coado mandei dei- tar de infufao huma onça de folhas de fenede Lapata, (que he melhor que o de Tripoli, porque efte he bra- vio , & faz dores no ventre, ) &. paffadas doze ho- ras , fe torne a coar o tal licor , & a cinco onças delle mandei ajuntar huma onça de xarope Sapor Regis , & dous ofcropulos de cremores de tartaro verdadeiros; com eftes xaropes naa fo fe forao purgando fuave- mente os humores vifcofos, & acido-falinos, mas fo -. raofe juntamente abrindo as obftrucções; & o q mata. he, fe forão excitando os rins, paraque fizeffem bem a. oficio, que tem , de repurgar pela ourina a maffa fan- guinaria dos foros falgados, & picantes, queabundavào na doente; porque, como diz Poterio, (6.) pela froxi- dao,& debilidade , ou obftrucções, que os rins contra- hem por varias caufas, hua das quaes fao os alimentos groffeiros, terreftres , ou falgados, fuccede muitas ve- zes nao poderem attrahir os foros, q eftaõ mifturados com o langue , & ficando efte impuro , & falgado, ne- ccffariamente ha de remear , & fahir para fora a fuper- ficie -
64 Obfervacoes Medicas Doutrinaes. cozida com avenca, & pimpinela, foltando em dua canadas della meya onca das minhas pilulas Alcali. cas, que fa o mellor abforbente , & dulcificanteqne tem a Medicina : (& nas terras onde naofc acharem as ditas pilula-,podem fervir,aindaquc com virtude mai: to inferior ; ös.olhos dos caranguejos preparados ) pa-. raque defte modo.fe foffem duléificando os acidos Congelantes, & confequentemente fe foffem foltan- do, & circulando os humores, que por congelados, & reteudos pelos acidos, eraa caufa das qucixas qne padecia. Tambem lhe receitei , para tomar cm jejum, & aofol pofto, os oito xaropes feguintes. Tomai de cafcas de raizes de falfa das hortas, de lingua de vac- de erva molarinha, luparos, avenca, &cerfolio, de cada coufa deftas hunama cheya; de polypodio de carvatho bem machucado huma onga, tudofe coza (conforme os preceito's da Arte ) em panela de.bar- Fo com feis quartilhos de agua commua, atéfegaf. tar ametade; & nefte coziménto:coado mandei dei tar de infufaö huma onca de folhas de fenede Lapata, (que he melhor.que o de Tripoli , porque efte he bra-. vio ,& faz dores no ventre,)&.paffadas doze ho ras, fe tornea cqaro tallicor , & acinco oncas delle mandei ajuntar huma onca de xarope Sapor Regi,& . dous fcropulos decremores de tartaro verdadeiros;: com eftes xaropes naafo.fe forao purgando fuave-. mente os humores vifcofos, & acido-falinos,mas fo-. rafe juntamenteabrinda as obftrucsöes, & o mais. he, fe forao excitando os rins, paraque fizefferm bem a. officio , que tem , de repurgar pela ourina a maffa fan- guinaria dos foros falgados,& picantes,queabundava na doente, porgue, como diz Poterio, (.) pela froxi- da,& debilidade , qu obftruccöes, que os rins'contra- hem por varias caufas, htia das quaes.fao.os alimentos groffeirs, terreftres , ou falgadas, fuccede muitas ve-- zes na poderemattrahir os foros , efta mifturados com o fangue,& ficandoefte impuro,& falgado, ne- ccffariarmente ha de remear , & fahir para fóraa fuper: ficie
6% Obfervações Medicas Doutrinaes. cozida com avenca , & pimpinela, foltando emduas — | canadas della meya onça das minhas pilutas Alcali- ” ! €as, que faõ omelhor abforbente , & dulcificante que tem a Medicina: (& nas terras onde nãofe acharem as ditas pijulas, podem fervir,aindaque com virtude muis to inferior ; os.olhos dos caranguejos preparados ) pa- raque defte modo fe foflem duleificando os acidos e... ' — congelantes, & confequentemente fe foflem foltan- do, & circulando os humores, que por congelados, & reteudos pelos acidos, eraõ a caufa das queixas que padecia. Tambem lhe receitei, para tomar em jejum, - & 20 fol pofto, os oito xaropes feguinres. Tomai de cafcas de raizes de falfa das hortas, de lingua de vac-' ca, & deangelica, de cada confa deftas huma onça; . deervamotlarinha, luparos, avenca , &cerfolio, de -« cadácoufadeftas huma maô cheya; de polypodio de - carvalho bem machucado huma onça, tudofe coza (conforme os preceitos da Arte ) em panela de bar-' ro com feis quartilhos de agua commua , até fe af». tar ametade ; & nefte cozimento coado mandei deix tarde infufaô huma onça de folhas de fenede Lapata, (que he melhor que o de Tripoli, porque efte he bra- vio , & faz dores no ventre, ) & pafladas doze hos. ras, fetornea coarotal licor, & acinco onças delle mandei ajuntar huma onça de xarope Sapor Regis, &e .' dous efcropulos de cremores detartaro verdadeiros; com eftes xaropes naõ fó fe foraó purgando fuave- mente os humores vifcofos, & acido-falinos , mas fo-, raófe juntamenteabrindo as obftrucções; & ogqmais, | he, fe forão excitando os rinº, paraque fizefiem bem a officio, que tem , de repurgar pela ourina a mafla fan- guinaria dos foros falgados,& picantes,queabundavaõ na doente; porque, como diz Poterio, (6.) pela froxi- daõ,& debilidade , ou obftrucções, que os rins conrra- hem por varias caufas, ha das quaes faõ.0s alimentos groffeirôs, terreftres , ou falgadas, fuccede muitas ve- zes naó poderem attrahir os foros , j eftaô mifturados. como fangue , & ficando efte impuro, & falgado, ne. | ceffariamente ha de remear , & fahir para fóra à faper | o. : cie «
64 Observaçones Medicas Doutrinaes. cozida com avenca, & pimpinela, soltando em duas canadas della meya onça das minhas pilulas Alcali¬ cas, que saon o melhor abforbente, & dulcificante que tem a Medicina: (& nas terras onde namo se acharem as ditas pilulas, podem servir, aindaque com virtude mui¬ to inferior; os olhos dos caranguejos preparados) pa¬ raque deste modo se fossem dulcificando os acidos congelantes, & consequentemente se fossem soltan- do, & circulando os humores, que por congelados, & reteudos pelos acidos, eraon a causa das queixas que padecia. Tambem lhe receitei, para tomar em jejum, & ao sol posto, os oito xaropes seguintes. Tomai de cascas de raizes de salsa das hortas, de lingua de vac- ca, & de angelica, de cada cousa destas huma onça; de erva molarinha, luparos, avenca, & cerfolio, de cada cousa destas huma maon cheya; de polypodio de carvalho bem machucado huma onça, tudose coza (conforme os preceitos da Arte) em panela de bar- ro com seis quartilhos de agua commua, até se gas¬ tar ametade; & neste cozimento coado mandei dei¬ tar de infusaon huma onça de folhas de sene de Lapata, que he melhor que o de Tripoli, porque este he bra- vio, & faz dores no ventre,) & passadas doze ho- ras, se torne a coaro tal licor, & a cinco onças delle mandei ajuntar huma onça de xarope Sapor Regis, & dous escropulos de cremores de tartaro verdadeiros; com estes xaropes naon so se foraon purgando suave¬ mente os humores viscosos, & acido-salinos, mas fo¬ raonse juntamente abrindo as obstrucçones; & o que mais he, se foramo excitando os rins, paraque fizessem hem o officio, que tem, de repurgar pela ourina a massa san- guinaria dos soros salgados, & picantes, que abundavaon na doente; porque, como diz Poterio, (6.) pela froxi¬ daon, & debilidade, ou obstrucçones, que os rins contra¬ hem por varias causas, huma das quaes saon os alimentos grosseiròs, terrestres, ou salgados, succede muitas ve¬ zes naon poderem attrahir os soros, quae estaon misturados com o sangue , & ficando este impuro, & salgado, ne¬ cessariamente ha de remear, & sahir para fora à super¬ ficie
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Observaçaõ IX. 65 ficie do corpo , corroendoa , vellicandoa , & fazendo em humas pessoas comichões , em outras pustulas , ou lepras , & em outras hydropesias . Nem se admirem que eu mandasse tomar os sobreditos oito xaropes duas vezes no dia ; porque tenho observado com a experiencia de muitos annos que as doenças antigas , & as que tem raizes mui profundas , ou estaõ em partes mui distantes , se não podem curar sem remedios mui efficazes , & repetidos , porque de outra sorte , sendo os remedios leves , ou poucas vezes applicados , naõ chegão com virtude aos lugares enfermos aonde hão de servir , & conseguintemente se balda o trabalho , & não se consegue a saude . Não he opinião minha , he sentença de Galeno , (7.) o qual fallando com os Medicos , lhes diz assim : Se alguma parte estiver doente em lugar muito distante , serà razaõ excogitar algum remedio , cuja virtude seja taõ efficaz , & permanente , que não se acabe antes de chegar ao lugar aonde ha de servir . E em outro lugar (8.) diz : Mais valentes , & efficazes remedios saõ necessarios para as doenças , que estaõ em partes profundas , que para as que estaõ na superficie do corpo . E em outra parte (9.) diz : Pela qual razaõ ou o medicamento seja daquelles , que se applicaõ por fora , ou daquelles que se tomao por dentro , lhe naõ avemos de considerar a virtude , que de presente tem , mas que virtude teraõ , quando chegarem ao lugar offendido ; porque verdadeiramente o remedio , que passa por muitas partes antes que chegue àquella aonde ha de servir , perde totalmente na passagem a virtude , & efficacia , se desde o seu principio he fraco , & de pouca virtude . 7. Preparados que tive os humores com os xaropes mui repetidos , ordenei a purga seguinte . Tomem de xarope sobredito cinco onças , & nellas mandei infundir dous escropulos de agarico trociscado , & meya onça de catholicaõ atado em ligadura , & passadas seis horas , se coe tudo por panno tapado , & se ajuntem dous escropulos de cremores de tartaro verdadeiro , & se dè a beber ao enfermo ; & passados dous dias,
65 'Obfervaçao IX. ficie do corpo, cortoendoa, vellicandoa, & fazendo em humas peffoas comichões , em outras puftulas, ou lepras, & em outras hydropefias. Nem fe admi- rem que eu mandaffe tomar os fobreditos oito xaro- pes duas vezes no dia ; porque tenho obfervado com a experiencia de muitos annos que as doenças antigas, & as que tem raizes mui profundas, ou eftaő em par- tes mui diftantes , fe não podem curar fem remedios mui efficazes, & repetidos, porque de outra forte, fendo os remedios leves , ou poucas vezes applica- dos, naõ chegão com virtude aos lugares enfermos aonde hão de fervir , & confeguintemente fe balda o trabalho , & não fe confegue a faude. Não he opi- nião minha,he fentença de Galeno, (7.) o qual fallan- do com os Medicos, lhes diz affim : Se alguma parte eftiver doente em lugar muito diftante, fera razaõ ex- cogitar algum remedio , cuja virtude feja tao eficaz, & permanente, que não fe acabe antes de chegar ao lugar aonde ha de fervir. E em outro lugar (8.) diz : Mais valentes, & eficazes remedios fao neceffarios para as doenças , que eftaõ em partes profundas, que para as que eftao na Superficie do corpo. E em outra parte (9.) diz: Pela qual razaõ ou o medicamento feja daquelles , que fe applicaõ por fora, ou daquelles que fe tomao por den- tro, the nao avemos de considerar a virtude , que de pre- fente tem , mas que virtude terao , quando chegarem ao lugar ofendido ; porque verdadeiramente o remedio, que paffa por muitas partes antes que chegue aquella conde ha de fervir , perde totalmente na paffagem a vir- tude , & efficacia, fe defde o feu principio be fraco , & de pouca virtude. : 7. Preparados que tive os humores com os xaro- pes mui repetidos , ordenei a purga feguinte. Tomem de xarope fobredito cinco onças, & nellas mandei in- fundir dous efcropulos de agarico trocifcado, & meya onça de catholicao atado em ligadura , & paffadas feis horas, fe coe tudo por panno tapado, & fe ajun- tem dous efcropulos de cremores de tartaro verda- deiro, & fede a beber ao enfermo ; & paffados dous dias,
Obfervacao. IX: 6`5 fcie döcorpo, corroendoa, vellicandoa,&.fazendo em humas peffoas comiches , em outras puftulas, ou lepras, & em outras hydropefias. Nem fe admi- 'rem que eu mandaffe tomar os fobreditos oito xaro- pés duas vezes no dia ; porque tenh obfervado com a experiencia de'muitos annos que'as doencas antigas, & as que tem raizes mui profundas , ou eftaö em par- tes muidiftantes, fe nao podem curar fem reimedios mui efficazes, & repetidos, porque de outra forte, fendo os remedios leves , ou poucas vezes applica- dos, nao chegao com virtude aos lugares enfermo$ aonde hao defervir , & confeguintemente fe balda trabalho , & nao fe confegue a faude. Näo heopi- niao minha,he fentenca de Galeno, (7.) o qual fallan- docom os Medicos, lhes diz affim : Se alguna parte eftiver doente em lugar muito diftante, /era razaoex- cogitar algum remedio , cuja virtude feja ta efficaz, ds permanente, que naofe acabe anites de chegar ao lugar aonde ha de/ervir. E em outro lugar(8.) diz : Mai valentes, efficazes reinedios fa neceffarios para as doengas, que efta em partes profundas, que para as que efta nafuperficie docorpo. E em outra parte (9.) diz: Pelaqual raza ou o medicamentofeja daquelles, que feapplicapor fora, ou daquelles quefe toma por der- tro, lbe na avemos de conpderar & virtude , gue de pre- fente tem, mas que virtudetera; quando chrgarem ao lugar offendido ; porque verdadeiramente o remedis que papfa por muitas partes antes que cbegue aquclla aonde ba defervir , perde totalmente napafflagem a vir- tude, &efficacia, Je defde ofeuprincipio be fraco, de pouca virtude. :. 7. Preparados que tive os humores comos xaro- pes mui repetidos, ordenei a purga feguinte. Tomem de xarope fobredito cinco oncas, & nellas mandei in- fundir dous efcropulos de agarico trocifcado, & meya onca de catholica atado em ligadura , & paffadas feis horas, fe coe. tudo por panno tapado, & fe ajun- tem dous efcropulos de cremores de tartaro verda- deiro, & fede abeber aoenfermo; & paffados dous dias,
Obfervação TX. 65 ficie dôcorpo, cortoendoa , vellicandoa , & fazendo , em humas pefloas comichões , em outras puftulas, . ou lepras , & em outras hydropefias. Nem fe admi- Tem que en mandaíle tomar os fobreditos oito xaro- . pes duas vezes no dia ; porque tenho obfervado coma experiencia de' muitos annos que as doenças antigas, & as que tem raizes mui profundas , ou eftaô em par- tes muidiftantes , fe não podem curar fem remedios mui efficazes , & repetidos, porque de outra forte, fendo os temedios leves , ou poucas vezes applica- dos , naó chegão com virtude aos lugares enfermos aonde hão defervir , & confeguintemente fe balda o trabalho , & não fe confegue a faude. Não he opi- nião minha,he fentença de Galeno, (7.) o qual fallan- do com os Medicos , lhes diz afim : Se alguma parté eftíiver doente em lugar muito diftante , fera razao ex- cogitar algum remedio , cuja virtude feja tao efficaz, & permanente , que não fe acabe antes de chegar ao lugar aonde ba de fervir. É em outro lugar (8.) diz: Mas valentes, & éfficazes remedios fão neceffarios para à doenças , que eftao em partes profundas, que parva as que eftao na fiperficie do corpo. É em outra parte (9.) diz: Pela qual razao ouo medicamento feja daqueles, que feapplicao por fora , ou daquelles que fe tomao por der- tro, lhe não avemos de conhderar à virtude , que de pre- Sente tem, mas que virtude terão , quando chegarem ao lugar offendido ; porque verdadeiramente o remedio, que pf [A muitas partes antes que chegue àquella aonde ba de fervir , perde totalmente na palfagem a vir- tude , E eficacia, fe defde o feu principio be fraco , & de Poucasvirtude. o ' '7. Preparados quetive os humores com os xaro- pes mui repetidos, ordenei a purga feguinte. Tomem de xarope fobredito cinco onças , & nellas mandei in- fundir dous efcropulos de agarico trocifcado, & meya onça de catholicaô atado em ligadura , & pafladas feis horas, fe coe tudo por panno tapado, & fe ajun- tem dous efcropulos de cremores de tartaro verda- deiro, & fedê a beber ao enfermo ; & paflados dous
Observaçaon IX. 65 ficie dò corpo, corfoendoa , vellicandoa , & fazendo em humas pessoas comichôes, em outras pustulas, ou lepras, & em outras hydropesias. Nem se admi¬ rem que eu mandasse tomar os sobreditos oito xaro¬ pes duas vezes no dia; porque tenho observado com a experiencia de muitos annos que as doenças antigas, & as que tem raizes mui profundas, ou estao em par¬ tes mui distantes, se namo podem curar sem remedios mui efficazes, & repetidos, porque de outra sorte, sendo os remedios leves, ou poucas vezes applica¬ dos, nao chegao com virtude aos lugares enfermos aonde hao de servir, & conseguintemente se balda o trabalho, & namo se consegue a saude. Namo he opi¬ niamo minha, he sentença de Galeno, (7.) o qual fallan- do com os Medicos, lhes diz assim: Se alguma parte estiver doente em lugar muito distante, sera razaon ex¬ cogitar algum remedio, cuja virtude seja taon essicaz, & permanente, que nao se acabe antes de chegar ao lugar aonde ha de servir. E em outro lugar (8.) diz: Mau valentes, & efficazes remedios sao necessarios para as doenças, que estao em partes profundas, que para as que estao na superficie do corpo. E em outra parte (9.) diz: Pela qual razaon ouo medicamento seja daquelles, que se applicaon por fora, ou daquelles que se tomaò por den¬ tro, lhe nao avemos de considerar à virtude, que de pre¬ sente tem, mas que virtude terao, quando chegarem ao lugar offendido; porque verdadeiramente o remedio, que passa por muitas partes antes que chegue aquella aonde ha de servir, perde totalmente na passagem a vir- tude, & efficacia, se desde o seu principio he fraco, & de pouca virtude. 7. Preparados que tive os humores com os xaro- pes mui repetidos, ordenei a purga seguinte. Tomem de xarope sobredito cincò onças , & nellas mandei in- fundir dous escropulos de agarico trociscado, & meya onça de catholicaon atado em ligadura, & pastadas seis horas, se coe tudo por panno tapado , & se ajun- tem dous escropulos de cremores de tartaro verda- deiro, & se dè a beber ao enfermo ; & passados dous dias,
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66 Observações Medicas Doutrinaes. dias , lhe fiz tomar a mesma purga , porque he mui propria para este caso , & descansando tres dias , lhe fiz tomar , de cinco em cinco dias , as pilulas seguintes , que para alimpar o corpo de humores grossos , viscosos , & salinos , excedem a todos os remedios da Arte . Tomai de mercurio precipitado com oleo de enxofre campanado cinco grão , misturemse com o que bastar de confeiçaõ de Jacintos , & se forme huma pilula , que se tomarà na madrugada , & descansando cinco dias se tome outra prepara do mesmo modo , & se vaõ continuando , até que se tomem as ditas seis , & descansando entaõ seis dias , lhe ordenei tomasse as duas apozemas seguintes . Tomai de passas sem grainha huma onça , de cascas de raizes de borragens , de salsa , de funcho , & de grama , de cada cousa destas tres oitavas , tudo se coza em panela de barro , com o que bastar de agua commua para duas apozemas , & neste cozimento se infundaõ de assucar rosado de Alexandria quatro onças , de folhas de sene de lapata quatro oitavas , de conserva de borragens onça & meya , & coandose tudo com forte expressaõ , ajuntei a cinco onças deste cozimento duas onças de xarope Rey , & huma oitava de cremor de tartaro ; & com este remedio conheceo notavel melhoria. Finalmente para acabar de vencer huma doença taõ antiga , & huma comichaõ taõ rebelde , ordenei (como remedio precisamente necessario para abrir as veas ) o uso do aço , que tomou quarenta dias , preparado sem vinagre , sem oleo de enxofre , & sem outros dissolventes azedos , nem corrosivos , mas preparado sómente com agua da fonte ; porque a experiencia me tem ensinado , que os remedios , que se preparaõ com licores azedos , perdem a virtude antacida , & absorbente dos humores acres , & jà naõ ficaõ alcalicos vazios , porquanto estaõ cheyos dos dissolventes azedos com que se preparàraõ , & por esta razão naõ surtem os grandes effeitos , que delles se esperaõ . Pelo contrario os remedios , que se preparaõ sem menstruos azedos , conservaõ a vírtude antacida , absorbente , & alcalica,
66 Obfervações Medicas Doutrinaes. dias, lhe fiz tomar a mefma purga, porque he mui propria para efte cafo, & defcanfando tres dias, lhe fiz tomar, de cinco em cinco dias., as pilulas feguin- tes , que para alimpar o corpo de humores groffos, vifcofos, & falinos, excedem a todosos remedios da Arte. Tomai de mercurio precipitado com oleo de enxofre campanado cinco grãos, mifturemfe com o que baftar de confeiçao de Jacintos, & fe forme huma pilula, que fe tomarà na madrugada, & defcanfando cinco dias fe tome outra preparada do mefmo modo, & fe vao continuando, até que fe tomem as ditas feis, & defcanfando entao feis dias , lhe ordenei tomaffe as duas apozemas feguintes. Tomai de paffas fem grai- nha huma onça, de cafcas de raizes de borragens, de falfa, de funcho, & de grama, de cada coufa deftas tres oitavas , tudo fe coza em panela de barro, com o que baftar de agua commùa para duas apozemas, & nefte cozimento fe infundao. de affucar rofado de Alexandria quatro onças, de folhas de fene de lapa- ta quatro oitavas, de conferva de borragens onça & meya, & coandofe tudo com forte expreffao, ajun- tei a cinco onças defte cozimento duas onças de xa- rope Rey , & huma oitava de cremor de tartaro; & com efteremedio conheceo notavel melhoria. Final- mente para acabar de vencer huma doença tao anti- ga, & huma comichao tao rebelde, ordenei ( como remedio precifamente neceffario para abrir as veas) o ufo doaço, que tomou quarenta dias , preparado fem vinagre, fem oleo de enxofre, & fem outros dif- folventes azedos , nem corrofivos, mas preparado fó- mente com agua da fonte ; porque a experiencia me tem enfinado, que os remedios, que fe preparaõ.com licores azedos, perdem a virtude antacida, & abfor- bente dos humores acres , & jà nao ficao alcalicos va- zios, porquanto eftaõ cheyos dos diffolventes azedos com que fe prepararao, & por efta razão naõ furtem os grandes effeitos, que delles fe efperaõ. Pelo contra- rio os remedios, que fe preparaõ fem menftruos aze- dos, confervao a virtude antacida , abforbente , & al- calica,
66 Obfervacoes Medicas Doutrinaés. dias, lhe fiz tomar a mefma purga, porque hemui propria para efte cafo,& defcanfando tres dias, lhe fiz tomar , de cinco em cinco dias, as pilulas feguin- tes, que para alimpar o corpo de humores groffos, vifcofos, & falinos, excedem a todosos remedios da Arte. Tomai de mercurio precipitado com oleode enxofre campanado cinco graos, mifturemfe com o que baftar de confeica de Jacintos, & fe forme huma pilula, que fe tomara na madrugada, & defcanfando cinco dias fe tome outra preparada do mefmo modo, &feva continuando, ate que fe tomem as ditas feis, & defcanfando enta feis dias , lhe ordenei tomaffe as duas apozemas feguintes. Tomai de paffas fem grai- nhahuma onca, de cafcas de raizes.deborragens, de falfa, defuncho, & de grama, decada coufa deftas tresoitavas, tudo fecoza em panela de barro, com oque baftar de agua coinmua para duas apozemas, & nefte cozimento fe infunda.de affucar rofado de Alexandria quatro onsas, de folhas de fene delapa- ta quatro oitavas, de conferva de borragens. onca & meya,& coandofe tudo com forte expreffa, ajun- tei a cinco oncas defte cozimento duas oncas dexa- rope Rey , &huma oitava de cremor de tartaro; & com efte remedio conheceo notavel melhoria. Final- mente para acabar de vencer huma doenca ta anti- ga, & huma comicha ta rebelde, ordenei (como remedio precifamente neceffario para abrir as veas) oufo doaco, que tomou quarenta dias ; preparad fem vinagre, fem oleo de enxofre, & fem outros dif- folventes azedos , nem corrofivos , mas preparado f6- mente con agua da fonte ; porqueaexperiencia me tem enfinado, queos remedios, que fe prepara.com licores azedos, perdem a virtude antacida, & abfor- bente dos humores acres , & ja na fica alcalicos va zios, porquantoefta cheyos dos diffolventes azedos com que fe preparara, & por efta razao nafurtem os grandes effeitos, que delles feefpera. Pelocontra- .rio os remedios, que fe prepara fem menftruos aze- dos, conferva a virtude antacida , abforbente, & al calica,
66 Obfervações Medicas Doutrinaés. dias, lhe fiz tomar a mefma.purga, porque be mui ropria para efte cafo, & defcanfando tres dias, lhe. É, tomar , de cinco em cinco dias, as pilulas feguin-' tes, que para alimpar o corpo de humores groflos, * vifcolos, & falinos, excedem a todosos remedios da Arte. Tomai de mercurio precipitado com oleo de enxofre campanado cinco grãos , mifturemfe com o 'que baftar de confeiçaô de Jacintos, & fe forme huma pilula , que fe tomarà na madrugada, & defcanfando cinco dias fe tome outra preparada do mefmo modo , & fevaõ continuando , até que fetomem as ditas feis, & defcanfando entaóõ feis dias , lhe ordenei tomaíle as duas apozemas feguintes. Tomai de paífas fem grai- nha huma onça, de cafcas de raizes de borragens, de falfa, defuncho, & de grama , decada coufa deftas « tresoitavas, tudo fecoza em panela de barro, com oque baftar de agua commua para duas apozemas, & nefte cozimento fe infundaõ. de aflucar rofado de Alexandria quatro onças, de folhas de fene delapa- ta quatro eitavas , de conferva de borragens onça & meya , & coandofe tudo com forte expreffaô, ajun-. teia cinco onças defte cozimento duas onças de xa- rope Rey, & huma oitava de cremor de tartaro; & com efte remedio conheceo notavel melhoria. Final. mente para acabar de vencer huma doença taô anti= ga, & huma comichaõ taô rebelde, ordenei ( como . remedio precifamente neceflario para abrir as veas) oufo doaço, que tomou quarenta dias ; preparada fem vinagre, femoleo de enxofre , & fem outros dif. folventes azedos , nem corrofivos, mas preparado fó- mente com agua da fonte; porque a experiencia me tem enfinado, que os remedios , que fe preparaô com licores azedos , perdem a virtude antacida , & abfor- . bente dos humores acres , & jà naô ficaó alcalicos vaz zios, porquanto eftaô cheyos dos diffolventes azedos com que fe prepáràraõ, & por efta razão naó furtem os grandes effeitos, que delles fe efperaõ. Pelo contra- Fio os remedios , que fe preparaô fem menftruos aze- dos , confervaô a virtude antacida , abforbente, & al- calica,
66 Observaçones Medicas Doutrinaes. dias, lhe fiz tomar a mesma purga, porque he mui propria para este caso, & descansando tres dias, lhe fiz tomar, de cinco em cinco dias, as pilulas seguin¬ tes, que para alimpar o corpo de humores grossos, viscosos, & salinos, excedem a todos os remedios da Arte. Tomai de mercurio precipitado com oleo de enxofre campanado cinco granos, misturemse com o que bastar de confeiçaon de Jacintos , & se forme huma pilula, que se tomarà na madrugada, & descansando cinco dias se tome outra preparada do mesmo modo , & se vaon continuando, até que se tomem as ditas seis, & descansando entaon seis dias, lhe ordenei tomasse as duas apozemas seguintes. Tomai de passas sem grai¬ nha huma onça, de cascas de raizes de borragens, de salsa, de funcho, & de grama, de cada cousa destas tres oitavas, tudo se coza em panela de barro, com o que bastar de agua commua para duas apozemas, & neste cozimento se infundaon de assucar rosado de Alexandria quatro onças, de folhas de sene de lapa- ta quatro oitavas, de conserva de borragens onça & meya, & coandose tudo com forte expressao, ajun¬ tei a cinco onças deste cozimento duas onças de xa- rope Rey, & huma oitava de cremor de tartaro; & com este remedio conheceo notavel melhoria. Final¬ mente para acabar de vencer huma doença tao anti¬ ga, & huma comichaon tao rebelde, ordenei (como remedio precisamente necessario para abrir as veas ouso do aço, que tomou quarenta dias, preparado sem vinagre, sem oleo de enxofre, & sem outros dis- solventes azedos, nem corrosivos, mas preparado so¬ mente com agua da fonte; porque a experiencia me tem ensinado, que os remedios, que se preparaon com licores azedos, perdem a virtude antacida, & absor¬ bente dos humores acres, & jà naon ficaon alcalicos va¬ zios, porquanto estaon cheyos dos dissolventes azedos com que se preparàraon, & por esta razano naon surtem os grandes effeitos, que delles se esperao. Pelo contra- rio os remedios, que se preparao sem menstruos aze¬ dos, conservaon a virtude antacida, absorbente , & al¬ calica,
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Observaçaõ IX. 67 calica, em que consiste todo o seu prestimo , que he chupar , & embeber em si os succos acidos corrosivos : & como o aço preparado sem cousas azedas seja hum dos melhores absorbentes , que tem a Medicina , por esta razão não quis usar delle preparado com os sobreditos azedos , para que ficando absorbente vazio tomasse em si a acrimonia dos humores , que nesta senhora redundavão , & os congelavaõ , & os naõ deixavaõ circular , & por esta razão reprezados , & engrossados os ditos humores , não só oppilavão as vias , mas pela demora adquiriraõ huma tal acrimonia , & salsugem , que causáraõ pustulas , coceiras , & comichões desesperadas , que só se tiraõ bem , descoalhando-os & só se descoalhão , tirandolhes o azedume. Dei pois à sobredita senhora ( quarenta dias ) o aço preparado sem cousas corrosivas , dandolhe a beber , passadas tres horas , hum quartilho de soro de cabras ; & com estes remedios se curou de taõ cruel enfermidade . 8 . Bem sei não ha de faltar quem me condemne , por dar quarenta dias aço a huma doente , que se estava abrazando em Vesuvios de fogo , & comichaõ intoleravel ; mas ainda que eu saiba que por defender a verdade ha de perigar o meu credito , eu quero antes perdello , que perder a alma , & assim hey de fazer sempre o que entender que he melhor para a vida dos enfermos , & digaõ os desaffeiçoados o que quizerem , porque contra a verdade , & a razão (10.) nenhũa força tem as settas da maledicencia , & seria eu reo de hum grande crime , se privasse ao mundo de huma noticia tão importante ao bem cõmum , mayormente quando me consta que ha Medicos taõ medrosos , que naõ ousaõ a dar mais que nove dias o aço ; o qual temor , & covardia naõ procede de outra cousa mais que de estarem atados às regras das velhas , que firmemente entendem naõ póde aver obstrucção taõ pertinaz , que se naõ renda com nove dias de aço : comtudo como nas cousas humanas nenhuma aja taõ infallivel , & perpetua , que naõ tenha suas excepções ; por isso (con-
67 Obfervação IX. calica, em que confifte todo o feu preftimo, que he chupar, & embeber em fi os fuccos acidos corrofi- vos : & como o aco preparado fem coufas azedas feja hum dos melhores abforbentes, que tem a Medicina, por efta razão não quiz ufar delle preparado com os fobreditos azedos, para que ficando abforbente va- zio tomaffe em fi a acrimonia dos humores , que nefta fenhora redundavão, & os congelavao, & os nao dei- xavaõ circular, & por efta razão reprezados, & en- groffados os ditos humores, não fó oppilavão as vias, mas pela demora adquiriraõ huma tal acrimonia, & falfugem, que caufarao puftulas, coceiras, & comi- chões delefperadas, que fó fe tirao bem , defcoalhan- do-os, & fo fe defcoalhão, tirandolhes o azedume. Dei pois à fobredita fenhora ( quarenta dias ) o aço preparado fem coufas corrofivas, dandolhe a beber, paffadas tres horas , hum quartilho de foro de cabras; & com eftes remedios fe curou de tao cruel enfermi- dade. 8. Bem fei não ha de faltar quem me condemne, por dar quarenta dias aço a huma doente, que fe ef- tava abrazando em Vefuvios de fogo, & comichao in- toleravel ; mas ainda que eu faiba que por defender a verdade ha de perigar o meucredito, eu quero antes perdello, que perder a alma, & affim hey de fazer fem- pre o que entender que he melhor para a vida dos en- fermos, & digao os defaffeiçoados o que quizerem, porque contra a verdade , & a razão (10.) nenhua for- ça tem as fettas da maledicencia,& feria eu reo de hum grande crime , fe privaffe ao mundo de huma noticia tão importante ao bem comum , mayormente quan- do me confta que ha Medicos taõ medrofos, que naõ oufao a dar mais que nove dias o aço; o qual temor, & covardia nao procede de outra coufa mais que de eftarem atados às regras das velhas, que firmemen- te entendem na póde aver obftrucção taõ pertinaz, que fe naõ renda com nove diasde aço: comtudo co- mo nas coufas humanas nenhuma aja tao infallivel; & perpetua , que nao tenha fuas excepções ; por iffo. (con-
Obfervacao IX. 67 calica, em.que confifte todo ofeu preftimo, que he chupar,& embeber em fi os fuccos acidos corrofi. vos :& como o aco preparado fem coufas azedas feja hum dos melhores abforbentes, que tem a Medicina, per efta razao naoquiz ufar delle preparado com os fobreditos azedos, para que ficando abforbente: va- zio tomaffe em fi a acrimonia dos humores , que nefta fenhora redundavao,& os congelava, & os na dei- xavao circular, & por efta razao reprezados, & en- groffados os ditos humores , naof6 oppilavao as vias, mas pela demora adquiriraö huma tal acrimonia, & falfugem, que caufara puftulas, coceiras, & comi- chöes defefperadas, que f6 fe tira bem , defcoalhan- do-os, & f6 fe defcoalhao, tirandolhes o azedume: Dei pois a fobredita fenhora ( quarenta dias ) oaco preparadofern coufas corrofivas, dandolhe abeber, paffadas tres.horas , hum quartilho de foro de cabras; & com eftes.remedios fe curou de tacruel enfermir dade. 8. : Bem fei nao ha de faltar quem me condemne, por dar quarenta dias aco a huma doente, que fe ef- tava abrazando em Vefuvios de fogo, & comicha in- toleravel; mas ainda que cu faiba que por defender a verdade ha de perigar o meucredito, eu quero antes perdello, que perder a alma, & affim hey dé fazer fem- pre oque entender que hemelhor para a vida dos en- fermos, & diga os defaffeicoados o que quizerem, porquecontra a verdade , & a razao (1o.) nenhúa for- grande crime, fe privaffe ao mundo de huma noticia 1ao importante ao bein cömum., mayormente quan- dome conftaque ha Medicos ta medrofos , que na ufaa darmais que nove dias o aco, o qual temor, & covardia na procede deoutra coufa mais que de eftarem atados as regras das yelhas, que firmemen- te entendem na póde aver obftruccaö ta pertinaz, que fe naö rendacom nove dias de aco : contudo co- monas coufas humanas nenhuma aja ta infallivel; & perpetua, que na tenha fuas excepcoes ; por iffo. (con-
* —Oblervação IX. 67 : calica, em que confifte todo o feu preítimo, que he chupar, '& embeber em fi os fuccos acidos corrofi- vos :& como o aço preparado fem coufas azedas feja - hum dos melhores abforbentes, que tema Medicina, per efta razão não quiz ufar delle preparado com os Tobreditos azedos , para que ficando abforbente va- zio tomaíle em fi a acrimonia dos humores , que nefta fenhora redundavão, & os congelavao, & os naó dei- | xavaõô circular, & por eta razão reprezados , & en- groffados ns ditos humores , não fó oppilavão as vias, mas pela demora adquiriraô huma tal acrimonia, & x falfugem, que caufãrao puftulas, coceiras, & comi- chões delefperadas , que fó fe tirao bem , defcoalhan- do-os , & fó fe defcoalhão, tirandolhes o azedume. Dei pois à fobredita fenhora ( quarenta dias ) oaço , preparado fem coufas corrofivas, dandolhe a beber, : pafladas tres.horas, hum quartilho de foro de cabras; , & com eftes remedios fe curou de taô cruel enfermi- 1 NE dade. : ENA, | 8. - Bem fei não hade faltar quem me condemne, . > PESTE por dar quarenta dias aço a huma doente, que fe ef- tava abrazando em Vefuvios de fogo, & comichaõ in- toleravel; mas ainda que eu faiba que por defender a verdade ha de perigar o meucredito, eu quero antes perdello, que perder a alma, & affim-hey de fazer fem- re o que entender que heinelhor para a vida dos en- ermos , & digaô os defaffeiçoados o que quizerem, porque contra a verdade , & a razão (10.) nenhãa for- çatemas fettas da maledicencia,& feria eu reo de hum grande crime, fe privafle ao mundo de huma noticia . táãoimportante ao bem cômum , mayormente quan- do me confta que ha Medicos taô medrofos, que naõ nuíaõ a dar mais que novedias o aço; o qual temor, & covardia naô procede de outra coufa mais que de eftarem atados às regras das velhas, que irmemen- te entendem naõ pode aver obftrucção taó pertinaz, que fe naô renda com nove dias de aço : comtudo co- mo nas coufas humanas nenhuma aja taô infallivel; & perpetua , que naó tenha fuas excepções; pos iflo. : con- . e Y
Observaçao IX. 67 calica, em que consiste todo o seu prestimo, que he chupar, & embeber em si os succos acidos corrosi¬ vos : & como o aço preparado sem cousas azedas seja hum dos melhores absorbentes, que tem a Medicina, por esta razamo namo quiz usar delle preparado com os sobreditos azedos, para que ficando absorbente va¬ zio tomasse em si a acrimonia dos humores, que nesta senhora redundavamo, & os congelavaon, & os nao dei¬ xavao circular, & por esta razamo reprezados, & en¬ grossados os ditos humores, namo só oppilavamo as vias, mas pela demora adquiriraon huma tal acrimonia, & salsugem, que causaraon pustulas, coceiras, & comi¬ chones desesperadas, que so se tiraon bem , descoalhan- do-os, & só se descoalhao, tirandolhes o azedume. Dei pois à sobredita senhora (quarenta dias) o aço preparado sem cousas corrosivas, dandolhe a beber, passadas tres horas, hum quartilho de soro de cabras; & com estes remedios se curou de tao cruel enfermi¬ dade. 8. Bem sei namo ha de faltar quem me condemne, por dar quarenta dias aço a huma doente, que se es- tava abrazando em Vesuvios de fogo, & comichaon in¬ toleravel; mas ainda que eu saiba que por defender a verdade ha de perigar o meucredito, eu quero antes perdello, que perder a alma, & assim hey de fazer sem- pre ò que entender que he melhor para a vida dos en- fermos, & digaon os desaffeiçoados o que quizerem, porque contra a verdade , & a razano (10.) nenhuma for ça tem as settas da maledicencia, & seria eu reo de hum grande crime, se privasse ao mundo de huma noticia tamo importante ao bem commum, mayormente quan¬ do me consta que ha Medicos taon medrosos, que naon ousaon a dar mais que nove dias o aço; o qual temor, & covardia naon procede de outra cousa mais que de estarem atados às regras das velhas, que firmemen te entendem naon pode aver obstrucçamo tao pertinaz, que se naon renda com nove dias de aço: comtudo co¬ mo nas cousas humanas nenhuma aja tao infallivel; & perpetua, que naôn tenha suas excepçones; por isso (con¬
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68 Observações Medicas Doutrinaes. ( conforme a experiencia de muitos annos ) conheço que naõ tem numero certo os dias , que se haõ de dar os remedios ; mas o que tenho por certo he , que se devem continuar atè se vencer a doença , ou atè que os effeitos mostrem que naõ convem continuallos : naõ he só voto meu , he conselho de Tito Livio . (11.) 9. Esta verdade experimentei na sobredita enferma , a qual estava tão obstruida , que se usara sómente de tres xaropes , de huma purga , de tres apozemas , & de nove dias de aço , como he costume de alguns Medicos ordinarios , me cansaria de balde ; porque como as obstrucções estivessem em partes mui distantes , & fossem taõ antigas , era impossivel vencellas em poucos dias , nem com remedios leves , mas com os activos , & muito continuados : (12.) & porque eu o fiz assim , por isso a doente cobrou saude perfeitissima , não obstante esta tida por incuravel ; porque absorbidos os humores acidos pela virtude alcalica do aço , ficou o sangue mais fluido , & capaz de se poder continuar a circulaçaõ , & baixarem os meses copiosamente , por ter as vias abertas ; & assim se tirou felizmente a comichaõ , & se vio restituida ao seu natural estado , & saude desejada. 10 . Desta Observaçaõ aprendão os Medicos principiantes , que quando os remedios estiverem bem indicados da doença , aindaque logo não aproveitem , nem por isso os larguem , antes constantemente os continuem muito tempo , porque elles viraõ a fazer o que se pertende : assim o a conselha Galeno , ( 13. ) & eu o faço sempre assim. 11. O mesmo quero se entenda do uso dos xaropes , das purgas , das apozemas , das tisanas , dos sudorificos , do aço , do leite , dos foros , dos banhos , das ajudas purgativas , & de ameijoada , das irrigações de leite , & de quaesquer outros medicamentos ; porque he puerilidade , ou ignorancia crassa affirmar que os xaropes haõ de ser tres , as purgas huma , as apozemas quatro , as tisanas seis , & que o aço se ha de dar só nove dias ; sendo certo que os medicamentos ( como
68 Obfervações Medicas Doutrinaes. (conforme a experiencia de muitos annos ) conheço que nao tem numero certo os dias , que fe haõ de dar os remedios ; mas o que tenho por certo he, que fe de- vem continuar atè fe vencer a doença, ou atè que os effeitos moftrem que naõ convem continuallos : naõ he fó voto meu, he confelho de TitoLivio. (11.) 9. Efta verdade experimentei na fobredita en- ferma, a qual eftava tão obftruida, que fe ufara fó- mente de tres xaropes , de huma purga, de tres apoze- mas , & de nove dias de aço, como he coftume de al- guns Medicos ordinarios , me canfaria de balde ; por- que como as obftrucções eftiveffem em partes mui di- ftantes, & foffem tao antigas, era impoffivel vencel- las em poucos dias , nem com remedios leves, mas com os activos, & muito continuados : (12.) & por- que eu o fiz affim , por iffo a doente cobrou faude per- feitiffima, não obftante eftar tida por incuravel ; por- que abforbidos os humores acidos pela virtude alcali- ca do aço, ficou o fangue mais fluido, & capaz de fe poder continuar a circulação , & baixarem os mefes copiofamente, por ter as vias abertas ; & affim fe ti- rou felizmente a comichaõ, & fe vio reftituida ao feu natural eftado, & faude defejada. 10. Defta Obfervaçaõ aprendão os Medicos prin- cipiantes , que quando os remedios eftiverem bem in- dicados da doença, aindaque logo não aproveitem, nem por iffo os larguem , antes conftantemente os continuem muito tempo, porque elles viráõ a fazer o que fe pertende : afim o a confelha Galeno, (13.) & eu o faço fempre affim. II. . O mesmo quero fe entenda do ufo dos xaro: pes, das purgas , das apozemas , das tifanas, dos fudo- rificos , doaço , do leite, dos foros , dos banhos, das ajudas purgativas, & de ameijoada , das irrigações de leite, & de quaefquer outros medicamentos ; por- que he puerilidade, ou ignorancia craffa affirmar que os xaropes hao de fer tres , as purgas huma, as apoze- mas quatro, as tifanas feis, & que o aço fe ha de dar fó nove dias ; fendo certo que os medicamentos (co- mo. > - . : 1
6s Obfervacoes Medicas Doutrinaes. (conforme a experiencia de muitos annos ) conheco que na tem numero certo os dias,que fe ha de dar os remedios ; mas o que tenho por certo he, que fe de- vem continuar até fe vencer a doenca, ou ate qué os effeitos moftrem que naconvem continuallos : na he f6 voto meu, he confelho deTitoLivio. (11. 9. Efta verdade experimentei na fobredita en- ferma, a qual eftava tao obftruida, que fe ufara f6- mente.de tres xaropes, de huma purga, de tres apoze- mas, & de nove dias de aso, como he coftume de al- guns Medicos ordinarios , me canfaria de balde ; por- . : que como as obftruccöes eftiveffem em partes mui di- ftantes, & foffem taö antigas, era impoffivel vencel- las em poucos dias , nem com remedios leves, mas com os activos, & muito continuados : (12:) & por- que eu o fiz affim , por iffo a doente cobrou faude per- feitiffima, nao obftante eftar tida por incuravel , por- que abforbidos os humores acidos pela virtude alcali- ca do aco, ficou ofangue mais fluido,&capaz defe poder continuar a circulaca , & baixaremosmefes copiofamente, por ter as vias abertas ; & affim fe ti- rou felizmente a comicha , & fe vio reftituida aoféu natural eftado , & faude defejada. 10. Defta Obfervaca aprendaoos Medicos prin- cipiantes , que quando os remedios eftiverem bem in- dicados da doenca, aindaque logo nao aproveitem, nem por iffo os larguem , antes conftantémente os continuem muito tempo, porque elles vira a fazer 0que fe pertende: affim o a confelha Galeno, (13. &eu ofacofempre affim. .11.. mefmo quero fe entenda do ufo dos xaro- pes, das purgas , das apozemas , das tifanas, dos fudo- rificos, doaco,do leite, dos foros, dos banhos, das ajudas purgativas, & de ameijoada , das irrigages de leite, & de quaefquer outros medicamentos ; por- que he puerilidade, ou ignorancia craffa affirmar que Os xaropes ha de fer tres , as purgas huma, as apoze mas quatro, as tifanas.feis, & queoaco fe hadedar f6 nove dias ; fendo certoque os medicamentos(co- mo.
68 Obfervações Medicas Doutrinaes. (conforme a experiencia de muitos annos ) conheço que naó tem numero certo os dias , que fe haô de dar , : . —osremedios;masoquetenho por certo he, que fe de- vem continuar até fe vencer a doença, ou 4té' qué os effeitos moftrem que naô convem continúallos: naõ he fó voto meu, he confelho deTitoLivio. (11.) 9. Efta verdade experimentei na fobredita en- ferma, a qual eftava tão obfítruida, que fe ufara fó- . mente de tres xaropes , de huma purga, de tres apoze- “mas, & de nove dias de aço , como he coftume de al- guns Medicos ordinarios , me canfaria de balde ; por- -' ue como as obftrucções eftiveflem em partes mui di- flantes , & foflemtaô antigas , era impoílivel vencel- las em poucos dias , nem com remedios leves , mas com os a&ivos , & muito continuados: (12.) & por- ue eu o fiz aflim , por iflo a doente cobrou faude per- ficifima , não obftante eftar tida por incuravel ; por- que abforbidos os humores acidos pela virtude alcali- ca do aço, ficou o fangue mais fluido, & capaz de fe poder continuar a circulaçaô , & baixarem os mefes copiofamente , por ter as vias abertas ; & aflim feti- rou felizmente a comichaô , & fe vio reftituida ao fêeu « natural eftado , & faude defejada. 10. Defta Obfervaçaõ aprendão 6s Medicos prin- cipiantes , que quando os remedios eftiverem bemin+ dicados da doençà, aindaque logo não aproveitem, nem por iflo os larguem , antes conftantemente os continuem muito tempo, porque elles virãô a fazer o que fe pertende: aflim o a confelha Galeno, (13.) &euofaçofempre aflim. ; | 11., O mefmo quero fe entenda do ufodos xaro: pes; das purgas , das apozemas , das tifanas, dos fudo- rificos , doaço ;do leite, dos foros , dos banhos , das ajudas purgativas, & de ameijoada , das irrigações de leite, & de quaefquer outros medicamentos ; por-. que he puerilidade, ou ignorancia crafla afirmar que os xaropes haô de fer tres , as purgas huma , as apoze- mas quatro, as tifanas feis, & queoaço fe ha de dar fó nove dias ; fendo certo que os medicamentos (co- : mo.
68 Observaçones Medicas Doutrinaes. (conforme a experiencia de muitos annos ) conheço que naon tem numero certo os dias, que se haô de dar os remedios; mas o que tenho por certo he, que se de- vem continuar atè se vencer a doença, ou ate que os effeitos mostrem que naon convem continuallos: naon he fó voto meu, he conselho de TitoLivio. (11. Esta verdade experimentei na sobredita en ferma, a qual estava tamo obstruida, que se usara só¬ mente de tres xaropes, de huma purga, de tres apoze- mas, & de nove dias de aço, como he costume de al- guns Medicos ordinarios, me cansaria de balde ; por- que como as obstrucçones estivessem em partes mui di¬ stantes, & fossem tao antigas, era impossivel vencel¬ las em poucos dias, nem com remedios leves, mas com os activos, & muito continuados: (12.) & por- que eu o fiz assim , por isso a doente cobrou saude per- feitissima, namo obstante estar tida por incuravel; por¬ que absorbidos os humores acidos pela virtude alcali- ca do aço, ficou o sangue mais fluido , & capaz de se poder continuar a circulaçaon, & baixarem os meses copiosamente, por ter as vias abertas; & assim se ti¬ rou felizmente a comichao , & se vio restituida ao seu natural estado, & saude desejada. 10. Desta Observaçaon aprendamo os Medicos prin¬ cipiantes, que quando os remedios estiverem bem in dicados da doença, aindaque logo nao aproveitem, nem por isso os larguem, antes constantemente os continuem muito tempo, porque elles viráô a fazer o que se pertende : assim o a conselha Galeno, (13. & eu o faço sempre assim. 11. O mesmo quero se entenda do uso dos xaro¬ pes, das purgas, das apozemas, das tisanas, dos sudo- rificos, do aço, do leite, dos soros, dos banhos, das ajudas purgativas, & de ameijoada, das irrigaçoes de leite, & de quaesquer outros medicamentos; por- que he puerilidade , ou ignorancia crassa affirmar que os xaropes hao de ser tres , as purgas huma , as apoze- mas quatro, as tisanas seis, & que o aço se ha de dar só nove dias; sendo certo que os medicamentos (co- mo
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Observaçaõ IX. 69 mo diz Galeno ) nem como o peso , nem com a medida , nem com o numero , ou com a penna se podem descrever . Nem imaginem os Medicos modernos , ( que saõ os com quem fallo ) que sou taõ presumido , que me atrevo a darlhes este conselho fundado na minha authoridade , porque só me estribo na de Galeno , & de outros gravissimos Doutores , que mandaõ continuar os remedios , atè se conseguir a saude : assim o fiz purgando muitas vezes a alguns alporquentos : assim o fez Dioscorides ( 14. ) dando todos os dias de hum anno huma oitava de pò de raiz de brionia para vencer huma gotta coral : assim o fazem hoje os Medicos da Corte , dando o leite de burras cinco , & seis meses aos que padecem rheumatismos , gottas arteticas , colicas pictonicas , parlesias espurias , hydropesias tympaniticas , & dores ictericas : & eu o dei , dous annos successivos , à Madre Soror Marianna de Encarnaçaõ , Abbadessa do Convento do Calvario ; mas por isso a curei de huma dureza feirrhosa , de que naõ avia esperança , porque no discurso de seis annos lhe naõ tinha aproveitado remedio algum . Assim o fiz , dando nove meses o dito leite ao Padre Mestre presentado Fr. Manoel Guilherme ; mas por isso sarou das dores da gotta , que o apertavaõ mui repetidas vezes . Confesso que sempre tive por apocryfo , & errado aquelle methodo de curar , que manda dar quatro , ou cinco xaropes para preparar os humores . Se pois os remedios devem continuarse atè que as enfermidades se vençaõ , naõ ha que admirar purgasse tantas vezes a esta doente , & lhe desse tantos dias aço ; pois tantos foraõ necessarios para triunfar da enfermidade , & segurar a saude , que logrou trinta annos depois que lhe fiz esta cura. Por este mesmo estylo , & com grande felicidade curei outras obstrucções rebeldes ; dando quarenta dias aço à Madre Dona Francisca de Sà Coutinho , Religiosa no Convento de Santa Monica : & à mulher de hum entalhador , morador na rua da Oliveira. Duzentos banhos dei a hũa Religiosa do Salvador , filha do Capi
Obfervação IX. mo diz Galeno ) nem com o pefo, nem com a me dida , nem com o numero, ou com a penna fe po- dem defcrever .. Nem imaginem os Medicos moder- nos ; ( que fao os com quem fallo ) que foutso prefa mido, que me atrevo a darlhes efte confetho funda . dona minha authoridade , porque fo me eftribo na de Galeno, & de outros graviffimos Doutores, que man- dao continuar os remedios , atè fe confeguir a fau- de: affmofiz purgando muitas vezes a alguns alpor- quentos : affim o fez Diofcorides (14. ) dando todos os - dias de hum anno huma oitava de pò de raiz de brio- nia para vencer huma gotta coral : affim o fazem hoje os Medicos da Corte , dando o leite de bur- ras cinco, & feis mefes aos que padecem theumatif- mos, gottas arteticas, colicas pictonicas, parlefias efpurias , hydropefias tympaniticas, & dores icteri- cas: & cu o dei , dous annos fucceffivos, à Madre So- ror Marianna da Encarnação , Abbadeffa do Conven- to do Calvario; mas por iffo a curei de huma dureza - fcirrhofa, de que nao avia esperança, porque no dif- carfo de feis annos lhe nao tinha aproveitado remedio algum. Afim o fiz, dando nove mefes o diro leite ao Padre Meftre prefentado Fr. Manoel Guilherme; mas por iffo farou das dores da gotta, que o aperta- . vão pui repetidas vezes. Confeffo que Sempre tive por apocryfo, & errado aquelle methodo de curar, que manda dar quatro , ou cinco xaropes para prepa- rar os humores. Se pois os remedios devem conci- nuarfe ate que as enfermidades fe venção, nao ha que admirar purgaffe tantas vezes a efta docente, & lhe deffe tantos dias aço ; pois tantos forao neceffarios para triunfar da enfermidade, & fegurar a faude, que logroa trinta anos depois que lhe fez efta cura. Por efte mefmo eftylo, & com grande felicidade cu- rei outras obftnicções rebeldes; dando quarenta dias aço à Madre Dona Francifcade Sa Coutinho, Reli- giofa no Convento de Santa Monica: & à mulher de ' hom entalhador, morador na rua da Oliveira. Duzen- tos banhos dei a hãa Religiofa de Salvador, filha do: Capi- 4 1
Obfervaca : 1X.. : mo diz Galeno) nem corn o pefo, nem com a'ne. dida , nem com o numero, ou com a penna fe po- dem defcrever. Nem imaginem os Medicos moder- nos; (quc faoscom quemfallo) quefouta prefa- . mido, que me atrevo a darlhes efte confetho .fnda: . dona minha authoridade, porque fóme eftribo na de Galeno, & deoutros graviffimos Doutores, que man. da continuar os remedios , ate fe confeguir a fau- de: affmofiz purgando muitas vezes a alguns alpor- quentos : affm fez Diofcorides (14.) dando todos os dias de hum anno humaoitava de po de raiz de brio nja para vencer huma gotta coral : affm o fazem hoje os Medicos da Corte , dando o leite de bur- ras cinco, &.feis. mefes aos qac padccem theumatif mos, gottas arteticas, colicas pictonicas, parlefias efpurias, hydropefas tympaniticas, & dores iaeri- cas:. &cu o dei , dous annos fucceffivos , a Madre So- ror Marianna da Encarnacao , Abbadeffa da Conven- todo Calvario; mas por ifloacurei.de huma durcza fcirrhofa, dequc na avia efperansa, porque no dif- curfo de feisannos Ihe na tinha aprveitado remedio algum. Affim o fiz, dand& nave mefes o.dito Icite ao Padre Meftre prefentado Fr. ManoelGuilherme; mas por iffo farou das dores dagotta, que oaperta- . rao nai repetidas vezes. Confefla que fenpre tive por apocryfo, & errado.aquelle methodo de curar, que mandadar quatro, ou tinco xaropes para prepa rar .os humores-Se pois os xancdios devem conci muarfeateque asenfermiades fewenca, mahaqae admirar purgaffe tantas vezes a cfta docrte, & fhe deffe tantos dias aco : pois tanras foras. neceffarios para triunfar da cnfermidade, & fegurar a faude: que logroa trinta aunos depaisqae lhefz cfta cura. Por efte mefmo eftylo, & com grande félicidadc au- rei outrasobftruccoes rebeldes, danda qmarentadias aso *Madre Dona FrancifcadesaCoutinho, Rali- giofa no Convento dc Santa Monica.: & amalher de hum.cntathador, morador na ruada Olivcira. Duzetl- tos banbos tei a hua Religiofa da Satvador , ftha do. CTD1
- mo diz Galeno ) ném com o pefo, nen com à mes 'dida , nem com o numero, ou com a de po. dem deferever.- Nem imaginem 08 Medicos moder. nos; (que faó os com querm-fallo ) que foutaô prefas * “mido, que meatrevo a darlhes efte confetho -furidas -— . dona minha authoridade » porque fó me eftriho na de Galeno, & de outros gravifimos Doutores, que man=« daô continnar os remedios , até fe confeguir a fau. de: affimofiz purgando muitas vezes aalguns alpor. quentos: aff o fez Diofcorides (14. ) dando todos os ias de hum anno huma oitava de pô de raiz de brio- nia para vencer brasa gotra coral : afiirÕra o fazem hoje os Medicos da Corte , dando o leite de bur- ras cinco, & feis mefes aos que padecem theumatif- . mos, gotras arteticas, colicas pi&onicas , parlefias efpurias , hydropefras tympaniticas, & dores i&eri- cas:. & eu o dei , dous annos fucceífivos, 2. MadreSo- —.º ror Marianna da Entarnaçao , Abbadeflado Conven- = todo Calvario; mas por iffoa curei de huma dureza - feirrhofa, de que naô avia efperança,-porque no dif- curto de feisannos Hlte naó tinha aproveitado rernedio algum. Affim o fiz, dandô nove mefes o diro leite ao Padre Meftre prefentado Fr. Manoel Guilherme; “mas por iflo farou das dores da gotta, que oaperra- . « vô ryui repetidas vezes. Confefla que fempre tive por apocryfo, & errado aquelle methodo de curar, “que manda dar quatro , ou tinco xatopes para ptepas rar os humores. Se pois os remedios devem conck mmarfe até que as enfermidades fe wença6, naô Pa quê admirar purgaffe tantas vezes a efta doenve, & lhe deffe tantos dias aço ; pois tantos forao neceffarios para triunfar da enfermidade , & fegurar a faude , | : : - qmelogroa trinta annos depois que lhe fez eftez cura. ANN Por efte metmo eftylo, & com grande felicidade an- o O reiontras obftrueções rebeldes; dando quarensa dias aço à Madre Dona Francifea de Sà Coutinho, Reli-- EIA : giofano Convento de Santa Monica: & à mulher de e .entalhador, morador na rua da Oliveira. Duzem- + o tos banhos dei a hãa Religiofa da Salvador , flha do:
Observaçao IX. 69 mo diz Galeno) nem com o peso, nem com à me¬ dida, nem com o numero, ou com a penna se po¬ dem descrever. Nem imaginem os Medicos moder¬ nos, (que saon os com quem fallo) que sou tao presu¬ mido, que me atrevo a darlhes este conselho funda¬ do na minha authoridade; porque so me estribo na de Galeno, & de outros gravistimos Doutores, que man¬ daon continuar os remedios, atè se conseguir a fau¬ de: assim o fiz purgando muitas vezes a alguns alpor¬ quentos: assim o sez Dioscorides (14.) dando todos os dias de hum anno huma oitava de pò de raiz de brio- nia para vencer huma gotta coral: assim o fazem hoje os Medicos da Corte , dando o leite de bur- ras cinco, & seis meses aos que padecem rheumatis¬ mos, gottas arteticas, colicas pictonicas, parlesias espurias, hydropesias tympaniticas, & dores icteri¬ cas: & eu o dei, dous annos successivos, à Madre So¬ ror Marianna da Encarnaçaon, Abbadessa do Conven¬ to do Calvatio; mas por isto a curei de huma dureza fcirrhosa, de que naon avia esperança, porque no dis¬ curfo de seis annos llie naon tinha aproveitado remedio algum. Assim o siz, dandò nove meses o dito leite ao Padre Mestre presentado Fr. Manoel Guilherme; mas por isso sarou das dores da gotta, que o aperta¬ vaon mui repetidas vezes. Confesso que sempre tive por apocryfo, & errado aquelle methodo de curar, que manda dar quatro, ou cinco xatopes para prepa¬ rar os humores. Se pois os remedios devem conci¬ nuarse atè que as enfermidades se vençaon, naon ha que admirar purgasse tantas vezes a esta doente, & lhe desse tantos dias aço; pois tanros foraon necessarios para triunsar da enfermidade, & segurat a saude, que logron trinta annos depois que lhe siz esta cura¬ Por este mesmo estylo, & com grande felicidade cu¬ rei outras obstrucçones rebeldes; dando quarenta dias aço à Madre Dona Francisca de Sà Coutinho, Reli¬ giosa no Convento de Santa Monica: & à mulher de num entalhador, morador na rua da Oliveira. Duzen¬ tos banhos dei a huma Religiosa do Salvador, filha do¬ Capi¬
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70 Observações Medicas Doutrinaes. Capitão Manoel Jorge , Procurador da Cidade : estava esta Religiosa taõ profundamente melancolica , & imaginativa , que de dia , & de noite estava dizendo se naõ podia salvar , nem a misericordia de Deos , sendo infinita , lhe avia de perdoar ; & com este excessivo numero de banhos cobrou a saude , que desejava : & tenho por certo , que se me contentasse com quarenta , ou cincoenta banhos , como alguns se contentaõ , ficaria melancolica , & maniaca , como estava dantes , nem conseguiria a boa saude , que hoje logra . OBSERVAÇAM X De hum continuo fluxo de ʃangue das almorreinas , que certo doente padeceo por cauʃa de exceʃʃivo trabalho , & quentura ; com que ʃe enfraquecèraõ as officinas naturaes de maneira , que em lugar de gerarem ʃangue puro , & ʃaudavel , geràraõ ʃoros mordazes , & ʃalgados , de que ʃe ʃeguiraõ grandes ʃedes , & huma inchaçaõ univerʃal , annunciadora de huma hydropeʃia incuravel . 1. Aindaque o exercicio , & trabalho moderados ʃejaõ as couʃas mais proveitoʃas que ha para conʃervar a ʃaude , & prolongar a vida , porque com hum , & com outro ʃe fortificaõ os membros ʃe vivifica o calor , ʃe aperfeiçoa a nutricaõ , ʃe volatilizaõ os eʃpiritos , ʃe circula o ʃangue , ʃe diʃʃipaõ os vapores , ʃe abrem os póros , ʃe repurgaõ as fuligens , & ʃe conʃeguem tantas utilidades , que ʃo se conhecem pelos damnos que faz a falta delle , como diz Ovidio ; (1.) & nòs o vemos nos preʃos , que por lhes faltar o exercicio , perdem muitos as cores , outros inchaõ , outros ʃe fazem hydropicos : o meʃmo obʃervamos na malicia , & falta de ʃabor nas carnes dos animaes que ʃe naõ exercitaõ ; porèm he de advertir , que ʃe o exercicio , & trabalho ʃaõ grandes , ou intempeʃtivos,
. Obfervações Medicas Doutrinaes. Capitão Manoel Jorge, Procurador da Cidade: efta- va efta Religiofa tao profundamente melancolica, & imaginativa, que de dia, & de noite eftava dizendo fe nao podia falvar,nem a mifericordia de Deos,fendoin- finita, lhe avia de perdoar; & com efte excellivo nume -. ro de banhos cobrou a faude , que defejava : & tenho por certo, que fe me contentaffe com quarenta , ou cincoenta banhos, como alguns fe contentaõ, fica- ria melancolica, & maniaca, como eftava dantes; nem confeguiria a boa faude , que hoje logra .. OBSERVAÇAM X. De bum continuo fluxo de fungue das almorreimas, que certo doente padeceo por caufa de exceffivo trabalho, & quentura ; com que fe enfraquecerao as oficinas naturaes de maneira, que em lugar de gerarem fan- gue puro, & laudavel, gerarao foros mordazes, & falgados, de que fe feguirao grandes fedes., & buma . inchacao univerfal, annunciadora de buma bydro- pefia incuravel: I. A Indaque o exercicio , & trabalho mo- derados fejao as coufas mais proveitofas que ha para confervar a faude, & prolongar a vida, porque com hum, & com outro fe fortificao os mem- bros , fe vivifica o calor , fe aperfeiçoa a nutricao, fe volatiliza os efpiritos,fe circula o fangue , fe diffipaő os vapores , fe abrem os poros, fe repurgao as fuli- gens , & fe confeguem tantas utilidades , que fo fe co- nhecem pelos damnos que faz a falta delle , como diz Ovidio; (1.) & nos o vemos nos prefos, que por lhes faltar o exercicio , perdem muitos as cores, outros in- chao, outros fe fazem hydropicos: o mefmo obfer- vamos na malicia, & falta de fabor nas carnes dos ani- maes que fe nao exercitao ; porem he de advertir , que fe 'o exercicio, & trabalho fao grandes , ou intempef- tivos,
"a Obfervacoes Medicas Doutrinaes.. Capitao Manoel Jorge , Procurador da Cidade : efta- va efta.Religiofa ta profundamente melancolica, & imaginativa, que de dia, & de noite eftavadizendofe na podia falvar,nem a mifericordia de Deos,fendoin- finita,lhe avia de perdoar; & com efteexceffivo nume- rodebanhos cobrou a faude, que defejava: & tenho por certo, quefe me contentaffe .com quarenta , ou cincoenta barhos, como alguns fecontenta, fica- ria melancolica, & maniaca, como eftava. dantes; nem confeguiria a boa faude , que hoje logra. .. OBSERV ACAM x.. De bum continuo fluxo defangue das almorreinas , que 'certo doente padeceo por caufa deexcefivotrabalbo, . d quentura; com que /e cnfraquecerao as officin:ts naturaes de maneira, que em lugar de geraremfan- guepuro, &.laudavel, geraraforos mordazes, s Jalgados , de que fefeguira5 gtandes./edes; s: buma . inchasa univer/al,annunciadora de buma.bydro- pefia incuravel. Indaque o exercicio , & trabalho mo- derados feja as coufas mais proveitofas que hapara confervar.a faude, & prolongar a vida, porque com hum, & com outro fe fortificaö os mem- bros, fe.vivificao calor , feaperfeicoa a nutrica, fe volatiliza os efpiritos,fe circula o fangue fe diffipa os vapores , feabrem os poros, fe.repurgao as fuli- gens , & fe confeguem tantas utilidades , que f&fe co- nhecem pelos damnos que faz a falta delle, como diz Ovidio (1.) & nos o vemos nos prefos, que por lhes faltar o exercicio , perdem muitos as cores, outros in- cha, outros fe fazem hydropicos:. o mefmoobfer- vamos na malicia , & falta de fabor nas carnes dos ani maes quéfe naexercita , porem he deadvertir , que fe 0.exercicio , & trabalho fa grandes , ou intempef tivos,
7a Obfervações Medicas Doutrinaes. ., o* Capitão Manoel Jorge , Procurador da Cidade: efta- | vaelta.Religiofa taó profundamente melancolica, & imaginativa, que de dia , & de noite eftava dizendo fe nap podia falvar,nem a mifericordia de Deos,fendoin- e. ' finita,lhe avia de perdoar; & com efte exceflivo nume- - - ro de banhos cobrou a faude , que defejava: & tenho - porcerto , que fe me contentafle com quarenta , ou cincoenta barihos, como alguns fe contentaõ, fica- | ria melancolica, & maniaca, como eftava dantes ; 2 + =... nemconfeguiria a boafaude, que hojelogra. .- OBSERVAÇAM X.. De hum continuo fluxo de fiungue das almorreimas, que *. . “certo doente padeceoporcaufa deexcelfivotrabalho, - & quentura ; com que fe enfraquecerao as oficinas . naturaes de maneira, que em lugar de geravem fan- guepuro, & laudavel, geràâraô foros mordazes, & [algados ; de que fe feguivaD grandes fedes., & buma * inchaçao univer/al, anuunciadora de buma bydro- pefia incuravel. | E 1. | Tndaque o exercicio , & trabalho mo- - derados fejaô as coufas mais proveitofas ” que ha para confervar a faude, & prolongar a vida, porque com hum , & com outro fe fortificaô os mem- ros , fe vivificao calor , fe aperfeiçoa a nutricaó, fe volatilizaô os efpiritos,fe circula o fangue ,fe diffipas - —esvapores, fe abrem os póros, fe repurgaõ as fuli- gens , & fe confeguem tantas utilidades , que fófe co- nhecem pelos damnos que faz a falta delle "como diz. Ovidio ;. (1.) & nôs o vemos nos prefos , que por lhes faltaro exercicio , perdem muitos às cores , outros in chaõ, outros fe fazem hydropicos: o mefmo obfer- "vamos na malicia , & falta de fabor nas carnes dos ani- : maes que fe naó exercitaô ; porêm he deadvertir , que fe'o exercicio , & trabalho faó grandes , ouintempef- “ ! tivos,
. -. . 70 Observaçones Medicas Doutrinaes. Capitamo Manoel Jorge, Procurador da Cidade: esta- va esta. Religiosa taon profundamente melancolica, & imaginativa, que de dia, & de noite estava dizendo se naon podia salvar, nem a misericordia de Deos, sendo in¬ finita, lhe avia de perdoar; & com este excessivo nume¬ ro de banhos cobrou a saude, que desejava : & tenho por certo, que se me contentasse com quarenta, ou cincoenta banhos, como alguns se contentao, fica¬ ria melancolica, & maniaca, como estava dantes, nem conseguiria a boa saude, que hoje logra. OBSERVAQAM X. De hum continuo fluxo de sungue das almorreimas, que certo doente padeceo por causa de excessivo trabalho, & queutura; com que se enfraquecerao as officinus naturaes de maneira, que em lugar de gerarem san¬ gue puro, & laudavel, geraraon soros mordazes, & salgados, de que se seguiraon grandes sedes, & huma inchaçaon universal, annunciadora de buma bydro¬ pesia incuravel. Indaque o exercicio, & trabalho mo¬ A derados sejaon as cousas mais proveitosas que ha para conservar a saude, & prolongar a vida, porque com hum, & com outro se fortificaon os mem¬ bros, se vivifica o calor, se aperfeiçoa a nutricaon, se volatilizaon os espiritos, se circula o sangue , se dissipaon os vapores, se abrem os póros, se repurgao as fuli- gens, & se conseguem tantas utilidades, que só se co- nhecem pelos damnos que faz a falta delle, como diz Ovidio; (1.) & nòs o vemos nos presos, que por lhes faltar o exercicio, perdem muitos às cores, outros in¬ chao, outros se fazem hydropicos: o mesmo obser¬ vamos na malicia, & falta de sabor nas carnes dos ani¬ maes que se naon exercitaon; porèm he de advertir, que se o exercicio, & trabalho saon grandes, ou intempes- tivos,
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Observaçaõ X. 71 tivos, taõ longe eʃtaõ de ʃer convenientes para a vida , & ʃaude , que antes com elles ʃe enfraquecem os eʃpiritos , ʃe exaʃpera o calor , ʃe emmagrecem as carnes , ʃe relaxaõ os nervos , ʃe envelhece o corpo , & ʃuccedem mil damnos outros , a que a Medicina naõ pòde dar remedio , como pela ʃeguinte Obʃervaçaõ farei manifeʃto. 2. O Reverendo Padre Fr. Patricio de Saõ Paulo Religioʃo Dominicano Hybernio , logrou muitos annos perfeitiʃʃima ʃaude ; mas andando o tempo , ou pelo muito trabalho , & exercicio que teve , ou pelos grandes cuidados , com que perpetuamente vivia , cahio em huma tal excandeʃcencia do figado , & entranhas , que em lugar de gerarem ʃangue louvavel , & perfeito , geravão humores acres , corroʃivos , & feroʃos ; & como eʃtes não eraõ capazes para as partes ʃe ʃuʃtentarem com elles , os arrojou a provida natureza (como inuteis , & feculentos) para as partes inferiores , deʃcarregando-os nas veas hemorrhoidaes ; & como eʃtas de ʃua natureza coʃtumaõ eʃtar cheyas de ʃangue adulto , negro , & craʃʃo , como diz Fernelio (2.) naõ foy neceʃʃario muito , para que com a chegada da materia pungente , que de novo ʃe miʃturou com elle , ʃe aʃʃanhaʃʃe o que alli eʃtava de tal modo , que em breviʃʃimos dias , abertas as bocas das almorreimas , ouveʃʃe hum copioʃiʃʃimo fluxo dellas , & deʃta continuada effuʃaõ de ʃangue ʃe resfriàraõ , & debilitàraõ o figado , & officinas naturaes de maneira , que começou a incharlhe o corpo todo ; principios infalliveis de hua hydropeʃia , enfermidade verdadeiramente tanto para temer , como difficultoʃa de curar , mayormente por ʃobrevir a hua doença prolongada , & a hum homem jà fraco , & falto de eʃpiritos . Porèm como ʃeja obrigaçaõ de quem he humano compadecerʃe das miʃerias humanas , & naõ aja acçaõ tão generoʃa , como he amparar os perseguidos , confortar aos deʃmayados , & dar ʃaude aos enfermos ; pois , como diz Cicero , (3.) para iʃʃo naʃcemos , & naõ para nòs ʃòs fomos creados , fiz quanto
Obfervação X. 71 . tivos , tao longe eftaõ de fer convenientes para a vida, & faude, que antes com elles fe enfraquecem os efpi- ritos, fe exafpera o calor , fe emmagrecem as carnes, fe relaxao os nervos , fe envelhece o corpo , & fucce- dem mil damnos outros, a que a Medicina naõ pòde dar remedio, como pela feguinte Obfervaçaõ farei manifefto. . 2. O Reverendo Padre Fr. Patricio de Sao Pau- lo, Religiofo Dominicano Hybernio, logrou muitos annos perfeitiffima faude; mas andando o tempo, ou pelo muito trabalho, & exercicio que teve, ou pelos grandes cuidados , com que perpetuamente vivia , ca- hio em huma tal excandefcencia do figado, & entra- nhas , que em lugar de gerarem fangue louvavel , & perfeito, geravão humores acres, corrofivos, & fe- rofos ; & como eftes, não erao capazes para as partes fe fuftentarem com elles, os arrojou a provida natu- reza (como inuteis, & feculentos ) para as partes in- feriores, defcarregando-os nas veas hemorrhoidaes; & como eftas de fua natureza coftumaõ eftar cheyas de fangue adufto, negro, & craffo, como diz Ferne- Lio, (2.) naofoy neceffario muito, para que com a chegada da materia pungente, que de novo fe miftu- rou com elle, fe affanhaffe o que alli eftava de tal mo- do, que em breviffimos dias , abertas as bocas das al- morreimas , ouveffe hum copiofiffimo fluxo dellas , & defta continuada effufao de fangue fe resfriàrao, & debilitàraõ o figado, & officinas naturaes de manei- ra, que começou a incharlhe o corpo todo; princi- pios infalliveis de hua hydropefia, enfermidade ver- dadeiramente tanto para temer , como difficultofa de curar,mayormente por fobrevir a hua doença prolon- gada, & a hum homem ja fraco ; & falto de efpiritos. 3. Porem como feja obrigação de quem he hu -. mano compadecerfe das miferias humanas , & nao aja acçaõ tão generofa, como he amparar aos perfe- guidos, confortar aos defmayados, & dar faude aos enfermos ; pois, como diz Cicero, (3.) para iffo naf- cemos , & nao para nos fős fomos creados; fiz quan- to è 0
Obfervacao x 7 I tivos , ta longe efta de fer convenientes paraa vida, & faude, que antes com elles feenfraquecem os efpi- ritos, fe exafpera o calor , fe emmagrecem .as carnes, fe relaxaos nervos, fe envelhece ocorpo , & fucce- dem mil damnos outros, a que a Medicina na pöde dar remedio, como pela feguinte Obfervaca farei manifefto. 2. O Reverendo Padre Fr. Patricio de Sa Pau- lo, Religiofo Dominicano Hybernio, logrou muitos annos perfeitiffima faude; mas andando o tempo, ou pelo muito trabalho, & exercicio gue teve, ou pelos grandes cuidados, comque perpetuamente vivia , ca- hioem huma tal excandefcencia dofigado, & entra- nhas,que em lugar de gerarem fangue louvavel, & perfeito, gerayao humores acres, corrofivos, & fe- : rofos ; & como eftes. nao era capazes para as partes fe fuftentarem con elles, os arrojou a provida natu- reza (como inuteis, & feculentos ) para as partes in- feriores, defcarregando-os nas veas hemorrhoidaes; & comoeftas de fua natureza coftuma eftar cheyas de fangue adufto, negro, & craffo, como diz Ferne- lio,(2.) naofoy neceffario muito, para que m a chegada da materiapungente, que de novo fe miftu- . rou com elle, fe affanhaffe'o que alli eftava de tal mo- do, que em breviffimos dias , abertas as bocas das al- morreimas, ouveffe hum copiofiffimo fluxo dellas , & defta continuada cffufa de fangue fe resfriara; & debilitara o figado, & officinas naturaes.demanei- ra, que coimecou a incharlhe o corpo todo, princi- pios infalliveis de hua hydropefia, enfermidade ver- dadeiramente tanto para temer , como difficultofa de curar,mayormente por fobrevir a hua doenca prolon- gada, & a hum hornem ja fraco , & falto de efpiritos. 3. Porem como feja obrigacao de quem he hu-- mamo compadecerfe das miferias humanas , & na aja accaö tao generofa, como he amparar aos perfe- guidos, confortar aos.defmayados, & dar faudeaos enfermos ; pois,comodiz Cicero,(3.) para iffo naf- cemos , & na para nos fös fomos creados ;. fiz quan- to
o ' Obfervaçaão XX. 71 NE. . tivos , taô longe eltaó de fer convenientes para a vida, ó' 1. —&faude,queantescomelles feenfraquecemos efpi- t ritos, fe exaípera o calor , fe emmagrecem as carnes, . & fe relaxaõó os nervos , fe envelhece o corpo , & fucçe- -) dem mil damnos outros, a que a Medicina naô pôde ! DA 2' — darremedio, como pela feguinte Obfervaçaó farei 1; manifelto, o ri 2. OReverendo Padre Fr. Patriciode Saó Pau- « —lo,Religiofo DominicanoHybernio, logrou muigos | . annos perfeitiflima faude; mas andando otempo, ou |, | :. pelomuito trabalho, & exercicio que teve, ou pelos .i — grandescuidados,com-que perpetuamentevivia,ca- — . hio em humagtal excandefcencia do figado, & entra- | nhas, que em lugar de gerarem fangue louvavel, & . — perfeito, geravão humores acres, corrofivos, & fe- — rolos; &comoeltes não eraô capazes para as partes * fefuftentarem com elles, os arrojou a provida natu- : " reza (como inuteis , & feculentos ) paraaspartesin- — . Nm º +. feriores, defcarregando-os nas veas hemorrhoidaes; '* — &comoceltas defua natureza colftumaô eftar cheyas | de fangue aduíto , negro, & craflo, como diz Ferne- lio, (2.) naófoy neceffario muito, para que eam a chegada da materia pungente , que de novo fe miftu- « rou com elle, fe affanhafle o que alli eftava de tal mo- . do, que em breviflfimos dias , abertas as bocas das al- ' morreimas , ouveíle hum copiofifimo fluxo dellas , & * —defta continuada effufaô de fangue fe resfriãraô, & : * —debilitáraôo ofigado, & officinas naruraes.de manei- | õ * — Ta, que começou à incharlhe o corpo todo; princi- | | — piosinfalliveis de húa hydropefia, enfermidade ver- ' | dadeiramente tanto para temer , como difficultofa de curar,mayormente por fobrevir a hiia doença psolon- gada , & a hum homem jà fraço ; & falto de efpiritos. “3. Porêm como feja obrigaçaõ de quemhe hu-. mato compadecerfe das milerias humanas , & nao aja acçaó tão generofa , como he amparar aos perfe- guidos, confortar aos defmayados , & dar faude aos enfermos ; pois, como diz Cicero, (3.) paraiflo naf- cemos , & naô para nôs fós fomos creados; fiz quan- ' -to . á , s
Observaçaon X. 71 tivos, tao longe estao de ser convenientes para a vida, & saude, que antes com elles se enfraquecem os espi- ritos, se exaspera o calor, se emmagrecem as carnes, se relaxaon os nervos, se envelhece o corpo , & succe- dem mil damnos outros, a que a Medicina nao pòde dar remedio, como pela seguinte Observaçaon farei manifesto. 2. O Reverendo Padre Fr. Patricio de Sao Pau- lo , Religioso Dominicano Hybernio , logrou muitos annos perfeitissima saude; mas andando o tempo, ou pelo muito trabalho, & exercicio que teve, ou pelos grandes cuidados, com que perpetuamente vivia, ca¬ hio em huma, tal excandescencia do figado, & entra¬ nhas, que em lugar de gerarem sangue louvavel, & perfeito, geravamo humores acres, corrosivos, & se¬ rosos; & como estes namo eraô capazes para as partes se sustentarem com elles, os arrojou a provida natu¬ reza (como inuteis, & fecusentos) para as partes in¬ feriores, descarregando-os nas veas hemorrhoidaes; & como estas de sua natureza costumaon estar cheyas de sangue adusto , negro , & crasso , como diz Ferne lio, (2.) nao foy necessario muito, para que com a chegada da materia pungente , que de novo se mistu- rou com elle , se assanhasse o que alli estava de tal mo- do, que em brevissimos dias, abertas as bocas das al¬ morreimas, ouvesse hum copiosissimo fluxo dellas, & desta continuada effusaon de sangue se resfriàraon, & debilitàrao o figado, & officinas naturaes de manei- ra, que começou a incharlhe o corpo todo ; princi- pios infalliveis de hua hydropesia, enfermidade ver- dadeiramente tanto para temer , como difficultosa de curar, mayormente por sobrevir a huma doença prolon¬ gada, & a hum homem jà fraco, & falto de espiritos. 3. Porèm como seja obrigaçao de quem he hu¬ mano compadecerse das miserias humanas, & naon aja acçaon tamno generosa, como he amparar aos perse¬ guidos, confortar aos desmayados, & dar saude aos enfermos; pois, como diz Cicero , (3.) para isso nas- cemos, & naon para nòs sos fomos creados; fiz quan¬ to
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72 Observações Medicas Doutrinaes. to foy poʃʃivel por defender ao ʃobredito enfermo das mãos da morte , que o ameaçava . 4. A primeira , & principal indicação que tomei para o curar , foy purgar os humores ʃeroʃos , & pungentes , que com a ʃua acrinomia , & quentura irritavão a natureza, adelgaçavão o sangue, & provocavão o fluxo ; para iʃʃo lhe fiz tomar tres onças de agua benedicta vigorada , porque me lembrou ter lido em Galeno , (4.) & em outros graves Authores , que nas dores , ou fluxos das almorreimas , nos priapiʃmos , nas dores dos rins , & da bexiga , nas colicas nephriticas , nas ʃuppreʃʃões da ourina, & em todas as doenças das partes pudendas , naõ avia remedio mais efficaz , & conveniente , que os vomitorias repetidas vezes tomados, por quanto neʃtas enfermidades convem muito revellir , & divertir os humores para a parte contraria : & como não aja remedio , que taõ prompta , & fielmente faça eʃte effeito como a ʃobredita agua , por iʃʃo neʃte caʃo , & nos referidos coʃtumo uʃar ʃempre della , dandoa duas , & tres vezes em dias alternados . Nem me enganou a eʃperança ; porque depois de tomar tres vezes o ʃobredito vomitorio , reconheceo notavel melhoria , & para o confirmar nella , lhe fiz tomar , tres dias alternados , os ʃeguintes xaropes , que para evacuar brandamente os ʃoros mordazes , que ʃaõ os que abrem o caminho aos humores , que cahem nas almorreimas , ʃaõ excellentiʃʃimos , & ʃe preparaõ do modo ʃeguinte . Tomai tres oitavas de caʃcas de myrobalanos citrinos , & huma oitava de ruibarbo , tudo ʃe machuque , & ʃe deite de infuʃaõ em huma canada de agua de tanchagem quente , & paʃʃadas dozes horas , ʃe deite fóra a dita agua , & fazendo entaõ hum cozimento freʃco para os tres xaropes , deite nelle os taes myrobalanos , & ruibarbo , dandolhe hua leve fervura , & coandoʃe com forte expreʃʃaõ , mandei ajuntar a cada quatro onças deʃte cozimento duas onças de xarope das noʃʃas roʃas , & depois que com os taes xaropes , & vomitorios ʃe diminuiraõ os ʃoros mordazes , tratei de divertir , &
72 Obfervaç ões Medicas Doutrinaes. to foy poffivel por defender ao fobredito enfermo das mãos da morte , que o ameaçava. . 4. A primeira; & principal indicação que tomei para o curar , foy purgar os humores ferofos, & pun- gentes, que com a fua acrimonia, & quentura irri- tavão a natureza , adelgaçavão o fangue, & provoca- vão o fluxo ; para iffo lhe fiz tomar tres onças de agua benedicta vigorada, porque me lembrou ter lido em Galeno, (4.) & em outros graves Authores, que nas dores, ou fluxos das almorreimas , nos priapifmos, nas dores dos rins, & da bexiga, nas colicas nephri- ticas, nas fuppreffoes da ourina , & em todas as doen- ças das partes pudendas, naõ avia remedio mais effi- caz , & conveniente, que os vomitorios repetidas ve- zes tomados , por quanto neftas enfermidades con- vem muito revellir ; & divertir os humores para a parte contraria: & como não aja remedio, que taõ prompta , & fielmente faça efte effeito como a fo- bredita agua, por iffo nefte cafo, & nos referidos cof- tumo ufar fempre della, dandoa duas, & tres vezes em dias alternados. Nem me enganou a efperança; porcae depois de tomar tres vezes o fobredito vomi« torio, reconheceo notavel melhoria, & para o con- firmar nella, lhe fiz tomar , tres dias alternados, os seguintes xaropes, que para evacuar brandamente os foros mordazes, que fao os que abrem o caminho aos humores , que cahem nas almorreimas , fao excel- lentiffimos , & fe preparao do modo feguinte. Tomai tres oitavas de cafcas de myrobalanos citrinos , & hu- ma oitava de ruibarbo, tudo fe machuque, & fe dei- te de infufao em huma canada de agua de tanchagem quente , & paffadas doze horas, fe deite fora a dita agua; & fazendo entao hum cozimento frefco para os tres xaropes, deitei nelle os taes myrobalanos, & ruibarbo, dandolhe hua leve fervura, & coandofe tom forte expreffao, mandei ajuntar a cada quatro onças defte cozimento duas onças de xarope das noffas ro- fas, & depois que com os taes xaropes, & vomitorios fe diminuirao os foros mordazes, tratei de divertir, & ,
/2 Obfervac öes MedicasDoutrinaes: tofoy poffivel pór defender aofobredito enfermo das maos da morte , que o améacava: 4. A primeira, & principal indicacaoque tomei para o curar, foy purgar os hamores ferofos, & pun- gentes, que com a fua acriinónia, &.quenturairri- tavao anatureza, adelgacavaoo fanigue, & provoca- vao o fluxo ; para iffo lhe fiz tomar tres oncas de agua benedicta vigorada, porque me lembrou ter lido em Galeno, (4.) & ein outros graves Authores , que nas dores, ou fluxos das almorreimas , nos priapifmos, nas dores dos rins, & da bexiga, nas colicas nephri- ticas, nas fuppreffoes da ourina , & em todas as doen- cas das partes pudendas, na avia reradióinais effi- caz , & conveniente, que os vomitorios repétidas ve- zes tomados , por quanto neftas enfermidades con- vem muito revellir ; & divertir os hunores para.a parte contraria: & como nao aja remedio, que ta prompta , & fielmente fasa efte effeito como a fo- bredita agua, por iffo nefte cafo, & nos referidos cof- tumoufar fempre della, dandoa duas, & tres vezes em dias alternados. Nem me enganou a efperanca; porcae depois de tomar tres vezes o fobredito vomi* torio, reconhece notavel melhoria, & para o con- frmar nella,lhe fiz tomar, tres dias alternados, os Ieguintes xaropes, que para evacuar brandamente os foros mordazes, que fa os que abrem o caminho aos: humores , que cahem nas almorreimas , fa excel- lentiffimos,& fe préparaodo modo feguinte. Tomai tres oitavas de cafcas de myrobalanos citrinos , & hu- ma oitava de:ruibarbo, tudo fe machuque, & fe dei- te de infufa em luma canada deagua de tanchagem quente , & paffadas doze horas, fe deite fóra adita agua, & fazendo enta hum cozimento frefco para os tres xaropes, deitei nelleos taes myrobalanos, & ruibarbo, dandolhe hüa leve fervura,& coandofe Com forte expreffa, mandei ajuntar a cada quatro ongas. defte cozimento duas.ongas de xarope das noffas ro- fas, & depois que com os taes xaropes, & vomitorios fe diminuira s foros mordazes, tratei de divertir , &
. 72 Obfervãas ões Medicas Doutrinães. . . tofoy poffivel pór deferider ao fobredito enfermo das mãos da morte, que 0 àméaçava. * “4. Aprimeira; & principal indicação que tomei ” para o curar, foy purgár os humores ferofos , & pun- gentes, que com a fua áàcrimônia, & quenturáirri- tavão anatureza, ddeIgaçavão o farigue, & provocá- vão o fluxo; para iflo lhe fiz tomar tres onças de agua benedi&a vigorada , porque me lembrou ter lido em Galeno, (4.) & em outros graves Authores , que nas dores, ou fluxos das almorreimas ; nos priapifmos, nas dores dos rins , & da bexiga, has colicas nephri- ticas, nas fupprefloês dá ourina ; & em todas às doen- ças dás partes pudendas, naô avia rerfiedio mais ef- caz , & conveniente, quê os vomitorios repétidas ve- zes tomados , por quanto neftas enfermidades con- vem muito revellir ; & divertir os humores para.a parte contrariá: & como não aja remedio, que taô promprá ; & fielmente faça efte effeito como a fo- redita agua, por iflo nelte cafo , & nosreferidos cof= tumo ufar femipre della, dandoa duas, & tres vezes - em dias alternados. Nem me enganou a efperança; . porqte depois de tomar tres vezes o fobredito vomi« torio, reconheceo notavel melhoria, & para o con- firmar nella, lhe fiz tomar , tres dias alternados , os feguintes xaropes, que para evacuar brandamente os - foros mordazes , que faõóos queabremo caminho aos humores , que cahem nas almorreimas , faó excel- lentiffimos , & fe prepara do modo feguinte. Tomai tres oitavas de caícas de myrobalanos citrinos , & hu- ma oitava desuibarbo, tudo fe machuque, & fe dei- J . tedeinfufaô emliumá canada de aguia de tanchágem quente , & paflatlas doze horas , fe deite fóra adita | agua , & fazendo entaó hum cozimento frefco para . a « ostres xaropes, deitei nelle os taes myrobalanos, & : ruibarbo, dandolhe hãa leve fervura,& coandofe om - Forte expreflaô, mandei ajuntar a cada quatro onças. SS defte cozimento duas onças de xarope das noffas ro- . fas, & depois que com os taes xaropes, & vomitorios | fe diminuiraô 6s foros mordazes , tratei de divertir , & so
72 Observaç oes Medicas Doutrinaes. to foy possivel por defender ao sobredito enfermo das manos da morte, que o ameaçava. 4. A primeira; & principal indicaçamo que tomei para o curar, foy purgar os humores serosos, & pun¬ gentes, que com a sua acrimonia, & quentura irri¬ tavao a natureza, adelgaçavao o sangue, & provoca- vamo o fluxo; para isso lhe fiz tomar tres onças de agua benedicta vigorada, porque me lembrou ter lido em Galeno, (4.) & em outros graves Authores, que nas dores, ou fluxos das almorreimas, nos priapismos, nas dores dos rins, & da bexiga, nas colicas nephri¬ ticas, nas suppressoes da ourina, & em todas as doen¬ ças das partes pudendas, naon avia remaediò mais effi¬ caz, & conveniente, que os vomitorios repetidas ve- zes tomados, por quanto nestas enfermidades con¬ tem muito revellir, & divertir os humores para a parte contraria: & comò nao aja remedio, que taon prompta, & fielmente faça este effeito como a so¬ bredita agua, por isso neste caso, & nos referidos cos¬ tumo usar sempre della, dandoa duas, & tres vezes em dias alternados. Nem me enganou a esperança; porque depois de tomar tres vezes o sobredito vomi- torio, reconheceo notavel melhoria, & para o con- firmar nella, lhe fiz tomar, tres dias alternados, os seguintes xaropes, que para evacuar brandamente os soros mordazes, que saon os que abrem o caminho aos humores, que canem nas almorreimas, sao excel¬ lentissimos, & se preparaon do modo seguinte. Tomai tres oitavas de cascas de myrobalanos citrinos, & hu- ma oitava de ruibarbo, tudo se machuque, & se dei- te de infusaon em huma canada de agua de tanchagem quente , & passadas doze horas, se deite fóra a dita agua, & fazendo entao hum cozimento fresco para os tres xaropes, deitei nelle os taes myrobalanos , & ruibarbo, dandolhe huma leve fervura, & coandose eom forte expressaon, mandei ajuntar a cada quatro onças deste cozimento duas onças de xarope das nossas ro- sas, & depois que com os taes xaropes, & vomitorios se diminuirao os soros mordazes, tratei de divertir,
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Observaçaõ X. 73 & dirivar o reʃtante delles para as vias da ourina , eʃperando que deʃte modo deʃafogaria as almorreimas , & não correriaõ mais humores a ellas ; & para iʃʃo , depois de deʃcanʃar tres dias , lhe dei os ʃeguintes pòs em cinco dias ʃucceʃʃivos . Tomai de raiz de ʃoldanella huma onça , de ruibarbo eʃcolhido dous eʃcropulos , de eʃpicanardo meyo eʃcropulo , tudo junto ʃe faça em pò , & ʃe divida em cinco partes iguaes , miʃturando cada parte com cinco onças de agua cozida com cerfolio , ou com huma onça de raiz de rilhaboy , ou quatro onças de vinhos do Rim , ou vinho de enforcado , & ʃe dè ao doente em jejum . 5. No entretanto que ʃe fazia eʃte remedio , ordenei que muitas vezes no dia lavaʃʃe as almorreimas com agua cozida com folhas de congorça , que neʃte achaque tem admiravel virtude , & que eʃtando ainda a parte molhada , lhe deitaʃʃem por cima os meus pòs das almorreimas , ou as untaʃʃem com o meu celebre lenimento , que por ʃer hum dos mayores ʃegredos , que eu ʃei fazer , por iʃʃo o tenho comigo , & o naõ largo a boticario algum , para deʃte modo tirar a occaʃiaõ de que o adulterem , & vendão com o nome de que he meu , como vendem o cordeal , & os trociʃcos de Fioravanto , & outros ʃegredos , que nem a meu proprio filho tenho revelado. 6. Finalmente mandei que todas as noites lhe fizeʃʃem huma fomentaçaõ ʃobre as coʃtas , & ʃobre o lugar dos rins com o ʃeguintes ungento . Tomai de polpa de canafiʃtula , tirada de freʃco , quatro onças , de aʃʃucar de chumbo huma onça , de unguento roʃado tres onças , tudo ʃe miʃture para fazer a fomentaçaõ . Também lhe encomendei que fizeʃʃe muito por andar ʃempre facil na camara; por quanto as fezes duras obrigaõ a fazer grandes forças para se deitarem fóra , & das taes forças procedem as almorreimas , & os fluxos dellas , como acontece nas mulheres difficultosas em parir , porque pelas grandes forças que fazem para lançar a criança , ʃe enchem de almorreimas . Para acudir pois à dureza do ventre que tambem
73 Obfervaçaõ X. & dirivar o reftante delles para as vias da ourina , ef- perando que defte modo defafogaria as almorreimas, & não correriao mais humores a ellas ; & para iffo, depois de defcanfar tres dias , lhe dei os feguintes pos em cinco dias fucceffivos. Tomai de raiz de fol- danella huma onça, de ruibarbo efcolhido dous ef- cropulos, de efpicanardo meyo efcropulo , tudo jun- to fe faça em pò, & fe divida em cinco partes iguaes, mifturando cada parte com cinco onças de agua cozi- da com cerfolio, ou com huma onça de raiz de rilha- boy , ou quatro onças de vinho do Rim, ou vinho de enforcado , & fe dè ao doente em jejum. 5. No entretanto que fe fazia efte remedio, or- denei que muitas vezes no dia lavaffe as almorreimas com agua cozida com folhas de congorça, que nefte achaque tem admiravel virtude , & que eftando ainda a parte molhada , lhe deitaffem por cima os meus pòs das almorreimas, ou as untaffem com o meu cele- bre lenimento, que por fer hum dos mayores fegre- dos, que eu fei fazer , por iffo o tenho comigo, & o nao largo a boticario algum , para defte modo tirar a occafiao de que o adulterem, & vendão com o nome de que he meu , como vendem o cordeal , & os tro- cifcos de Fioravanto, & outrosfegredos, que nem a meu proprio filho tenho revelado. - 6. Finalmente mandei que todas as noites lhe fi- zeffem huma fomentaçao fobre as coftas, & fobre o lugar dos rins com o feguinte unguento. Tomai de polpa de canafiftula , tirada de frefco, quatro onças, de affucar de chumbo huma onça, de unguento rofa- do tres onças, tudo fe mifture para fazer a fomenta- çaõ. Tambem lhe encomendei que fizeffe muito por andar fempre facil na camara; por quanto as fezes duras obrigaõ a fazer grandes forças para fe deitarem fora, & das taes forças procedem as almorreimas , & os fluxos dellas, como acontece nas mulheres diffi- cultofas em parir, porque pelas grandes forças que fazem para lançar a criança, fe enchem de almorrei- mas. Para acudir pois à dureza do ventre de que tam- bem
Obfervaca X: 73 & dirivar o reftante delles para as vias da urina, ef- perando que defte modo defafogaria as almorreimas, & nao correria mais humores a ellas ; & para iffo, depois de defcanfar tres. dias , lhe dei os feguintes pos emcinco dias fucceffivos. Tomai de raiz de fol- danella huma onga, de ruibarbo efcolhido dous ef- cropulos, de efpicanardo meyo efcropulo , tudo jun- to fe faca em po, & fe divida em cinco partes iguaes, mifturando cada parte com cinco oncas de agua cozi- da com cerfolio, ou con huma onca de raiz de rilha- boy , ou quatro ongas de vinho do Rim, ou vinho de enforcado, & fe de ao doente em jejum. 5. No entretanto que fe faziaefte remedio, or- denei que muitas vezes no dia lavaffe as almorreimas com agua cozida comfolhas de congorca, que nefte achaque tem admiravel virtude , & que eftando ainda a parte molhada, lhe deitaffem por cima os meus pos das almorreimas, ou as untaffem com o meu cele- dos, que eu fei fazer, por iffoo tenho comigo,& na largo a boticario algum , para defte modo tirar a occafiaδ deque o adulterem, & vendao com o nome : de que he meu, como vendem ocordeal , & os tro- cifcos de Fioravanto, & outrosfegredos, que nem a méu proprio filho tenho revelado. 6.. Finalmente inandei que todas as noites lhe f- zeffem huma fomentacao fobre as coftas, & fobre o polpa de canafiftula, tirada de frefco, quatro oncas, de affucar de chumbo huma onga, de unguento rofa- do trés.oncas, tudo fe imifture para fazer a fomenta- a. Tambem lhe encomendei qúe fizeffe muito por andar fempre facil na camara; por quanto as fezes duras obriga a fazer grandes forcas para fe deitarem f6ra, & das taes forcas procedem as almorreimas , & os fluxos dellas, como acontece nas mulheres diff- cultofas em parir, porque pelas grandes forcas que fazem para lancar a crianca, fe enchem de almorrci- mas. Para acudir pois a.dureza do ventre de que tam- bem
ns... Obfervaçõô X. : 3 & dirivart o reftante delles para as vias da ourina ,*ef« perando que defte modo defafogaria as almorreimas, & não correriao mais humores a ellas; & para iflo, depois de defcanfar tres dias , lhe dei os feguintes pôs emcinco dias fucceffivos. Tomai de raiz de fol- danella huma onça, de ruibarbo efcolhido dous ef. cropulos , de efpicanardo meyo eferopulo, tudo jun- to fe faça em pô, & fe divida emcinco partes iguaes, milíturando cada parte com cinco onças de agua cozi- da com cerfolio, ou com huma onça de raiz de rilha- boy , ou quatro onças de vinho do Rim , ou vinho de enforcado , & fe dê ao doente em jejum. —5. Noentretanto que fefazia efte remedio, or* denei que muitas vezes no dia lavaíle as almorreimas com agua cozida com folhas de congorça; que nefte achaque tem admiravel virtude, & que eftando ainda a parte molhada , lhe deiraflem por cima os meus pôs das almorreimas, ou as untaflem com o meu cele- bre lenimento , que por fer hum dos mayores fegre- dos , que eu fei fazer , por iflo o tenho comigo, & o naõ largo a boticario algum , para defte modo tirar a occafia6 de que o adulterem, & vendão com o nome de que he meu, como vendem ocordeal , & os tro- cifcos de Fioravanto, & outrosfegredos, que nem a mêéu proprio filho tenho revelado. 6. “Finalmente mandei que todas as noites lhe fi- zeflem huma fomentaçao fóbre as coftas, & fobre o lugar dos rins com o feguinte unguento. Tomai de olpa de canafiftula , tirada defrefco, quatro onças, de aflucar de chumbo huma onça; de unguento rofa- dotres onças, tudo fe mifture para fazer a fomenta- çaó. Tambem lhe encomendei que fizefle muito por andar fempre facil na camara; por quanto as fezes duras obrigaõ a fazer grandes forças para fe deitarem fóra , & das taes forças procedem as almorreimas , & os fluxos dellas, como acontece nas mulheres diff cultofas em parir, porque pelas grandes forças que fazem para lançar a criança, fe enchem de almorrei- mas. Para acudir pois à dureza do ventre de que tam ” em amPE NELA
Observaçaon X. 73 & dirivar o restante delles para as vias da ourina, es- perando que deste modo desafogaria as almorreimas, & namo correriaon mais humores a ellas; & para isso, depois de descansar tres dias, lhe dei os seguintes pòs em cinco dias successivos. Tomai de raiz de sol¬ danella huma onça, de ruibarbo escolhido dous es¬ cropulos, de espicanardo meyo escropulo , tudo jun- to se faça em pò, & se divida em cinco partes iguaes, misturando cada parte com cinco onças de agua cozi¬ da com cerfolio, ou com huma onça de raiz de rilha¬ boy, ou quatro onças de vinho do Rim , ou vinho de enforcado , & se dè ao doente em jejum. No entretanto que se fazia este remedio, or¬ denei que muitas vezes no dia lavasse as almorreimas com agua cozida com folhas de congorça, que neste achaque tem admiravel virtude, & que estando ainda a parte molhada, lhe deitassem por cima os meus pòs das almorreimas, ou as untassem com o meu cele¬ bre lenimento, que por ser hum dos mayores segre- dos, que eu sei fazer, por isso o tenho comigo , & o naon largo a boticario algum, para deste modo tirar a occasiaon de que o adulterem, & vendamo com o nome de que he meu, como vendem o cordeal, & os tro- ciscos de Fioravanto, & outros segredos, que nem a meu proprio filho tenho revelado. 6. Finalmente mandei que todas as noites lhe fi- zessem huma fomentaçaon sobre as costas, & sobre o lugar dos rins com o seguinte unguento. Tomai de polpa de canafistula, tirada de fresco , quatro onças, de assucar de chumbo huma onça, de unguento rosa- do tres onças, tudo se misture para fazer a fomenta- çaon. Tambem lhe encomendei que fizesse muito por andar sempre facil na camara; por quanto as fezes duras obrigaon a fazer grandes forças para se deitarem fora, & das taes forças procedem as almorreimas, & os fluxos dellas, como acontece nas mulheres diffi¬ cultosas em parir, porque pelas grandes forças que fazem para lançar a criança, se enchem de almorrei¬ mas. Para acudir pois à dureza do ventre de que tam- bem
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74 Observações Medicas Doutrinaes. bem se queixava , & que coʃtuma ʃer huma das principaes cauʃas de aver almorreimas , lhe mandei preparar a seguinte conʃerva , para tomar huma vez em cada ʃemana , na primeira meʃa , em quantidade de huma onça . Tomai de uvas paʃʃadas , tirada a grainha , meyo arratel , de polpa de canaʃiʃtula freʃca meyo arratel , de cremores de tartaro verdadeiros tres onças , de erva doce em pò grosso duas oitavas & meya , tudo ʃe miʃture , & com aʃʃucar ʃe faça electuario , que ʃe guardarà em panela vidrada bem cuberta , para ʃe uʃar quando for tempo . E com eʃta conʃerva ʃe facilitou a camara de sorte , que naõ neceʃʃitou de fazer força para curʃar ; e conʃequentemente ʃe livrou de huma enfermidade taõ enfadonha , & penoʃa . Tambem aconʃelhei ao sobredito enfermo , que por muitos meʃes bebeʃʃe agua cozida do modo ʃeguinte . Em dez quartilhos de agua commua mandei ajuntar duas oitavas de erva poligono , ( chamada chamada por outro nome centinodia , ou erva andorinha , ) & dandolhe huma fervura por hum quarto de hora , a mandei coar depois de eʃtar fria , & entaõ lhe mandei ajuntar duas oitavas das minhas pilulas antifebriles , que se acharáõ em minha caʃa , & della ʃe levaõ para todo o Reyno , & ʃuas Conquiʃtas ; porque conʃervaõ a ʃua virtude muitos annos : a qual agua por razão das ditas pilulas tem huma propriedade maravilhoʃa , que abʃorbe , & embebe em ʃi toda a acrimonia dos humores , que ʃaõ os que fazem as dores , abrem as vias , & provocão os fluxos . Mandeilhe ultimamente que trouxeʃʃe , por tempo de hum annno , nas algibeiras meya duzia de biʃnagas , as quaes , por certa virtude occulta , curaõ & desecaõ as almorreimas , como me conʃta por innumeraveis caʃos , que tenho viʃto em peʃʃoas , que nomearei , ʃe for neceʃʃario para confirmaçaõ da minha verdade . Finalmente foraõ todos os remedios , que appliquei ao ʃobredito Religioʃo , taõ felizmente ʃuccedidos , que ʃarou com admiraçaõ dos que o tinhaõ viʃto em taõ perigoʃo eʃtado . 6. Duas cousas peço aos ʃenhores Medicos leitores.
74 Obfervações Medicas Doutrinaes.' bem fe queixava, & que coftuma fer huma das princi- paes caufas de aver almorreimas, lhe mandei prepa- rar a feguinte conferva , para tomar huma vez em ca- da femana, na primeira mefa , em quantidade de hu- ma onça. Tomai de uvas paffadas, tirada agrainha, meyo arratel, de polpa de canafiftula frefca meyo ar- ratel , de cremores de tartaro verdadeiros tres onças, de erva doce em pò groffo duas oitavas & meya, tu- do fe mifture, & com affucar fe faça electuario, que fe guardarà em panela vidrada bem cuberta, para fe ufar quando for tempo. E com efta conferva fe facili- tou a camara de forte , que naõ neceffitou de fazer força para curfar ; & confequentemente fe livrou de huma enfermidade tao enfadonha, & penofa. Tam- bem aconfelhei ao fobredito enfermo, que por mui- tos mefes bebeffe agua cozida do modo feguinte. Em dez quartilhos de agua commua mandei ajuntar duas oitavas de erva poligono, (chamada por outro nome centinodia, ou erva andorinha, ) & dandolhe huma fervura por hum quarto de hora, a mandei coar de- pois de eftar fria, & entao lhe mandei ajuntar duas oitavas das minhas pilulas antifebriles, que fe acha- rao em minha cafa, & della fe levao para todo o Rey -. no, & fuas Conquiftas ; porque confervao a fua virtu-, de muitos annos : a qual agua por razao das ditas pi- lulas tem huma propriedade maravilhofa , que ab- forbe, & embebe em fi toda a acrimonia dos humores, que fao os que fazem as dores, abrem as vias, & pro -. vocão os fluxos. Mandeilhe ultimamente que trou- xeffe, por tempo de hum anno, nas algibeiras meya, duzia de bifnagas, as quaes, por certa virtude occulta, curao, & defecao as almorreimas, como me confta por. innumeraveis cafos , que tenho vifto em peffoas, que nomearei, fe for neceffario para confirmação da mi- nha verdade. Finalmente forao todos os remedios, que appliquei ao fobredito Religiofo, taõ felizmen- te fuccedidos, que farou com admiraçao dos que o ti- nhaõ vifto em taõ perigofo eftado. 6. Duas coufas peço aos fenhores Medicos leito- res. - - . . .. --
74 Obfervacoes Medicas Doutrinaes. ben fe queixava , & que coftuma fer huma das prinici- paes caufas de aver almorreimas, Ihe mandei prepa- rar afeguinte conferva , para tomar huma vez em ca- da femana, na primeira mefa, em.quantidade de hu- ma onca. Tomai de uvas paffadas, tirada agrainha, meyo arratel, de polpa de canafiftula frefca meyc ar- ratel, de cremores de tartaro verdadeiros tres oncas, de erva doce em pogroffo duas oitavas & meya, tu- do femifture, & com affucar fefaca electuario, que fe guardara em panela vidrada bem cuberta , para fe ufar quando for tempo. E com efta conferva fe facili- tou a camara de forte , que na neceffitou de fazer forca para curfar ; & confequentemente fe livrou de huma enfermidade ta enfadonha,& penofa. Tam- bem aconfelhei ao fobredito enferm, que por mui tos mefes bebeffe agua cozida do modo feguinte.. Em dez quartilhos de agua commua mandei ajuntar duas oitavas de erva poligono, (chamada por outro nome centinodia, ou erva andorinha,) &dandolhe huma fervura por hum quarto de hora, a mandei coar. de- pois de eftar fria, & enta lhe mandei ajuntar duas oitavas das minhas pilulas antifebriles, que fe acha- rá em minha cafa, & della fe leva para todo o.Rey- no, & fuas Conquiftas ; porque conferva a fua.virtu-. de muitos annos: a qual agua por razao das ditas pi- lulas tem huma propriedade maravilhofa , que ab- forbe,& embebe em fi toda a acrimonia dos humores, que fa os que fazem as dores, abremas vias., & pro-. vocao os fuxos. Mandeilhe ultimamente que trou xeffe, por tempo de hum anno, nas algibeiras imeya, curaö,& defeca as almorreimas,como me confta por. innumeraveis cafos , quetenho vifto em peffoas, que. nomearei , fe for neceffario para confirmaca da mi nha verdade. Finalmente fora todos os remedios, que appliquei ao fobredito Religiofo, ta felizmen te fuccedidos, que farou con admiraga dos queo ti-- nha vifto em ta perigofo eftado. res.
74 Obfervações Medicas Doutrinaes. bem fe queixava , & que coftuma fer huma das princi. paes caufas de aver almorreimas, lhe mandei prepa- rar a feguinte conferva, paratomar huma vez em ca- da femana , na primeira mefa , em quantidade de hu ma onça. Tomai de uvas paffadas, tirada agrainha, meyoarratel, de polpa de canafiftula frefca meyo ar- ratel, de cremores detartaro verdadeiros tres onças, de erva doce em pô grofílo duas oitavas & meya, tu- do fe milture , & com aflucar fe faça ele&uario, que fe guardarà em panela vidrada bem cuberta, para fe ufar quando for tempo. E com efta conferva fe facili- tou a camara de forte , que naõ neceffitou de fazer força para curfar; & confequentemente fe livrou de huma enfermidade taô enfadonha ,& penofa. Tam- bem aconfelhei ao fobredito enfermô, que por mui- tos mefes bebefle agua cozida do modo feguinte. Em dez quartilhos de agua commua mandei ajuntar duas oitavas de erva poligono , (chamada por outro nome centinodia, ou erva andorinha, ) & dandolhe huma fervura por hum quarto de hora, a mandei coar de- pois de eftar fria, & entaô lhe mandei ajuntar duas oitavas das minhas pilulas antifebriles , que fe acha- rao em minha cafa, & della fe levaô para todo o Rey- no, & fuas Conquiftas ; porque confervaô a fua virru-. de muitos annos: a qual agua por razão das ditas Piz lulas tem huma propriedade maravilhofa , que ab- forbe,& embebe em fi toda a acrimonia dos humores, que faõ os que fazem as dores, abremas vias, & pro-. vocão os fluxos. Mandeilhe ultimamente que trou= xefle, por tempo de hum anno, nas algibeiras meya, duzia de bifnagas, as. quaes, por certa virtude occulta, curao,& defecaô as almorreimas,como me confta por innumeraveis cafos, quetenho vifto em pefloas, que nomearei, fe for neceflario para confirmaçaô da mi- nha verdade. Finalmente foraô todos os remedios , que appliquei ao fobredito Religiofo, raô felizmen- te fuccedidos, que farou com admiraçaódos queori- nhaôviftoemtaõ perigofo eftado. | 6. Duas confas peço aos fenhores Medicos leito- res,
74 Observaçones Medicas Doutrinaes. bem se queixava, & que costuma ser huma das princi¬ paes causas de aver almorreimas, lhe mandei prepa- rar a seguinte conserva, para tomar huma vez em ca¬ da semana , na primeira mesa , em quantidade de hu- ma onça. Tomai de uvas passadas, tirada a grainha, meyo arratel , de polpa de canasistula fresca meyo ar- ratel, de cremores de tartaro verdadeiros tres onças, de erva doce em pò grosso duas oitavas & meya, tu- do se misture , & com assucar se faça electuario , que se guardarà em panela vidrada bem cuberta, para se usar quando for tempo. E com esta conserva se facili- tou a camara de sorte, que naô necessitou de fazer força para cursar; & consequentemente se livrou de huma enfermidade tao enfadonha, & penosa. Tam¬ bem aconselhei ao sobredito enfermò , que por mui- tos meses bebesse agua cozida do modo seguinte. Em dez quartilhos de agua commua mandei ajuntar duas oitavas de erva poligono , (chamada por outro nome centinodia, ou erva andorinha , ) & dandolhe huma fervura por hum quarto de hora, a mandei coar de¬ pois de estar fria, & entao lhe mandei ajuntar duas oitavas das minhas pilulas antifebriles, que se acha¬ rao em minha casa , & della se levaon para todo o Rey- no , & suas Conquistas; porque conservaon a sua virtu- de muitos annos: a qual agua por razano das ditas pi- lulas tem huma propriedade maravilhosa, que ab¬ sorbe, & embebe em si toda a acrimonia dos humores, que saon os que fazem as dores, abrem as vias, & pro- vocao os fluxos. Mandeilhe ultimamente que trou¬ xesse, por tempo de hum anno , nas algibeiras meya. duzia de bisnagas, as quaes, por certa virtude occulta, curaôn, & desecaon as almorreimas, como me consta por innumeraveis casos, que tenho vistò em pessoas, que nomearei , se for necessario para confirmaçaon da mi¬ nha verdade. Finalmente forao todos os remedios, que appliquei ao sobredito Religioso , tao felizmen¬ te succedidos, que sarou com admiraçaon dos que o ti- nhao visto em taon perigoso estado. 6. Duas cousas peço aos senhores Medicos leito¬ res.
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Observaçaõ X. 75 res. A primeira, que queiraõ julgar com animo deʃapaixonado o que aqui eʃcrevo , porque o naõ faço por vaidade ou jactancia, mas por zelo do bem commum . A ʃegunda , que naõ ʃe envergonhem de aprender dos outros o que naõ ʃouberem , porque (fóra de Deos) ninguem tem ʃabedoria infinita : nem ʃe deʃprezem de enʃinar o que tiverem aprendido , ʃeguindo deʃte modo o conʃelho de Saõ Baʃilio , (5 .) que dizia : aprendei ʃem pejo , enʃinai sem inveja , & naõ occulteu o que de outrem tiveres aprendido. OBʃERVAÇAM XI . De huma exceʃʃiva dor , & ardor de ourina , que certo enfermo padecia tres dias cada mes deʃde a idade de ʃeis annos atè a de dezoito , ʃem que a diligencia dos Medicos , nem o regimento do doente lhe aproveitaʃʃem ; atè que apellando para os remedios Chymicos , cobrou a ʃaude que deʃejava . 1. Manoel dias Loureiro , morador na Tanoeria , deʃde a idade de ʃeis annos começou a padecer dores de ourina , em certos dias de cada mes , tão crueis , que o chegavaõ às portas da morte . Para curar a eʃte menino ʃe chamàraõ os Medicos de mayor fama : examinàraõ elles com curioʃa indagaçaõ qual ʃeria a cauʃa de durarem ʃó tres dias as taes dores , ficando todo o mais tempo do mes ʃaõ , & livre dellas : & depois de huma larga conferencia , & concordarem todos no que aviaõ de fazer , começàraõ a applicar os remedios convenientes, mas com taõ desgraçado effeito, que se baldàraõ as diligencias da Arte, porque tornando a chegar os tres dias do seguinte mes , tornou a padecer as meʃmas dores. Chamaraõʃe novamente os Medicos , & applicandolhe elles differentes remedios , nenhum fruto experimentaraõ , porque tornando a vir o ʃeguinte mes , o aʃʃaleàraõ
75 Qbfervação X. res. A primeira, que queiraõ julgar com animo defa- paixonado o que aqui efcrevo, porque o naõ faço por vaidade, ou jactancia, mas por zelo do bem commum. A fegunda, que nao fe envergonhem de aprender dos outros q que nao fouberem, porque ( fora de Deos) ninguem tem fabedoria infinita: nem fe defprezem de enfinar o que tiverem aprendido, feguindo defte » modo o confelho de Sao Bafilio,(5.) que dizia: Apren- dei fem pejo , enfinai fem inveja, & nao occulter o que de outrem tiveres aprendido. OBSERVAÇAM XI. De huma exceffiva dor , & ardor de ourina, que certo enfermo padecia tres dias cada mes defde a idade de feis annos'ate a de dezoito, fem que a diligencia dos Medicos, nem o regimento do doente lhe aproveitaf- fem; ate que appellando para os remedios Chymicos, co- brou a faude que defejava. I. M Anoel dias Loureiro, morador na Ta- noeria, defde a idade de feis annos co- meçou a padecer dores de ourina, em certos dias de cada mes , tão crueis, que o chegavaõ às portas da morte. Para curar a efte menino fe chamarao os Me- dicos de mayor fama : examinarao elles com curiofa . indagaçaõ qual feria a caufa de duraremfó tres dias as taes dores, ficando todo o mais tempo do mes fao , & livre dellas : & depois de huma larga conferencia, & concordarem todos no que aviaõ de fazer , começà- rao a applicar os remedios convenientes , mas com . tao defgraçado effeito , que fe baldàraõ as diligencias da Arte, porque tornando a chegar os tres dias do fe- guinte mes, tornou a padecer as mefmas dores, Cha- maraofe novamente os Medicos , & applicandolhe elles differentes remedios, nenhum fruto experimen- taraõ, porque tornando a vir o feguinte mes, o affaltà- raõ
Qbfervacao X 7s res. A primeira, que queira julgar com'animo defa- paixonadoo queaqui efcrevo, porqueona faco por vaidade, ou jactancia, mas por zelo do bem commum. A fegunda , que na fe envergonhem de aprender dos outros q que naö fouberem, porque ( fórade Deos) ninguem tem fabedoria infinita: nem fe defprezem de enfinar o que tiverem aprendido, feguindo defte modo o confelho de Sa Bafilio,(5.) que dizia: Apren deifem pejo, enfinai fem inveja, na occulteno que de outrem tiveres aprendido. OBSERV ACAMXI. De huma excelfiva dor, ardor de ourina, quecerto enfermopadecia tres dias cada mes defde a idade de fei annsate a de dezoito,fem que a diligentia dos Medicos, nem o regimento do doente lbe aproveitaf- fem; ate que appellando para os remediosChymicos,co- brou afaude que defejava. Anoel dias Loureiro , morador na Ta- V noeria , defde a idade de feis annos co- megou a padecer dores de ourina, em certos dias de cada mes , tao crueis, que o chegava as portas da morte. Para curar a efte menino fe chamarao os Me- dicos de mayor fama : examinara elles com'curiofa : indagaca qual feria a caufa de durarémf6 tres dias as taes dores, ficandotodo o mais tempo do mes fa, & .livre.dellas : & depois de hüma larga conferencia, & concordarem todos no que avia defazer , comeca- ra a applicar os remedios convenientes , mas con taö defgracadoeffeito , que fe baldara as diligencias da Arte, porque tornando a chegar os tres dias do fe- guinte mes , tornou a padecer as mefmas dores. Cha- marafe novamente os Medicos , & applicandolhe elles,differentes remedios, nenhum fruto expcrimen- tara, porque tornandoa vir o feguinte mes, o affalta- rao
'Qblervaçao x. 7S : res. A primeira, que queiraô julgar com'animo defa- 'paixonado o que aqui efcrevo , porque o naõ faço por vaidade, ou ja&ancia, mas por zelo do bem commum. A fegunda, que naô fe envergonhem de aprender dos outros q que naõ fouberem, porque ( fóra de Deos) ninguem tem fabedoriafnfnita: nem fe defprezem de enfinar o que tiverem aprendido, feguindo defte » modo o confelho de Saô Balilio,(5.) que dizia: Apren- dei fem pejo , enfinai fem inveja , & nao oceulte o que de outrem tiveres aprendido. Rios SS 0na0 3500 OS SOs cn SOS «ASTON ADE Sa ao E 00 ao SS 00 S S 00-a0 GOO - OBSERVAÇAM XL De huma excelliva dor , & ardor de ourina, quecerto enfermo padecia tres dias cada mes defde a idade de - feu annôNare a de dezoito, fem que a diligenvia dos Medicos, nem o regimento do doente lhe aproveitaf. : fem; ate que appellando para os remedios Chymicos, so- - broua/aude que defejava, ' . | Do SE Anoel dias Loureiro, morador na Ta- . noeria , deíde a idade de feis annos co- meçou a padecer dores de ourina, em certos dias de cada mes , tãocrueis, que o chegavaô às portas da morte. Para curar a efte menino fechamàraõos Me- dicos de mayor fama: examinàraõ elles com'curiofa indagaçaõ qual feria a caufa de durarem£ó tres dias as taes dores, ficando todo o mais tempo do mes faô, & Jivre dellas : & depois de hima larga conferencia, & concordarem todos no que aviaô de fazer , começà- a : raô aapplicar os remedios convenientes , mas com taô defgraçado effeito , que fe baldàâraô as diligencias da Arte, porque tornando a chegar os tres dias do fe- guinte mes, tornou a padecer as mefmas dores. Cha- | PAN maraófe novamente os Medicos , '& applicandolhe oo elles differentes remedios, nenhum fruto expcrimen- : tàraó, porque tornando a vir o feguinte mes, o affaltà- * * o rao "Ud e ? ' ep
Observaçaon X. 75 res. A primeira, que queiraon julgar com animo desa¬ paixonado o que aqui escrevo, porque o naon faço por vaidade, ou jactancia, mas por zelo do bem commum. A segunda, que nao se envergonhem de aprender dos outros q que nao souberem, porque (fóra de Deos) ninguem tem sabedoria infinita: nem se desprezem de ensinar o que tiverem aprendido, seguindo deste » modo o conselho de Saon Basilio,(5.) que dizia: Apren¬ dei sem pejo, ensinai sem inveja, & naon occulteus o que de outrem tiveres aprendido. 0 OBSERVAQAM XI. De huma excessiva dor, & ardor de ourina, que certo enfermo padecia tres dias cada mes desde a idade de seu annos'atè a de dezoito, sem que a diligencia dos Medicos, nem o regimento do doente lhe aproveitas¬ sem; atè que appellando para os remedios Chymicos, co¬ brou a saude que desejava. I. Anoel dias Loureiro, morador na Ta¬ noeria, desde a idade de seis annos co¬ meçou a padecer dores de ourina, em certos dias de cada mes, tamo crueis, que o chegavaon às portas da morte. Para curar a este menino se chamàraon os Me¬ dicos de mayor fama: examinàraon elles com curiosa indagaçaon qual seria a causa de durarem so tres dias as taes dores, ficando todo o mais tempo do mes saô , & livre dellas: & depois de huma larga conferencia, & concordarem todos no que aviaô de fazer, começ⬠rao a applicar os remedios convenientes, mas com taon desgraçado effeito , que se baldàraon as diligencias da Arte, porque tornando a chegar os tres dias do se- guinte mes, tornou a padecer as mesmas dores. Cha- maraose novamente os Medicos, & applicandolhe elles differentes remedios, nenhum fruto experimen¬ tàraon, porque tornando a vir o seguinte mes, o assaltଠrao
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76 Obʃervações Medicas Doutrinaes. raõ as meʃmas queixas com tanta crueldade como de antes . Fatigado o menino aʃʃim pela violencia das dores , como pela multidaõ dos remedios : & deʃconfiados os Medicos pela reʃiʃtencia do mal, ʃe deʃpediraõ , & o deixàraõ entregue ao bom regimento , eʃperando que com eʃte , & com os mayores annos melhoraʃʃe. Obʃervou pontualmente o regimento que lhe mandàraõ ; mas nem por iʃʃo deixou de padecer , nos tres dias de cada mes , as dores com a meʃma tyrannia : & como viʃʃe , que nenhum fruto colhera dos muitos remedios , que ʃe lhe fizeraõ , ʃe reʃolveo a ir paʃʃando atè chegar a dezoito annos ; & vendo que nem a mayor idade , nem a rigoroʃa dieta lhe tinhaõ aproveitado , me chamou , por ter ouvido dizer que eu ʃabia preparar alguns remedios muito ʃingulares alcançados por força do meu eʃtudo , & curioʃidade ; & pondo no meu conʃelho as eʃperanças da ʃua vida , me diʃʃe as ʃeguintes palavras : Suave me seria o morrer , ʃe ao menos ʃoubeʃʃe donde procedem taõ deshumanas dores , que me aʃʃaltaõ tres dias cada mes , deixandome livre todo o mais tempo : ʃe me dereis a razão deʃtes aʃʃaltos, ( aindaque me naõ livreis de taõ penoʃa enfermidade ) farei de vòs taõ grande eʃtimaçaõ , que vos reʃpeitarei como a hum Oraculo , & Hippocrates redivivo. 2. Para dar ʃoluçaõ a eʃta pergunta recorri a doutrina de Galeno , (1.) o qual o livro ʃegundo das differenças das febres , attribue a cauʃa deʃtas repetições assim à parte que manda , como à parte que recebe ; porque he acçaõ natural , que toda a parte forte deita fóra de ʃi , & deʃcarrega na que he mais fraca o que a maltrata ; (2.) porque ʃuccede nas partes do noʃʃo corpo , o que coʃtuma ʃucceder em huma mal governada Republica , na qual os poderoʃos avexaõ aos que menos podem , & eʃtes opprimem aos mais humildes , & aʃʃim vaõ proʃeguindo com as vexações , atè que chegaõ às pessoas mais infimas , & deʃemparadas , as quaes como naõ tenhaõ forças , nem valor para reʃiʃtir , nem defenderʃe do mal que lhes fazem , nem finalmente tenhaõ jà outra parte mais fraca para onde
76 Obfervações Medicas Doutrinaes. raõ as mefmas queixas com tanta crueldade como de antes. Fatigado o menino affim pela violencia das do- res, comopela multidaõ dos remedios: & defconfiados os Medicos pela refiftencia do mal, fe defpedirao, & o deixarao entregue ao bom regimento, efperando que com efte, & com os mayores annos. melhoraffe. Ob- fervou pontualmente o regimento que lhe mandaraõ; mas nem por iffo deixou de padecer , nos tres dias de cada mes,as dores com a melma tyrannia: & como vif- fe que nenhum fruto colhera dos muitos remedios, que le lhe fizerao, fe refolveo a ir paffando ate chegar a dezoito annos; & verdo que nem a mayor idade, nem a rigorofa dieta lhe tinhaő aproveitado, mecha- mou, por ter ouvido dizer que eu fabia preparar al- guns remedios muito fingulares alcançados por força do meu eftudo , & curiofidade ; & pondo, no meu con- felho as efperanças da fua vida, me diffe as feguintes palavras: Suave me feria o morrer, fe aomenos fou- beffe donde procedem taõ deshumanas dores , que me affaltao tres dias cada mes , deixandome livre todo o' mais tempo : fe me dereis a razão deftes affaltos, (ain- daque me naõ livreis de tao penofa enfermidade ) fa- rei de vòs taõ grande eftimaçaõ, quevos refpeitarei como a hum Oraculo, & Hippocrates redivivo. 2. Para dar foluçaõ a efta pergunta recorri à doutrina de Galeno, (1.) o qual no livro fegundo das diferenças das febres, attribue a caufa deftas repeti- ções affim à parte que manda , como à parte que re- cebe ; porque he acçao natural, que toda a parte for- te deita fora de fi, & defcarrega na que he mais fraca a que a maltrata; (2. )porque fuccede nas partes do noffo. corpo, o que coftuma futceder em huma mal gover- nada Republica, na qual os poderofos avexaõ aos que menos podem, & eftes opprimem aos mais humildes, & affim vao profeguindo com as vexações, atè que chegao às peffoas mais infimas , & defemparadas, as quaes como nao tenhao forças, nem valor para refif- tir, nem defenderfe do mal que lhes fazem, nem fi- nalmente tenhao jà outra parte mais fraca para on- de - - 0
76' Obfervacoes Medicas Doutrinaes. ra as mefmas queixas com tanta crueldade como da antes. Fatigado o menino affim pela violencia das do- res, comopela multida dos remedios:& defconfados os Medicos pela refiftencia do mal, fe defpedirao,& o deixara entregue ao bom regimento, efperandoque com efte, & coni os mayore annos.melhoraffe. Ob- fervou pontualmente o regimento que lhe mandara; mas nem por iffodeixou de padecer, nos tres dias de cada mes,as dores com a mefma tyrannia: & como vif- fe que nenhum fruto colhera dos muitos remedios, que fe lhe fzera, fe refolveo a ir paffando ate chegar a dezoito annos, & verdo que nem a mayor idade, nema rigorofa dieta lhe tinhaö aproveitado, me cha- mou, por ter ouvido dizer que eu fabia preparar al- guns reinedios.muito fingulares alcancados por forga do meu eftudo , & curiofidade ; & pondo, no meu con- felho as efperancas da fua vida, me diffe as feguintes palavras: Suave me feria o morrer , fe aomenos fou- beffe donde procedem ta deshumanas dores , que mé affalta tres dias cada mes , deixandome livte todo o mais tempo: fe me dereis a razao deftes affaltos, (ain- daque me na livreis deta penofa enfermidade ) fa- rei de vös ta grande eftimaca, quevos refpeitarei como a hum Oraculo , & Hippocrates redivivo. Para dar foluca a efta pergunta recorri a doutrina de Galeno, (1.)o qual nolivro fegundo das. differencas das febres, attribue a caufa deftas repeti- göes affim a parte que manda , como a parte que're- cebe ; porque he accaö natural, que todaa partefor-- te deita fora de fi, & defcarrega na quehe mais fraca que a maltrata;(2.)porqueYuccede nas partes do noffoi. corpo, o que coftuma futceder em huma mal gover- nada Republica, na qual os poderofos avexaaos que menos podem,.& eftes opprimem aos mais humildes, & affim va profeguindo com as vexacöes, ate que chega as peffoas mais inffimas , & defemparadas, as quaes como nao tenhaö forcas, nem valor para reff- tir, nem defenderfe do.mal que lhes fazem, nem f- nalmente tenlha ja outra parte mais fraca para. on- de
76º Obfervações Medicas Doutrinaes. raõas mefimas queixas com tanta crueldade como de antes. Fatigado o menino aífim pela violencia das do. res, comopela multidaõô dos remedios: & defconfiados os Medicos pela refiftencia do mal, fe defpediraõ,& o deixàraó entregue ao bom regimento, efperando que com efte, & corà os mayor& annos-melhorafle. Ob+ « fervou pontualmente o regimento que lhe mandàraõ; mas nem por iflo deixou de padecer , nos tres dias de cada mes,as dores com a melma tyrannia: & como vifz fe que nenhum fruto colhera dos muitos remedios, que le lhe fizeraô , fe refolveo a ir paflando atê chegar a dezoito annos ; & verdo que nem a mayor idade ; nemarigorofa dieta lhe tinhaô aproveitado, mecha- ' mou, por ter ouvido dizer que eu fabia preparar al- guns remedios muito fingulares alcançados por força do meu eftudo , & curiofidade ; & pondo, no meu con- felho as efperanças da fua vida , me diffe as feguintes palavras: Suave me feria o morrer , fe 40menos fou- efle donde procedem taô deshumanas dores , que mé aflaltaó tres dias cada mes , deixandome livre todo o mais tempo: fe me dereis a razão deftes affaltos , (ain- daque me naô livreis de taô penofa enfermidade ) fa- rei de vôs taõ grande eftimaçaõô, quevos refpeirarei como a hum Oraculo, & Hippocrates redivivo. . 2. — Para dar foluçaô a efta pergunta recorri à doutrina de Galeno, (1.) o qual no livro fegundo das, differenças das febres , attribue a caufa deftas repeti- ções aflim à parte que manda , como à parte que re cebe; porque he acçaô. natural, que todaa parte for tedeitafóra de fi, & defcarrega na que he mais fraca a que a maltrata;(2. porque Tuccede nas partes do nofla. corpo, o que coftuma futceder em huma mal gover+« nada Republica, na qual os poderofos avexaõaos que menos podem, & eftes opprimem aos mais humildes, & afllim vaô profeguindo com as vexações, até que chegaô às peíloas mais infimas , & defemparadas, as quaes como naô tenhaóô forças, nem valor para refif. tir, nem defenderfe do mal que lhes fázem, nem fix nalmente tenhaó jà outra parte mais fraca para on. de
76 Observaçones Medicas Doutrinaes. raon as mesmas queixas com tanta crueldade como de antes. Fatigado o menino astim pela violencia das do¬ res, comopela multidaon dos remedios: & desconfiados os Medicos pela resistencia do mal, se despediraon, & o deixàraon entregue ao bom regimento , esperando que com este, & com os mayores annos melhorasse. Ob¬ servou pontualmente o regimento que lhe mandàraon; mas nem por isso deixou de padecer, nos tres dias de cada mes, as dores com a mesma tyrannia: & como vis- se que nenhum fruto colhera dos muitos remedios, que se lhe fizerao, se resolveo a ir passando atè chegar a dezoito annos; & verdo que nem a mayor idade, nem a rigorosa dieta lhe tinhaon aproveitado, me cha- mou, por ter ouvido dizer que eu sabia preparar al guns remedios muito singulares alcançados por força do meu estudo , & curiosidade ; & pondo no meu con- selho as esperanças da sua vida, me disse as seguintes palavras: Suave me seria o morrer, se ad'menos sou- besse donde procedem tao deshumanas dores, que mé assaltaon tres dias cada mes, deixandome livre todo o mais tempo: se me dereis a razano destes assaltos , (ain- daque me nao livreis de tao penosa enfermidade ) fa¬ rei de vòs tao grande estimaçaon, que vos respeitarei como a hum Oraculo, & Hippocrates redivivo. 2. Para dar soluçao a esta pergunta recorri à doutrina de Galeno, (1.)o qual no livro segundo das differenças das febres, attribue a causa destas repeti¬ çones assim à parte que manda, como à parte que re- cebe; porque he acçaô natural, que toda a parte for- te deita fora de si, & descarrega na que he mais fraca q que a maltrata; (2.) porque succede nas partes do nosso. corpo, o que costuma succeder em huma mal gover¬ nada Republica, na qual os poderosos avexaon aos que menos podem, & estes opprimem aos mais humildes, & assim vaon proseguindo com as vexaçones, atè que chegaon às pessoas mais infimas, & desemparadas, as quaes como naon tenhaon forças, nem valor para resis¬ tir, nem defenderse do mal que lhes fazem, nem fi- nalmente tenhaon jà outra parte mais fraca para on¬ de
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Obʃervação XI. 77 de arrojem o damno , que lhes fizeraõ , neceʃʃariamente haõ de ʃofrer o mal , ʃem o poderem fazer a outrem : da meʃma sorte as partes mais nobres do noʃʃo corpo deʃcarregaõ todos os humores nocivos ʃobre as partes menos nobres , & eʃtas os arrojaõ para outras mais inferiores , & eʃtas os lançaõ em outras mais infimas , atè que de todo ʃahem fóra do corpo , ou ʃe encaʃaõ , & fazem aʃʃento em alguma parte viliʃʃima . Iʃto obʃervamos mais ordinariamente , quando a parte que padece , (àlem de ʃer fraca , & mais debil que as outras ) he de ʃua natureza deʃtinada para receber os excrementos , como he a bexiga para receber os ʃoros , & os deitar fòra : jà ʃe com eʃʃes ʃoros ʃe miʃtura alguma acrimonia maligna por vicio do corpo , ou do figado , ou dos rins , neceʃʃariamente os ha de receber a meʃma bexiga , & indo de dia em dia creʃcendo , & augmentandoʃe , chegaõ a tanta copia , & mordacidade , que offendem a meʃma bexiga , cauʃando nella ardores , & picadas , que perʃeveraõ com mayor crueldade deʃde o tempo em que começaõ de ourinar , até que a ourina acaba de ʃahir . E ʃe alguem me perguntar a razão porque na bexiga ʃe ajunta tanta copia de ourina , & tão acre , que perturba a natureza , & a obriga a ourinar tam repetidas vezes : reʃponderei que iʃto procede de huma fraqueza , que a bexiga adquirio lenta , & ʃucceʃʃivamente por cauʃa de alguma materia , que dentro reʃide ; & daqui vem que debilitada a bexiga não pòde converter o proprio alimento em ʃubʃtancia louvavel , & por eʃta razão ella meʃma ʃe negocea a mayor , & mais lamentavel ruina ; concorrendo tambem para iʃto huma diʃposiçaõ ʃemelhante àquella qualidade , que fica nas panelas , em que ʃe cozeo algua iguaria deʃte , ou daquelle cheiro , ou ʃabor . 3. Naõ ʃatisfez eʃta repoʃta ao deʃejo do enfermo , porque dizia elle , que ʃe as dores , picadas , & ardores , que elle padecia em tres dias de cada mes , procedeʃʃem de mà diʃcraʃia , & debilidade , que a bexiga tinha contrahido lentamente , ʃempre perʃeverariaõ da meʃma sorte , pois a tal diʃcraʃia , & fraqueza perʃe
77 Obfervaçao XI. · de arrojem o damno, que lhes fizeraõ, neceffariamen- te hao de fofrer o mal, fem o poderem fazer a outrem! da mefma forte as partes mais nobres do noffo corpo defcarregaõ todos os humores nocivos fobre as partes . menos nobres , & eftas os arrojaõ para outras mais in- feriores, & eftas os lançao em outras mais infimas, atè que de todo fahem fóra do corpo, ou fe encafao, & fazem affento em alguma parte viliffima. Ifto ob- fervamos mais ordinariamente, quando a parte que padece, (àlem de fer fraca, & mais debil que as ou- tras ) ,he de fua natureza deftinada para receber os ex- crementos, como he a bexiga para receber os foros, & os deitar fóra : ja fe comeffes foros fe miftura algu- ma acrimonia maligna por vicio do corpo, ou do fi- gado, ou dos rins , neceffariamente os ha de receber a mefma bexiga, & indo de dia em dia crefcendo , & augmentandofe , chegao a tanta copia, & mordaci- dade , que offendem a mefma bexiga, caufando' nella ardores, & picadas, que perfeverao com mayor cruel- dade defde o tempo em que começaõ de ourinar, até que a ourina acaba de fahir. E fe alguem me pergun- tar a razão porque na bexiga fe ajunta tanta copia de ourina , & tao acre , que perturba a natureza, & a obriga a ourinar tam repetidas vezes: refponderei que ifto procede de huma fraqueza, que a bexiga adqui- rio lenta, & fucoeffivamente por caufa de alguma ma- teria, que dentro refide; & daqui vem que debilitada a bexiga não pode converter o proprio alimento em fubftancia louvavel, & por efta razão ella mefma fe negocea a mayor , & mais lamentavel ruina ; concor- rendo tambem para ifto huma difpofiçao femelhante àquella qualidade, que fica nas panelas, em que fe co- zeoalgua iguaria defte, ou daquelle cheiro, ou fabor. 3. Nao fatisfez efta repofta ao defejo do enfer- mo, porque dizia elle, que fe as dores, picadas , & ardores , que elle padecia em tres dias de cada mes, procedeffem de mà difcrafia , & debilidade, que a be- xiga tinha contrahido lentamente, fempre perfevera- ciao da mesma forte, pois a tal difcrafia, & fraqueza . perfe- , -
Obfervacao xI. 77 de arrojem o damno, que lhes fizera, neceffariamen- te haö de fofrer o mal, fem o poderem fazer a outrem. da mefma forte as partes mais nobres do noffo corpo defcarrega todos os humores nocivos fobre as partes menos nobres , & eftas os arroja para outras mais in- feriores, & eftas os lanca em outras mais infimas , ate que de todo fahem f6rado corpo, ou fe encafa, & fazem affento em alguma parte viliffima. Iftoob- fervamos mais ordinariamente, quando a parte que padece, (alem de fer fraca, & mais debil que as ou- tras ) he de fua natureza deftinada para receber os ex- crementos, como he a bexiga para receber os foros, & os deitar fora: ja fe comeffesforos fe miftura algu- ma acrimonia maligna por viciodo cerpo, ou dofi- @ado, ou dos rins, neceffariamente os ha de receber a mefma bexiga, & irrdo de dia em dia crefcendo , & augmentandofe, chega a tanta copia, & mordaci- dade , que offendem a mefina bexiga, caufando*nella ardores, & picadas, que perfeveraö com mayor cruel- dade defde o tempo em que comeca de ourinar , atê tar a razao porque na bexiga fe ajunta tanta copia de ourina , & tao acre , quc perturba a natureza, & a obriga a ourinar tam repetidas vezes: refponderei que iftoprocede de huma fraqueza, que abexiga adqui- rio lenta , & fuceeffivamente por caufa de alguma ma- teria, que dentro.refide; & daqui vem que debilitada a bexiga nao pode converter o proprio alimento em fubftancia louvavel, & por efta razao ellamefma fe negocea a mayor , & mais lamentavel ruina ; concer- : rendo tambem para ifto huma difpofica femelhante aquella qualidade , que fica nas panelas, em que fe co- zeoalgua iguaria defte., ou daquelle cheiro, ou fabor. . 3. Nao fatisfez.efta repofta aodefejo do enfer- mo, porque dizia elle, que fe as. dores, picadas,& ardores,, que elle padecia em tres dias decada mes, procedeffem de ma difcrafia , & debilidade, que a be- xiga tinha contrahido lentamente , fempre perfevera- ria danefma forte, pois atal difcrafia,& fraqueza perfe-
Obífetvaçaõ 1. 7 - dearrojem o damno, que lhes fizeraõ, neceflariamen=- te haô de fofrer o mal, fem o poderem fazer a outrem: da mefma forte as partes mais nobres do noffo corpo : defcarregaó todos os humores nocivos fobre as partes , menos'nobres, & eftas os arrojaõ para outras mais in- feriores, & eftas os lançaô em outras mais infimas , 4rtê que de todo fahem fóra do corpo, ou fe encafaõ, & fazem aflento em alguma parte viliffima. Ifto ob- fervamos mais ordinariamente, quando a parte que padece, (àlem de fer fraca, & mais debil que as ou- tras ) he de fua natureza deftinada para receber OS Ex- crementos , como he a bexiga para receber os foros, & os deitar fóra: jà fe comefles foros fe miftura algu- ma acrimonia maligna por vicio do cerpo, ou do fi- gado , ou dos rins, neceflariamente os ha de receber a mefma bexiga, & irrdo de dia em dia crefcendo , & augmentandofe, chegaõ a tanta copia, & mordaci- dade , que offendem a mefiha bexiga, canfando'nella ardores, & picadas, que perfeveraô com mayor cruel- dade deíde o tempo em que começaõ de ourinar, até |) queaourinaacaba de fabir. E fealguem me pergun- — —tararazãoporque na bexiga fe ajunta tantacopia de | Ourina , & tão acre , que perturba a natureza, & a obriga a ourinar tam repetidas vezes: refponderei que .iftoprocede de huma traqueza, quea bexiga adqui- rio lenta , & fuceeflivamente por caufa de alguma ma- teria, que dentro refide; & daqui vem que debilitada a bexiga não pôde converter o proprio alimento em fubítancia louvavel , & por efta razão ella mefma fe negocea a mayor , & mais lamentavel ruina ; concer- :rendo tambem para ifto huma difpofiçao femelhante àquella qualidade , que fica nas panelas, em que fe co- zeoalgãa iguaria delte, ou daquelle cheiro, ou fabor. 3. “Naó fatisfez efta repofta aodefejo do enfer- mo, porque dizia elle, que fe as dores, picadds , & ardores , que elle padecia emtres dias de cada mes, procedeflem de mà diferafia , & debilidade, que a be- xiga tinha contrahido lentamente , fempre perfevera- > riaô da meima forte, pois atal difcrafia, & fraqueza » perfe- E UU" | “ va
Observaçaon XI. 77 de arrojem o damno, que lhes fizeraon, necessariamen- te hao de sofrer o mal, sem o poderem fazer a outrem: da mesma sorte as partes mais nobres do nosso corpo descarregaon todos os humores nocivos sobre as partes menos nobres, & estas os arrojaon para outras mais in¬ feriores, & estas os lançaon em outras mais infimas, atè que de todo sahem fóra do corpo, ou se encasao, & fazem assento em alguma parte vilissima. Isto ob¬ servamos mais ordinariamente, quando a parte que padece, (alem de ser fraca, & mais debil que as ou- tras), he de sua natureza destinada para receber os ex- crementos, como he a bexiga para receber os soros, & os deitar fora: jà se com esses soros se mistura algu¬ ma acrimonia maligna por vicio do corpo, ou do fi¬ gado, ou dos rins, necessariamente os ha de receber a mesma bexiga, & indo de dia em dia crescendo , & augmentandose, chegaô a tanta copia, & mordaci¬ dade, que offendem a mesma bexiga, causando'nella ardores, & picadas, que perseveraon com mayor cruel¬ dade desde o tempo em que começao de ourinar, até que a ourina acaba de sahir. E se alguem me pergun¬ tar a razano porque na bexiga se ajunta tanta copia de ourina, & tamo acre, que perturba a natureza, & a obriga à ourinar tam repetidas vezes: responderei que isto procede de huma fraqueza, que a bexiga adqui¬ rio lenta, & sucoessivamente por causa de alguma ma¬ teria, que dentro reside; & daqui vem que debilitada a bexiga namo pòde converter o proprio alimento em substancia louvavel, & por esta razamo ella mesma se negocea a mayor, & mais lamentavel ruina; concor- rendo tambem para isto huma disposiçaon semelhante àquella qualidade, que fica nas panelas, em que se co- zeo alguma iguaria deste, ou daquelle cheiro, ou sabor. Nao satisfez esta reposta ao desejo do enfer¬ mo, porque dizia elle, que se as dores, picadds, & ardores, que elle padecia em tres dias de cada mes, procedessem de mà discrasia , & debilidade , que a be- xiga tinha contrahido lentamente, sempre persevera¬ riao da mesma sorte, pois a tal discrasia, & fraqueza. perse¬
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78 Obʃervações Medicas Doutrinaes. perʃeverava ʃempre : porèm como eu padeço eʃtas queixas ʃó tres dias no mes , neceʃʃariamente hei de dizer que de outra cauʃa procedem. 4. Da repoʃta , & argumento deʃte enfermo preʃumi que as taes dores , & ardores naõ procediaõ de pedra , nem de chaga da bexiga , como ordinariamente procedem ; porque ʃe procedeʃʃem de qualquer deʃtas cauʃas , perʃeverariaõ todos os dias igualmente , & com a meʃma crueldade atormentariaõ ao enfermo , em quanto a pedra naõ ʃahiʃʃe , ou a chaga ʃe naõ curaʃʃe : àlem de que , ʃe as dores procedeʃʃem de pedra , ou de chaga , ʃahiria a ourina mal cheiroʃa , taõ branca , & taõ crua , como a agua da fonte , & appareceria no fundo do ourinol hum polme arenoʃo , ou fabuloʃo , furfuraceo , ou huns fios peganhoʃos , & àlem deʃtes ʃinaes teria o doente continuas erecções , ou alterações ʃenʃuaes , dores , & comichoes no membro , & no pentem , com continuados deʃejos de ourinar ; finalmente precederia o aver alguma hora ourinado ʃangue ; porèm como nenhum deʃtes sinaes ʃe achaʃʃem no doente , neceʃʃariamente ouve de julgar que as taes dores procediaõ ʃómente de algumas areas , & materias , que pouco a pouco ʃe hiaõ ajuntando , atè que adquiriraõ tal copia , & acrimonia , que fazia aquelles ʃymptomas nos tres dias deʃtinados , no quaes ( depois de paʃʃadas as dores ) ʃahiaõ muitas areas , & materias groʃʃas , de que ʃe ʃeguia aplacarem logo os ardores , & os mais ʃymptomas ʃobreditos. 5. Conhecendo pois que as materias tartareas , & acido-ʃalinas com a ʃua copia , & acrimonia eraõ a causa das ʃobreditas dores , & ardores , aʃʃentei comigo que o verdadeiro remedio era reʃolver o tartaro craʃʃo , & pungitivo , fazendolhe tomar primeiro que tudo (quatro vezes em dias alternados ) tres onças de agua benedicta bem vigorada ; aʃʃim porque na opiniaõ de graves Authores , ( 3 . ) naõ ha remedio , que tanto aproveite em todos os achaques dos rins , & da bexiga ; como paraque revellidos , & evacuados os humores
78 Observações Medicas Doutrinaes. perfeverava fempre : porèm como eu padeço eftas queixas fó tres dias no mes, neceffariamente hei de di- zer que de outra caufa procedem. 4. Da repofta, & argumento defte enfermo pre- fumi que as taes dores, & ardores nao procediao de pedra , nem de chaga da bexiga: , como ordinaria- mente procedem ; porque fe procedeffem de qual- quer deftas caufas , perfeverariao todos os dias igual- mente, & com a mefma crueldade atormentariao ao `enfermo, em quanto a pedra nao fahiffe , ou a chaga fe nao curaffe : alem de que, fe as dores procedef- fem de pedra, ou de chaga , fahiria a ourina mal chej- rofa, tao branca, & taő crua, como aagua da fonte, & appareceria.no fundo do ourinol hum polme are- nofo, ou fabulofo , futfuraceo , ou huns fios pega- nhofos , & alem deftes finaes teria o doente conti- nuas erecções, ou alterações fenfuaes, dores, & co- michoes nomembro, & no pentem, com continua- dos defejos de ourinar ; finalmente precederia o aver alguma hora ourinado fangue : porem como nenhum deftes finaes fe achaffem no doente, neceffariamente ouve de julgar que as taes dores procediaõ fómente de algumas areas, & materias , que pouco a pouco fe hiao ajuntando, atè que adquirirao tal copia, & acri- monia, que fazia aquelles fymptomas nos tres dias. deftinados , nos quaes ( depois de paffadas as dores). fahiao muitas areas , & materias groffas , de que fe fe- guia aplacarem logo os ardores, & os mais fympto- mas fobreditos. . .. 5. Conhecendo pois que as materias tartareas, & acido-falinas com a fua copia, & acrimonia erao a cau- fa das fobreditas dores, & ardores, affentei comigo que o verdadeiro remedio era refolver o tartaro craf- fo, & pungitivo, fazendolhe tomar primeiro que tu- do ( quatro vezes em dias alternados ) tres onças de agua benedicta bem vigorada ; affim porque na opi- niać de graves Authores, (3.) naõ ha remedio, que tanto aproveite em todos os' achaques dos rins, & da .bexiga; como paraque revellidos, & evacuados os hu- mores . ..
78 Obfervacoes Medicas Doutrinaes. perfeverava fempre : porém como eu padeco eftas queixas fo tres dias no mes,neceffariamente hei de di- zer que de outra caufa procedem. 4. Da repofta, & argumento defteenfermopre. fumi que as taes dores, & ardores nao procedia de pedra , nem de thaga da bexiga: , como ordinaria- .mente procedem ; porque fe.procedeffem de qual- quer deftas caufas , perfeveraria todos os dias igual- mente, & com a mefma.crueldade atormentaria ao enfermo, em quanto a pedra na fahiffe, ou a chaga fe nao curaffe : alem de que, fe as dores procedef. fem de pedra, ou de chaga, fahiria a ourina mal chej- rofa, ta branca, & ta crua, como aagua da tonte, & appareceria.no fundo do ourinol hum polme are- nofo, ou fabulofo , futfuraceo , ou huns fios pega- nhofos , & alem deftes finaes teria o doente:conti- nuasereccoes, ou alteracoes fenfuaes, dores, & co- michoes nomembro, & no pentem., coin continua- dos defejos de ourinar ; finalmente precederia oaver alguma horaourinado fangue: porem como nenhum deftes finaes fe achaffem no doente, neceffariamente oúve de julgar que as taes dores procediafómente hiaö ajuntando, até que adquirira tal copia, & acri- monia, que fazia aquelles fymptomas nos tres dias. deftinados, nos quaes ( depois. de paffadas as dores): fahia muitas areas , & materias groffas, de que fe fe- guia aplacarem logo os ardores , & os mais fympto- mas fobreditos. . 5. Conhecendo poisque as materias tartareas,& acido-falinas com afua copia,& acrimonia eraö a cau- fa das fobreditas dores, & ardores, affentei comigo que o verdadeiro remedio era refolver o tartaro craf- fo,& pungitivo, fazendolhe tomar primeiro que tu- do ( quatro vezes em dias alternados ) tres oncas de agua benedicta bem vigorada ; affim porque na opi- niao degraves Authores, (3.) na ha remedio, que tanto aproveite em todos os achaques dos rins, & da bexiga; como paraque revellidos, & evacuados os hu- mores
78 Obfervações Medicas Doutrinaes.. perfeverava fempre : porêm como eu padeço eftas queixas fó tres dias no mes,neceflariamente hei de di- zer que de outra caufa procedem. 4. Darepoíta, & argumento defte enfermo pre- fumi que as taes dores , & ardores naô procediao de pedra , nem de thaga da bexiga, como ordinaria- “mente procedem ; porque fe procedeflem de qual- quer deftas caufas , perfeverariaô todos os dias igual- mente, & com a meflma crueldade atormenraria6 ao ' enfermo, em quanto a pedra naó fahifle , ou a chaga de naõ curafle : àlem de que, fe as dores progedef- fem de pedra , ou de chaga , fahiria a ourina mal chej- rofa, taó branca , & taô crua, como aagua da fonte, & appareceria.no fundo do ourinol hum polme are- nofo, ou fabulofo , futfuraceo , ou huns fios pega- nhofos , & àlem deftes finaes teria o doente conti- nuas erecções , ou alterações fenfuaes , dores, & co- micheês nomembro, & no pentem, com continua- dos defejos de ourinar ; finalmente precederia o aver alguma hora ourinado fangue: porêm como nenhum defítes finaes fe achaflem no doente, neceffariamente oúve de julgar que as taes dores procediaô fómente de algumas areas, & materias, que pouco a pouco fe hiaô ajuntando, atê que adquiriraôó tal copia, & acri- monia, que fazia aquelles fympromas nos tres dias- deftinados , nos quaes (depois de paffadas as dores) fahiaô muitas areas , & materias groflas , de que fe fe- guia aplacarem Jogo os ardores , & os mais iympto-» mas fobreditos. o 5. Conhecendo poisqueas materias tartareas, &: acido-falihas com a fua copia,& acrimonia eraó a cau- fa das fobreditas dores, & ardores , affentei comigo ue o verdadeiro remedio era refolver o tartaro craf... o , & pungitivo, fazendolhe tomar primeiro que tu- do ( quatro vezes em dias alternados ) tres onças de agua benedi&ta bem vigorada ; afim porque na opi- niaô degraves Authores, (3.) naô ha remedio, que tanto aproveite em todos os achaques dos rins, & da «bexiga; como paraque revellidos, & evacuados os hu- . i mores
78 Observaçones Medicas Doutrinaes. perseverava sempre: porèm como eu padeço estas queixas so tres dias no mes, necessariamente hei de di- zer que de outra causa procedem. Da reposta , & argumento deste enfermo pre- sumi que as taes dores, & ardores naô procediao de pedra, nem de chaga da bexiga, como ordinaria¬ mente procedem; porque se procedessem de qual¬ quer destas causas, perseverariaon todos os dias igual¬ mente, & com a mesma crueldade atormentariao ao enfermo, em quanto a pedra nao sahisse , ou a chaga se nao curasse: àlem de que, se as dores proçedes- sem de pedra, ou de chaga, sahiria a ourina mal chei- rosa, taon branca, & tao crua, como aagua da fonte, & appareceria. no fundo do ourinol hum polme are noso, ou sabuloso, furfuraceo, ou huns fios pega¬ nhosos, & àlem destes sinaes teria o doente conti¬ nuas erecçones, ou alteraçones sensuaes, dores, & co¬ michoës no membro, & no pentem, com continua¬ dos desejos de ourinar; finalmente precederia o aver alguma hora ourinado sangue: porèm como nenhum destes sinaes se achassem no doente , necessariamente ouve de julgar que as taes dores procediao somente de algumas areas, & materias, que pouco a pouco se hiaò ajuntando, atè que adquiriraon tal copia , & acri- monia, que fazia aquelles symptomas nos tres dias destinados, nos quaes (depois de passadas as dores) sahiaon muitas areas, & materias grossas, de que se se¬ guia aplacarem logo os ardores, & os mais sympto¬ mas sobreditos. 5. Conhecendo pois que as materias tartareas, & acido-saliñas com a sua copia, & acrimonia eraon a cau¬ sa das sobreditas dores, & ardores, assentei comigo que o verdadeiro remedio era resolver o tartaro cras- so , & pungitivo, fazendolhe tomar primeiro que tu¬ do (quatro vezes em dias alternados) tres onças de agua benedicta bem vigorada; assim porque na opi¬ niaon de graves Authores, (3.) nao ha remedio , que tanto aproveite em todos os' achaques dos rins, & da y.bexiga; como paraque revellidos, & evacuados os hu¬ mores
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Obʃervaçaõ XI. 79 mores por vomito , & curʃo , ficaʃʃe o corpo mais aliviado , & as vias mais diʃpoʃtas para lhe dar as ʃeguintes pilulas , que tem notavel efficacia para evacuar as materias tartareas , & fabuloʃas , e ʃe preparaõ do modo ʃeguinte . Tomai de calomelanos Turqueti , tres vezes ʃublimado , meya oitava , de trociʃcos de Alandal ʃubtilizadiʃʃimos cinco grãos , tudo ʃe miʃture com huma oitava de terebinthina de beta , & ʃe formem doze pilulas ; ordenando ao doente , que as tomaʃʃe na madrugada , & que de quatro em quatro dias tomaʃʃe outras ʃemelhantes , & ʃe repetiʃʃem vinte vezes . Naõ he dizivel a ʃuavidade com que eʃte remedio obrou , nem o alivio que o doente ʃentio : acabadas que foraõ de tomar as pilulas , deʃcanʃou quatro dias , & paʃʃado elles , lhe dei o ʃeguinte medicamento , que para abrir as veas ureteras , & fazer ourinar , tem magnifica propriedade , & ʃe prepara do modo ʃeguinte . Tomem de pedra Judaica , & de criʃtal pedra , de cada couʃa deʃtas huma onça , façaõʃe em pò ʃubtiliʃʃimo , & ʃe miʃturem com igual quantidade de ʃal armoniaco , & em huma redoma de vidro ( enterrada em area atè o meyo ) ʃe ʃublime com fogo moderado no principio , & ao depois com fogo forte , & da materia ʃublimada , ou pegada nas partes ʃuperiores do vidro , dei ao doente dous eʃcropulos deʃatados em meyo quartilho de agua cozida com raizes de eʃpargos , ou de ortigas , ou com folhas de cerfolio , ou de pimpinella . Com eʃte remedio ourinou muito , & conheceo grande melhoria ; mas porque naõ foy tanta como eu deʃejava , lhe dei oito dias doze gottas de oleo de alambre miʃturadas em ʃeis onças de agua cozida com huma onça de raiz de rilhaboy ; & foy Deos ʃervido que com eʃte remedio , & com lhe prohibir que naõ comeʃʃe queijo , nem manteiga , preʃunto , peixe , nem legumes , o livraʃʃe de taõ terrivel enfermindade ; & para que naõ tornaʃʃe a cahir nella , nem criaʃʃe mais ʃemelhantes humores viʃcoʃos , & tartareos , ordenei que por tempo de hum anno bebeʃʃe agua cozida com hum molhinho de pimpinella , ou
5 Obfervação XI. mores por vomito , & curfo, ficaffe o corpo mais ali- viado, & as vias mais difpoftas para lhe dar as feguin- .tes pilulas , que tem notavel efficacia para evacuar as materias tartareas , & fabulofas , & fe preparaõ do .modo feguinte. Tomai de calomelanos Turqueti, tres vezes fublimado , meya oitava, de trocifcos de Alandal fubtilizadiffimos cinco grãos, tudo fe mif- ture com huma oitava de terebinthina de beta, & fe formem doze pilulas ; ordenando ao doente, que as tomaffe na madrugada, & que de quatro em quatro dias tomaffe outras femelhantes, & fe repetiffem vin- te vezes. Nao he dizivel a fuavidade com que efte re- medio obrou , nem o alivio que o doente fentio : aca- badas que forao deromar as pilulas, defcanfou qua- tro dias, & paffados elles, lhedei o feguinte medica- mento, que para abrir as veas ureteras, & fazer ou- rinar, tem magnifica propriedade, & fe prepara do modo feguinte. Tomem de pedra Judaica, & de crif- tal pedra, de cada coufa deftas huma onça, façaõfe em po fubtiliffimo, & femifturem com igual quanti- dade de fal armoniaco, & em huma redoma de vidro (enterrada em area atè o meyo ) fe fublime com fogo moderado no principio, & ao depois com fogo forte, & da materia fublimada, ou pegada nas partes fupe- riores do vidro, dei ao doente dous efcropulos defa- tados em meyo quartilho de agua cozida com raizes de efpargos , ou de ortigas, ou com folhas de cerfolio, ou de pimpinella. Com efte remedio ourinou muito, & conheceò grande melhoria; mas porque nao foy tanta como eu defejava , lhe dei oito dias doze gottas de oleo de alambre mifturadas em feis onças de agua cozida com huma onça de raiz de rilhaboy ; & foy Deos fervido que com efte remedio, &.com lhe pro- hibir que nao comeffe queijo, nem manteiga, prefun- to, peixe, nem legumes, o livraffe de tao terrivel en- fermidade ; & para que nao tornaffe a cahir nella nem criaffe mais femelhantes humores vifcofos, & tartareos, ordenei que por tempo de hum'anno be- beffe agua cozida com hum molhinho de pimpinella, 79 - -----
Obfervacao XI.: ·. 7 .mores por vomito , & curfo, ficaffe o corpo mais ali. viado,& as.vias mais difpoftas paralhe dar as feguin- . tes pilulas , que tem notavel efficacia para evacuar as :materias tartareas , & fabulofas , & fe.prepara do modo feguinte: Tomai de calomelanos Turqueti , .tres vezes fublimado , meya oitava, de.trocifcos de . Alandal fubtilizadiffimos cinco:graos, tudo fe mif- ture com huma. oitava de terebinthina de beta, & fe formem doze pilulas; ordenando ao doente, que.as tomaffe na madrugada, & que de quatro em quatrb dias tomaffe outras femelhantes , & fe repetiffem vin- te vezes. Na he dizivel a fuavidade com que efte re- : .medio obrou , nem o alivioque o doente fentio: aca- .badas que fora detomar as pilulas, defcanfou qua tro dias, & paffados elles, lhedei o feguinte medica- .mento, que: paraabrir as veas ureteras, & fazer ou- rinar., tem magnifica propriedade, & fe prepara do modo feguinte. Tomcim de pedra Judaica, & decrif- tal pedra, de cadacoufa deftas huma onca, fagafe em po fubtiliffimo , & fe mifturem com igual quanti- dade de fal armoniaco, & em huma redoma de vidro : (enterrada em. area até 9 meyo ) fe fublime com fogo moderado no principio, &.ao depois com fogo forte, & da materia fublimada, ou pegada nas partes fupe- riores.do vidro, dei ao doente dousefcropulos defa- tados em meyo quartilho de agua cozida com raizcs deefpargos , ou de ortigas, ou com folhas de cerfolio, ou de pimpinella. Com efte remedio ourinou muito, & conhece grande melhoria; mas porque naö foy tantacomo eu defejava , lhe dei oito dias doze:gottas de.oleo de alambre mifturadas em feis oncas de agua cozida com huma onca de raiz de rilhaboy : & foy Deos fervido que com efte remedio, &.com lhe pro- hibir que nao comeffe queijo, nem manteiga, prefun- to ,: peixe, nem legumes, livraffe de taterrivel en- fermidade ; & para que na tornaffe a cahir nellax nem criaffe mais femelhantes hunores vifcofos, & tartareos, ordenei quc por tempo de hum anno be- beffe agua cozida coin hum molhinho de pimpinella, 011
2 pau a 2 A eo aih coiiiMiaciceiedob sentado . w Obfervaçãõ D.6 RM 7O .mores por vomito ; & curfo , ficafle o córpo mais alia “viado , & as vias mais difpofítas É biaa dar as feguin- .tes pilulas , que term noravel efficacia para evacuar as «materias tartareas , & fabulofas , & fe preparaô do .modo feguinte. Tomai de calomelanos Turqueti, tres vezes fublimado , meya oitava, detrocifcos de .Alandal fubrilizadiflimos cinco:grãos , tudo fe mif- ture com huma oitava de terebinthina de beta , & fe formem doze pilulas ; ordenando ao doente, que as tomaíle na madrugada, & que de quatro em quatro dias tomaffe outras femelhantes , & fe repetiffem vin- tevezes. Naó he dizivel a fnavidade com que efte re- . medio obrou , nem o alivio que o doente fentio: aca- badas que foraó dexomar as pilulas, defcanfou qua- tro dias, & paífados elles , Ihedei o feguinte medica- mento, que para abrir as veas ureteras, & fazer ou- rinar, tem magnifica propriedade, & fe prepara do modo feguinte. Tomem de pedra Judaica, & decrif- tal pedra, de cada confa deftas huma onça, façaõfe em pô fubtilifimo , & femifturem com igual quanti- dade de fal armoniaco, & em huma redoma de vidro (enterrada em area atê q meyo ) fe fublime com fogo moderado no principio , &,ao depois com fogo forte, : & damateria fublimada, ou pegada nas partes fupe- . riores do vidro, dei ao doente dous efcropulos defa- tados em meyo quartilho de agua cozida com raizes deeípargos, ou de ortigas, ou com folhas de cerfolio, ou de pimpinella. Comefte remedio ourinou muito, & conheces grande melhoria; mas porqut naô foy tanta como eu defejava , lhe dei oito dias dozegottas - deoleo de alambre mifturadas emfeis onças de agua cozida com huma onça de raiz de rilhaboy ; & foy Deos fervido que com efte remedio, & com lhe pro- hibir que naó comeffe queijo , nem manteiga, prefun- to , peixe, nem legumes, o livraffe de taó terrivel en- fermidade ; & rara que naõ tornaíle a cabir nella nem criafle mais femelhantes humores vifcofos, & tartareos, ordenei que por tempo de hum'anno be- befle agua cozida com hum molhinho de pimpinella, * 1 Ou os o > x
79 Observaçao XI. mores por vomito, & curso, ficasse o corpo mais ali¬ viado, & as vias mais dispostas para lhe dar as seguin¬ tes pilulas, que tem notavel efficacia para evacuar as materias tartareas, & sabulosas, & se preparao do modo seguinte. Tomai de calomelanos Turqueti. tres vezes sublimado, meya oitava, de trociscos de Alandal subtilizadissimos cinco gramos, tudo se mis¬ ture com huma oitava de terebinthina de beta, & se formem doze pilulas; ordenando ao doente, que as tomasse na madrugada, & que de quatro em quatro dias tomasse outras semelhantes, & se repetissem vin¬ te vezes. Nao he dizivel a suavidade com que este re- medio obrou, nem o alivio que o doente sentio. aca¬ badas que foraon de tomar as pilulas, descansou qua¬ tro dias, & passados elles, lhe dei o seguinte medica- mento, que para abrir as veas ureteras, & fazer ou¬ rinar, tem magnifica propriedade, & se prepara do modo seguinte. Tomem de pedra Judaica, & de cris- tal pedra, de cada cousa destas huma onça, façaôse em pò subtilissimo , & se misturem com igual quanti¬ dade de sal armoniaco, & em huma redoma de vidro enterrada em area atè o meyo) se sublime com fogo moderado no principio, & ao depois com fogo forte. & da materia sublimada, ou pegada nas partes supe¬ riores do vidro, dei ao doente dous escropulos desa¬ tados em meyo quartilho de agua cozida com raizes de espargos, ou de ortigas, ou com folhas de cerfolio, ou de pimpinella. Com este remedio ourinou muito, & conheceò grande melhoria; mas porquè nao foy tanta como eu desejava, lhe dei oito dias doze gottas de oleo de alambre misturadas em seis onças de agua cozida com huma onça de raiz de rilhaboy; & foy Deos servido que com este remedio , & com lhe pro- hibir que naon comesse queijo, nem manteiga, presun¬ to, peixe, nem legumes, o livrasse de tao terrivel en- fermidade; & para que naô tornasse a cahir nella, nem criasse mais semelhantes humores viscosos, & tartareos, ordenei que por tempo de hum anno be¬ besse agua cozida com hum molhinho de pimpinella, ou
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80 Obʃervações Medicas Doutrinaes ou de cerfolio , duas oitavas de alcaçuz , & meya onça de aʃʃucar cande violado ; & que por tempo de ʃeis meʃes tomaʃʃe em jejum hum caldo de frangaõ cozido com folhas de betonica , & de erva turca , chamada herniaria , porque naõ ʃe póde explicar a grande virtude , que eʃtas duas ervas tem para gaʃtar a pedra , & materias viʃcoʃas da bexiga , & dos rins . Ordenei tambem que de oito em oito dias tomaʃʃe huma onça da ʃeguinte conʃerva . Tomem de polpa de canafiʃtula tirada de fresco , tres onças , de carne das cereijas , ou ginjas ʃeccas tres onças , de cremores de tartaro legitimamente preparados huma onça , de terebinthina de beta , lavada em tantas aguas de malvas atè que fique bem branca , duas onças , tudo ʃe miʃsture com duas onças de pò de alcaçuz , & ʃe faça conʃerva , a qual naõ ʃó tem admiravel virtude para curar as dores , & achaques dos rins , & da bexiga , mas para preʃervar de gotta. 6 . Eʃte remedio communico a todos em ʃerviço do bem commum , & ʃe a algum Medico parecer menos bom do que a mim me parece , peçolhe que o naõ uʃe , ou o emende , porque mais quero deʃdizerme da minha opiniaõ , & ʃugeitarme ao parecer de quem he mais douto , ( 4 . ) que encorrer no crime de teimoʃo ; porque ʃe ( como dizem graves Authores ) ( 5 . ) não foy deʃcredito em Hippocrates dizer que ʃe enganára com as ʃoturas da cabeça : nem em Galeno dizer que ʃe enganàra cuidando que tinha huma pedra atraveʃʃada em alguma vea uretera , ʃendo que era huma dor de colica : nem em Alzaravio dizer que ʃe enganàra com ʃua mulher , porque lhe dera huma purga eʃtando pejada , cuidando que o naõ eʃtava : com quanta mais razão devo eu deʃdizerme , & naõ porfiar em o meu voto , quando os Principes da Medicina ʃe naõ envergonháraõ de deʃdizerse ? merecendo pelas taes confiʃʃoes mais louvores , do que mereceriaõ , ʃe levados de alguma vaidade defendeʃʃem os ʃeus erros , porque com iʃʃo dariaõ occaʃiaõ aos vindouros , paraque cahiʃʃem em outros ʃemelhantes : o certo he , que eʃtes
80 Observações Medicas Doutrinaes. ou de cerfolio , duas oitavas de alcaçuz , & meya on- ça de affucar cande violado; & que por tempo de feis mefes tomaffe em jejum hum caldo de frangao cozi- do com folhas de betonica, & de erva turca, chamada herniaria , porque nao fe póde explicar a grande vir- tude, que eftas duas ervas tem para gaftar a pedra, & materias vifcofas da bexiga, & dos rins. Ordenei tambem que de oito em oito dias tomaffe huma onça da feguinte conferva. Tomem de polpa de canafiftu- la, tirada de frefco , tres onças, de carne das cereijas, ou ginjas feccas tres onças , de cremores de tartaro le- gitimamente preparados huma onça, de terebinthina de beta , lavada em tantas aguas de malvas atè que fi- que bem branca, duas onças, tudo fe mifture com duas onças de pò de alcaçuz, & fe faça conferva, à qual nao fó tem admiravel virtude para curar as do- res , & achaques dos rins , & da bexiga, mas para pre- fervar de gotta. . 6. Efte remedio communico a todos em ferviço do bem commum, & fe a algum Medico parecer me- nos bom do que a mim me pareçe , peçolhe que o naõ ufe , ou o emende, porque mais quero defdizerme da minha opiniao , & fugeitarme ao parecer de quem he mais douto, (4.) que encorrer no crime de teimofo; porque fe ( como dizem graves Authores ) (5.) não foy defcredito em Hippocrates dizer que fe engana- ra com as foturas da cabeça : nem em Galeno dizer que fe enganàra cuidando que tinha huma pedra atra- veffada em alguma vea uretera, fendo que era huma dor de colica : nem em Alzaravio dizer que fe enganà- ra com fua mulher , porque lhe dera huma purga ef- tando pejada , cuidando que o nao, eftava :· com quan- ta mais razão devo eu defdizerme, & nao porfiar em o meu voto, quando os Principes da Medicina fe naõ envergonháraõ de defdizerfe? merecendo pelas taes confiffoés mais louvores, do que mereceriao , fe leva- dos de alguma vaidade defendeffem os feus erros ; porque com iffo dariaõ occafiaõ aos vindouros , para- que cahiffem em outros femelhantes: o certo he, que eftes - 1.
8 Obfervacoes Medicas Doutrinacs. ou de cerfolio, duas. oitavas de alcacuz , & meya on- ga de affucar cande violado; & que por tempo de feis mefes tomaffe em jejum hum caldo de franga: cózi- docom folhas de betonica, & de erva turca, chamada herniaria, porque naöfe póde explicar agrande vir- tude, que eftas duas ervas tem para gaftar a pedra, & materias vifcofas dabexiga, & dos rins. Ordenei tambem que de oito em oito dias tomaffe huma onca da feguinte conferva. Tomem de polpa de canafiftu- la, tirada de frefco , tres ongas, de carne das cereijas, ou ginjas feccas tres ongas , de cremores de tartaro le- gitimamente preparados huma onca , de terebinthina debeta, lavada em tantas aguas de malvas ate quefi- que bem branca, duas oncas, tudo fe mifture com duas oncas de podealcacuz, & fe faca conferva, a qual naö f6 tem admiravel. virtude para curar as do- res, & achaques dos rins, & da bexiga, mas para pre- fervar de gotta. 6. Efte remedio communico a todos em fervico do ben commum, & fe a algum Medico parecer me- nos bom do que a mim me parece , pecolhe que o na ufe, ou o emende, porque mais quero defdizerme da minha opinia , & fugeitarme ao parecer de quem he mais douto, (4.) que encorrer nocrime de teimofo; porque fe (como dizen graves Authores ) (5.) na foy defcredito em Hippocrates dizer que fe engana-- ra com as foturas da cabeca : nem em Galenodizer que fe enganara cuidando que tinha huma pedraatra veffada ein alguma vea uretera, fendo que era huma dor decolica: nem em Alzaravio dizer que fe engana- ra com fua mulher , porque lhe dera huma purga ef- tando pejada , cuidando que o na,eftava : com quan- ta mais razao devo eu.defdizerme, & na porfar em o meu voto, quando os Principesda Medicina fe na envergonhara de defdizerfe? merecendo pelas taes confiffos mais louvores, doque mereceria, fe leva- dos de alguma vaidade..defendeffem os feus erros; porque com iffo daria occafia aos vindouros , para quc cahiffem em outros femelhantes: o certo he, qua eftes
* 80 Obfervações Medicas Doutrinaes. ou de cerfolio , duas óitavas de alcaçuz , & meya on- ça de aflucar cande violado ; & que por tempo de feis mefes tomafle em jejum hum caldo de frangaô cozi- do com folhas de betonica, & de ervaturca, chamada — herniaria, porque naó fe póde explicar a grande vir- tude, que eftas duas ervas tem para gaítar a pedra, & materias vifcofas da bexiga, & dos rins. Ordenei tambem que de oito em oito dias tomaflfe huma onça da feguinte conferva. Tomem de polpa de canafiftu- | la, tirada de frefco , tres onças, de carne das cereijas, : ou ginjas feccas tres onças , de cremores de tartaro le- í gitimamente preparados huma onça , de terebinthina de beta , lavada emrantas aguas de malvas até que fi- s ue bem branca, duas onças, tudo fe mifture com duas onças de pô de alcaçuz , & fe faça conferva, à qual naó fó tem admiravel virtude para curar as do- res , & achaques dos rins , & da bexiga, mas para pre- : fervar de gotta. : | : '6. Efte remedio communico a todos em ferviço do bem commum, & fe a algum Medico parecer me- nosbom do que a mim me pareçe , peçolhe que o naõ ufe, ou o emende, porque mais quero defdizerme da minha opiniaô , & fugeitarme ao parecer de quem he mais douto, (4.) que encorrer no crime de teimofo; porque fe (como dizem graves Authores ) (5:) não foy defcredito em Hippocíates dizer que fe enganá- ra com as foturas da cabeça : nem em Galeno dizer que fe enganàra cuidando que tinha huma pedra atra<« veífada em alguma vea uretera , fendo que era huma dor de colica: nem em Alzaravio dizer que fe enganà+ ra com fua mulher , porque lhe dera huma purga ef- tando pejada , cuidando que o naõ eftava :: com quan- ta mais razão devo eu defdizerme, & naó porfiar em o meu voto, quando os Principesda Medicina fe naõ * envergonháraô de defdizerfe? merecendo pelas taes iconfifloés mais louvores , do que mereceriaô , fe leva- dos de alguma vaidade defendeflem os feus erros ; porque com iflo dariaô occafiaõ aos vindouros,para- — que cahiflem em outros femelhantes: o certo he , que | Pos elites
80 Observaçones Medicas Doutrinaes. ou de cerfolio, duas oitavas de alcaçuz, & meya on- ça de assucar cande violado; & que por tempo de seis meses tomasse em jejum hum caldo de frangaô cozi¬ do com folhas de betonica , & de erva turca, chamada herniaria, porque naon se pode explicar à grande vir¬ tude, que estas duas ervas tem para gastar a pedra, & materias viscosas da bexiga, & dos rins. Ordenei tambem que de oito em oito dias tomasse huma onça da seguinte conserva. Tomem de polpa de canafistu- la, tirada de fresco , tres onças, de carne das cereijas, ou ginjas seccas tres onças, de cremores de tartaro le- gitimamente preparados huma onça, de terebinthina de beta, lavada em tantas aguas de malvas atè que fi- que bem branca, duas onças, tudo se misture com duas onças de pò de alcaçuz, & se faça conserva, a qual naon só tem admiravel virtude para curar as do¬ res, & achaques dos rins , & da bexiga, mas para pre- servar de gotta. 6. Este remedio communico a todos em serviço do bem commum, & se a algum Medico parecer me¬ nos bom do que a mim me pareçe, peçolhe que o naon use, ou o emende , porque mais quero desdizerme da minha opiniaon, & sugeitarme ao parecer de quem he mais douto, (4.) que encorrer no crime de teimoso; porque se (como dizem graves Authores) (5.) nano foy descredito em Hippocrates dizer que se enganá- ra com as soturas da cabeça. nem em Galeno dizer que se enganàra cuidando que tinha huma pedra atra- vessada em alguma vea uretera, sendo que era huma dor de colica: nem em Alzaravio dizer que se enganà- ra com sua mulher, porque lhe dera huma purga es¬ tando pejada, cuidando que o naon estava: com quan- ta mais razao devo eu desdizerme, & nao porfiar em o meu voto, quando os Principes da Medicina se naon envergonhárao de desdizerse? merecendo pelas taes confissoës mais louvores, do que mereceriao , se leva- dos de alguma vaidade defendessem os seus erros, porque com isso dariaon occasiaon aos vindouros, para¬ que cahissem em outros semelhantes: o certo he, que estes »
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Obʃervaçaõ XI. 81 eʃtes grandes homens confeʃʃáraõ que se aviaõ enganado , porque como eraõ taõ grandes , nada lhes faria eʃcurecer o ʃeu bom nome : o que naõ acontece nos Medicos pequenos , que como tem pouco cabedal , qualquer migalha de fama que percaõ , ʃe conʃideraõ aniquilados , & por iʃʃo ʃaõ taõ teimoʃos em defender o que huma vez chegàraõ a votar . 7 . Jà que neʃta Obʃervaçaõ fallei ʃobre dores pertencentes às vias da ourina , quero fazer duas advertencias aos principiantes . A primeira he , que ʃe entenderem que as dores procedem de chaga da bexiga , que neʃte caʃo dem a beber ao tal doente , ʃeis meʃes , agua ferrada com ferro ; porque diz Scribonio Largio ( 6 . ) que he grandiʃʃimo remedio nas dores , & queixas da bexiga , como elle obʃervou com as aguas das caldas de Thuʃcia , que ʃaõ de ferro , & ʃe chamaõ em Toʃcana Veʃicarias . A ʃegunda he , q dem aos taes enfermos , em vinte dias continuos , o calomelanos ʃublimado trinta vezes , atè que quaʃi fique fixo ; porque na opiniaõ de Riverio , ( 7 . ) ʃe algum remedio póde curar as chagas da bexiga , he o mercurio diaphoretico fixo , ou o oleo doce do mercurio ; mas o ʃaber preparar o tal oleo , naõ he a todos facil . 8 . Semelhante caʃo a eʃte obʃervei em hum menino de idade de nove annos , chamado Cayetano Franciʃco , filho de Pedro Franciʃco , & de Sebaʃtiana Gomes , moradores na rua da Arrochela , que fica defronte do Convento de Saõ Bento . Para eʃte rapaz fui chamado depois de ter padecido largos tempos eʃtas crueliʃʃimas dores , & eʃtar taõ magro que parecia hua imagem da morte , porque nem de dia , nem de noite dormia , nem tinha ʃoʃʃego , dandolhe cinco vezes a agua benedicta em dias alternados , & fazendolhe beber em jejum , por tempo de tres meʃes , hum quartilho de leite de burra miʃturado com meya oitava das minhas pilulas antefebriles , ordenandolhe que pelo meʃmo tempo bebeʃʃe agua , em que miʃturaʃʃem coral preparado ; & foy Deos ʃervido que ʃarou de taõ cruel doença no anno de 1702 . Vanelmont acon-
Obfervação XI. 8İ eftes grandes homens confeffáraő que fe aviaõ enga- nado ,porque como eraõ taõ grandes, nada lhes fa- ria efcurecer o feu bom nome : o que naõ acontece nos Medicos pequenos , que como tem pouco cabedal, qualquer migalha de fama que percao, fe confiderao aniquilados, & por iffo fao tao teimofos em defender o que huma vez chegaraõ a votar. 7. Jà que nefta Obfervaçao fallei fobre dores per- tencentes às vias da ourina, quero fazer duas adver- tencias aos principiantes. A primeira he, que fe en- tenderem que as dores procedem de chaga da bexi- ga , que nefte cafo dem a beber ao tal doente, feis me- fes, agua ferrada com ferro; porque diz Scribonio Largio (6.) que he grandiffimo remedio nas dores , & queixas da bexiga, como elle o obfervou com as aguas das caldas de Thufcia, quefao de ferro, & fe chamao em Tofcana Veficarias. A fegunda he, q dem aos taes enfermos , em vinte dias continuos, o calomelanos fublimado trinta vezes , atè que quafi fique fixo; por- que na opiniao de Riverio, (7.) fe algum remedio póde curar.as chagas da bexiga , he o mercurio dia- phoretico fixo, ou o oleo doce do merturio ; mas o fa- ber preparar o tal oleo , nao he a todos facil. 8. Semelhante cafo a efte obfervei em hum me- nino de idade de nove annos , chamado Cayetano Francifco, filho de Pedro Francifco, & de Sebaftia- na Gomes, moradores na rua da Arrochela, que fi- ca defronte do Convento de Sao Bento. Para elte ra- paz fui chamado depois de ter padecido largos tem- pos eftas crueliffimas dores, & eftar taõ magro que pa- recia hűa imagem da morte , porque nem de dia , nem de noite dormia, nem tinha foffego, dandolhe cinco vezes a agua benedicta em dias alternados, & fazer- dolhe beber em jejum , por tempo de tres mefes, hum quartilho de leite de burra mifturado com meya oita -- va das minhas pilulas antefebriles , ordenandolhe que pelo mefmo tempo bebeffe agua, em que miftu- raffem coral preparado; & foy Deos fervido que fa- rou de tao cruel doença no anno de 1702. Vanelmont acon- . ---- ,
Obfervacao XI. 8 1 eftes grandes homens confeffára que fe avia enga- 1 nado -porque como eraö ta grandes, nada lhes fa- ria efcurecer o feu bom nome : o que naö acontece nos Medicos pequenos , que como tein pouco cabedal, qualquer migalha de fama que perca, fe confidera aniquilados, & pór iffofata teimofos em defender o que huma vez chegarao a votar. 7. Ja que nefta Obfervaca fallei fobre dores per- tencentes as vias da ourina, querofazer duas adver- tencias aos principiantes. A primeira he, que fe en- tenderem que as dores procedem de chaga dabexi- ga , que neftecafo dem a beber ao tal doente , feis mé Tes, agua ferrada coim ferro; porque diz Scribonio Largio (6.) que he grandiffimo remedionas. dores , & queixas da bexiga, como elle o obfervou com as aguas das caldas de Thufcia, quefa de ferro, & fe chama em Tofcana Veficarias. A fegunda he , q dem aos taes enfermos , em vinte dias continuos, o calomelanos fublimado trinta vezes , ate que quafi fque fixo ; por- que na opinia de Riverio, (7.) fe algum remedio póde curar,as chagas da bexiga , he o mercurio dia- phoretico fixo, ou o oleo doce do merturio ; mas o fa-- ber preparar o tal oleo , nao he a todos facil. 8. Semelhante cafo a efte obfervei cm hum me- nino de idade de nove annos , chamado Cayctano Francifco, filho de Pedro Francifco, & de Sebaftia- naGomes, moradores narua da Arrochela, que f- ca defronte do Convento de Sao Bento. Para efte ra- paz fui chamado depois de ter padecido largos tem- pos eftas crueliffimas dores,& eftar ta magro que pa- recia hua imagem da morte , porque nem de dia , nem de noite dormia,nem tinha foffego, dandolhe cinco yezes aagua benedicta em dias alternados, & fazeri- dolhe beber em jejum , por tenpo de tres mefes, hum quartilho de leite de burra mifturado com meya oita-- va das minhas pilulas antefebriles , ordenandolhe que peto mefmo tempo bebeffe agua,em que miftu- raffem:coral preparado; & foy Deos fervido que fa- .rou de ta cruel doenganoanno de 1792. Vanelmont acon-
* 'Obfervação XI. 81 2 | eftesgrandes homens confefláraô que fe aviaó enga- ! “nado,porque como eraó taô grandes , nada lhes fa- ria efcurecer o feu bom nome: o que naô acontece nos . Medicos pequenos , que como tem pouco cabedal, . —qualquermigalha de fama que percao, fe confideraõ * aniquilados, & por iflofaõótaô teimofos em defender O que huma vez chegàraô a votar. | 7. Jàquenefta Obfervaçao fallei fobre dores per- tencentes às vias da ourina, quero fazer duas adver- tencias aos principiantes. A primeira he, que fe en- tenderem que as dores prócedem de chaga da bexi- : ga, que neftecafo dema beber ao tal doente , feis me- des , agua ferrada com ferro; porque diz Scribonio Largio (6.) que he grandifimo remedio nas dores , & queixas da bexiga, como elle o obfervou com as aguas das caldas de Thufcia, quefaô de ferro , & fe chamaõ em Tofcana Velicarias. A fegunda he, qdemaos taes enfermos , em vinte dias continuos, o calomelanos fublimado trinta vezes ,até que quafi fique fixo ; por- que na opiniaô de Riverio, (7.) fe algum remedio i —póde curar,aschagas da bexiga, he o mercurio dia- horetico fixo, ou o oleo docê do merturio; mas o fa- Ber preparar otal oleo , naô he a todos facil. 8. — Semelhante cafo a efte obfervei em hum me- nino de “idade de nove annos , chamado Caycrano Francifco, filho de Pedro Francifco, & de Sebaftia- '* —hnaGomes, moradores narua da Arrochela, que fi- ca defronte do Convento de Sao Bento. Para elte ra- paz fui chamado depois de ter padecido largos tem- - pos eftas crueliflimas dores,& eítart tao magro que pa- recia hõia imagem da morte , porque nem de dia , nem de noite dormia, nem tinha Bffezo ; dandolhe cinco vezes a avua benediéta em dias alternados, & fazen- dolhe beber em jejum , por tempo de tres mefes, hum quartilho de leite de burra mifturado com meya oita-- va das minhas pilulas antefebriles ; ordenandolhe que pelo mefmo tempo bebefle agua, em que miftu- raflem coral preparado ; & foy Deos fervido que fa- rou de taó cruel doençano anno de 1702. Vanelmont ' acon- rrdinlaeeecutos ÉB s
Observaçaon XI. 81 estes grandes homens confessaraon que se aviaon enga- nado, porque como eraô tao grandes, nada lhes fa¬ ria escurecer o seu bom nome: o que nao acontece nos Medicos pequenos, que como tem pouco cabedal, qualquer migalha de fama que percao , se consideraon aniquilados, & por isso saon taon teimosos em defender ò que huma vez chegàraon a votar. 7. Jà que nesta Observaçaon fallei sobre dores per- tencentes às vias da ourina, quero fazer duas adver tencias aos principiantes. A primeira he, que se en¬ tenderem que as dores procedem de chaga da bexi ga, que neste caso dem a beber ao tal doente , seis me ses, agua ferrada com ferro; porque diz Scribonio Largio (6.) que he grandissimo remedio nas dores , & queixas da bexiga, como elle o observou com as aguas das caldas de Thuscia, que saon de ferro , & se chamaon em Toscana Vesicarias. A segunda he, quae dem aos taes enfermos, em vinte dias continuos, o calomelanos sublimado trinta vezes, atè que quasi fique fixo; por¬ que na opiniao de Riverio, (7.) se algum remedio póde curar. as chagas da bexiga, he o mercurio dia¬ phoretico fixo, ou o oleo doce do merturio; mas o sa¬ ber preparar o tal oleo , naó he a todos facil. 8. Semelhante caso a este observei em hum me¬ nino de idade de nove annos, chamado Cayctano Francisco, filho de Pedro Francisco, & de Sebastia- na Gomes, moradores na rua da Arrochela, que fi¬ ca defronte do Convento de Sao Bento. Para este ra¬ paz fui chamado depois de ter padecido largos tem- pos estas cruelissimas dores, & estar taon magro que pa¬ recia huma imagem da morte, porque nem de dia, nem de noite dormia , nem tinha sossego , dandolhe cinco vezes a agua benedicta em dias alternados, & fazen¬ dolhe beber em jejum, por tempo de tres meses, hum quartilho de leite de burra misturado com meya oita¬ va das minhas pilulas antefebriles, ordenandolhe que pelo mesmo tempo bebesse agua, em que mistu¬ rassem coral preparado; & foy Deos servido que sa¬ rou de taon cruel doença no anno de 1702. Vanelmont acon¬
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82 Obʃervações Medicas Doutrinaes . ( 8 . ) aconʃelha os eʃpiritos de ʃal , por remedio maravilhoʃo para os ardores da ourina , & para as eʃtrangurias dos velhos , principalmente ʃe os taes eʃpiritos de ʃal forem deʃatados em cozimento de ʃemente de biʃnaga , porque diʃʃolvem os humores viʃcoʃos , & fazem deitar as areas . OBSERVAÇAM XII De huma ʃuppreʃʃaõ alta de ourina , que hum Religioʃo de Saõ Bernardo padeceo vinte dias , no fim dos quaes teve ʃaude , porque deitou pelas ʃangrias dos braços grande quantidade de ourina , como ʃe conheceo pela cor , & cheiro della. 1. Hippocrates , aquelle grande Oraculo da Medicina , certifica , & com muita razão , que a Arte Medica he tão vaʃta , & dilatada , que não tem termo , em que caiba , nem baliʃa , que a comprehenda , por quanto ainda que elle nos deixou os ʃeus Aforiʃmos , & regras univerʃaes por onde nos governamos ; comtudo a experiencia nos moʃtra que naõ ha no mundo couʃa algũa taõ certa , nem taõ infallivel , q naõ tenha ʃuas excepções , & deixe de faltar algũas vezes . Como couʃa certa , & infallivel diz Hippocrates ( 1 . ) que nem as mulheres padecem gotta em quanto lhes baixa a conjunçaõ menʃal ; nem os meninos em quanto naõ tem uʃo de mulher : & pela experiencia conʃta que algũas mulheres bem menʃtruadas , & alguns meninos incapazes por ʃua idade de ter copula com mulheres , padecem dores de gotta inʃoportaveis . O meʃmo Hippocrates ( 2 . ) certifica que os accidentes de gotta coral nas peʃʃoas velhas , & nas que paʃʃaõ de vinte & cinco annos ʃaõ incuraveis ; & eu curei dos taes accidentes a tres homens , hum dos quaes paʃʃava de trinta annos , & os dous paʃʃavaõ de vinte & cinco , como os curioʃos poderaõ ver na minha Polyan-
$2 Obfervações Medicas Doutrinaes. (8. ) aconfelha os efpiritos de fal , por remedio mara- vilhofo para os ardores da ourina , & para as eftrangu- rias dos velhos , principalmente fe os taes efpiritos de fal forem defatados em cozimento de femente de bif- naga, porque diffolvem os humores vifcofos, & fa- zem deitar as areas. OBSERVA ÇA ME XII. De huma fuppreffao alta de ourina, que bum Religiofo de Sao Bernardo padeceo vinte dias , no fim dos quaes teve faude, porque deitou pelas fangrias dos braços grande quantidade de ourina, como fe conheceo pela cor , ds cheiro della. 1. H Ippocrates , aquelle grande Oraculo da Medicina, certifica, & com muita ra- zao, que a Arte Medica he tão vafta, & dilatada, que não tem termo, em que caiba, nem balifa, que a com- prehenda, por quanto aindaque elle nos deixou os feus Aforifmos, & regras univerfaes por onde nos gover- namos; comtudo a experiencia nos moftra que naõ ha no mundo coufa algua tao certa , nem tao infallivel, q naõ tenha fuas excepções, & deixe de faltar algűas ve- zes. Como coufa certa, & infallivel diz Hippocrates (1.) que nem as mulheres padecem gotta em quanto lhes baixa a conjunção menfal ; nem os meninos em quanto nao tem ufo de mulher : & pela experiencia confta que alguas mulheres bem menftruadas, & al- guns meninos incapazes por fua idade de ter copula com mulheres, padecem dores de gotta infoportaveis. O mefmo Hippocrates (2.) certifica que os accidentes .de gotta coral nas peffoas velhas , & nas que paffao de. vinte & cinco annos fao incuraveis ; & eu curei dos. taes accidentes a tres homens, hum dos quaes pafla- va de trinta annos , & os dous paffavao de vinte & cinco, como os curiofos poderáõ ver na minha Po- lyan- ---
82 Obfervacoes Medicas Doutrinaes. (8.) aconfelha os efpiritos de fal , por remedio mara- vilhofo para os ardores da ourina , & para as eftrangu- rias dos velhos , principalmente fe os taes efpiritos de fal forem defatados em cozimento de femente de bif- naga, porque diffolvem os humores vifcofos,& fa- zem deitar as areas. 0$$0 0$$0-0$580$500$$03$ 0$5005$00$80- -0950$50$$0 OBSERVACAMF:XII. De huma fupprefa alta deourina, quebum Religiofö de SaBernardopadeceo vinte dias, no.fim dos quaes tevefaude, porque deitou pelas.fangrias dos brasos grande quantidade deourina, tomo fe conheceo pela cor, ds cheiro della. H Ippocrates , aquelle grande Oraculo da Medicina, certifica, & com muita ra- zao, que a Arte Medica he tao vafta., & dilatada, que 'nao tem termo , em que caiba , nem balifa, que a com- prehenda,por quanto aindaque elle nos deixou os feus namos; comtudo a experiencia nos moftra que na ha no mundo coufa algúa ta certa , nem ta infallivel, naö tenha fuas excepcöes, & deixe de faltar algúas ve- zes. Como coufa certa, & infallivel diz Hippocrates (1.) que nem as mulheres padecem gotta em quanto ihes baixaaconjunca menfal ; nem os meninos em quantona tem ufo de mulher : & pela experiencia confta que alguas mulheres bem menftruadas, & al- guns imeninos incapazes por fua idade dé ter copula com mulheres,padeceim dores de gotta infoportaveis. O mefmo Hippocrates (2.) certifica que os accidentes de gotta coral nas peffoas velhas , & nas que paffa de vinte & cinco annos fa incuraveis ; & eu curei dos taes accidentes a tres homens, hum dos quaes pafla- va de trinta annos , & os dous paffava de vinte & cinco, como os curiofos poderao ver naminha Po- lyan-
82 Obfervações Medicas Doutrinaes. (8.) aconfelha os elpiritos de fal, por remedio mara- vilhofo para os ardores da ourina , & para as eftrangu- rias dos velhos , principalmente fe os taes efpiritos de fal forem defarad, naga, porque diflolvem os humores vilcofos , & fa- zemdeitar as areas. a o «0350708 50n «o SS 00 soSS Or ag SS aa SCr a SS Or ao SS Oo NES Oo anSS Oo ca SOo ans ãOo | : OBSERVAÇAM3GZ XII. De huma fupprelfao alta deourina, que bum Religiofo de Sao Bernardo padeceo vinte dias , no fim dos quaes + tevefaude, porque deitou pelas fangrias dos braços grande quantidade de ourina , como fe conheceo pela cor, & cheiro della. 1 Ippocrates , aquelle grande Oraculo da Medicina, certifica, & com muita ra- zão, quea Arte Medica he tão vaíta, & dilatada, que nãotem termo, em que caiba, nem balifa, que a com- prehenda,por quanto aihdaque elle nos deixou os feus Aforilmos, & regras univerfaes por onde nos gover- namos; comtudo a experiencia nos moftra que naô ha : no mundo coufa alga taóô certa , nem taô infallivel, ! naô tenha fuas excepções, & deixe de faltar algãas ve- zes. Como confa certa , & infallivel diz Hippocrates (1.) que nem as mulheres padecem gotta em quanto lhes baixa a conjunçaô menfal; nem os meninos em quanto naô tem ufo de mulher: & pela experiencia, confta que algãas mulheres bem menftruadas, & al- guns meninos incapazes por fua idade dê ter copula com mulheres,padecem dores de gotta infoportaveis. O memo Hippocrates (2. ) certifica que os accidentes -de gotta coral nas peíloas velhas, & nas que paílaô de vinte & cinco annos faó incuraveis ; & eu cureidos. taes accidentes a tres homens , hum dos quaes pafla- va de trinta annos , & os dous paflavaó de vinte & cinco, como os curiofos poderãô ver na minha Po- : > lyan- os em cozimento de femente de bif.. t |
82 Observaçones Medicas Doutrinaes. (8.) aconselha os espiritos de sal, por remedio mara- vilhoso para os ardores da ourina , & para as estrangu- rias dos velhos, principalmente se os taes espiritos de sal forem desatados em cozimento de semente de bis- naga, porque dissolvem os humores viscosos, & fa¬ zem deitar as areas. OBSERVAQAMEXII. De huma suppressaon alta de ourina, que hum Religioso de Saon Bernardo padeceo vinte dias, no fim dos quaes teve saude, porque deitou pelas sangrias dos braços grande quantidade de ourina, como se conheceo pela cor, & cheiro della. TIppocrates, aquelle grande Oraculo da 1. Medicina, certifica, & com muita ra¬ zamo, que a Arte Medica he tamo vasta , & dilatada , que nâmo tem termo, em que caiba, nem balisa, que a com¬ prehenda, por quanto aindaque elle nos deixou os seus Aforismos, & regras universaes por onde nos gover¬ namos; comtudo a experiencia nos mostra que naon ha no mundo cousa alguna taon certa , nem taon infallivel, quo naon tenha suas excepçones, & deixe de faltar algumas ve¬ zes. Como cousa certa, & infallivel diz Hippocrates (1.) que nem as mulheres padecem gotta em quanto lhes baixa a conjunçaon mensal; nem os meninos em quanto naô tem uso de mulher: & pela experiencia consta que algumas mulheres bem menstruadas, & al¬ guns meninos incapazes por sua idade de ter copula com mulheres, padecem dores de gotta insoportaveis. O mesmo Hippocrates (2.) certifica que os accidentes de gotta coral nas pessoas velhas, & nas que passao de vinte & cinco annos saô incuraveis; & eu curei dos taes accidentes a tres homens, hum dos quaes passa- va de trinta annos, & os dous passavao de vinte & cinco, como os curiosos poderaô ver na minha Po¬ lyan-
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Observaçaõ XII. 83 lyanthea Medicinal de ʃegunda impreʃʃaõ tract . 2 . cap . 9 fol . 80 . do num . 34 . atè . 38 . E tambem conʃta q Mathias Cornaro , Medico de Maximiliano II . curou de gotta coral a hũa mulher , que tinha ʃetenta annos . Diz mais o ʃobredito Hippocrates que os empyematicos , & os que tem materias ʃupuradas dentro no vaõ do peito , ʃó ʃe purgaõ , & evacuaõ por eʃcarro : & a experiencia tem moʃtrado que eʃcapàraõ alguns deitando as materias já por via das ourinas , jà miʃturadas com a camara . O meʃmo certifica Paulo Gineta , dizendo que quando o apoʃtema do peito ʃe rompe , cahe a materia humas vezes no eʃtomago , outras vezes nos inteʃtinos , & outras vezes na bexiga pelos anfractos das veas , como por huns canos , ou aqueductos . Nem Galeno deixou de conhecer iʃto meʃmo quando diʃʃe : Naõ he para admirar , nem he impoʃʃivel , que das partes , que eʃtaõ ʃuperiores ao ʃepto tranʃverʃo , corra , & deʃça materia ao ventre , & das que ficaõ abaixo deʃte , caya , & deʃça a materia pelos rins à barriga. E porque Meʃues o diʃʃe ainda mais claro , não ʃerá fóra de razão referir aqui as ʃuas palavras , que ʃão as ʃeguintes : Depoisque os abʃceʃʃos , ou apoʃtemas do peito rebentaõ , deitaõ algũs a tal materia , & cahe na cavidade do peito por deʃtillaçaõ ; a eʃtes , ou pela vea do chylo cahe na parte concava do figado , & dahi pelas veas dos inteʃtinos póde ʃahir de miʃtura com a camara ; mas ʃe pelo contrario a materia do apoʃtema , que eʃtava no peito , cahir , & correr para a parte convexa do figado , dahi pelas veas emulgentes darà comʃigo nos rins , & na bexiga , & ʃahirà pela via da ourina. 2 . Tambem diz o meʃmo Hippocrates , que no coraçaõ naõ ʃe gera achaque , nem o offende humor algum , porque he formado de ʃubʃtancia ʃolida , & denʃa , como conʃta de huma experiencia de Nicolao Maʃʃa , o qual abrindo o corpo de hum homem morto , & examinando com grande cuidado as partes interiores do peito , achou na ʃubʃtancia do coraçaõ huma chaga ; & perguntando aos familiares da caʃa , ʃe aquelle homem ʃe queixava algumas vezes de dor , ou
83 Obfervação XII. lyanthea Medicinal da fegunda impreffao tract. 2. cap. 9. fol.80. do num. 34. atè 38. E tambem confta q Mathias Cornaro, Medico de Maximiliano II. curou de gotta coral a hua mulher, que tinha fetenta annos. Diz mais o fobredito Hippocrates que os empyemati- cos , & os quetem materias fupuradas dentro no vao do peito, fo fe purgao, & evacuaõ por efcarro: & aex- periencia tem moftrado que 'efcaparaõ alguns deitan- do as materias já por via das ourinas, jà mifturadas com a camara. O mefmo certifica Paulo Gineta, di- zendo que quando o apoftema do peito fe rompe, ca- he a materia humas vezes no eftomago, outras vezes nos inteftinos , & outras vezes na bexiga pelos anfra- Etos das veas, como por huns canos , ou aqueductos. Nem Galeno deixou de conhecer ifto mefmo quando diffe : Nao he para admirar , nem be impoffivel, que das partes, que eftao Superiores ao fepto tranfverfo, corra, & defça materia ao ventre , & das que ficaõ abaixo def- te , caya, & defça a materia pelos rins a barriga. E por- que Mefues o diffe ainda mais claro, não fera fóra de razão referir aqui as fuas palavras , que faõ as feguin- tes : Depoisque os abfcefos, ou apaftemas do peito re- hentaï , deitao algūs a tal materia, & cabe na cavida- de do peito por deftillaçaõ ; a eftes, ou pela vea do chylo cabe na parte concava do figado, & dabi pelas veas dos intestinos pode fahir de miftur a com a camara ; mas fe pe- lo contrario a materia do apoftema , que eftava no peito, cahir , & correr para aparte convexa do figado, dabi pelas ve as emulgentes darà comfigo nosrins, & na bexi- ga , & fahir à pela via da ourina. 2. Tambem diz o mefmo Hippocrates, que no coraçao naõ fe gera achaque, nem o offende humor algum , porque he formado de fubftancia folida , & denfa , como confta de huma experiencia de Nico- lao Maffa, o qual abrindo o corpo de hum homem morto, & examinando com grande cuidado as partes interiores do peito, achou na fubftancia do coração huma chaga; & perguntando aos familiares da cafa, fe aquelle homem fe queixava algumas vezes de dor, ou
Obfervacao XII. 83 lyanthea Medicinal da fegunda impreffa tract. z: cap. 9. fol.80. do num. 34. ate 38. E tambem confta @ Mathias Cornaro , Medico de Maximiliano I1. curou de gotta coral a húa mulher , que tinha fetenta annos. Diz mais o fobredito Hippocrates que osempyemati- cos,& os quetem materias fupuradas dentro no va do peito, f6 fe purga, & evacua por efcarro: & aex- periencia tem moftrado que efcapara alguns deitan do as materias ja por via das ourinas, ja mifturadas com a camara. O mefmo certifica Paulo Gineta, di- zendo que quando o apoftema do peito fe rompe, ca- he a materia humas vezes noeftomago , outras vezes nos inteftinos , & outras vezes na bexiga pelos anfra- Ctos das veas, como por huns canos, ou aqueductos. Nem Galeno deixou de conhecer ifto mefmo quando diffe: Na be para adinirar , ncin be inpofivel, que das partes, que efta fuperiores aofepto tranfverf6, corr a, defεa nateria ao ventre , s das que fica abaixo def- te, caya, defca a materiapelos rins a barriga. E por- que Mefues diffe ainda mais claro, nao fera f6ra de razao referir aqui as fuas palavras , que fa as feguin- tes: Depoisque os ab/ceflos, ou apoftemas do peito re- bénta, deita algus a tal materia, cabe na cavida- de do peito por deftillasa; a eftes, ou pela vea do chylo cabe na parte concava do figado, . dabi pelas vea: dos inteftinos póde fabir de miftura com a camara ; in as fe pe. locontrario a materia do apoftema, que eftava no peito, abir, &correr para aparte convexa dofigado, dabi pelas veas emulgentes dara comfigo nos rins, na bexi- ga , o fabira pela via da ourina. Tambem diz o mefino Hippocrates, que no 2. coraca na fe gera achaque , nem qffende humor algum, porque heformado de fubftancia folida , & denfa , como confta de huma experiencia de Nico- lao Maffa, o qual abrindo ocorpo de hum homem morto., & examinando com grande cuidado as partes interiores.do peito, achou nafubftancia do coraca huma chaga ; & perguntando aos familiares da cafa, fe aquelle homem fe queixava algumas vezes de dor, ou
Obfervaçãoó XIf. 3 lIyanthea Medicinal da fegunda impreflaô tra&. 2. cap. 9. fol.8o. do num. 34. até 38. E tambem confta Mathias Cornaro, Medico de Maximiliato II. curou de gotta coral a htia mulher , que tinha fetenta annos. Diz mais o fobredito Hippocrates que os empyemati- cos, & os quetem materias fupuradas dentro no vaó do peito, fó fe purgaõ, & evacuaô por efcarro: & a ex« periencia tem moltrado que 'eflcapàraô alguns deitan- do as materias já por via das ourinas, jà mifturadas coma camara. O mefmo certifica Paulo Gineta, di- zendo que quando o apoftema do peito fe rompe, ca- he a materia humas vezes no eftomago , outras vezes nos inteftinos , & outras vezes na bexiga pelos anfra- &os das veas , como por huns canos, ouaquedudtos. Nem Galeno deixou de conhecer ifto mefmo quando difle: Naô he para adminirar , nem be impolfrvel, que das partes, que eflaõ fuperióres ao fepto tranfver/o , corra, efça materia ao ventre , & das que ficao abaixo def- te , caya, & defça a materia pelos rins à barriga. E por- que Mefues o difle ainda mais claro, não ferá fóra de razão referir aqui as fuas palavras , que faõas feguin- tes: Depoisque os abfeeffos, ou apofiemas do peito re- bentao , deitao algús a tal materia , & cabe na cavida- de do peito por deftillaçao ; a eftes, oupela vea do chylo cabe na parte concava do figado , & dabi pelas veas dos irniteftinos póde fabir de miflura com a camara ; mas fe pe do contrario a materia do apoftema , que eftava no peito, cabir , & correr parva aparte convexa do figado, dahi ; pelasveas emulgentes dará comfigo nostins, & na bexi- £a, & fabira pelavia da ourina. 2. Tambem diz o mefmo Hippocrates, que no | coraçaô naófegeraachaque, nemo offende humor ) algum , porque he formado de fubítancia folida , & denfa , como confta de huma experiencia de Nico- lao Mafíla, o qual abrindo ocorpo de hum homem morto, & examinando com grande cuidado as partes interiores do peito, achou na fubftancia do coraçaõ huma chaga; & perguntando aos familiares da cafa, feaquelle homem fe queixava algumas vezes de dor, ” ; eu
Observaçaon XII. 83 lyanthea Medicinal da segunda impressaon tract. 2. cap. 9. fol. 80. do num. 34. atè 38. E tambem consta que Mathias Cornaro, Medico de Maximiliano II. curou de gotta coral a huma mulher, que tinha setenta annos. Diz mais o sobredito Hippocrates que os empyemati- cos, & os que tem materias supuradas dentro no vaon do peito, só se purgaon, & evacuaon por escarro: & a ex- periencia tem mostrado que escapàraon alguns deitan¬ do as materias já por via das ourinas, jà misturadas com a camara. O mesmo certifica Paulo Gineta, di¬ zendo que quando o apostema do peito se rompe , ca- he a materia humas vezes no estomago, outras vezes nos intestinos, & outras vezes na bexiga pelos anfra¬ ctos das veas, como por huns canos, ou aqueductos. Nem Galeno deixou de conhecer isto mesmo quando disse : Nao he para admirar, nem he impossivel, que das partes, que estaon superiores ao septo transverso, corra, & desça materia ao ventre, & das que sicaon abaixo des¬ te, caya, & desça a materia pelos rins à barriga. E por¬ que Mesues o disse ainda mais claro , nano será fóra de razamo referir aqui as suas palavras, que saon as seguin¬ tes: Depoisque os abscessos, ou apostemas do peito re¬ bentaò, deitaon algus a tal materia, & cahe na cavida- de do peito por destillaçaon; a estes, ou pela vea do chylo cahe na parte concava do figado, & dahi pelas veas dos intestinos pode sahir de mistura com a camara; mas se pe¬ lo contrario a materia do apostema, que estava no peito, cahir, & correr para a parte convexa do figado, dahi pelas veas emulgentes darà comsigo nos rins, & na bexi¬ ga , & sahirà pela via da ourina. 2. Tambem diz o mesmo Hippocrates, que no coraçaon naon se gera achaque, nem o offende humor algum, porque he formado de substancia solida , & densa, como consta de huma experiencia de Nico¬ lao Massa, o qual abrindo o corpo de hum homem morto, & examinando com grande cuidado as partes interiores do peito , achou na substancia do coraçaon huma chaga; & perguntando aos familiares da casa, se aquelle homem se queixava algumas vezes de dor, Ou
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84 Observações Medicas Doutrinaes. ou aflicçaõ do coraçaõ , lhe reʃpondèraõ que naõ . 3 . Tambem he ʃentença definitiva de Hippocrates , ( 3 . ) que ʃe as prenhadas ʃe ʃangrarem , ou tomarem algũa purga , moveràõ : & taõ longe eʃtá iʃto de ʃer aʃʃim , que paraque naõ movão , as ʃangramos , & purgamos cada dia , como eu o tenho feito muitas vezes com feliciʃʃimo ʃucceʃʃo , não ʃó dandolhes purgas brandas , & benignas , mas dandolhes a agua benedicta , ou os pòs de quintilio , que ʃuppoʃto fazem algumas ancias , ʃaõ taõ fieis , & ʃeguros , que ʃó a tal agua , ou pòs ʃaõ capazes de as livrar de mover , como tenho experimentado , quando entendo que a cauʃa porque movem , he a copia de humores cacochymicos , alheyos da natureza do ʃangue : nem iʃto he experiencia ʃó minha , he doutrina de Hollerio ( 4 . ) no commento dos Aphoriʃmos . Diz àlem diʃto o meʃmo Hippocrates , ( 5 . ) q as feridas da bexiga ʃaõ incuraveis : & conʃtanos com toda a certeza que em França , em Hollanda , & em outras partes do mundo ʃe abrem muitas bexigas para tirarlhes as pedras , & por beneficio de peritiʃʃimos Cirurgiões ʃe curaõ perfeitamente , & vivem largos annos . Eu tive na minha mão huma pedra do tamanho de huma caʃtanha , que ʃe tirou da bexiga aberta ao ferro ʃem perigo da vida da enferma , que era criada de Luis de Saldanha , morador à Junqueira . 4 . Tambem he ley aʃʃentada de Hippocrates , ( 6 . ) que na entrada dos creʃcimentos ʃe naõ dè de comer , nem de beber aos doentes : & naõ obʃtante eʃte preceito , não ha Medico taõ covarde , que ʃe o doente he muito magro , ou de temperamento muito ʃecco , ou colerico , ou muito fraco , lhe naõ dè de comer em qualquer hora da ʃezaõ , para evitar que o doente ʃe faça hectico , ou morra de fraqueza . 5 . Bem encomendaõ Galeno , ( 7 . ) & Avicenna ( 8 . ) que ʃe naõ ʃangrem os meninos antes de terem quatorze annos : & a experiencia moʃtra que com ʃangrias moderadas os livramos hoje de graviʃʃimas doenças , ʃendo de menos de hum anno . Fi
84 Observações Medicas Doutrinaes. ou aflicçaõ do coração, lhe refponderaõ que naõ. 3. Tambem he fentença definitiva de Hippocra- tes, (3.) que feas prenhadas fe fangrarem, ou toma- rem algua purga, moverào: & tao longe efta ifto de fer affim, que paraque nao movao, as fangramos, & purga- mos cada dia,como eu o tenho feito muitas vezes com feliciffimo fucceffo, não fó dandolhes purgas bran- das , & benignas, mas dandolhes a agua benedicta, ou os pos de quintilio, que fuppofto fazem algumas ancias, fao tao fieis , & feguros , que fó a tal agua , ou pos faõ capazes de as livrar de mover , como tenho ex- perimentado , quando entendo que a caufa porque movem , he a copia de humores cacochymicos , alhe- yos da natureza do fangue: nem ifto he experiencia fó minha , he doutrina de Hollerio (4. ) no commento dos Aphorifmos. Diz àlem difto o mefmo Hippocra- tes, (5.) q as feridas da bexigafao incuraveis: & confta- nos com toda a certeza que em França, em Hollanda, & em outras partes do mundo fe abrem muitas bexi- gas para tirarlhes as pedras , & por beneficio de peri- tiffimos Cirurgiões fe curao perfeitamente, & vivem largos annos. Eu tive na minha mão huma pedra do tamanho de huma caftanha, que fe tirou da bexiga aberta ao ferro fem perigo da vida da enferma, que era criada de Luis de Saldanha, morador à Junquei- ra. 4. Tambem he ley affentada de Hippocrates,' (6. )que na entrada dos crefcimentos fe nao dè de co- mer, nem de beber aos doentes : & nao obftante efte preceito, não ha Medico taõ covarde, que fe o doen -. te he muito magro , ou de temperamento muito fec- co, ou colerico, ou muito fraco, lhe naõ dè de comer em qualquer hora da fezao, para evitar que o doente fe faça hectico, ou morra de fraqueza. 5. Bem encomendaõ Galeno, (7.) & Avicenna(8.) que fe nao fangrem os meninos antes de terem qua- torze annos: & a experiencia moftra que com fan- grias moderadas os livramos hoje de graviffimas do- enças , fendo de menos de hum anno. Fi-
*4 Obfervacoes Medicas Doutrinaes. ou afficcaö do coraca, lhe refpondera que na. 3.. Tambem he fentenca definitiva de Hippocra- tes, (3.) que fe as prenhadas fe fangrarem, ou toma- rem algúa purga, movera: & ta longe eftá ifto de fer affim,que paraque na'mováo, as fangrainos,& purga- mos cada dia,como eu o tenho feito muitas vezes com feliciffimo fucceffo, nao f6 dandolhes purgas bran- das , & benignas, mas dandolhes a agua benedicta, ou os pos de quintilio, que fuppofto fazem algumas ancias, fa tafieis , & feguros , que f6 a tal agua, ou pos fa capazes de as livrar de mover , como tenho ex- perimentado , quando entendo que a caufa porque movem, he a copia de humores cacochymicos, alhe- yos da natureza do fangue : nem ifto he experiencia f6 minha , he doutrina de Hollerio (4.) no commento dos Aphorifmos. Diz alem difto o mefino Hippocra- tes,(5.) as feridas da bexigafa incuraveis:& confta- nos com toda a'certeza que em Franca, em Hollanda, & em outras partes do mundo fe abrem muitas bexi- gas para tirarlhes as pedras, & por beneficio de peri- tiffimos Cirurgies fe cura perfeitamente, & vivem largos annos. Eu tive na minha mao huma pedra do tamanho de huma caftanha, que fe tirou da bexiga abérta ao ferro fem perigo da vida daenferma, que era criada de Luis de Saldanha, morador a Junquei- ra. Tambem. he ley affentada de Hippocrates, 4. (6.)que na entrada dos crefcimentos fe naö de deco- mer,nem debeber aos doentes : & na obftanteefte preceito, nao ha Medico tao covarde, que fe o doen te he muito imagro , ou de temperamento muito fec- co , ou colerico, ou muito fraco, lhe na de de comer em qualquer hora da feza,para evitar que o doente fe faca hectico, ou morra de fraqueza. 5. Bem encomenda Galeno, (7.)& Avicenna(8.) que fe na fangrem os meninos antes de terem qua- torze annos : & a experiencia moftra que com fan- grias moderadas os livramos hoje de graviffimas do- encas, fendo de menos de hum anno. : Fi-
t4 Obfervações Medicas Doutrinaes. ou aflicçaô do coraçaõô , lhe refpondêraô que naõ. 3. Tambem he fentença definitiva de Hippocra- tes, (3.) que feas prenhadas fe fangrarem, ou toma- rem algãa purga, moverão: & raó longe eta ifto de fer aflim,que paraque naô movão, as fangramos,& purga- mos cada dia,como eu o tenho feito muitas vezes com | feticiflimo fucceflo, não fó dandolhes purgas bran- das , & benignas, mas dandolhes a agua benedidta, , ou os pôs de quintilio, que fuppofto fazem algumas ancias , faótaô fieis , & feguros , quefó a tal agua , ou pôs faô capazes de as livrar demover , comotenho ex- perimentado , quando entendo que a caufa porque movem, he a copia de humores cacochymicos , alhe- yos da natureza do fangue: nemifto he experiencia fó minha , he doutrina de Hollerio (4.) no commento dos Aphorifmos. Diz àlem digo o memo Hippocra- tes,(5.) Gas feridas da bexigafaô incuraveis:& confta- nos com toda a'certeza que em França, em Hollanda, & em outras partes do mundo fe abrem muitas bexi- gas para tirarlhes as pedras , & por benefício de peri- tifimos Cirurgiões fe curaó perfeitamente, & vivem largos annos. Eu tive na minha mão huma pedra do tamanho de huma caftanha , que fe tirou da bexiga aberta ao ferro fem perigo da vida da enferma, que grias moderadas os livramos hoje de graviflimas do- enças, fendo de menos de hum anno. era criada de Luis de Saldanha, morador à Junquei- ra. o : . 4. "Tambem he ley affentada de Hippocrates, (6.)que na entrada dos crefeimentos fe naô dê de co- mer , nem de beber aos doentes : & naô obítante efte preceito, não ha Medico taô covarde, que fe o doen-. te he muito magro , ou de temperamento muito fec« co, ou colerico, ou muito fraco, lhe naô dê de comer em qualquer hora da fezab/para evitar que o doente fe faça he&ico, ou morra de fraqueza. 5. Bemencomendaõ Galeno, (7.) & Avicenna(8.) que fe naó fangrem os meninos antes de terem qua- torze annos: & a experiencia moítra que com fan-
84 Observaçones Medicas Doutrinaes. ou afsicęaon do coraçaon, lhe respondèrao que naó. Tambem he sentença definitiva de Hippocra¬ tes, (3.) que se as prenhadas se sangrarem , ou toma- rem alguma purga, moveràon: & taon longe està isto de ser assim, que paraque naon movamo, as sangramos, & purga¬ mos cada dia, como eu o tenho feito muitas vezes com felicissimo successo, namo só dandolhes purgas bran¬ das, & benignas, mas dandolhes a agua benedicta, ou os pòs de quintilio , que supposto fazem al gumas ancias, saon tao fieis, & seguros, que só a tal agua, ou pòs sao capazes de as livrar de mover , como tenho ex- perimentado, quando entendo que a causa porque movem , he a copia de humores cacochymicos , alhe- yos da natureza do sangue : nem isto he experiencia só minha , he doutrina de Hollerio (4.) no commento dos Aphorismos. Diz àlem disto o mesmo Hippocra- tes, (5.) que as feridas da bexiga saon incuraveis: & consta- nos com toda a certeza que em França, em Hollanda, & em outras partes dò mundo se abrem muitas bexi¬ gas para tirarlhes as pedras, & por beneficio de peri¬ tissimos Cirurgiones se curao perfeitamente, & vivem largos annos. Eu tive na minha mao huma pedra do tamanho de huma castanha, que se tirou da bexiga aberta ao ferro sem perigo da vida da enferma, que era criada de Luis de Saldanha, morador à Junquei- Tambem he ley assentada de Hippocrates, (6.) que na entrada dos crescimentos se nao dè de co- mer, nem de beber aos doentes: & nao obstante este preceito , nao ha Medico tao covarde , que se o doen- te he muito magro, ou de temperamento muito sec- co , ou colerico , ou muito fraco , lhe naô dè de comer em qualquer hora da sezaon, para evitar que o doente se faça hectico, ou morra de fraqueza. 5. Bem encomendaó Galeno, (7.) & Avicenna(8.) que se nao sangrem os meninos antes de terem qua¬ torze annos: & a experiencia mostra que com san¬ grias moderadas os livramos hoje de gravissimas do¬ enças, sendo de menos de hum anno. Fi¬
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Observaçaõ XII. 85 6 . Finalmente diz Hippocrates , que os que padecem ʃuppreʃʃoẽs de ourina , morrem , ʃe atè o ʃeptimo dia naõ ourinaõ : & eu tenho viʃto alguns doentes , que ourináraõ no fim do oitavo , & eʃcapàraõ da morte . Dos referidos caʃos ʃe colhe claramente , que as regras , & ʃentenças de Hippocrates , aindaque pela mayor parte ʃejaõ verdadeiras , a experiencia moʃtra que algũas vezes ʃaõ falliveis , & outras vezes he acertado naõ as ʃeguir ; & para confirmaçaõ diʃto me permittaõ que refira o ʃeguinte caʃo . 7 . O Muito Reverendo Padre Fr. Pedro Manoel , Religioʃo da Ordem de Saõ Bernardo , filho do Excellentiʃʃimo Senhor Dom Sanche Manoel , Conde de Villaflor , depois de huma ʃuppreʃʃaõ alta , que lhe durou vinte dias , ʃalvou a vida , contra a opinião de Hippocrates , porque ʃangrandoʃe doze vezes nos braços , deitou tanta quantidade de ourina pelas ʃciʃuras das veas , quanta pudera ter deitado pela via urinaria em todos aquelles dias : & não ʃó eʃcapou do grandiʃʃimo perigo , em que eʃtava , mas até eʃte dia logra perfeitiʃʃima ʃaude . 8 . Neʃte lugar ʃe offerecem duas couʃas dignas de reparo , & importancia na pratica de Medicina . A primeira he conʃiderar quam errados vaõ aquelles Medicos , que ʃaõ taõ contumazes , & atados aos conʃelhos , & regras dos antigos , que nem à razão natural , nem ao que vem com ʃeus olhos , querem dar credito ; o que he muito abominavel ; porque ʃeria melhor examinar as cauʃas do que vem , que negar teimoʃamente a fé do que experimentaõ ; porque ( como dizem graves Authores ) ( 9 . ) a razão , & a experiencia ʃempre foraõ mais poderoʃas que a authoridade humana , pois a eʃta ( diz Santo Agoʃtinho ) ( 10 . ) ʃó os parvos ʃe rendem . O meʃmo quaʃi diz Valeʃio : ( 11 . ) & ʃuppoʃto que Hippocrates , & Galeno , como diz Pemplio , ( 12 . ) ʃejaõ noʃʃos Meʃtres , naõ ʃaõ tão ʃenhores dos noʃʃos entendimentos , que ajamos de jurar por infallivel tudo , o que elles diʃʃeraõ : do caʃo , que aqui referimos , conʃta mui bem eʃta verdade ; pois
85 Obfervaçao XII. 6. Finalmente diz Hippocrates, que os que pa- decem fuppreffoes de ourina, morrem, fe atè o fepti- mo dia naõ ourinaõ : & eu tenho vifto alguns doentes, que ourinárao no fim do oitavo, & efcaparao da mor- te. Dos referidos cafos fe colhe claramente, que as re- gras , & fentenças de Hippocrates , aindaque pela mayor parte fejao verdadeiras, a experiencia moftra que alguas vezes faõ falliveis , & outras vezes he cer- tado naõ as feguir ; & para confirmaçaõ difto me per- mittao que refira o feguinte cafo. 7. O Muito Reverendo Padre Fr. Pedro Manoel, Religiofo da Ordem de Sao Bernardo, filho do Excel- lentiffimo Senhor Dom Sancho Manoel, Conde de Villaflor, depois de huma fuppreffao alta, que lhe durou vinte dias, falvou a vida, contra a opiniaõ de * Hippocrates , porque fangrandofe doze vezes nos braços , deitou tanta quantidade de ourina pelas fci -. furas das veas , quanta pudera ter deitado pela via uri- naria em todos aquelles dias : & não fó efcapou do grandifimo perigo, em que eftava, mas até efte dia logra perfeitiffima faude. 8. Nefte lugar fe offerecem duas coufas dignas de reparo, & importancia na pratica da Medicina. . A primeira he confiderar quam errados vaõ aquelles Medicos , que faõ taõ contumazes , & atados ads con- felhos , & regras dos antigos, que nem a razão natu- sal , nem ao que vem com feus olhos , querem dar credito; o que he muito abominavel; porque feria me- lhor examinar as caufas do que vem, que negar teimo- famente a fé do que experimentaõ ; porque ( como di- zem graves Authores ) (9.) a razão, & a experiencia fempre forao mais poderofas que a authoridade hu- mana , pois a efta (diz Santo Agoftinho ) (10.) fó os parvos fe rendem. O mefmo quafi diz Valefio:(11.) & fuppofto que Hippocrates; & Galeno, como diz Pemplio, (12.) fejao noffos Meftres, nao fao tão fe- nhores dos noffos entendimentos, que ajamos de ju- .rar por infallivel tudo, o que elles differao : do cafo, que aqui referimos , confta mui bem efta verdade; pois m C. 25. a- m S, 1- - 1 1
Obfervacao XlI. 85 6. Finalmente diz Hippocrates, que os que pa- decem fuppreffoes de ourina, morrem, fe atc o fepti- mo dia naourina : & eu tenho vifto alguns doentes, que ourinára no fim do oitavo, & efcapara da mor- te. Dos referidos cafos fe colhe claramente, que as re- gras , & fentencas de Hippocrates , aindaque pela mayor partefejaö verdadeiras, a cxperiencia moftra que algúas vezes fa falliveis , & outras vezes he ácer-- tado na as feguir ; & para confirmaca difto me per- mitta que refira o feguinte cafo. 7.. O Muito Reverendo Padre Fr. Pedro Manoel, Religiofo da Ordem de Sa Bernardo, flho do Excel- Ientiffimo Senhor Dom Sancho Manoel, Conde de Villaflor, depois de huma fuppreffa alta, que lhe C! durou vinte dias, falvou a vida, contra a opinia de E - Hippocrates , porque fangrandofe doze vezes nos 1 bracos , deitou tanta quantidade de ourina pelas fci-. & furas das veas , quanta pudera ter deitado pela via uri- naria em todos aquelles dias : & nao fó efcapou do grandiffimo perigo, em que eftava, mas até efte dia logra perfeitiffima faude. 8. : Nefte lugar feofferecem duas coufas dignas de reparo, & importancia na pratica da Medicina. .A primeira he confiderar quam errados va aquelles Medicos , que fa ta contumazes , & atados aos con- felhos , & regras dos antigos, que nen a razao natu- ral , nem ao que vem com feus ollos , quereim dar credito; o que he muito aboininavel; porque feria me' Thor examinar as caufas do que vem,que negar teino e famenteafé do que experimenta; porque ( como di- zem graves Authores) (9.) arazao,& a experiencia fempre fora mais poderofas que a authoridade hu- mana, pois.aefta (diz Santo Agoftinho) (10.) f6 os parvos ferendem. O.mefmoquaffi diz Valefio.#(11.) &fuppofto que Hippocrates, & Galeno, coino diz Pemplio, (12.) feja noffos Meftres , na fa tao fe- nhores dos noffos entendimentos, que ajaros de ju- .rar por infallivel tudo, oquc elles differa5 : do cafo, que aqui referimos , confta.mui bem efta verdadé; pois
Obfervaçãao XII, 85 6. Finalmente diz Hippocrates, que os que pa- decem fupprefloês de ourina, morrem, fe atê o fepti- mo dia nao ourinaô : & eu tenho vifto alguns doentes, que ourináraô no fim do oitavo, & efcapãraô da mor- S te. Dos referidos cafos fe colhe claramente, que as re- ' gras , & fentenças de Hippocrates ; aindaque pela Y mayor parte fejaó verdadeiras , a experiencia moftra . — quealghasvezesfaõ falliveis, & outras vezes he ácer- tado naô as feguir ; & para confirmaçaõ difto me per* mitraó que refira o feguinte cafo. Ú 7. O Muito Reverendo Padre Fr. Pedro Manoel, . — ReligiofodaOrdemdeSaõ Bernardo, filho do Excel- 'lentiffimo Senhor Dom Sancho Manoel, Conde de Villaflor, depois de huma fuppreflaô alta, que lhe durou vinte dias, falvona vida, contra a opiniaó de Hippocrates , porque fangrandofe doze vezes nos *— — braços,deitou tanta quantidade de ourina pelas fei-- ' furas das veas , quanta pudera ter deitado pela via uri- " — nariaem todos aquelles dias : & não 1ó efcapou do Do grandiffimo perigo , em que eftava, mas até efte dia logra perfeitiflima faude. | — & : Nefte lugar feofferecem duas coufas dignas | derreparo, & importancia na pratica da Medicina. A primeira he confiderar quam errados vaó aquelles Medicos, que faó taô contumazes , & átados 20s con- felhos , & regras dos antigos , que hein à razão natuº sal , nem ao que vem com feus olhos , querém dar credito;-o que he muito abomminavel; porque feria me: lhor examinar as caufas do que vem,que negar teirho: famentea fé do que experimentaõ; porque ( como di- .zem graves Authores ) (9.) arazão, & a experiencia fempre foraô mais poderofas qe a authoridade hu- mana , pois a efta (diz Santo Agolítinho ) (10.) (ó os parvos É rendem. O mefmo quafi' diz Valefio *(11.) ) & fuppolto que Hippocrates ; & Galeno, coinó diz Pemplio, (12.) fejaô noflos Meftres , naô faõô tão fe- nhores dos noffos entendimentos , que ajamos de ju- «rar por infallivel tudo , o que elles differã6 : do cafo, " que aqui referimos , confta. mui bem efta verdade; ' : | «pois 2
Observaçao XII. 85 6. Finalmente diz Hippocrates, que os que pa- decem suppressoës de ourina, morrem, se atè o septi- mo dia naon ourinaon: & eu tenho visto alguns doentes, que ourináraon no fim do oitavo, & escapàraò da mor¬ te. Dos referidos casos se colhe claramente, que as re- gras, & sentenças de Hippocrates, aindaque pela mayor parte sejaon verdadeiras, a experiencia mostra que algumas vezes saon falliveis, & outras vezes he acer¬ tado naon as seguir; & para confirmaçaon disto me per¬ mittaon que refira o seguinte caso. 7. O Muito Reverendo Padre Fr. Pedro Manoel, Religioso da Ordem de Sao Bernardo, filho do Excel- lentissimo Senhor Dom Sancho Manoel, Conde de Villaflor, depois de huma suppressaon alta, que lhe durou vinte dias, salvou a vida, contra a opiniaon de Hippocrates, porque sangrandose doze vezes nos braços, deitou tanta quantidade de ourina pelas sci¬ suras das veas, quanta pudera ter deitado pela via uri¬ naria em todos aquelles dias: & namo só escapou do grandissimo perigo, em que estava, mas até este dia logra perfeitissima saude. 8. Neste lugar se offerecem duas cousas dignas de reparo , & importancia na pratica da Medicina. A primeira he considerar quam errados vao aquelles Medicos, que saon taon contumazes, & atados aos con selhos, & regras dos antigos, que nem à razamo natu¬ ral, nem ao que vem com seus ollios, querem dar credito; o que he muito abominavel; porque seria me¬ lhor examinar as causas do que vem, que negar teimo¬ samente a fé do que experimentaon; porque (como di- zem graves Authores) (9.) a razamo, & a experiencia sempre foraon mais poderosas que a authoridade hu¬ mana, pois a esta (diz Santo Agostinho) (10.) so os parvos se rendem. O mesmo quasi diz Valesio: (11. & supposto que Hippocrates, & Galeno, como diz Pemplio, (12.) sejao nossos Mestres, naon saon tamo se¬ nhores dos nossos entendimentos, que ajamos de ju¬ rar por infallivel tudo, o que elles disserao: do caso, que aqui referimos, consta mui bem esta verdade; pois
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86 Observações Medicas Doutrinaes. pois vemos que ʃuccedem muitas couʃas contra o que Hippocrates tinha aʃʃentado como certo , & infallivel . 9 . A ʃegunda couʃa digna de grande reparo he ver quam erradamente procedem os Medicos , que nas ʃuppreʃʃoes altas da ourina tem medo de ʃangrar repetidas vezes , quando a experiencia nos moʃtra que nenhum remedio , depois dos pòs de quintilio , ou da agua benedicta vigorada , he mais proveitoʃo que as ʃangrias dos braços repetidas ; principalmente quando entendermos que as taes ʃuppreʃʃoes altas procedem de grande enchimento , inflammaçaõ , ou oppilaçaõ das veas emulgentes , porque deʃcarregadas ellas , ʃe tiraõ os taes emabaraços , & surtem entaõ admiraveis effeitos os remedios provocativos das ourinas , como eu tenho obʃervado em muitas ʃuppreʃʃoes taõ perigoʃas , que aviaõ de matar os doentes , ʃe eu lhes não acudira logo com vomitorios de agua benedicta , & com repetidas ʃangrias nos braços , dandolhes depois diʃʃo o meu grande ʃegredo , com o qual tenho feito curas tão prodigioʃas , como os curioʃos podem ver na minha Polyanthea nova trat . 2 . cap . 81 . fol . 509 . num . 36 . atè 42 . Por eʃte meʃmo methodo livrei da morte ao Padre Fr . Andre da Trindade , Cuʃtodio , Lente jubilado , & Qualificador do Santo Officio , Religioʃo Franciʃcano da Terceira Ordem , o qual avia cinco dias , & cinco noites que naõ podia ourinar , & com ʃangrias altas , & o meu grande remedio ourinou doze ourinois cheyos dentro de huma noite , como poderàõ certificar todos os Religioʃos daquelle Convento , em 8 . de Junho de 1704 . Com as meʃmas ʃangrias altas , & com o meu ʃegredo livrei tambem da morte a huma Religioʃa do Convento da Annunciada , filha de Manoel Leal , ourives do ouro ; a qual Religioʃa em 12 . de Fevereiro de 1705 . teve hũa ʃuppreʃʃaõ alta , que lhe durou oito dias , & oito noites , & eʃtando jà deʃconfiada de tres Medicos doutos , fui chamado , & ʃangrandoa algumas vezes nos braços , & dandolhe o meu ʃegredo , ourinou tres ourinois che
86 Obfervações Medicas Doutrinaes. pois vemos que fuccedem muitas coufas contra o que Hippocrates tinha affentado como certo, & infalli- vel. 9. A fegunda coufa digna de grande reparo he ver quam erradamente procedem os Medicos , que : nas fuppreffoes altas da ourina tem medo de fangrar repetidas vezes, quando a experiencia nos moftra que nenhum remedio, depois dos pòs de quintilio, ou da agua benedicta vigorada, he mais proveitofo que as fangrias dos braços repetidas ; principalmente quan- do entendermos que as taes fuppreffoés altas proce- dem de grande enchimento, inflammaçaõ, ou oppi- laçaõ das veas emulgentes, porquedefcarregadas el- las , fe tirao os taes embaraços, & furtem entao ad- miraveis effeitos os remedios provocativos das ouri- nas, como eu tenho obfervado em muitas fuppreffoes . . tao perigofas , que aviaõ de matar aos doentes , fe eu lhes não acudira logo com vomitorios de agua bene- dicta, & com repetidas fangrias nos braços, dando- lhes depois diffo o meu grande fegredo, com, o qual tenho feito curas tãoprodigiofas, como os curiofos podem ver na minha Polyanthea nova trat. 2. cap. 81. fol. 509. num. 36. atè 42. Por efte mefmo metho- do livrei da morte ao Padre Fr. Andre da Trindade, Cuftodio, Lente jubilado, & Qualificador do Santo Oficio,Religiofo Francifcano da Terceira Ordem, o qual avia'cinco dias, & cinco noites que naõ podia ou- rinar, & com fangrias altas, & o meu grande remedio ourinou doze ourinois cheyos dentro de huma noite, como poderào certificar todos os Religiofos daquel- le Convento,em 8. de Junho de 1704. Com as mefmas fangrias altas, & com o meu fegredo livrei tambem da morte a huma Religiofa do Convento da Annun- ciada, filha de Manoel Leal, ourives do ouro ; a qual Religiofa em 12. de Fevereiro de 1705. teve hua fup- preffao alta, que lhe durou oito dias, & oito noites, & eftando jà defconfiada de tres Medicos doutos, fui chamado, & fangrandoa algumas vezes nos braços, & dandolhe o meu fegredo , ourinou tres ourinois che-
86 Obfervacoes Medicas Doutrinacs. pois vemos que fuccedem muitas coufas contra o que Hippocrates tinha affentado como certo, & infalli-- vel. 9. A fegunda coufa digna de grande reparo he ver quam erradamente procedem os Medicos , que nas fuppreffos altas da ourina tem medo de fangrar repetidas vezes, quando a experiencia nos moftra que nenhum remedio, depois dos pos de quintilio, ou da agua benedicta vigorada, he mais proveitofo que as fangrias dos bracos repetidas ; principalmente quan- do'entendermos que as taes fuppreffos altas proce- dem de grande enchimento, inflammaca, ou oppi- laca das veas emulgentes, porquedefcarregadas el- las, fe tira os taes embaracos, & furtem enta ad- miraveis effeitos os remedios provocativos das ouri- nas, como eu tenho obfervadoem.muitas fuppreffoés : ta perigofas, que avia de.matar aos doentes, fe eu lhes nao acudira logo. com vomitorios de agua bene- dicta , & com repetidas fangrias nos bracos, dando- lhes depois.diffo omeu grande fegredo, com,oqual tenho feito curas taoprodigiofas, como os curiofos podem ver na minha Polyanthea nova trat. 2. cap. 81. fol. 509. num. 36. até 42. Por efte mefmo metho- do livrei damorte ao PadreFr. Andre da Trindade, Cuftodio, Lente jubilado, & Qualificador do Santo Officio,Religiofo Francifcanoda Terceira Ordem, & qual avia'cinco dias, & cinco noites que naö podia ou- rinar , & com fangrias altas, & o meu grande remedio ourinou doze ourinois cheyos dentro de huma noite, como podera certificar todos os Religiofos daquel: 1e Convento,em 8. de Junho de 1704. Com as mefmas fangrias altas, & com o meu fegredolivrei tambem da morte a huma Religiofa do Convento da Annun- ciada,flha de Manoel Lcal, ourives do.ouro; a quat Religiofa em 12. de Fevereiro de 1705. teve hua fup- preffa alta, que lhe durou oito dias, &oito noites, & eftando ia defconfiada de tres Medicos doutos, fui chamado, & fangrandoa algumas vezes nos bracos, & dandolhe o meu fegredo , ourinou tres ouainais che-
86 Oblervações Medicas Doutrinaes. . pois vemos que fuccedem muitas confas contra o que Hippocrates tinha aflentado como certo, & infalli- vel. ' 9. A fegunda coufa digna de grande reparo he ver quam erradamente procedem os Medicos , que nas fuppreffoês altas da ourina tem medo de fangrar repetidas vezes, quando a experiencia nos moftra que nenhum remedio, depois dos pôs de quintilio, ou da agua benedi&a vigorada , he mais proveitofo que as fangrias dos braços repetidas; principalmente quan- do entendermos que as taes fupprefloês altas proce- dem de grande enchimento, inflammaçaõ, ou oppi- laçaô das veas emulgentes , porque defcarregadas el- las, fetiraô ostaes embaraços , & furtem entaô ad- miraveis effeitos os remedios provocativos das ouri- nas, como eu tenho obfervadoem muitas fupprefloês . taô perigofas , que aviaô de matar aos doentes , feeu lhes não acudira logo com vomitorios de agua bene- diéta , & com repetidas fangrias nos braços , dando- lhes depois diffo o meu grande fegredo, com,o qual tenho Feito curas tãoprodigiofas, como os curiofos podem ver na minha Polyanthea nova trat. 2. cap. 81.fol. 509. num. 36. atê 42. Por eíte mnefmo metho- do livrei da morte ao Padre Fr. Andre da Trindade, Cuftodio, Lentejubilado, & Qualificador do Santo Officio,Religiofo Francifcano da Terceira Ordem, o qual avia cinco dias, & cinco noites que naô podia our rinar , & com fangrias altas, & o meu grande remedio ourinou doze ourinois cheyos dentro de huma noite, . como poderãõ certificar todos os Religiofos daquel- le Convento,em 8. de Junho de 1704. Com as meímas fangrias altas, & com o meu fegredo livreitambem da morte a huma Religiofa do Convento da Annun- ciada, filha de Manoel Leal , ourives do ouro; a qual Religiofa em 12. de Fevereiro de 1705. teve hia Íup- preflaô alta , que lhe durou oito dias, & oito noites, & eftando jà defconfiada de tres Medicos doutos , fui chamado , & fangrandoa algumas vezes nos braços, & dandolhe o meu fegredo , ourinou tres onrinois che- . t . Í | ( ( ! |
86 Observaçones Medicas Doutrinaes. pois vemos que succedem muitas cousas contra o que Hippocrates tinha assentado como certo, & infalli¬ vel. A segunda cousa digna de grande reparo he ver quam erradamente procedem os Medicos, que nas suppressoes altas da ourina tem medo de sangrar repetidas vezes, quando a experiencia nos mostra que nenhum remedio, depois dos pòs de quintilio , ou da agua benedicta vigorada, he mais proveitoso que as sangrias dos braços repetidas; principalmente quan¬ do entendermos que as taes suppressoës altas proce- dem de grande enchimento, inflammaçao , ou oppi- laçaó das veas emulgentes, porque descarregadas el- las, se tiraô os taes embaraços, & surtem entaô ad¬ miraveis effeitos os remedios provocativos das ouri¬ nas, como eu tenho observado em muitas suppressoens taon perigosas, que aviaon de matar aos doentes, se eu lhes namo acudira logo com vomitorios de agua bene¬ dicta, & com repetidas sangrias nos braços, dando¬ lhes depois disso o meu grande segredo , com, o qual tenho feito curas tamo prodigiosas, como os curiosos podem ver na minha Polyanthea nova trat. 2. cap. 81. fol. 509. num. 36. atè 42. Por este mesmo metho- do livrei da morte ao Padre Fr. Andre da Trindade, Custodio, Lente jubilado , & Qualificador do Santo Officio, Religioso Franciscano da Terceira Ordem, o qual avia cinco dias, & cinco noites que naon podia ou¬ rinar, & com sangrias altas, & o meu grande remedio ourinou doze ourinois cheyos dentro de huma noite, como poderàon certificar todos os Religiosos daquel¬ le Convento, em 8. de Junho de 1704. Com as mesmas sangrias altas, & com o meu segredo livrei tambem da morte a huma Religiosa do Convento da Annun¬ ciada, filha de Manoel Leal, ourives do ouro; a qual Religiosa em 12. de Fevereiro de 1705. teve huma sup- pressaon alta, que lhe durou oito dias, & oito noites, & estando jà desconfiada de tres Medicos doutos, fui chamado, & sangrandoa algumas vezes nos braços, & dandolhe o meu segredo, ourinou tres ourinois che¬
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Observaçaõ XIII. 87 cheyos dentro de oito horas , & ʃarou radicalmente ; do qual ʃucceʃʃo poderáõ ʃer teʃtimunhas todas as Religioʃas do dito Convento . OBSERVAÇAM XIII. De hum fluxo de ʃangue dos narizes taõ rebelde , que naõ quiz obedecer aos remedios mais efficazes da Arte ; & eʃtando o doente taõ deʃconfiado da vida , como inchado do corpo me mandou chamar , naõ querendo fazello atè aquelle tempo , ʃem ter para iʃʃo outra cauʃa mais , que por ter ouvido dizer que nos grandes perigos uʃava de alguns remedios , que por ʃerem ʃegredos meus , naõ queria fazer publicos ; mas como entendeo que morria , quiz uʃar dos taes remedios ; & dandolhos tres dias ʃucceʃʃivos de manhãa , & de tarde , parou o ʃangue , & ʃe deʃvaneceo a inchaçaõ leucophlegmatica , que caminhava para huma hydropeʃia mortal . 1. Aindaque cada dia vão ʃahindo no mundo novas enfermidades ( 1. ) ao compaʃʃo que a malicia dos homens vai cada dia commettendo novas culpas ; comtudo he taõ grande a miʃericordia de Deos , que deʃcobre cada dia novos remedios , com que poʃʃamos curar aos meʃmos , a quem elle pelos ʃeus delitos chegon a ferir. Quantos medicamentos temos hoje , que deʃde o principio do mundo eʃtiverão encubertos com a eʃcura nevoa da noʃʃa ignorancia ? Quantas enfermidades tem avido atè eʃte tempo , cujas couʃas , & remedios foraõ naõ ʃó deʃconhecidos , mas nem ʃonhados dos mayores Medicos ? Em abono deʃta verdade quero referir a ʃeguinte Obʃervaçaõ, da qual ʃe naõ ha de ʃeguir pouca utilidade ao bem commum . 2. Manoel Ribeiro Cotrim , morador em Alfama , no beco chamado de Galè , padeceo no diʃcurʃo de
Obfervação XIII. 87 cheyos dentro de oito horas , & farou radicalmente; do qual fucceffo poderáo fer teftimunhas todas as Religiofas do dito Convento. OBSERVAÇAM XIII. De bum fluxo de fangue dos narizes tao rebelde , que nao quiz obedecer aos remedios mais eficazes da Arte ; & eftando o doente tañ defconfiado da vida , como incha- do do corpo me mandou chamar , nao querendo fazel- lo ate aquelle tempo, fem ter para ifo outra caufa mais , que porter ouvido dizer que nos grandes peri- - gos ufava de algunsremedios , que por ferem Segredos meus, nao queria fazer publicos; mas como entendco que morria, quiz ufar dos taesremedios; & dando- . lhos tres dias fucceffi vos de manhaa , & de tarde , pa- rou o fangue, & fe defvanecco a inchacao leucophleg- matica , que caminhava para huma hydropefia mor- tal. 1 I. A Indaque cada dia vão fahindo no mundo novas enfermidades (1. )ao compaffo que a malicia dos homens vai cada dia commettendo no- vas culpas ; comtudo he tao grande a mifericordia de Deos , que defcobre cada dia novos remedios, com que poffamos curar aos mefmos, a quem elle pelos feus delitos chegou a ferir. Quantos medicamentos temos hoje , que defde o principio do mundo eftive- rão encubertos com a efcura nevoa da noffa ignoran- cia ? Quantas enfermidades tem avido atè efte tempo, ,cujas caufas, & remedios forao nao fo defconhecidos, mas nem fonhados dos mayores Medicos? Em abono defta verdade quero referir a feguinte Obfervaçaõ, da qual fe nao ha de feguir pouca utilidade ao bem com- mum. 2. Manoel Ribeiro Cotrim, morador em Alfa- ma, nobeco chamado da Galè , padeceo no difcurfo de ¥ 1- 1 i- 5
Obfervacao XIII. 27 cheyos dentro deoitohoras, &farou radicalmente; do qual fucceffo poderäo fer teftimunhas todas as Religiofas do dito Convento. O B SE R V AC A M XIII De bum fluxode fangue dos narizes ta rebelde, que na quiz obedecer aos rcmcdios inas efficazes da Arte ; eftando o doente ta5 defconfiado da vida , como incha- do do corpo nc mandou chamar , nao querendo fazel- lo ate aquelle tompo, fem tcr para iffo outra caufa mais, que por ter ouvido dizer guc nos grandesperi- gos ufava de algunsreinedios, que por ferem fegredos meus, na queria fazer publicos; mas como entendco que morria, quiz ufar dos taes remedios; dandc- Ibos tres.dias fucceffivos de manbaa, de turde , pa. rou ofangue, fe defvanecco a inchaga leucophleg . matica , que caminbava para buma bydropefia mor- tal. Indaque cada dia vao fahindo no mundo 1 novas enfermidades(1.ao compaffo que amalicia dos homens vai cada dia commettendo no- vas culpas ;. comtudo he ta grande a mifericordia dc Deos, que defcobre cada dia novos rémedios, com que poffamos curar aos mefmos, a quem elle pelos feus delitos chegou a ferir. Quantos medicamentos temos hoje , que defde o principio do mundo eftive- rao encubertos com a efcura nevoa da noffa ignoran- cia?Quantas enfermidades tem avidoate efte tempo, ' cujas caufas, & remedios fora na fo defconhecidos, mas.nem fonhados dos mayores Medicos: Em abono defta verdade quero referir a feguinte Obfervaga.da qual fe na ha de feguir pouca utilidade ao bem com- mum. 2. Manoel Ribeiro Cotrim, morador em Alfa ma, nobeco chamado da Gale, padeceo no difcurfo de
Obfervaçãó XI. 7 * — cheyos dentro deoitohoras, & farou radicalmente; . — do qual fucceflo poderáó fer reftimunhas todas as * Religiofasdodito Convento. OBSERVAÇAM XIII. » — Debumfluxode/anquedos narizes tao rebelde, que nao r quizobedeceraosremedios mau efficazesda Avte; & eftando o doente ta defconfiado da vida , como incha- - “do docovpo me mandou chamar , naú querendo fazel- | do ate aquelle tempo , fem ter para 1/fo outra caufa | -, mas, que portter onvido dizer que nos grandes peri- ' gos ufava de algunsremedios , gue por ferem fegredos ss , Meus, moqueria fazer publicos; mas como entendeo ' ? quemorria, quiz ufar dos tacsremedios; & dando- dhos tres.dias fuccellivos de manhãa , & de tarde , pa- rouo fangue, & fe defvaneceo a inchaçao lencophleg- | matica ; que caminhava para huma bhydropefia mor- | tal. ' + 1. Indaque cada dia vão fahindo no mundo " novas enfermidades(1.)ao compaffo que a malicia dos homens vai cada dia commettendo no- —vasculpas;, comtudo he ta6 grande a mifericordia de Deos, que defcobre cada dia novos rêmedios, com que poílamos curar aos melmos, a quem elle pelos eus delitos chegou a ferir. Quantos medicamentos temos hoje, que defde o principio do mundo eftive- rão encubertos com a efcura nevoa da noffa ignoran- cia? Quantas enfermidades tem avido atê efte tempo, , cujas caufas, & remedios foraó naô fó defconhecidos, mas nem fonhados dos mayores Medicos? Em abono defta verdade quero referir a feguinte Obfervaçaõ; da qual fe naô ha de feguir pouca utilidade ao bem com- mum. 2. Manoel Ribeiro Cotrim, morador em Alfa ma, nobeco chamado da Galé , padeceo no difeurfo . de E
Observaçaon XIII. cheyos dentro de oito horas, & sarou radicalmente; do qual successo poderaô ser testimunhas todas as Religiosas do dito Convento. OBSERVAQAM XIII. De hum fluxo de sangue dos narizes taon rebelde, que naon quiz obedecer aos remedios mais efficazes da Arte; & estando o doente taò desconfiado da vida, como incha¬ do do corpo me mandou chamar, nao querendo fazel¬ lo atè aquelle tempo, sem ter para isso outra causa mais, que porter ouvido dizer que nos grandes peri¬ gos usava de alguns remedios, que por serem segredos meus, naò queria fazer publicos; mas como entendeo que morria, quiz usar dos taes remedios; & dando¬ lhos tres dias successi vos de manhama, & de tarde, pa¬ rou o sangue, & se desvaneceo a inchaçaon leucophleg- matica, que caminhava para huma hydropesia mor¬ tal. Indaque cada dia vamo sahindo no mundo novas enfermidades (1.) ao compasso que a malicia dos homens vai cada dia commettendo no¬ vas culpas; comtudo he taon grande a misericordia de Deos, que descobre cada dia novos rémedios, com que possamos curar aos mesmos, a quem elle pelos seus delitos chegou a ferir. Quantos medicamentos temos hoje , que desde o principio do mundo estive- ramo encubertos com a escura nevoa da nossa ignoran¬ cia? Quantas enfermidades tem avido atè este tempo, cujas causas, & remedios foraon naon so desconhecidos, mas nem sonhados dos mayores Medicos? Em abono desta verdade quero referir a seguinte Observaçao, da qual se naon ha de seguir pouca utilidade ao bem com- mum. Manoel Ribeiro Cotrim, morador em Alfa¬ ma, no beco chamado da Galè , padeceo no discurso de
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88 Observações Medicas Doutrinaes. de tres meʃes hum fluxo de ʃangue pelos narizes taõ copioʃo , & delgado , que jà naõ era vermelho , mas tão deʃcorado , que parecia agua de lavadura da carne ; & como os Medicos por eʃte final conheceʃʃem que o dito ʃangue ʃahia mais por fraqueza das entranhas , que por ʃobegidão , ʃe naõ atreveraõ a ʃangrallo , porque entenderão que ʃe faria logo hydropico ; & levados deʃte juʃtiʃʃimo medo ʃe empenhàrão em ʃuʃpender o ʃobredito fluxo , applicando para iʃʃo remedios confortativos do figado , & entranhas debilitadas , uʃando de adstringentes , de narcoticos , de amuletos , & de outros muitos eʃpecificos , que por virtude occulta coʃtumão ʃuʃpender a ʃemelhantes fluxos ; mas como viʃʃem que tanta multidaõ de remedios lhe não aproveitàrão , diʃʃeraõ ao doente que me chamaʃʃe , porque ʃabiaõ que eu preparava por minhas mãos varios remedios de virtudes mui preʃentaneas , & que entre elles poderia ter algum , com que lhe valeʃʃe : chamáraõme com effeito , & vendo eu o miʃeravel eʃtado do enfermo , me atemorizei igualmente com os companheiros , porque me lembrou aquella ʃentença aurea de Joaõ Fernelio , ( 2 . ) na qual encomenda muito aos Medicos , que naõ ʃejão como os ignorantes , que tanto que algum doente deita ʃangue pelo nariz , ou tem ourinas vermelhas , o ʃangraõ logo , ʃem advertir que muitas vezes ʃahe o dito ʃangue naõ ʃó por enchimento das veas , mas por outras muitas cauʃas : como ʃuccede àquelles , que tem as entranhas naturaes , & o figado fraco , inchado , ou ʃcirrhoʃo , porque a eʃtes lhes ʃahe facilmente pelo nariz do meʃmo modo , que ʃahe aos hydropicos . Conʃideradas , & premeditadas bem eʃtas palavras de taõ grave Author , fui de parecer que ʃe naõ ʃangraʃʃe , nem tiraʃʃe huma gotta de ʃangue ao enfermo , porque certiʃʃimamente ʃe avia de fazer hydropico , como jà vi a três doentes , que avendo tido grandes fluxos de ʃangue deʃcorado ; & ʃeroʃo , os ʃangràraõ contra o meu voto , & dentro de poucos dias cahiraõ em hydropeʃias , de que morréraõ . O meʃmo diz Henrique
$8 Obfervações Medicas Doutrinaes. de tres mefes hum fluxo de fangue pelos narizes.tao copiofo, & delgado, que jà naõ era vermelho, mas tão defcorado, que parecia agua de lavadura da car- ne ; & como os Medicos por efte final conheceffem que o dito fangue fahia mais por fraqueza das entra- nhas , que por fobegidão, fe nao atreveraõ a fangral- lo, porque entenderão que fe faria logo hydropico; & levados defte juftiffimo medo fe empenharão em lufpender o fobredito fluxo, applicando para iffo re- medios confortativos do figado, & entranhas debili- tadas , ufando de adftringentes , de narcoticos , de amuletos, & de outros muitos efpecificos, que por vir- tude occulta coftumão fufpender a femelhantes flu- xos ; mas como viffem que tanta multidaõ de reme- dios lhe não aproveitarão, differao ao doente que me chamaffe , porque fabiao que eu preparava por mi- nhas mãos varios remedios de virtudes mui prefentà-„ neas , & que entre elles poderia ter algum, com que lhe valeffe : chamaraome com effeito, & vendo eu o miferavel eftado do enfermo, me atemorizei igual- mente com os companheiros , porque me lembrou aquella fentença aurea de Joao Fernelio, ( 2.) na qual encomenda muito aos Medicos, que não fejão como os ignorantes, que tanto que algum doente deita fan- gue pelo nariz, ou tem ourinas vermelhas , o fangrað logo, fem advertir que muitas vezes fahe o dito fan- gue não fo por enchimento das veas, mas por outras muitas caufas : como fuccede àquelles, que tem as entranhas naturaes, & o figado fraco, inchado, ou fcirrhofo, porque a eftes lhes fahe facilmente pelo na -. riz do mefmo modo, que fahe aos hydropicos. Con- fideradas , & premeditadas bem eftas palavras de tao grave Author , fui de parecer que fe nao fangraffe, nem tiraffe huma gotta de fangue ao enfermo, por- que certiffimamente fe avia de fazer hydropico, co- mo jà vi-a tres doentes , que avendo tido grandes flu- xos de fangue defcorado; & ferofo , os fangraraocon- tra o meu voto, & dentro de poucos dias cahiraõ em hydropefias , de que morrerao. O mesmo diz Henri- , que -. 1
88 Obfervacoes MedicasDoutrinaes. de tres mefes hum fluxo defangue pelos narizes.ta copiofo, & delgado, que ja na era vermelho, mas taodefcorado, que parecia agua de lavadura da car- ne; & comoos Medicos por efte final conheceffem que o dito fangue fahia mais por fraqueza das entra nhas , que por fobegidao, fe na atrevera a fangral- lo,porque entenderao que fe faria logo hydropico; & levados defte juftiffimo medo fe empenharao em fufpender ofobredito fluxo, applicando: para iffo re- medios confortativos do figado, & entranhas debili- tadas , ufando de adftringentes , de narcoticos , de amuletos, & de outros muitos efpecificos,que por vir- tude occulta coftumao fufpender a femelhantes flu- xos; mas como viffem que tanta multida de reme- dios lhenao aproveitarao, differaao doente que me chamaffe , porque fabia que eu preparava por mi- nhas maos varios remedios de virtudes mui prefenta- neas, & que entreelles poderia ter algum, com que lhe valeffe : chamaraome com effeito, & vendo eu o miferavel eftado do enfermo, me atemorizei igual- mente com os companheiros , porque me lembrou aquella fentenga aurea de Joa Fernelio , ( 2-) na qual encomenda inuito aos Medicos, que nao fejaocomo os ignorantes, que tanto que algum doente deita fan- gue. pelo nariz, ou tem ourinas vermelhas , o fangra Iogo, fem advertir que muitas vezes fahe. dito fan- gue nao f6 por enchimento das veas, mas por outras muitas caufas: como fuccede aquelles, que tem as entranhas naturaes, & o:figado fraco, inchado, ou fcirrhofo, porque a eftes lhes fahe facilmente pelo na-. riz do mefino modo, que fahe aos hydropicos. Con- fideradas , & premeditadas bem eftas palavras de ta grave Author , fui de parecer quefe na fangraffe, nem tiraffe huma gotta de fangue aoenfermo, por- que certiffimamente fe avia defazer hydropico, co- mo ja vi-a tres doentes, queavendo tidograndes flu- xos de fangue defcorado; & ferofo , os fangraracon- tra omeu voto, & dentro depoucos dias cahira em hydropefias , dequé morréra. O mefmo diz Henri- que
88 Obfervações Medicas Doutrinaes. de tres mefes hum fluxo defangue pelos narizes raô copiofo, & delgado, que jà naô era vermelho , mas tão defcorado, que parecia agua de lavadura da car-« ne; & como os Medicos por efte final conheceflem que o dito fangue fahia mais por fraqueza das entra- nhas , que por fobegidão, fenaó atreveraõa fangral- lo, porque entenderão que fe fariá logo hydropico; & levados defte juftilimo medo fe empenhãàrão em - fnfpender o fobredito fluxo , applicando: para iffo re» medios confortativos do figado , & entranhas debili- Í tadas , ufando de adftringentes , de narcoticos , de amuletos, & de outros muitos efpecificos,que por vir- tude occulta coftumão fufpender a femelhantes fin- xos ; mas como viflfem que ranta multida6 de reme- dios lhe não aproveitàrão, difleraô ao doente que me chamafle , porque fabiaô que eu preparava por mi- nhas mãos varios remedios de virtudes mui prefentá-,, neas, & que entre elles poderia ter algum, com que lhe valeffe : chamáraôme com effeito, & vendoeu o mileravel eftado do enfermo, me atemorizei igual- mente com os companheiros , porque me lembrou aquella fentença aurea de Joa6 Fernelio , ( 2.) na qual encomenda muito aos Medicos, que não fejão como os ignorantes, quertanto que algum doente deita fan- gue pelo nariz , outem ourinas vermelhas ,o fangra& logo, fem advertir que muitas vezes fahe.o dito fan« gue não fó por enchimento das veas, mas por outras. muitas caufas: como fuccede àquelles, que tem as entranhas naturaes, & o figado fraco, inchado, ou fcirrhofo, porque a eftes lhes fahe facilmente pelo na>. riz do mefmo modo, que fahe aos hydropicos. Con* fideradas , & premediradas bem eftas palavras de taõ grave Author , fui de parecer quefe naó fangrafle, nem tirafle huma gotta de fangue ao enfermo, por- que certiflimamente fe avia de fazer hydropico, co- mo jà vi-a tres doentes, que avendo tido grandes flu- - xos de fangue deflcorado; & ferofo , os fangràâraó-con- tra o meu vote, & dentro de poucos dias cahiraó em hydropefias, de que morrérao. O melmo diz Henri- - "que ,
88 Observaçones Medicas Doutrinaes. de tres meses hum fluxo de sangue pelos narizes taon copioso, & delgado , que jà naô era vermelho , mas tao descorado, que parecia agua de lavadura da car- ne ; & como os Medicos por este sinal conhecessem que o dito sangue sahia mais por fraqueza das entra¬ nhas, que por sobegidamo , se nao atreveraón a sangral- lo , porque entenderano que se faria logo hydropico; & levados deste justissimo medo se empenhàrao em suspender o sobredito fluxo , applicando para isso re- medios confortativos do figado , & entranhas debili- tadas, usando de adstringentes, de narcoticos, de amuletos, & de outros muitos especificos, que por vir¬ tude occulta costumamo suspender a semelhantes flu¬ xos; mas como vissem que tanta multidaô de reme¬ dios lhe namo aproveitàramo , disseraon ao doente que me chamasse, porque sabiao que eu preparava por mi¬ nhas manos varios remedios de virtudes mui present⬠neas, & que entre elles poderia ter algum, com que lhe valesse: chamáraôme com effeito, & vendo eu o miseravel estado do enfermo, me atemorizei igual¬ mente com os companheiros, porque me lembrou aquella sentença aurea de Joaon Fernelio , (2.) na qual encomenda muito aos Medicos, que namo sejao como os ignorantes, que tanto que algum doente deita san- gue pelo nariz, ou tem ourinas vermelhas, o sangraon logo, sem advertir que muitas vezes sahe o dito san- gue nao só por enchimento das veas, mas por outras muitas causas: como succede àquelles, que tem as entranhas naturaes, & o figado fraco , inchado , ou scirrhoso, porque a estes lhes sahe facilmente pelo na¬ riz do mesmo modo, que sahe aos hydropicos. Con- sideradas, & premeditadas bem estas palavras de taon grave Author, fui de parecer que se nao sangrasse, nem tirasse huma gotta de sangue ao enfermo , por- que certissimamente se avia de fazer hydropico, co- mo jà vi-a tres doentes, que avendo tido grandes flu- xos de sangue descorado , & seroso , os sangràraon con- tra o meu voto, & dentro de poucos dias cahiraô em hydropesias, de que morréraon. O mesmo diz Henri¬ que
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Observaçaõ XIII. 89 que ab Heers , (3.) que vira a certo homem , que depois de grande fluxos de ʃangue , refrigerandoʃelhe o figado , morrèra hydropico . Conformàrãoʃe todos com o meu voto de que ʃe naõ tiraʃʃe ʃangue ; porèm não faltou quem diʃʃeʃʃe ʃe applicaʃʃem huns cauʃticos nas pernas , para dar vazão aos muitos soros , & humores lymphaticos , que em todo aquelle corpo redundavaõ . A eʃte voto reʃiʃti por duas razoes : a primeira , porque me conʃta que os cauʃticos poʃtos nas pernas inchadas , & cheyas de humores ʃeroʃos , ʃaõ muitas vezes cauʃa de ʃe mortificarem , & gangrenarem , & de apreʃʃarem a morte : a ʃegunda , porque ʃemelhantes fluxos de ʃangue , quando ʃaõ demaʃiados procedem da grande efferveʃcencia , delgadeza , & acrimonia do ʃangue , & da lympha , & neʃte caʃo ʃe exaʃperão , & fervem muito mais os ditos ʃoros lymphaticos , & o ʃangue ajudados com a acrimonia , & quentura dos cauʃticos , os quaes por razão das cantaridas , com que ʃaõ feitos , communicaõ aos humores hum certo fermento rarefactivo , & acrimonioʃo , damnoʃiʃʃimo aos hydropicos , & por eʃta razão nem aos taes doentes , nem aos freneticos os applico , & ʃó uso deles com grande proveito nas modorras , & nas Apoplexias , porque pelas chagas , & dores que fazem , naõ ʃó acordaõ aos doentes ; mas communicão a toda a maʃʃa ʃanguinea huma virtude diʃʃolvente , & deʃcoagulante , importantiʃʃima para a boa circulaçaõ dos humores . 3. Determinei pois purgar primeiro huma boa parte dos ʃoros gerados , dandolhe para eʃʃe fim , quatro vezes em dias alternados , cinco onças de agua de tanchagem ; ou , o que he melhor , de çumo de chicoria , em que primeiro eʃtiveʃʃem duas horas de infuʃaõ trinta grãos de trociʃcos de Alandal , & coandoʃe a dita agua por papel mataborraõ , ou panno bem tapado , lha fiz beber ; porque para purgar os humores lymphaticos , & ʃalgados , que redundaõ nos hydropicos , & nos que deitaõ tanto ʃangue delgado , não tem a Arte melhor remedio : & deʃcanʃando o doente vinte &
89 Obfervaçaõ XIII. que ab Heers, (3.) que vira a certo homem, que de- pois de grandes fluxos de fangue, refrigerandofelhe o figado , morrera hydropico. Conformàrãofe todos com o meu voto de que fe nao tiraffe fangue ; porèm não faltou quem diffeffe fe applicaffem huns caufticos nas pernas, para dar vazão aos muitos foros, & humo- res lymphaticos, que em todo aquelle corpo redunda- vao. A efte voto refifti por duas razoés: a primeira, porque me confta que os caufticos poftos nas pernas inchadas, & cheyas de humores ferofos, fao muitas vezes caufa de fe mortificarem, & gangrenarem, & de apreffarem a morte : a fegunda, porque femelhan- tes fluxos de fangue, quando fao demafiados, proce- dem da grande effervefcencia , delgadeza, & acrimo- nia do fangue, & da lympha, & nefte cafo fe exafpe- rão, & fervem muito mais os ditos foros lymphati- cos , & o fangue ajudados com a acrimonia, & quen- tura dos caufticos , os quaes por razão das cantaridas, com que faõ feitos, communicaõ aos humores hum certo fermento rarefactivo, & acrimoniofo, damno- fiffimo aos hydropicos , & por efta razão nem aos taes doentes, nem aos freneticos os applico, & fó ufo del- les com grande proveito nas modorras, & nas Apople- xias, porque pelas chagas, & dores que fazem, naõ fó acordaõ aos doentes ; mas communicão a toda a maffa fanguinea huma virtude diffolvente, & defcoa- gulante, importantiffima para a boa circulaçaõ dos humores. 3. Determinei pois purgar primeiro huma boa parte dos foros gerados , dandolhe para effe fim, qua- tro vezes em dias alternados, cinco onças de agua de tanchagem ; ou , o que he melhor , de çumo de chico- ria, em que primeiro eftiveffem duas horas de infufao trinta grãos de trocifcos de Alandal, & coandofe a di- ta agua por papel mataborraõ , ou panno bem tapado, lha fiz beber ; porque para purgar os humores lym- phaticos, & falgados , que redundao nos hydropicos, & nos que deitaõ tanto fangue delgado, não tem à 'Arte melhor remedio : & defcanfando o doente vinte 4
Obfervacao XIII. 89 que ab Heers , (3.) que vira acerto homem, que de- pois de grandes fluxos de fangue , refrigerandofelhe o figado , morrera hydropico. Conformaraofe todos com o meu voto de que fe na tiraffe fangue; porém nao faltou quem diffeffe fe applicaffem huns caufticos nas pernas, para dar vazao aos muitos foros, & humo- .res lymphaticos, que em todo aquelle corpo redunda- va. A efte voto refifti por duas razoes: a primeira, porque me confta que os caufticos poftos nas pernas inchadas, & cheyas de humores ferofos, fa muitas vezes caufa de fe mortificarem, & gangrenarem, & de apreffarem a morte : a fegunda, porquefemelhan- tes fluxos de fangue, quando fa demafiados, proce- dem dagrande effervefcencia, delgadeza, & acrimo- nia dofangue, & da lympha, & nefte cafo feexafpe- rao, & fervem muito mais os ditos foros lymphati- cos,& ofangue ajudados com a acrimonia, &quen- tura dos caufticos , os quaes por razao. das cantaridas, com que fa feitos, communica aos humores hum certofermento rarefactivo, & acrimoniofo, damno- fiffimo aos hydropicos, & por efta razao nem aos taes doentes, nem aos freneticos os applico, & foufo del- les.com grande proveito nas modorras, & nas Apople- xias, porque pelas chagas, & dores que fazem, na f6 acorda aos doentes ; mas communicao a toda a maffa fanguinea huma virtude diffolvente , & defcoa- gulante, importantiffima para a boa circulacaö dos humores. 3. Determinei pois purgar primeiro huma.boa parte dos foros gerados , dandolhe para effe fim, qua- tro vezes em dias alternados, cinco oncas de agua de tanchagem ; ou , o que he melhor, de cumo de chico- ria, em que primeiro eftiveffem duas horas de infufa trinta graos de trocifcos de Alandal, & coandofe a di- ta agua por papel mataborra , ou panno bem tapado, lha fiz beber ; porque para purgar os humoreslym- phaticos,& falgados , que redunda nos hydropicos, & nos que deita tanto fangue delgado, nao tem a Arte inelhor remedio : & defcanfando odoente vinte &
Obfervaçõó XIII. — que ab Heers , (3.) que vira a certo homem, que de- ' pois degrandes fluxos de fangue , refrigerandofelhe o figado , morrêra hydropico. Conformàrãofe todos “como meu voto de que fe naõ tirafle fangue ; porêm não faltou quem diffefle fe applicaflfem huns caufticos nas pernas, para dar vazão aos muitos foros, & humo- es lymphaticos, que em todo aquelle corpo redunda- vaõ. A efte voto refifti por duas razoês: a primeira, porque me confta que os cauíticos poftos nas pernas inchadas, & cheyas de humores ferofos , fao muitas vezes caufa de fe mortificarem, & gangrenarem, & deapreffarem a morte: a fegunda , porque femelhan- tes fuxos de fangue , quando faõ demafiados , proce- dem da grande efferveícencia, delgadeza , & acrimo- nia do fangue, & da lympha, & nefte cafo fe exaípe- Tão, & fervem muito mais os ditos foros lymphati- cos ,& o fangue ajudados com a acrimonia, & quen- tura dos caufticos ; Os quaes por razão das cantaridas, com que faó feitos, communiêaô aos humores hum certo fermento rarefa&ivo, & acrimoniofo, damno- fiflimo aos hydropicos , & por efta razão nem aos taes “doentes, nem aos freneticos os applico, & fóufo del- les com grande proveito nas modorras, & nas Apople- xias, porque pelas chagas , & dores que fazem, naô fó acordao aos doentes; mas communicão a toda a 'mafla fanguinea huma virtude diffolvente , & defcoa- fulante, importantiflima para a boa circulaçaõ dos umores. i | | | 3. Determinei pois purgar primeiro huma boa parte dos foros gerados , dandolhe para efle im, qua- tro vezes em dias alternados , cinco onças de agua de | tanchagem ; ou , o que he melhor, de çumo de chico-' ria, em que primeiro eftiveflem duas horas de infufaô trinta grãos de trocilcos de Alandal, & coandofe a di- ta agua por papel maraborraô , ou panno bem tapado, lha fiz beber ; porque para purgar os humoreslym- - phaticos , & falgados , que redundaõô nos hydropicos, & nos que deitaô tanto fangue delgado, não tem a Arte melhor remedio : & defcanfando odoente vinte ó ' & ES : ' O E 2: 3 A INOÇES o Nas
Observaçaon XIII. 89 que ab Heers, (3.) que vira a certo homem, que de- pois de grandes fluxos de sangue, refrigerandoselhe o figado , morrèra hydropico. Conformàramose todos com o meu voto de que se nao tirasse sangue; porèm namo faltou quem dissesse se applicassem huns causticos nas pernas, para dar vazamo aos muitos soros, & humo¬ res lymphaticos, que em todo aquelle corpo redunda- vaon. A este voto resisti por duas razomes: a primeira porque me consta que os causticos postos nas pernas inchadas, & cheyas de humores serosos, sao muitas vezes causa de se mortificarem, & gangrenarem, & de apressarem a morte: a segunda , porque semelhan- tes fluxos de sangue, quando sao demasiados , proce- dem da grande effervescencia , delgadeza, & acrimo- nia do sangue, & da lympha, & neste caso se exaspe- ramo, & fervem muito mais os ditos soros lymphati¬ cos, & o sangue ajudados com a acrimonia, & quen- tura dos causticos, os quaes por razamo das cantaridas, com que sao feitos, communicaon aos humores hum certo fermento rarefactivo, & acrimonioso, damno¬ sissimo aos hydropicos, & por esta razamo nem aos taes doentes, nem aos freneticos os applico, & só uso del- les com grande proveito nas modorras, & nas Apople¬ xias, porque pelas chagas, & dores que fazem, naon ló acordao aos doentes; mas communicao a toda a massa sanguinea huma virtude dissolvente, & descoa¬ gulante, importantissima para a boa circulaçaon dos humores. Determinei pois purgar primeiro huma boa parte dos soros gerados, dandolhe para esse fim, qua- tro vezes em dias alternados, cinco onças de agua de tanchagem; ou, o que he melhor, de çumo de chico- ria, em que primeiro estivessem duas horas de infusaon trinta graos de trociscos de Alandal, & coandose a di- ta agua por papel mataborraon , ou panno bem tapado, lha fiz beber; porque para purgar os humores lym¬ phaticos, & salgados, que redundaon nos hydropicos, & nos que deitaon tanto sangue delgado, namo tem a Arte melhor remedio: & descansando o doente vinte
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90 Observações Medicas Doutrinaes. & quatro horas , lhe comecei a dar , oito dias pela manhãa em jejum , & à noite antes de cear , huma oitava dos meus trociʃcos de eʃtancar ʃangue , feitos em pò , & miʃturados com huma onça de xarope de roʃas ʃeccas , mandandolhe beber em cima cinco onças de agua de tanchagem , em que eʃtiveʃʃem de infuʃaõ trinta folhas de ʃalva verde muito bem pizadas , & eʃpremidas ; & foy o effeito deʃte meu ʃegredo tão maravilhoʃo , que ao terceiro dia ʃe ʃuʃpendeo totalmente o ʃangue , como ʃe foʃʃe obra de milagre : mas eʃte ʃuceʃʃo , que aos circunʃtantes pareceo raro, & eʃtupendo , he para mim couʃa ordinaria , porque a experiencia , & maravilhoʃos effeitos que tenho viʃto deʃte remedio , ʃão tantos , que poʃʃo affirmar naõ ha medicamento que tão efficazmente fixe , & rebata o fervor , & orgaʃmo do ʃangue , que sahe de qualquer parte , como he eʃte meu ʃegredo : & confirmo iʃto ; porque tendo eu acudido ( de muitos annos a eʃta parte) a muitos fluxos de ʃangue, do nariz, da boca , da madre, das almorreimas , & de outras partes , & nem purgando-os repetidas vezes com o meu xarope de ruibarbo, mirobalanos citrinos , & xarope das noʃʃas roʃas , cuja receita enʃinei a fazer na Polyanthea nova trat. 2. cap. 56. fol. 372. num. 6. & 7. nem dandolhes o xarope do çumo da raiz do feto , nem do çumo das folhas das ortigas , nem os pòs das rans , nem a agua cozida com alquitira, & folhas tenras da azinheira, nem dandolhes os pòs do eʃterco de burro , nem applicando-lhes os pòs do vitriolo examinado, nem a pedra hematitis , nem os pòs das pernas das perdizes, pude vencellos , ʃem embargo de qualquer deʃtes remedios ʃer taõ excellente , & efficaz para eʃtancar qualquer fluxo de ʃangue,que pòdem competir entre ʃi ʃobre a primazia; porèm comparados com o meu remedio , todos ʃaõ ʃombra , & todos ʃaõ nada , como ʃe deixa ver por eʃte caʃo, & por muitos que naõ refiro, porque o fiz na minha Polyanthea da ʃegunda impreʃʃaõ trat. 3. cap. 4. fol. 854. do num. 57. até 66. aonde os curioʃos acharàõ nomeadas as peʃʃoas , a quem tenho curado de fluxos
90 Observações Medicas Doutrinaes. & quatro horas , lhe comecei a dar, oito dias pela ma- nhãa em jejum , & à noite antes de cear, huma oitava dos meus trocifcos de eftancar fangue, feitos em pò, . & mifturados com huma onça de xarope de rofas fec- cas , mandandolhe beber em cima cinco onças de agua de tanchagem , em que eftiveffem de infufao trinta folhas de falva verde muito bem pizadas, & ef- premidas ; & foy o effeito defte meu fegredo tao ma- ravilhofo, que ao terceiro dia fe fufpendeo totalmen- te o fangue, como fe foffe obra de milagre : mas efte fucceffo, que aos circunftantes pareceo raro, & eftu- pendo, he para mim coufa ordinaria, porque a expe- riencia, & maravilhofos effeitos que tenho vifto def- te remedio, faõ tantos , que poffo affirmar nao ha me- dicamento que tão efficazmente fixe, & rebata o fer- vor , & orgafmo do fangue, que fahe de qualquer par- te, como he efte meu fegredo : & confirmo ifto ; por- que tendo eu acudido ( de muitos annos a efta parte ) a muitos fluxos de fangue, do nariz, da boca, da madre, das almorreimas , & de outras partes, & nem purganz do-os repetidas vezes com o meu xarope de ruibarbo, mirobalanos citrinos, & xarope das noffas rofas, cuja. receita enfinei a fazer na Polyanthea nova trat. 2. cap. 56. fol. 372. num. 6. & 7. nem dandolhes o xaro- pe do çumo da raiz do feto, nem do çumo das folhas das ortigas, nem os pòs das rans, nem a agua cozida com alquitira, & folhas tenras da azinheira, nem dan- dolhes os pòs do efterco de burro, hem applicando- lhes os pos do vitriolo exanimado, nem a pedra hema- titis, nem os pòs das pernas das perdizes, pude vencel+ los, fem embargo de qualquer deftes remedios fer tao excellente, & efficaz para eftancar qualquer fluxo de fangue, que podem competir entre fi fobrea primazia; porèm comparados com o meu remedio, todos faő fombra, & todos fao nada, como fe deixa ver por efte cafo, & por muitos que nao refiro, porque o fiz na mi- nha Polyanthea da fegunda impreffao trat. 3. cap. 4. fol. 854. do num. 57. atè 66. aonde os curiofos acha- rào nomeadas as peffoas, a quem tenho curado de flu- xos
9o Obfervacoes Medicas Doutrinaes. & quatro horas , lhe comecei a dar, oitodias pela ma- nhaa em jejum, & a noite antes de cear, huma oitava dos meus trocifcos de eftancar fangue, feitos em po, & mifturados com huma onca de xarope de rofas fec- cas , mandandolhe beber em cima cinco. oncas de agua de tanchagem , em que eftiveffem de infufa trinta folhas de falva verdemuito bem pizadas, & ef- premidas ; & foy o cffeito defte meu fegredo ta ma- ravilhofo, que ao terceiro dia fe fufpendeo totalinen. te ofangue, comofefoffe obra de milagre: mas efte fucceffo, que aos circunftantés pareceo raro, & eftu- pendo, he para mim coufa ordinaria , porque a expe- riencia, & maravilhofos effeitos que tenho vifto def- te remedio, fa tantos , que poffo affrmar na ha mer dicamento que tao efficazmente fixe , & rebata o fer- vor , & orgafmo do fangue, que fahe de qualquer par- te, como he efte meu fegredo: & confirmo ifto; por- muitos fluxos de fangue, do nariz, da boca, da madre, das almorreimas , & de outras partes , & nem purgan7 do-os repetidas vezes com.o meu xarope d'e ruibarbo; mirobalanos citrinos, & xarope das noffas rofas, cuja receita enfinei a fazer na Polyanthea nova trat. z. cap.56.fol. 372. num.6. & 7.nem dandolhes o xaro- pe do cumq da raiz do feto, nem do cumo das folhas das ortigas, nem os pos das rans, nem a aguacozida com alquitira, & folhas tenras da azinheira, nem dan- dolhes os pos do efterco de burro, hem applicando: Thes os pös do vitriolo exanimado, nem a pedra hema- titis, nem os pös das pernas das perdizes,pude vencel+ los, femembargo de qualquer deftes remedios fer ta excellente, & efficaz para eftancar qualquer fluxo de fangue,que pödem competir entre fi fobrea primazias porem.comparados com o meu remedio, todos fa fombra, & todos fa nada, como fe deixa ver por efte cafo; & por muitos que na refro, porque o fiz na mi- nha Polyanthea da fegunda impreffa trat. 3. cap. 4. fol. 854. do num. 57.ate 66. aonde os curiofos acha- raö nomeadas.as peffoas, a quem tenho curado de flu- xos
so Obfervações Medicas Doutrinaes. & quatro horas ; lhe comecei a dar, oito dias pela ma- nhãa em jejum , & à noite antes de cear, huma oitava dos meus trocifcos de eftancar fangue, feitos em po & mifturados com huma onça de xarope de rofas fec- cas , mandandolhe beber em cima cinco onças de agua de tanchagem , em que eftiveflem de infufaõ trintá folhas de falva verde muito bem pizadas , & ef- premidas ; & foy o effeito defte meu fegredo taô ma= ravilhofo, que ao terceiro dia fe fufpendeo totalmen+- te o fangue, como fe fofle obra de milagre: mas efte fucceflo, que aos circunftantês pareceo raro, & eftu- pendo, he para mim coufa ordinaria, porque a expes riencia, & maravilhofos effeitos que tenho vifto def. te remedio, faó tantos , que poílo afirmar naó ha me- dicamento que tão efficazmente fixe, & rebata o fer- vor , & orgaímo do fangue , que fahe de qualquer par- te, Como be efte meu fegredo : & confirmo ido ; por= que tendo eu acudido ( de muitos annos a efta parte) a muitos fluxos de fangue, do nariz, da boca, da madre, das almorreimas , & de outras partes, & nem Purgan-s do-os repetidas vezes como meu xarope de ruibarbo; mirobalanos citrinos , & xarope das noffas rofas , cuja. receita enfinei a fazer na Polyanthea nova trat. 2. cap. 56. fol. 372. num. 6. & 7. nem dandolhes o xaro- pe do çumo da raiz do feto, nem do çumo das folhas das ortigas, nem os pôs das rans, nem a agua cozida “comalquitira, & folhas tenras da azinheira, nem dane dolhes os pôs do efterco de burro, hem applicando- lhesos pôs do vitriolo exanimado, nem a pedra hema- titis, nem os pôs das pernas das perdizes,pude vencel» los, femembargo de qualquer deftes remedios fer taõ excellente , & efficaz para eftancar qualquer fluxo de fangue,que pôdem competir entre fi fobrea primazia; porém comparados com o meu remedio, todos fa fombra , & todos faó nada , como fe deixa ver por efte cafo, & por muitos que naô refiro, porque o fiz na mi- . nha Polyanthea da fegunda impreflaô trar. 3. Cap. 4- fol. 854. donum. 57. atê 66. aonde os curiofos acha- rãô nomeadas as pefloas, a quem tênho curado de flu- : xos z
90 Observaçones Medicas Doutrinaes. & quatro horas, lhe comecei a dar, oito dias pela ma¬ nhaa em jejum, & à noite antes de cear, huma oitava dos meus trociscos de estancar sangue, feitos em pò, & misturados com huma onça de xarope de rosas sec¬ cas, mandandolhe beber em cima cinco onças de agua de tanchagem, em que estivessem de infusao trinta folhas de salva verde muito bem pizadas, & es- premidas; & foy o effeito deste meu segredo taó ma- ravilhoso, que ao terceiro dia se suspendeo totalmen- te o sangue , como se fosse obra de milagre : mas este successo, que aos circunstantès pareceo raro , & estu- pendo, he para mim cousa ordinaria , porque a expe- riencia, & maravilhosos effeitos que tenho visto des¬ te remedio , saon tantos, que posso affirmar naon ha me- dicamento que tamo efficazmente fixe, & rebata o fer¬ vor, & orgasmo do sangue , que sahe de qualquer par- te , como he este meu segredo . & confirmo isto ; por- que tendo eu acudido (de muitos annos a esta parte) a muitos fluxos de sangue, do nariz, da boca, da madre, das almorreimas, & de outras partes, & nem purgan¬ do-os repetidas vezes como meu xarope de ruibarbo, mirobalanos citrinos, & xarope das nossas rosas, cuja receita enfinei a fazer na Polyanthea nova trat. 2. cap. 56. fol. 372. num. 6. & 7. nem dandolhes oxaro- pe do çumo da raiz do feto , nem do çumo das folhas das ortigas, nem os pòs das rans, nem a agua cozida com alquitira, & folhas tenras da azinheira, nem dan¬ dolhes os pòs do esterco de burro , hem applicando- shes os pòs do vitriolo exanimado, nem a pedra hema- titis, nem os pòs das pernas das perdizes, pude vencel¬ los, sem embargo de qualquer destes remedios ser taon excellente , & efficaz para estancar qualquer fluxo de sangue, que pòdem competir entre si sobre a primazia; porem comparados com o meu remedio, todos sao sombra, & todos saon nada, como se deixa ver por este caso, & por muitos que naon refiro, porque o fiz na mi¬ nha Polyanthea da segunda impressaô trat. 3. cap. 4. fol. 854. do num. 57. atè 66. aonde os curiosos acha- ràon nomeadas as pessoas, a quem tenho curado de flu¬ xos
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Observaçaõ XIII. 91 xos sanguinolentos com taõ grande felicidade , que nem a inveja , nem a malicia podèraõ eʃcurecer a verdade dos taes ʃucceʃʃos. 4. Confio eu em Deos que naõ averà Medico Catholico , que depois de lhe conʃtar da grande virtude deʃte, & de outros meu ʃegredos, não queira uʃar delles , ʃó porque ʃaõ inventos meus , ou porque eu naõ tenha a gloria de que com as minhas armas ʃe conʃega a vitoria ; mas ʃe ouver algum ( o que eu naõ creyo ) de conʃciencia taõ larga, ou com quem poʃʃa mais a deʃaffeiçaõ que tem aos meus remedios , que a caridade que deve ter com os doentes , peçolhe se lembre da conta que Deos lhe ha de pedir , porque deʃprezou , & talvez infamou aos remedios de singulares virtudes , querendo antes uʃar de outros menos proveitoʃos , porque ʃe aʃʃim o fizer , temo lhe diga o Juiz ʃevero : Certamente condemnaʃte a tua alma , pois tendo noticia de remedios melhores , uʃaʃte dos peyores , como diz Helmonte (4.) OBSERVAÇAM XIV . De huma mulher , que para matar os porçovejos do seu leito , o lavou com vinagre fervido com rosalgar ; & como senaõ acautelasse dos vapores venenosos que subiaõ quando o rosalgar fervia , teve tantas ancias no coraçaõ , que morria dellas , se eu lhe naõ valéra com o meu Bezoartico , dandolho de hora em hora , & em grande quantidade , porque lhe naõ aproveitaria de outra sorte . 1 . Quem avia de imaginar que aquelle espelho Deifico , & ultima imagem da creaçaõ Divina , o Principe mais perfeito de todos os viventes , ( o homem digo ) naõ fora creado para viver largos annos , vendo que Deos , Author & Creador de tudo , o adornou , & enriqueceo com tantas prendas ,
91 Obfervaçao XIII. xos fanguinolentos com taõ grande felicidade, que nem a inveja, nem a malicia poderao efcurecer a ver- dade dos taes fucceffos. 4. Confio eu em Deos que não avera Medico Ca- tholico, que depois de lhe conftar da grande virtude defte, & de outros meus fegredos, nao queira ufar del- les, fó porque faõ inventos meus, ou porque eu nao tenha a gloria de que comas minhas armas fe confe- ga a vitoria ; mas fe ouver algum ( o que eu nao cre- yo ) de confciencia tao larga, ou com quem poffa mais a defaffeiçaõ que tem aos meus remedios, que a ca- ridade que deve ter com os doentes , peçolhe fe lem- bre da conta que Deos lhe ha de pedir, porque def- prezou, & talvez infamou aos remedios de fingulares virtudes, querendo antes ufar de outros menos pro- veitofos, porque fe affim o fizer , temo lhe diga o Juiz fevero : Certamente condemnafte a tua alma , pois tendo noticia de remedios melhores , ufafte dos peyo- res, como diz Helmonte (4.) OBSERVAÇAM XIV. De buma mulher , que para matar os porgovejos do feu leito, o lavou com vinagre fervido com rofalgar ; &' como fenaõ acautelaffe dos vapores venenofos que fu- biao quando o rofalgar fervia, teve tantas ancias no coração , que morria dellas, fè eu lhe nao valera com o meu Bezoartico, dandolho de hora embora, bem grande quantidade , porque lhe nao aproveitaria de outra forte. I. Q Uem avia de imaginar que aquelle efpe- lho Deifico, & ultima imagem da crea- çaõ Divina, o Principe mais perfeito de todos os vi- ventes , ( o homem digo ) naõ fora creado para viver largos annos, vendo que Deos, Author, & Creador de tudo, oadornou, & enriqueceo com tantas pren- das,
Obfervacao XIII 9t xos fanguinolentos com ta grande felicidade, que nem a inveja, nem a malicia podera efcurecer a ver- dade dos taes fucceffos. 4. Confio eu em Deosque nao avera Medico Ca- tholico, que depois de lhe conftar da grande virtude defte, & de outros meus fegredos, naö queira ufar del- les, f6 porque fa inventos meus, ou porque eu na tenha a gloria de que com as minhas armas fe confe- ga a vitoria:;, mas fe.ouver algum ( o que eu naöcre- yo ) de confciencia ta larga, ou com queim poffa mais a defaffeica que tem aos meus remedios, que a ca- ridade quedeve ter com os doentes, pesolhe fe lem- prezou , & talvez infamou aos remedios de fingulares virtudes, querendo antes ufar de outros menos pro- veitofos, porquefe affim o fizer, temo lhe diga o Juiz fevero : Certamente condemnafte a tua alma , pois téndo noticia de remedios melhores , ufafte dos peyo- res, como diz Helmonte (4.) O B S E R.V A.C A M. XIV. De buma mulber, que para matar osporsovejos do /eu leito, o lavou com vinagre fervido rom rofalgar ; comofena arautelaffe dos vapores veneriofós quefu- biaquando orofalgar fervia, teve tantas ancias no coraga, qte morria dellas ,féeu lbe na valéra com omeu Bezoartico, dandolbo de hora em bora, &em grande quantidade , porque.lbe na aproveitaria de outra forte. Uem avia de imiaginar qué aquelle efpc- lho Deifico, & ultima imagem da crea- $a Divina, o Principe mais perfeito de rodos os vi- ventes , ( o homem digo) nao fora.creado para viver largesannos, vendoque Deos, Author; & Creador de tudo,oadornou, & enriqueceo com tantas pren-- das,
Obífervaçao “XIII ot. xos fanguinolentos com taõô grande felicidade, que | nema inveja, nem a malicia podêras efcurecer a ver« Í dade dos taes fuceeflos. E 4. Confioeuem Deos que hão averà Medico Ca- "tholico, que depois de lhe conftar da grafide virtude delfte, & de outros meus fegredos, naô queira ufar del- les , fó porque faô inventos meus , ou porque eu naõ tenha a gloria de que comas minhas armas fe confe- ga a vitoria ; mas fe ouver algum (o queeu naócre- yo ) de confciencia taô larga, ou com quem pofíla mais a defaffeiçaô quetem aos meus remedios, que a ca- ridade que deve ter com os doentes , peçolhe fe lem- bre da conta que Deos lhe ha de pedir, porque def- prezou, & talvez infamou aos remedios de fingulares virtudes, querendo antes ufar de outros menos pro- veitofos , porque fe aflim o fizer, temo lhe diga o Juiz fevero : Certamente condemnalíte a tua alma , pois tendo noticia de remedios melhores , ufaíte dos peyo- res, comodiz Helmonte (4.) | CO OBSERVAÇAM XIV. De huma mulher , quê parva matar os porçoveros do fêu deito , o lavou com vinagre fervido com vofalgar; & como fêenao acautela[fe dos vapores venenofos que fi- biao quando 0 +ofa lgav fervia, téve tantas ancias no coração , que morria dellas , fe eu lhe nao valéra com e meu Besoartico, dandolho de hora embora, 6 em grande quantidade , porque.lhe nao aproveitaria de outra forte. | 1. Uemavia de imaginar quê aquelle efpe- | Qu; Deifico, & ultima imagem da crea- çaô Divina, o Principe mais perfeito de todos os vi- ventes, (o homem digo ) naô fora creado para viver larges annos , vendo que Deos, Author, & Creador de tudo , oadornou, & enriqueceo com tantas pren- | | : - das, & o : |
Observaçaon XIII. 91 xos sanguinolentos com taon grande felicidade, que nem a inveja, nem a malicia podèraon escurecer a ver¬ dade dos taes successos. 4. Confio eu em Deos que namo averà Medico Ca¬ tholico, que depois de lhe constar da grañde virtude deste, & de outros meus segredos, naon queira usar del- les, só porque saon inventos meus, ou porque eu naon tenha a gloria de que comas minhas armas se conse¬ ga a vitoria; mas se ouver algum (o que eu naon cre¬ yo ) de consciencia tao larga, ou com quem possa mais a desaffeiçaon que tem aos meus remedios, que a ca¬ ridade que deve ter com os doentes, peçolhe se lem- bre da conta que Deos lhe ha de pedir, porque des- prezou, & talvez infamou aos remedios de singulares virtudes, querendo antes usar de outros menos pro¬ veitosos, porque se assim o fizer , temo lhe diga o Juiz severo: Certamente condemnaste a tua alma, pois tendo noticia de remedios melhores, usaste dos peyo- es, como diz Helmonte (4.) e OBSERVAQAM XIV De huma mulher, què para matar os porçovejos do seu leito, o lavou com vinagre fervido com rosalgar; & como senaon acautelasse dos vapores venenosos que su¬ biaon quando o rosalgar fervia, teve tantas ancias no coraçaon, que morria dellas, se eu lhe naon valera com omeu Bezoartico, dandolho de hora em hora, & em grande quantidade, porque lhe naon aproveitaria de outra sorte. Uem avia de imaginar que aquelle espe- Llho Deifico, & ultima imagem da crea¬ çao Divina, o Principe mais perfeito de todos os vi¬ ventes, (ohomem digo) nao fora creado para viver largos annos, vendo que Deos, Author, & Creador de tudo, o adornou, & enriqueceo com tantas pren- das,
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92 Observações Medicas Doutrinaes. das , & perfeições , fazendo-o senhor do mundo , pondolhe debaixo dos pès tudo quanto ha na terra , creando-o quasi igual aos Anjos, coroando-o de gloria, & honra como diz David, (1.) & amando-o com tão grande extremo, que se fez homem para o remir, dando a vida por elle, morrendo em huma Cruz? Quem avia de imaginar ( torno a dizer ) que huma creatura taõ grande , & tão nobre avia de ter huma vida taõ curta , & cheya de miserias ? Com tudo a experiencia nos mostra a pouca duração , & a grande fragilidade desta Divina obra ; pois vemos que hum só bocado bastou para affogar a muitos , & que para matar a outros bastou huma leve espinha , sobejando hum só vapor para tirar a vida a outros : & por mais que pareça incrivel que para tirar a vida , fosse taõ poderoso hum cabello , como hum rayo ; comtudo pela seguinte Observaçaõ veremos que as sobreditas cousas naõ saõ menos efficazes para matar , do que as balas de Marte , & a fouce de Saturno para ferir . 2 . No bairro de Alfama junto à Igreja de Saõ Pedro morava Magdalena da Costa , a qual estando em huma visita acompanhada de varias amigas , se queixou que avia muitas noites naõ dormia , nem descansava , pelos muitos porçovejos , que no seu leito tinha : & como desde o principio do mundo atè este dia naõ aja Arte de tantos professores , como he a Medicina , os alfayates lhe daõ suas thezouradas , os çapateiros lhe curtem o couro , os ferreiros lhe malhaõ a cabeça , finalmente todos daõ voto sobre ella ; por isso ensinou cada huma das sobreditas amigas o seu remedio para matar , & affugentar a semelhantes savandijas : disse huma que naõ avia taõ bom remedio , como era perfumar o leito com sanguisugas postas em humas brazas : outra disse que naõ avia cousa taõ efficaz , & experimentada , como era untar o leito com fel de boy misturado com sabam : affirmou outra que não avia medicina mais presentanea que untar o leito com unguento de azougue : affirmou outra que o mais efficaz remedio era untar o leito , & todos os buracos delle com
92 Obfervações Medicas Doutrinaes. das , & perfeições , fazendo-o fenhor do mundo, pon- dolhe debaixo dos pès tudo quanto ha na terra, crean- do-o quafi igual aos Anjos, coroando-o de gloria, & honra, como diz David, (1.) & amando-o com tão grande extremo, que fe fez homem para o remir, dan- do a vida por elle, morrendo em huma Cruz ? Quem avia de imaginar ( tornoadizer ) que huma creatura tao grande, & tão nobre avia de ter huma vida taõ curta, & cheya de miferias ? Com tudo a experiencia nos moftra a pouca duração, & a grande fragilidade defta Divina obra; pois vemos que hum fó bocado baftou para afogar a muitos, & que para matar a ou- tros baftou huma leve efpinha , fobejando hum fó vapor para tirar a vida a outros : & por mais que pa- reça incrivel que para tirar a vida ; foffe taõ poderofo hum cabello, como hum rayo ; comtudo pela feguin- te Obfervaçaõ veremos que as fobreditas coufas naõ fao menos efficazes para matar, do que as balas de " Marte, & a fouce de Saturno para ferir. 2. No bairro de Alfama junto à Igreja de Sao Pe- dro morava Magdalena da Cofta, a qual eftando em huma vifita acompanhada de varias amigas, fe quei- xou que avia muitas noites naõ dormia, nemdefcan- fava, pelos muitos porçovejos, que no feu leito tinha: & como defde o principio do mundo atè efte dianaő aja Arte de tantos profeffores , como he a Medicina, os alfayates lhe dao fuas thezouradas, os çapateiros lhe curtem o couro, os ferreiros lhe malhaõ a cabeça, finalmente todos dao voto fobre ella; por iffo enfinou cada huma das fobreditas amigas o feu remedio para matar, & affugentar a femelhantes favandijas : diffe huma que nao avia tao bom remedio, como era per- fumar o leito com fanguifugas poftas em humas bra- zas: outra diffe que nao avia coufa tao efficaz, & ex- perimentada, como era untar o leito com fel de boy mifturado com fabam: afirmou outra que não avia medicina mais prefentanea que untar o leito comun- guento de azougue : afirmou outra que o mais efficaz remedio era untar o leito, & todos os buracos delle com
92 Obfervacöes Medicas Doutrinaes. das, & perfeicoes, fazendo-ofenhor do mundo, pon- dolhe debaixo dos pes tudo quanto ha na terra, crean- do-o quafi igual aos Anjos, coroando-o de gloria, & honra, como diz David, (1.) & amando-o com tao grande extremo , que fe fez homem parao remir, dan- do a vida por elle , morrendo em huma Cruz ? Quem avia de imaginar ( tornoadizer ) que huma creatura taö grande, & tao:nobre avia de ter huma vida ta curta, & cheya de miferias? Com tudo a experiencia nos moftra a pouca duracao, & a grande fragilidade defta Divina obra; pois vemos que hum f6 bocado baftou para affogar a muitos, & que para matar a ou- tros baftou huma leve, efpinha , fobejando hum f vapor para tirar a vida a outros : & por mais que pa- reca incrivel que para tirar a vida, foffe ta poderofo hum cabello, como hum rayo ; comtudo pela feguin- teObfervasa veremos que as fobreditas coufas na fa menos efficazes paramatar, do.que as balas de Marte, & a fouce de Saturno paraferir. 2. Nobairro de Alfama junto a Igreja de Sa Pe- dro moraya Magdalena da Cofta, a qual eftando em huma vifita acompanhada de varias amigas, fe quei- xouque avia muitas noites nao dormia, nemdefcan- fava , pelos muitos. porcovejos, que no feu leito tinha: & como defde o principio do mundo ate efte diana aja Arte de tantos profeffores, como he a Medicina, os alfayates lhe da fuas thezouradas, os capateiros The curtem o couro, os ferreiros lhe imalha a cabeca, finalmente todos da voto fobre ella; por iffo enfinou cada humadas fobreditas amigas o feu remedio para matar , & affugentar a femelhantes favandijas : diffe huma que naö avia ta bom remedio, como era per-. fumar ° leitocom fanguifugas poftas em humas.bra- zas : outra diffe que nao aviacoufataoefficaz, & ex- perimentada, como era untar o leito com fel de boy mifturado com fabam: affirmou outra que nao avia medicina mais prefentanea que untar.o.leito com un- guento de azougue : affirmou outra que o mais efficaz remedio era untar oleito, & todos os buracos delle com
s 2 Obfervações Medicas Doutrinaes. das , & perfeições , fazendo-o fenhor do mundo, ponº dolhe debaixo dos pês tudo quanto ha narerra, crean- . do-o quafi igual aos Anjos, coroando-o de gloria , & honra, como diz David, (1.) & amando-o com tão grande extremo, quefe fez homem para o remir,dan- do a vida por elle , morrendo em huma Cruz? Quem avia de imaginar (tornoadizer ) que huma creatura taô grande, & tão:nobre avia de ter huma vida taô curta, & cheya de miferias ? Com tudo a experiencia nos moltra a pouca duração, & a grande fragilidade defta Divina obra; pois vemos que hum fó bocado baftou para affogar a muitos , & que para matar a ou- tros baftou huma leve efpinha, fobejando hum fó vapor para tirar a vida a outros : & por mais que pa- reçaincrivel que para tirara vida ; fofle taõô poderofo hum cabello, como hum rayo ; comtudo pela feguin- te Obfervaçaô veremos que as fobreditas coufas nag faõô menos efficazes para matar, do que as balas de Marte, & a fouce de Saturno para ferir. 2. "Nobairrode Alfama junto à Igreja de Saô Pe- dro morava Magdalena da Cofta, a qual eftando em huma vifita acompanhada de varias amigas , fe quei- xou que avia muitas noites naô dormia, A eradefcan- fava, pelos muitos porçovejos, que no feu leito tinha: & como defde o principio do mundo atê eftedianaõ aja Arte de tantos profeffores , como hea Medicina, os alfayates lhe daô fuas thezouradas , os çapateiros lhe curtem o couro, os ferreiros lhe malhaõ a cabeça, Finalmente todos daô voto fobre ella ; por iflo enfinou cada huma das fobreditas amigas o feu remedio para matar, & affugentar a femelhantes favandijas : difle huma que naôóavia taô bom remedio, como era per-. fumar oleitocom fanguifugas poítas em humas bra- zas: outra dife que naô avia coufataó eficaz, & ex- Ps perimentada , como era untar o leito com fel deboy . milturado com fabam: affirmou outra que não avia medicina mais prefentanea que untar-o leito comuns guento de azougue: affirmon outra que o mais efficaz remedio era untar oleito, & todos os buracos delle. com
92 Observaçones Medicas Doutrinaes. das, & perfeiçoes, fazendo-o senhor do mundo, pon- dolhe debaixo dos pès tudo quanto ha na terra, crean- do-o quasi igual aos Anjos, coroando-o de gloria , & honra, como diz David, (1.) & amando-o com tamo grande extremo , que se fez homem para o remir, dan- do a vida por elle, morrendo em huma Cruz? Quem avia de imaginar (torno a dizer) que huma creatura taon grande, & tao nobre avia de ter huma vida taon curta, & cheya de miserias? Com tudo a experiencia nos mostra a pouca duraçamo, & a grande fragilidade desta Divina obra; pois vemos que hum só bocado bastou para affogar a muitos, & que para matar a ou¬ tros bastou huma leve espinha, sopejando hum só vapor para tirar a vida a outros: & por mais que pa- reça incrivel que para tirar a vida , fosse tao poderoso hum cabello, como hum rayo; comtudo pela seguin¬ te Observaçaon veremos que as sobreditas cousas naon sao menos efficazes para matar, do que as balas de Marte, & a fouce de Saturno para ferir. 2. No bairro de Alfama junto à Igreja de Sao Pe- dro morava Magdalena da Costa, a qual estando em huma visita acompanhada de varias amigas, se quei¬ xou que avia muitas noites naon dormia, nem descan¬ sava, pelos muitos porçovejos, que no seu leito tinha: & como desde o principio do mundo atè este dia naon aja Arte de tantos professores, como he a Medicina, os alfayates lhe daó suas thezouradas, os çapateiros lhe curtem o couro, os ferreiros lhe malhaon a cabeça, finalmente todos daon voto sobre ella; por isso ensinou cada huma das sobreditas amigas o seu remedio para matar, & affugentar a semelhantes savandijas: disse huma que naon avia taon bom remedio, como era per¬ fumar o leito com sanguisugas postas em humas bra¬ zas: outra disse que naon avia cousa taon efficaz, & ex¬ perimentada, como era untar o leito com fel de boy misturado com sabam: affirmou outra que namo avia medicina mais presentanea que untar o leito com un¬ guento de azougue: affirmou outra que o mais efficaz remedio era untar o leito, & todos os buracos delle com
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Observaçaõ XIV. 93 com cebo de carneiro : outra finalmente disse que nunca lhe faltàra , nem se achára enganada com a lavagem de vinagre forte fervido com hum pouco de rosalgar : agradou este ultimo remedio mais que os outros , & assim mandou comprar meya onça de rosalgar em pò , ordenando à sua criada que em huma panela o puzesse a ferver com huma canada de vinagre forte , & que como estivesse fervido , lavasse o leito muito bem de huma , & outra parte , sem lhe escapar greta , nem resquicio algum , por pequeno que fosse . Assim o fez a pobre criada ; mas taõ desgraçadamente executou o preceito de sua ama , que em menos de huma hora começou a ter ancias , & palpitaçoens do coraçaõ , tremores do corpo , ardores , & picadas nas mãos ; ( 2 . ) & como pela vehemencia dos symptomas , & qualidade venenosa do rosalgar se cubrisse de suor frio , & fosse cahindo em hum desmayo , & syncope mortal , se atemorizou de sorte , que pedio lhe chamassem logo hum Confessor , & hum Medico. Neste aperto fui chamado , & vendo eu a miseravel mulher em perigo taõ evidente desconfiei da sua vida ; porèm lembrandome da grande confiança , & crença que ella tinha em mim, não pude deixar de empenharme para a tirar da garganta da morte : mandei pois que se confessasse logo , & que com toda a pressa lhe dessem hum grande pucaro de leite de mulher , ou qualquer outro , que mais promptamente se achasse ; & que naõ se achando , lhe dessem hum quartilho de leite de amendoas doces , em que misturassem a agua de tres claras de ovos frescos bem batidas , & tres onças de lambedor violado ; & para rebater a qualidade venenosa do rosalgar , que jà lhe tinha assaltado o coraçaõ , ( como se deixava ver pelas excessivas ancias , tremores , & suores frios com que estava ) lhe receitei o cordeal seguinte , que para extinguir , & refrear a ferocidade de qualquer veneno mortifero , tem huma virtude , & efficacia superior a todos os remedios humanos , & se prepara do modo seguinte. Tomem de pevides de cidra azeda huma oitava , de raizes de escor
93 Observação XIV. com cebo de carneiro : outra finalmente diffe que nunca lhe faltara, nem fe achára enganada com ala- vagem de vinagre forte fervido com hum poucode rofalgar: agradou efte ultimo remedio mais que os outros, & afim mandou comprar meya onça de ro- falgar em pò, ordenando à fua criada que em huma panela o puzeffe a ferver com huma canada de vina- gre forte, & que como eftiveffe fervido, lavaffe o lei- to muito bem de huma, & outra parte, fem lhe efca- par greta, nem refquicio algum, por pequeno que fof- fe. Affim o fez a pobre criada; mas tao defgraçada- mente executou o preceito de fua ama , que em menos de huma hora começou a ter ancias, & palpitaçoens do coração, tremores do corpo, ardores, & picadas nas mãos ; (2. ) & como pela vehemencia dos fympto- mas , & qualidade venenofa do rofalgar fe cubriffe de fuor frio , & foffe cahindo em hum defmayo, & fyn- cope mortal, fe atemorizou de forte, que pedio lhe chamaffem logo hum Confeflor , & hum Medico. Nefte aperto fui chamado, & vendo eu a miferavel mulher em perigo taõ evidente defconfiei da fua vida; porèm lembrandome da grande confiança, & crença que ella tinha em mim, não pude deixar de empenhar- me para a tirar da garganta da morte: mandei pois que fe confeffaffe logo, & que com toda a preffa lhe defem hum grande pucaro de leite de.mulher, ou qualquer outro, que mais promptamente fe achaffe; & que nao fe achando, lhe deffem hum quartilho de leite de amendoas doces, em que mifturaffem a agua de tres claras de ovos frefcos bem batidas , & tres on- ças de lambedor violado; & para rebater a qualidade venenofa do rofalgar, que ja lhe tinha affaltado o co- raçao, ( como fe deixava ver pelas exceffivas ancias, tremores, & fuores frios com que eftava ) lhe receitei o cordeal feguinte, que para extinguir, & refreaf a fe- . rocidade de qualquer veneno mortifero, tem huma virtude', & efficacia fuperior a todos os remedios hu- manos, & fe prepara do modo feguinte. Tomem de pevides de cidra azeda huma oitava, de raizes de ef- cor: 1
ObfervacaoXIV. 93 com cebo de carneiro : outra finalmente diffe que nunca lhe faltara, ncm fe achara enganada com ala- vagem de vinagre forte fervido com hum poucode rofaigar : agradou efte ultino remedio mais que os outros, & affim mandou comprar meya onca de ro-. falgar em po, ordenando afua criada queem huma panela o puzeffe a ferver com huma canada de vina- gre forte,& que comoeftiveffe fervido, lavaffeo lei- to muito bem de huma, & outra parte, feim lheefca- par greta, nem refquicio algum, por pequeno que fof- fe. Affim o fez a pobre criada; mas ta defgracada- mente executou o preceito de fua ama , que em inenos .de humahora comecou a ter ancias , & palpitacoens do coraca, tremorcs do corpo, ardores, & picadas nas maos ; (.) & como pela vehemencia dos fympto- nmas , & qualidade venenofa do rofalgar fe cubriffede fuor frio, & foffe cahindo :em hum defmayo, & fyn- cope .mortal, fe atemorizou de forte, que pedioihe chamaffem logo hum Confeffor , & hum Medico. Nefte aperto fui chamado, & vendo eu a miferavel mulher em perigo ta evidente defconfei da fua vida; poréin lembrandome dagrande confianca,&crenca que ella tinha em mim, nao pude deixar de empenhar- me para a tirar da garganta da morte: mandei pois quefeconfeffaffe logo, & que com.toda a preffa lhe deffem hum grande pucaro de leite de,mulher, ou qualquer outro , que ivais promptamente fe achaffe; & que na feachando, lhe deffem humquartilho de leite deamendoas doces, em que mifturaffem a agua de tresclaras de ovos frefcos bem batidas , & tres on- .: cas de lambedor violado; & para rebater a qualidade venenofa do rofalgar, que ja lhe tinha affaltado o co- raca, ('como .fe deixava ver pelas exceffivas ancias, tremores, & fuores frios com que eftava ) lhe receitei o cordeal feguinte, que para extinguir, & refrear a fe-- rocidade de qualquer veneno mortifero, tem huma virtude,& effcaciafuperior a todos os remedios hu- manos, & fe prepara do modo feguinte. Tomem de pevides de cidra azedahuma oitava, de raizes de ef- cor:
Obflervaçõó XIV... 563 com cebo de carneiro : outra finalmente difle que nunca lhe faltãra , nem fe achára enganada com ála- vagem de vinagre forte fervido com hum poucode rofalgar: agradou efte ultimo remedio mais que os outros , & afim mandou comprar meya onça de ro-. falgar em pô, ordenando à fua criada que em huma panela o puzeffe a ferver com huma canada de vina- gre forte, & que como eftivefle fervido , lavalle o lei- to muito bem de huma , & outra parte , fem lhe efca- par greta, nem refquicio algum, por pequeno que fof- fe. Afim o feza pobre criada; mas tao delgraçada- mente executou o preceito de fua ama , que em menos de huma hora começou a ter ancias, & palpiraçoens do coraçaô, tremores do corpo, ardores, & picadas nas mãos ; (2.) & como pela vehemencia dos fm to- mas, & qualidade venenofa do rofalgar fe cubrifle de fuor frio , & fofle cahindo em hum defmayo, & fyn- cope mortal, fe atemorizou de forte, que pedio lhe chamaílem logo hum Confeflor , & hum Medico. Nefte aperto fui chamado, & vendo eu amiferavel mulher em perigo taô evidente defconfiei da fua vida; orêm lembrandome dagrande confiança, & crença que ella tinha em mim, não pude deixar de empenhar- me para atirar da garganta da morte: mandei pois que fe confeffafle logo, & que comroda a prefífa lhe 'deffem hum grande pucaro de leité de.mulher, ou qualquer outro , que mais prompramente fe achafle; & que naó feachando, lhe deflem hum quartilho de leite de amendoas doces, em que mifturaflem a agua de tresclaras de ovos frefcos bem batidas , & tres on- . ças de lambedor violado ; & para rebater a qualidade veneno/a do rofalgar, que jà lhe tinha aflaltado o co- : " S raçaô, ( como fe deixava ver pelas exceflivas ancias, tremores , & fuores frios com que eftava ) lhe reçeitei o cordeal feguinte, que para extinguir, & refrearafe- . rocidade de qualquer veneno mortifero, tem huma virtude, & eficacia fuperior a todos os remedios hu- manos, & fe prepara do modo feguinte. Tomem de pevides de cidra azeda huma oitava, de raizes de ef : cor- . . Ú -
Observaçaon XIV. 93 com cebo de carneiro. outra finalmente disse que nunca lhe faltàra, nem se achára enganada com a la vagem de vinagre forte fervido com hum pouco de rosalgar: agradou este ultimo remedio mais que os outros, & assim mandou comprar meya onça de ro¬ salgar em pò, ordenando à sua criada que em huma panela o puzesse a ferver com huma canada de vina¬ gre forte , & que como estivesse fervido , lavasse o lei- to muito bem de huma, & outra parte , sem lhe esca¬ par greta, nem resquicio algum, por pequeno que fos¬ se. Assim o fez a pobre criada; mas tao desgraçada¬ mente executou o preceito de sua ama , que em menos de huma hora começou a ter ancias, & palpitaçoens do coraçaon, tremores do corpo, ardores , & picadas nas manos; (2.) & como pela vehemencia dos sympto- mas, & qualidade venenosa do rosalgar se cubrisse de suor frio, & fosse cahindo em hum desmayo, & syn¬ cope mortal, se atemorizou de sorte , que pedio lhe chamassem logo hum Confessor, & hum Medico. Neste aperto fui chamado, & vendo eu a miseravel mulher em perigo taon evidente desconfiei da sua vida; porèm lembrandome da grande confiança, & crença que ella tinha em mim, namo pude deixar de empenhar- me para a tirar da garganta da morte: mandei pois que se confessasse logo , & que com toda a pressa lhe destem hum grande pucaro de leite de mulher, ou qualquer outro, que mais promptamente se achasse; & que nao se achando, lhe dessem hum quartilho de leite de amendoas doces, em que misturassem a agua de tres claras de ovos frescos bem batidas, & tres on- ças de lambedor violado; & para rebater a qualidade venenosa do rosalgar , que jà lhe tinha assaltado o co- raçao, (como se deixava ver pelas excessivas ancias, tremores, & suores frios com que estava) lhe reçeitei o cordeal seguinte , que para extinguir, & refrear a fe- rocidade de qualquer veneno mortifero, tem huma virtude, & efficacia superior à todos os remedios hu¬ manos, & se prepara do modo seguinte. Tomem de pevides de cidra azeda huma oitava, de raizes de es- cor¬
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94 Observações Medicas Doutrinaes. corcioneira duas onças , de folhas de cardo santo duas oitavas , tudo se machuque , & com huma canada de agua da fonte se ponhaõ a cozer em panela de barro , atè ficarem tres quartilhos , & tirandose a panela do lume , se coe esta agua com forte expressaõ , & dentro nella desfaçaõ tres oitavas do meu cordeal bezoartico , que se acharà em minha casa , ou nas boticas de Saõ Domingos , ou na de Joaõ Gomes Silveira , morador ao Chiado, ou na de Joaõ Baptista Leitaõ, morador à Cruz de Cata-que-farás , porque sós estes tres boticarios tem o tal cordeal verdadeiro , preparado por minhas mãos , porque os outros , que se vendem debaixo do meu nome , saõ falsificados ; que a tal estado chegou a malicia , & ambiçaõ dos homens. E deste cordeal bem vascolejado ordenei lhe dessem logo cinco onças , & o fossem repetindo de tres em tres horas ; & foi taõ presentanea a virtude deste admiravel contraveneno , que na mesma hora desapparecèraõ as ancias , as palpitações do coraçaõ, os suores frios , & os tremores do corpo ; & porque alguma malicia do rosalgar ( jà communicada às partes interiores ) naõ machinasse algum damno contra a vida da enferma , ordenei que a tivessem acordada as primeiras doze horas , porque com o somno se não entranhasse , & reconcentrasse mais nas partes profundas a qualidade mortifera do dito rosalgar . Ordeneilhe finalmente que em todos os caldos misturassem duas oitavas de oleo de semente dos nabos ( 3 . ) feito por expressaõ ; porque naõ he dizivel a estupenda virtude , que o dito oleo tem contra todos os venenos , & contra todas as doenças malignas , bexigas , & sarampãos : & foy Deos servido , que observandose pontualmente tudo , o que lhe ordenei , recuperou a vida , que desejava . 3 . Desta observaçaõ conheceràõ todos , quam grande virtude he a do meu cordeal , assim para vencer as febres malignas , como para rebater todo o veneno , que por erro , ou malicia se deo , como tenho visto algumas vezes : a primeira em hum escravo de Pedro Luis : a segunda em huma mulher , a quem seu marido
94 Obfervações Medicas Doutrinaes. corcioneira duas onças, de folhas de cardo fanto duas oitavas , tudo fe machuque, & com huma canada de agua da fonte fe ponhaõ a cozer em panela de barro, ate ficarem tres quartilhos, & tirandofe a panela do . lume, fe coe efta agua com forte expreffao, & dentro nella desfaçaõ tres oitavas do meu cordeal bezoarti- co, que fe acharà em minha cafa, ou nas boticas de Saõ Domingos , ou na de Joaõ Gomes Silveira, mora- dor ao Chiado, ou na de Joaõ Baptifta Leitaõ, mora- dor à Cruz de Cata-que-farás, porque fos eftes tres bc- ticarios tem o tal cordeal verdadeiro, preparado por minhas mãos , porque os outros , que fe vendem de- baixo do meu nome , fao falfificados ; que a tal eftado chegou a malicia, & ambição dos homens. E defte cordeal bem vafcolejado ordenei lhe deffem logo cin- co onças , & o foffem repetindo de tres em tres horas; & foi tao prefentanea a virtude defte admiravel con- traveneno, que na mefma hora defappareceraõ as an- cias , as palpitações do coração, os fuores frios, & os tremores do corpo ; & porque alguma malicia do ro- falgar (jà communicada às partes interiores ) naõ ma- chinaffe algum damno contra a vida da enferma , or- denei que a tiveffem acordada as primeiras doze ho- ra's, porque com o fomno fe não entranhaffe, & re- concentraffe mais nas partes profundas a qualidade mortifera do dito rofalgar. Ordeneilhe finalmente. que em todos os caldos mifturaffem duas oitavas de oleo de femente dos nabos (3.) feito por expreffaõ; porque nao he dizivel a eftupenda virtude , que o dito oleo tem contra todos os venenos , & contra todas as doenças malignas, bexigas, & farampãos: & foy Deos fervido, que obfervandofe pontualmente tudo, o que lhe ordenei , recuperou a vida, que defejava. 3 .¿ Defta Obfervaçao conhecerao todos, quam grande virtude he a do meu cordeal, affim para vencer as febres malignas, como para rebater todo o veneno, que por erro, ou malicia fe deo, como tenho vifto al- gumas vezes: a primeira em hum efcravo de Pedro Luis : a fegunda em huma mulher, aquem feu mari -. do
94 Obfervacoes Medicas Doutrinaes. corcioneira duas oncas, de folhas de cardo fanto duas oitavas, tudofe machuque, & com huma canada de agua da fonte fe ponha a cozer.em panela de barro, ate ficarem tres quartilhos, & tirandofe a panela do . lume, fe coe efta agua com forte expreffa, & dentro nella desfaca tres oitavas do meucordeal bezoarti- co, que fe achara em minha cafa, ou nas boticas de Sa Domingos , ou na de Joa Gomes Silveira , mora- dor ao Chiado, ou na de Joa Baptifta Leita , mora- dor a Cruz de Cata-que-faras,porque fós eftes tres bc- ticarios tem o tal cordeal verdadeiro, preparado por minhas maos , porque os outros , que fe vendem de- baixo do meu nome ,fafalfificados ; que a tal eftado chegou a malicia, &. ambica dos homens. E defte cordeal bem vafcolejado ordenei lhe deffem logo cin- co oncas , & o foffem repetindo de tres cm tres horas; & foi ta prefentanea a virtude defte admiravel con- traveneno, que na mefma hora defapparecéra as an- cias, as palpitacöes do coraga, os fuores frios , .& os tremores docorpo; & porque alguma maliciado ro. falgar (ja communicada as partes interiores ) naö ma- chinaffe algum damno contra avida da enferma , or- denei que a tiveffem acordada as primeiras doze ho- ras, porque com ofomno fe nao entranhaffe, & re- concentraffe mais nas partes profundas a qualidade mortifera do dito rofalgar.: Ordeneilhe finalmente: que em todos os caldos mifturaffem duas oitavas de öleo de femente dos nabos (3.) feito por expreffa) porque na he dizivel a eftupenda virtude, que o dit oleo tem contra todos os venenos, & contra todas as doencas malignas, bexigas, & farampaos: & foy Deos fervido, que obfervandofe pontualmente tudo, o que Ihe ordenei, recuperou a vida, que defejava. 3: Defta Obfervaca conhecera todos, quam grande virtude he a do meu cordeal , affim para véncer as febres malignas, como para rebater todo o veneno, que por erro, ou malicia fe deo , como tenho vifto al- gumas vezes: a primeira em hum..efcravode Pedro Luis : a fegunda em huma mulher ,, aquem feu mari- do
94 Obfervações Medicas Doutrinaes. corcioneira duas onças, de folhas de cardo fanto duas oitavas , tudo fe machuque, & com huma canada de agua da fonte fe ponhaó a cozer em panela de barro, até ficarem tres quartilhos, & tirandofe a panela do lume , fe coe efta agua com forte expreífaõo, & dentro nella desfaçaô tres oitavas do meu cordeal bezoarti- co, que feacharà em minha cafa, ou nas boticas de Saô Domingos , ou na de Joa6 Gomes Silveira, mora- dor ao Chiado, ou na de foa6 Baptifta Leitaô, mora- dor à Cruz de Cata-que-faras,porque fós eftes tres bc= ticarios tem o tal cordeal verdadeiro, preparado por minhas mãos , porque os outros , que fe vendem de- baixo do meu nome , faó falfificados ; que a tal eftado chegou a malicia, & ambiçaô dos homens. E defte” cordeal bem vafcolejado ordenei lhe deflfem logo cin- co onças , & o foflem repetindo de tres em tres horas; & foi raõ prefentanea a virtude defte admiravel con- traveneno, que na melma hora defapparecêraõas an- cias, as palpitações do coraçaõ, os fuores frios, .& os tremores do corpo ; & porque alguma maliciado ro- algas (jà communicada às partes interiores ) naô ma- chinafle algum damno contra a vida da enferma , or- denei que a tiveflem acordada as primeiras doze ho- ras, porque com o fomno fe não entranhafle, & re- concentrafle mais nas partes profundas a qualidade mortifera do dito rofalgar. Ordeneilhe finalmente que em todos os caldos mifturaffem duas oitavas de oleo de femente dos nabos (3.) feito por expreflaõ; porque naó he dizivel a eftupenda virtude, que o dito oleo tem contra todos os venenos , & contra todas as doenças malignas, bexigas, & farampãos: & foy Deos fervido, que obfervando/e pontualmente tudo, o que lhe ordenei , recuperou a vida , que defejava. 3.» Deita Obfervaçaõô conhecerãô todos, quam : grande virtude he a do meu cordeal, afim para véncer as febres malignas, como para rebater todo o veneno, que por erro, ou malicia fe deo , comotenho vifto al- gumas vezes: a primeira em hum efcravo de Pedro Luis: a fegunda em huma mulher, a quem feu mari-- | do 7
94 Observaçones Medicas Doutrinaes. corcioneira duas onças, de folhas de cardo santo duas oitavas, tudo se machuque, & com huma canada de agua da fonte se ponhaó a cozer em panela de barro, ate ficarem tres quartillios, & tirandose a pañela do lume, se coe esta agua com forte expressaon , & dentro nella desfaçao tres oitavas do meu cordeal bezoarti¬ co, que se acharà em minha casa, ou nas boticas de Saó Domingos, ou na de Joao Gomes Silveira, mora- dor ao Chiado, ou na de Joaon Baptista Leitao , mora- dor à Cruz de Cata-que-farás, porque sós estes tres be- ticarios tem o tal cordeal verdadeiro, preparado por minhas maos, porque os outros, que se vendem de¬ baixo do meu nome , sao falsificados ; que a tal estado chegou a malicia, & ambiçaon dos homens. E deste cordeal bem vascolejado ordenei lhe dessem logo cin- co onças , & o fossem repetindo de tres em tres horas; & foi tao presentanea a virtude deste admiravel con¬ traveneno , que na mesma hora desapparecèraon as an- cias, as palpitaçones do coraçaon, os suores frios, & os tremores do corpo; & porque alguma malicia do ro¬ salgar (jà communicada às partes interiores) nao ma¬ chinasse algum damno contra avida da enferma, or¬ denei que a tivessem acordada as primeiras doze ho¬ ras, porque com o somno se nao entranhasse, & re¬ concentrasse mais nas partes profundas a qualidade mortifera do dito rosalgar. Ordeneilhe finalmente que em todos os caldos misturassem duas oitavas de oleo de semente dos nabos (3.) feito por expressao; porque nao he dizivel a estupenda virtude , que o dito oleo tem contra todos os venenos, & contra todas as doenças malignas, bexigas, & sarampanos: & foy Deos servido , que observandose pontualmente tudo , o que Ihe ordenei, recuperou a vida, que desejava. 3. Desta Observaçaon conheceràô todos, quam grande virtude he a do meu cordeal, assim para vencer as febres malignas, como para rebater todo o veneno, que por erro , ou malicia se deo , como tenho visto al- gumas vezes: a primeira em hum escravo de Pedro Luis: a segunda em huma mulher, a quem seu mari¬ do
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Obʃervaçaõ XV. 95 do quiz matar injustamente , dandolhe para isso veneno ; & foy Deos servido , que acodindolhes eu com o meu cordeal , & com boa quantidade de leite de vaca , ou de amendoas doces , em que ajuntava duas onças de mucilagens de pevides de marmelo , escapáraõ todos da morte com grande credito da Arte , & gosto meu , graças sejaõ dadas ao Author da vida. OBSERVAÇAM XV. De huma mulher que padecia grandes dores no ventre , & eʃtomago acompanhadas com febre , tremores convulʃivos e afflicções do coraçaõ , a que ʃe applicàraõ tantos remedios inuteis que cheguei a ʃuʃpeitar que as ditas queixas procediaõ de lombrigas : & naõ me enganei ; porque dandolhe os remedios , que as mataõ , deitou , entre muitas pequenas , huma de dous covados , & no meʃmo dia teve ʃaude . . NAõ ha ciencia , que tanto neceʃʃite de hum artifice muito acautelado , & prudente , como a Medicina ; porque acontece cada dia serem chamados alguns Medicos para curar doenças , cujas cauʃas ʃaõ taõ occultas , & difficultoʃas de conhecer, que he neceʃʃario adivinhar . Deʃta verdade tive hum evidentiʃʃimo exemplo em certa mulher , chamada Maria Manoel : padeceo eʃta tantas dores no ventre , & eʃtomago , tantas ancias no coraçaõ, tantas fatuidades no juizo , tantos tremores , & movimentos convulʃivos nos nervos , & taõ repetidas alteraçoens nos pulʃos, que todos entendèraõ que brevemente morreria ; mayormente vendo que alguns Medicos , de quem fiàra a ʃua vida , eʃtiveraõ muito tempo embaraçados , & perplexos , ʃem acertar com a cauʃa da enfermidade , tendolhe feito mil diligencias , & applicado todas as artes , trabucos , machinas , batarias , & quantos petrechos tem inventado o engenho dos ho-
1 Obfervaç .. " XV. 95. do quiz matar injuftamente , dandolhe para iffo vene- no; & foy Deos fervido, que acodindolhes eu com o meu cordeal , & com boa quantidade de leite de vaca, ou de amendoas doces , em que ajuntava duas onças de mucilagens de pevides de marmelo, efcaparaõ to- dos da morte com grande credito da Arte, & gofto meu , graças fejao dadas ao Author da vida. OBSERVAÇAM XV. De huma mulher que padecia grandes dores no ventre, & estomago acompanhadas com febre , tremores con- vulfivos, & afflicgies do coração , a que fe applicarao tantos remedios inuters , que cheguei a fufpeitar que as dit as queixas procediao de lombrigas: & nao me enga- nei ; porque dandolhe os remedios, que as matao , dei- tou , entre muitas pequenas , huma de dous covados, &' no mefmo dia teve faude. I. N Aõ ha ciencia , que tanto neceffite de hum artifice muito acautelado, & pru- dente, como a Medicina; porque acontece cada dia ferem chamados alguns Medicos para curar doenças, cujas caufas fao tao occultas, & difficultofas de co- nhecer , que he neceffario adivinhar. Defta verdade tive hum evidentiffimo exemplo em certa mulher, chamada Maria Manoel: padeceo efta tantas dores no ventre, & eftomago, tantas ancias no coração, tan- tas fatuidades no juizo, tantos tremores, & movimen- tos convulfivos nos nervos , & tao repetidas altera- çoens nos pulfos, que todos entenderao que breve- mente morreria ; mayormente vendo que alguns Me- dicos, de quem fiàra a fua vida , eftiverao muito tempo embaraçados, & perplexos , fem acertar com a caufa da enfermidade, tendolhe feito mil diligencias, & ap- plicado todas as artes , trabucos, machinas , bararias, & quantos petrechos tem inventado o engenho dos ho- 1 : 1. ). : 1- ? e e ; 1 ;
Obfervac. XV: 9s do quiz matar injuftamente , dandolhe para iffo vene- no; & foy Deos fervido, que acodindolhes eu com o meu cordeal', & com boa quantidade de leite de vaca, ou de amendoas doces, em que ajuntava duas oncas de mucilagens de pevides de marmelo, efcaparao to- dos damarte com grande credito da Arte, & gofto meu , gracas fejao dadas ao Author da vida. $$0 0$$0 0$Se$$0 $S 0$$ $S0 0$$0 0$S0 +05$0 0$$6 $$0 OBSERV ACAM xV. De buma mulber que padccia grandes dores no ventre; déftomago aconpanbadas com febre , tremores con- vulfvos, afflicses do corasa, a que fe applicara tantos remedios inutc1s , que cheguei a/upeitar que as dit as queixasprocedia de lonbrigas: na me enga- - nei ; porque dandolbe os remedios, que as mata , dei- tou , entre muitas pequenas , buma de dous covados, no mefmo dia teve faude. hum artifice. muito acautelado, & pru- dente, comoa Medicina; porque acontece cada dia ferem.chamados alguns Medicos para curar doencas, cujas:caufas fao tao occultas, & difficultofas,de co- nhecer, que he neceffario adivinhar. Defta verdade tive hum evidentiffimo exemplo em certa mulher , chamada Maria Manoel: padeceoefta tantas dores.no ventre, & eftomag, tantas ancias no coracao, tan- tas fatuidades no juizo, tantos tremores, & movimen- ts convulfivos nos nervos , & ta repetidasaltera- coens nos pulfos, que todos éntendéra que breye- menté morreria ; mayormente vendo que alguns Me- dicos,de quem fiara a fua vida , eftivera muito tempo embaracados, & perplexos , fem acertar com a caufa da enfermidade, tendolhe feito mil diligencias, & ap- plicado todas as artes , trabucos , machinas , batarias, &.quantos petrechos: tem inventado oengenho dos ho-
Obfervaçso KV. os do quiz matar injuftamente , dandolhe para iflo vene- no; & foy Deos fervido, que acodindolhes en como meu cordeal , & com boa quantidade de leite de vaca, ou de amendoas doces , em que ajuntava duas onças de mucilagens de pevides de marmelo, efcaparaõ to- dos da morte com grande credito da Arte, & gofto meu , graças fejaô dadas ao Author da vida. e09300 «09500 eo SS 03500 OSS 00 a0 SÍ» ao SÉ 0O-a0 3500 SS 09 aa SOS a0 5500 a SSÃO OBSERVAÇAM XV. De huma mulher que padecia grandes dores no vêntie, & éftomago acompanhadas com febre tremores con- vulfivos, & afflicções do coraçao , a que fe applicavaõ. tantos remedios muteu , que cheguei a fulbeitar que as ditas queixas procediao de lombrigas: & não me enga- nei ; porque dandolhe os remedios , que as matao , dei- tou , entre muitas pequenas , buma de dous covados, & no mefmno dia teve faude. « Aô ha ciencia , que tanto neceffite de hum artifice muito acautelado, & pru- dente, como a Medicina; porque acontece cada dia ferem chamados alguns Medicos para curar doenças, cujas caufas faó tao oceultas, & difficultofas de co- nhecer , que he neceffario adivinhar. Defta verdade zivé hum evidentiffimo exemplo em certa mulher, chamada Maria Manoel: padeceo efta tantas dores no ventre, & eftomago, tantas ancias no coraçaãõ, tan- tas fatuidades no juizo, tantos tremores, & movimen- tos convulfivos nós nervos , & taô repetidas altera çoens nos pulíos, que todos entendêéraô que breve-- mente morreria ; mayormente vendo que alguns Me- dicos,de quem fiára a fua vida , eftiverao muito tempo embaraçados , & perplexos , fem acertãr com a caufa da enfermidade, tendolhe feito mil diligencias, & ap- ' plicado todas as artes , trabucos , imachinas , batarias, & quantos perrechos tem inventado o engenho dos
Observaç. XV. 95 do quiz matar injustamente , dandolhe para isso vene- no; & foy Deos servido, que acodindolhes eu com o meu cordeal, & com boa quantidade de leite de vaca, ou de amendoas doces, em que ajuntava duas onças de mucilagens de pevides de marmelo, escaparao to- dos da morte com grande credito da Arte, & gosto meu, graças sejaon dadas ao Author da vida. 50 OBSERVAQAM XV De huma mulher que padecia grandes dores no ventre, & estomago acompanhadas com febre, tremores con¬ vulsivos, & afflicęè es do coraçao, a que se applicàraò tantos remedios inuteis, que cheguei a suspeitar que as ditas queixas procedidon de lombrigas: & nao me enga- nei; porque dandolhe os remedios, que as mataò, dei tou, entre muitas pequenas, huma de dous covados, & no mesmo dia teve saude. TAon ha ciencia, que tanto necessite de hum artisice muito acautelado, & pru¬ dente, como a Medicina; porque acontece cada dia ferem chamados alguns Medicos para curar doenças, cujas causas saon taò occultas, & difficultosas de co¬ nhecer, que he necessario adivinhar. Desta verdade tive hum evidentissimo exemplo em certa mulher chamada Maria Manoel: padeceo esta tantas dores no ventre, & estomago, tantas ancias no coraçaon, tan¬ tas fatuidades no juizo, tantos tremores, & movimen¬ tos convulsivos nos nervos, & taô repetidas altera¬ çoens nos pulsos, que todos entendèrao que breve¬ mente morreria; mayormente vendo que alguns Me¬ dicos, de quem fiàra a sua vida, estiverao muito tempo embaraçados, & perplexos, sem acertàr com a causa da enfermidadę, tendolhe feito mil diligencias, & ap¬ plicado todas as artes, trabucos, machinas, batarias, & quantos petrechos tem inventado o engenho dos ho¬
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96 Obʃervações Medicas Doutrinaes . homẽs para render a ferocidade de tão poderoʃos inimigos ; mas tudo ʃem alivio ; porque as dores, ʃem ter reʃpeito a couʃa alguma , augmentàraõ cada vez mais a ʃua crueldade . 2 . Neʃta deʃeʃperaçaõ , quando a mulher impaciente com dores ʃe enfurecia contra ʃi ferindoʃe , & deʃpedaçandoʃe , fui chamado paraque lhe applicaʃʃe algũ remedio : confeʃʃo que temi entrar em tão grande tempeʃtade de dores , & perigos , que mal baʃtaria o melhor piloto para ʃahir bem de tamanha tormenta ; mas porque nos caʃos grandes vence muitas vezes o deʃejo , o que não podem as forças , foi preciʃo acudir a quem ʃe valia do meu amparo . Varias foraõ as conʃiderações que fiz para conhecer a cauʃa da doença : humas vezes entendia que tantos ʃymptomas , e taõ violentos naõ podiaõ proceder de outro principio, ʃenaõ de alguma aura , ou vapor maligniʃʃimo , que mordicando , & offendendo as tunicas do eʃtomago , & inteʃtinos , eraõ os authores das ʃobreditas queixas : outras vezes preʃumia que taõ terribeis ancias , & crueis afflicções ʃó as podia cauʃar algũ humor atrabiliario , ou colera praʃʃina , pois eʃta , na opiniaõ de graves Doutores , ( 1 ) faz muitas vezes effeitos peyores que o mais refinado veneno : outras vezes ʃuʃpeitava que alguma intemperança exotica , & deʃconhecida era a cauʃa de taõ lamentavel tragedia ; porèm como para todas eʃtas queixas , & cauʃas dellas ʃe tiveʃʃem applicado excellentes remedios ʃem proveito , imaginei que os exceʃʃivos movimentos , & convulʃoens dos nervos , ʃemelhantes aos da gotta coral , procediaõ de alguma depravada fermentaçaõ de humores , que ferviaõ no eʃtomago , ou meʃenterio , & mais partes vizinhas , que a miʃtura das ʃubʃtancias ʃalinas fez contra a natureza , a qual mixtaõ coʃtuma ʃer a cauʃa ordinaria das grandes , & furioʃas tempeʃtades , & ardentes febres , que succedem cada dia no corpo humano ; & como , ao meu entender , naõ ʃó a anaʃtomoʃi dos vapores adultos , mas tambem a metaʃtaʃi , ou mudança arrebatada , que os humores depravados fazem das
96 Obfervações Medicas Doutrinaes. homēs para render a ferocidade de tão poderofos ini- migos ; mas tudo fem alivio ; porque as dores , fem ter. refpeito a coufa alguma, augmentarao cada vez mais a fua crueldade. · 2. Nefta defefperação, quando a mulher impa- ciente com dores fe enfurecia contra fi ferindofe , & defpedaçandofe, fui chamado paraque lhe applicaffe algu remedio: confeffo que temi entrar em tão gran- de tempeftade dedores, & perigos , que mal baftaria o melhor piloto para fahir bem de tamanha tormenta; mas porque nos cafos grandes vence muitas vezes o defejo, o que não podem as forças , foi precifo acudir a quem fe valia do meu amparo. Varias foraoas confi- derações que fiz para conhecer a caufa da doença: hu- mas vezes entendia que tantos fymptomas , & taő vio- lentos naõ podiaő proceder de outro principio, fenaõ de alguma aura, ou vapor maligniffimo, que mordi- cando, & offendendo as tunicas do eftomago, & in- teftinos , eraõ os authores das fobreditas queixas : ou- tras vezes prefumia que taõ terribeis ancias , & crueis afflicções fó as podia caufar algu humor atrabiliario, ou colera praffina , pois efta , na opiniao de graves Doutores , (1.) faz muitas vezes efeitos peyores que o mais refinado veneno : outras vezes fufpeitava que alguma intemperança exotica, & defconhecida era a caufa de tao lamentavel tragedia; porem como para todas eftas queixas , & caufas dellas fe tiveffem appli- cado excellentes remedios fem proveito, imaginei que . os exceffivos movimentos , & convulfoens dos ner- vos, femelhantes aos da gotta coral , procediao de àl- guma depravada fermentaçaõ de humores, que fer- viao no eftomago, ou mefenterio, & mais partes vi- zinhas , que a miftura das fubftancias falinas fez con- tra a natureza, a qual mixtaõ coftumafer a caufa or- dinaria das grandes, & furiofas tempestades, & ar- dentes febres, que fuccedem cada dia no corpo hu- mano ; & como, ao meu entender, nao fó a anaftomofi dos vapores aduftos , mas tambem a metaftafi, ou mu- dança arrebatada, que os humores depravados fazem das
96 Obfervacoes Medicas Doutrinaes. homs para render a ferocidade de tao poderofos ini- migos ; mas tudo fem alivio ; porque as dores , fem ter .refpeito a coufa alguina, augmentarao cada vez mais a fua crueldade. 2. - Nefta defefperacao, quando a mulher impa- ciente com dores feenfurecia contra fi ferindofe, & defpedagandofe, fuichamado paraque lhe applicaffe algu remedio: confeffo que temi entrar em tao gran- de rempeftade de dores, & perigos, que mal baftaria o melhor piloto parafahir bem de tamanha tormenta; mas porque nos cafos grandes vence muitas vezes defejo , que nao podem as forcas , foi precifo acudir a quem fe valia do meu amparo. Varias foraas confi- deracöes que fiz para conhecer a caufa da doenca: hu- mas vezes entendia que tantos fymptomas , & ta vio- lentos na podia proceder de outro principio, fena de alguma aura, ou vapor maligniffimo, que inordi- cando, & offendendo as tunicas do eftomago, & in- teftinos , era os authores das fobreditas queixas : ou- tras vezes prefumia que ta terribeis ancias , & crueis afflicces f6 as podia caufar algu humor atrabiliario, ou colera praffina , pois efta , na opinia dé graves Doutores, (1.) faz muitas vezes effeitos peyores que o mais: refinado veneno : outras vezes fufpeitavaque algumaintemperanga exotica, & defconhecida era a caufa de ta lamentavel tragedia ; porém como para todas eftas queixas, & caufas dellas fe tiveffem appli- cado excellentes remedios fem proveito,imaginei que os exceffivos movimentos , & convulfoens dos ner- vos, femelhantes aos da gotta coral, procedia de al- guma depravada fermentaca de humores, que fer- via nQ.eftomago, ou mefenterio, & mais partes vi- zinhas , que a miftura das fubftancias falinas fez con- traa natureza, aqual mixta coftumafer a caufa or- dinaria das grandes, & furiofas tempeftades, & ar- dentes febres, que fuccedem cada dia no corpo hu- mano ; & como, ao meu entender, naö fo a anaftoinofi dos vapores aduftos , mas tambem a metaftafi, oú mu- danca arrebatada , que os humores depravados fazem :das
96 “Obfertvações Medicas Doutrinaes. homês para render a ferocidade de tão poderofos ini-= migos ; mas tudo fem alivio ; porque as dores , fem ter .refpeito a coufa alguma, augmentàraô cada vez mais a fua crueldade. 2. * Nefta defefperaçao, quando a mulherimpa- ciente com dores ftenfarecia contra fi ferindofe , & defpedaçandofe , fui chamado paraque lhe applicafle algú remedio: confeflo que temi entrar em tão gran- detempelítade dedores , & perigos , que mal baftaria o melhor piloto para fahir bem de tamanha tormenta; mas porque nos cafos grandes vence muitas vezes o defejo , o que não podem as forças , foi precifo acudir a quem fe valia do meu amparo. Varias foraõas confi- derações que fiz para conhecer a caufa da doença: hu- mas vezes entendia que tantos (ymptomas , & taô vio- lentos naó podiaô proceder de outro principio, fenas de alguma aura, ou vapor malignifimo, que mordi- cando, & offendendo as tunicas do eftomago, & in- teftinos , eraô os authores das fobreditas queixas: ou- tras vezes prefumia que taô terribeis ancias , & crueis afilicções as podia caufar algãá humor atrabiliario, ou colera praflina , pois efta , na ópiniaô dé graves Doutores , (1.) faz muitas vezes effeitos peyores que o mais refinado veneno: outras vezes fufpeirava que algumaintemperança exotica , & defconhecida era a caufa de taô lamentavel tragedia; porém como para. todas eftas queixas , & caufas dellas fetiveflem appli- cado excellentes remedios fem proveito,imaginei que : os exceflfivos movimentos , :& convulfoens dos ner- vos, femelhantes aos da gotta coral , procediaó de al- guma depravada fermentaçaõô de humores, que fer- viaô no eltomago, ou mefenterio, & mais partes vi- zinhas , que a miftura das fubftancias falinas fez con- trãa natureza, a qual mixtaô coftuma fer a caufa or- dinaria das grandes , & furiofas tempeítades, & ar- dentes febres, que fuccedem cada dia no corpo hu- mano ; & como, ao meu entender, naóô fó a anaftomofi dos vapores aduítos , mas tambem a meraítafi, oá mu- dança arrebatada , que os humores depravados fazem : + das
96 Observaçones Medicas Doutrinaes. homens para render a ferocidade de tamo poderosos ini¬ migos; mas tudo sem alivio; porque as dores, sem ter respeito a cousa alguma, augmentàraon cada vez mais a sua crueldade. 2. Nesta desesperaçaon, quando a mulher impa¬ ciente com dores se enfurecia contra si ferindose , & despedaçandose, fui chamado paraque lhe applicasse algum remedio. confesso que temi entrar em tano gran- de tempestade de dores, & perigos, que mal bastaria o melhor piloto para sahir bem de tamanha tormenta; mas porque nos casos grandes vence muitas vezes o desejo, o que namo podem as forças , foi preciso acudir a quem se valia do meu amparo. Varias foraon as consi¬ deraçones que fiz para conhecer a causa da doença: hu- mas vezes entendia que tantos symptomas, & tao vio- lentos naon podiaon proceder de outro principio , senaon de alguma aura, ou vapor malignissimo, que mordi- cando, & offendendo as tunicas do estomago , & in- testinos, eraon os authores das sobreditas queixas: ou¬ tras vezes presumia que taon terribeis ancias, & crueis afflicçones so as podia causar algum humor atrabiliario, ou colera prassina, pois esta, na opiniaô de graves Doutores, (1.) faz muitas vezes effeitos peyores que o mais refinado veneno: outras vezes suspeitava que alguma intemperança exotica, & desconhecida era a causa de tao lamentavel tragedia; porèm como para todas estas queixas, & causas dellas se tivessem appli¬ cado excellentes remedios sem proveito, imaginei que os excessivos movimentos, & convulsoens dos ner¬ vos, semelhantes aos da gotta coral, procediaon de al- guma depravada fermentaçaon de humores, que fer- viaon no estomago, ou mesenterio, & mais partes vi- zinhas, que a mistura das substancias salinas fez con¬ tra'a natureza, a qual mixtao costuma ser a causa or¬ dinaria das grandes, & furiosas tempestades, & ar- dentes febres, que succedem cada dia no corpo hu- mano ; & como, ao meu entender, naon só a anastomosi dos vapores adustos, mas tambem a metastasi, où mu¬ dança arrebatada, que os humores depravados fazem das
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Obʃervaçaõ XVI . 97 das partes inferiores para a cabeça , deʃʃem azos àquelles horrendos , & formidaveis movimentos , julguei que com toda a arte , & induʃtria ʃe avia de acudir primeiro a tirar a cauʃa , porque de outra sorte ( em quanto o humor maligno eʃtiveʃʃe dentro no corpo ) padeceria o doente as queixas referidas . 3 . Para purgar pois , & alimpar bem todo o humor nocivo , que pelos erros da vida , & indigeʃtões dos alimentos ʃe foraõ pouco a pouco ajuntando no eʃtomago , lhe dei meya oitava de vitriolo branco , deʃatado em tres onças de agua de erva cidreira : o qual remedio àlem de ʃer fiel , & ʃeguro , naõ paʃʃa a ʃua actividade da primeira regiaõ ; para conforto da qual , & para vencer as convulʃoẽs epilepticas he taõ proveitoʃo , & appropriado , q julguei ʃe devia repetir duas , ou tres vezes em dias alternados ; porèm como a doença depois do corpo eʃtar purgado copioʃamente com o ʃobredito remedio , continuaʃʃe com a mesma força , antes ʃe exaʃperaʃʃem mais os referidos ʃymptomas , julguei que o ʃucco nervoʃo ʃe offendia ; & irritava com algum humor , ou vapor acre , & pungente , & que para dulcificar , & aplacar a dita acrimonia , naõ avia remedio taõ proprio , & efficaz, como era o leite de burra , porque ʃobre ʃer grande mitigativo de dores , he remedio nervino , & que ʃó com elle podia vencer as ʃobreditas queixas : deilhe pois ( por tempo de tres meʃes ) o leite jà pela boca , jà por ajudas ; mas ʃem fruto . Neʃte aperto aʃʃentei como couʃa certa , que as ʃobreditas dores , anxiedades , & convulʃoens , ʃe deviaõ attribuir a lombrigas , que por eʃtarem famintas , ou aʃʃanhadas com o incendio da febre , mordiaõ , & picavaõ os nervos , & cauʃavaõ os ʃobreditos effeitos ; o que acabei de conhecer por dous sinaes . O primeiro , porque quanto mais tempo a doente eʃtava ʃem comer , tanto mais crueis dores , ancias , tremores , & febre padecia , de maneira que nem huma hora podia eʃtar ʃem comer , mas tanto que comia qualquer couʃa , se diminuhiaõ logo as dores , os tremores , a febre , & os mais symptomas . O ʃegundo sinal , por onde julguei
97 Obfervaçaõ XVI. das partes inferiores para a cabeça, deffem azos àquel- les horrendos, & formidaveis movimentos ; julguei que com toda a arte , & industria fe avia de acudir pri- meiro a tirar a caufa , porque de outra forte (em quan- to o humor maligno eftiveffe dentro no corpo ) pade- ceria o doente as queixas referidas. 3. Para purgar pois, & alimpar bem todo o hu- mor nocivo, que pelos erros da vida, & indigeftões dos alimentos fe foraõ pouco a pouco ajuntando no eftomago, lhe dei meya oitava de vitriolo branco, defatado em tres onças de agua de erva cidreira: o qual remedio alem de fer fiel, & feguro, nao paffa a fua actividade da primeira regiao; para conforto da qual, · & para vencer as convulfoes epilepticas he tao provei- tofo, & appropriado, q julguei fe devia repetir duas, ou tres vezes em dias alternados ; porèm como a doença depois do corpo eftar purgado copiofamente com o fobredito remedio, continuaffe com a mefma força, antes fe exafperaffem mais os referidos fymptomas, julguei que o fucco nervofo fe offendia; & irritava com algum humor, ou vapor acre, & pungente , & que pa- ra dulcificar, & aplacar a dita acrimonia, naõ avia re- medio tao proprio, & efficaz, como era o leite de bur- ra, porque fobre fer grande mitigativo de dores, he remedio nervino, & que fó com elle podia vencer as fobreditas queixas : deilhe pois ( por tempo de tres. mefes ) o leite jà pela boca, jà por ajudas ; mas fem fruto. Nefte aperto affentei como coufa certa, que as fobreditas dores, anxiedades , & convulfoens fe de- viao attribuir a lombrigas , que por eftarem famintas, Qu affanhadas com o incendio da febre, mordiao, & picavao os nervos , & caufavao os fobreditos effeitos; o que acabei de conhecer por dous finaes.O primeiro, porque quanto mais tempo a doente eftava fem co- mer, tanto mais crueis dores, ancias , tremores, & febre padecia, de maneira que nem huma hora podia eftar fem comer, mas tanto que comia qualquer cou- fa , fe diminuhiao logo as dores, os tremores, a febre, & os mais fymptomas. O fegundo final , por onde jul- guei
Obfervacao XVI. 97 das partes inferiores para a cabeca, deffem azos aquel- leshorrendos, & formidaveis movimentos; julguei que com toda a arte, & induftria fe avia de acudir pri- meiro a tirar a caufa , porque de outra forte (em quan- to o humor maligno eftiveffe dentro no corpo ) pade- ceria o doeate as queixas referidas. 3. Para purgar pois, & alimpar bem todoohu- mor nocivo, que pelos erros da vida, & indigeftoes dos alimentos fe fora pouco a pouco ajuntando no eftomago, lhe dei meya oitava de vitriolo branco; defatado en tres oncas de agua de crva cidreira: qual remedioalem dc fcr fel, & feguro, napaffaa fua actividade da primeira regia; para conforto da qual, &para vencer as convulfoés cpilepticas he ta provei- 'tofo,& appropriado, julguei fe devia repetir duas,ou tres vezes cm dias alternados ; porem como a doensa depois döcorpo éftar purgado copiofamente com o föbredito remedio, continuaffe coma mefma forca, antes fe exafperaffem mais os referidos fymptomas, julguei que o fucconervofo feoffendia,& irritava com algum humor, ou vapor acre, & ungente, & que pa- ra dulcificar , & aplacar a dita acrimonia, nao avia re- medio ta proprio, & efficaz, como era o leitede bur-- ra, porque fobre fer grande mitigativo de dores, hc remedionervino, &.que fo com elle podia vencer as ".fobreditas queixas. : deilhe pois (por tempo de tres mefes) oleite ja pela boca, ja por ajudas ; mas fem fruto. Nefte apertoaffentei como coufa certa, que as fobreditas dores, anxiedades , & convulfoens fe de- via attribuir a lombrigas, que por eftarem famintas, u affanhadas com o incendio da febre, mordiaö, &: picavaos nervos, & caufava os fobreditos effeits; o que acabei de conhecer por dous finaes.O primeiro, porque quanto mais tempo a doente eftava fem co- mer, tanto mais crueis dores, ancias , tremores, & febre padecia, de maneiraque nem huma horapodia eftar fem comer , mas tanto que comia qualquer cou- fa , fe dininuhia logoas dores , os tremores, a febre, & os mais fymptofnas. O fegundo final , por onde jul- guei
Obfervação XVI. o « daspartesinferiores paraa cabeça, deflem azos àquel: les horrendos , & formidaveis movimentos ; julguei que comtoda a arte, & induítria fe avia de acudir priz meiro a tirar a caufa , porque de outra forte (em quan- to o humor maligno eftivelle dentro no corpo ) pade- ceria o doente as queixas referidas. | 3. Para purgar pois, & alimpar bem todo o hu- mor nocivo, que pelos erros da vida , & indigeftões dos alimentos fe foraó pouco a pouco ajuntando no eftomago, lhe dei meya oitava de vitriolo branco ; defarado em tres onças de agua de erva cidreira: o qual remedio àlem de fer fiel, & feguro, naô paíla à fua actividade dá primeira regiaô; para conforto da qual, * &paravencer às convulíoês cepilepticas he taô provei- 2 tolo,& appropriado,4 julguei fe devia repetir duas,ou tres vezes em dias alternados ; porém como a doença depois do corpo eftar purgado copiofamente com o fobredito remedio, continuafle coma mefma força, antes fe exafperaffem mai£os referidos fymptomas, ! Julguei que o fucco nervoto fe offendia;& irritava com . | algum humor, ou vapor acre; & y ungente”, & que pa“ ra dulcificar, & aplacar a dita acrimonia, naõ avia re- medio taô proprio , & efficaz, como era o leite de bur- Fa, porque fobre fer grande mitigativo de dores, he . remedio nervino, & que f1ó com elle podia vencer as “fobreditas queixas + deilhe pois (por tempo dertres- .mefes ) o leite jà pela boca, jà por ajudas; mas fem fruto. Nefte aperto affentei como coufa certa, que as fobreditas dores, anxiedades, & convulfoens fe de- viaô attribuira lombrigas, que por eftarem famintas, wu aflanhadas com o incendio da febre, mordiáô, & picavaõos nervos, & caufavaô os lobreditos effeitos; + o que acabei de conhecer por dous finaes.O primeiro, | porque quanto mais témpo a doente eftava fem co- . mer, tanto mais crueis dores, ancias , tremores, & febre padecia, de maneira que nem huma horapodia = eftar Em comer, mas tanto que comia qualquer cou- fa , fe diminuhiaõ logo'as dores, os tremores, a febre, & os mais íymproinas. O fegundo final , por onde jul- : guei
Observaçao XVI. 97 das partes inferiores para a cabeça, dessem azos àquel¬ ses horrendos, & formidaveis movimentos; julguei que com toda a arte , & industria se avia de acudir pri- meiro a tirar a causa, porque de outra sorte (em quan¬ to o humor maligno estivesse dentro no corpo) pade¬ ceria o doente as queixas referidas. Para purgar pois, & alimpar bem todo o hu¬ mor nocivo, que pelos erros da vida, & indigestoes dos alimentos se foraô poucò a pouco ajuntando no estomago, lhe dei meya oitava de vitriolo branco , delatado em tres onças de agua de erva cidreira: o qual remedio àlem de ser fiel, & seguro, naon passa à sua actividade da primeira regiaon; para conforto da qual, & para vencer as convulsoës epilepticas he tao provei toso, & appropriado, que julguei se devia repetir duas, ou tres vezes em dias alternados; porèm como a doença depois do corpo estar purgado copiosamente com o sobredito remedio , continuasse com a mesma força, antes se exasperassem mais os referidos symptomas, julguei que o succo nervoso se offendia, & irritava com algum humor, ou vapor acre, & jungente, & que pa¬ ra dulcificar, & aplacar a dita acrimonia, naon avia re¬ medio tao proprio , & efficaz, como era o leite de bur- ra, porque sobre ser grande mitigativo de dores , he remedio nervino, & que só com elle podia vencer as fobreditas queixas. deilhe pois (por tempo de tres meses) o leite jà pela boca, jà por ajudas; mas sem fruto. Neste aperto assentei comò cousa certa, que as sobreditas dores, anxiedades, & convulsoens se de- viaon attribuir a lombrigas, que por estarem famintas, u'assanhadas com o incendio da febre, mordiaon, & picavaon os nervos, & causavaon os sobreditos effeitos; o que acabei de conhecer por dous sinaes. O primeiro, porque quanto mais tempo a doente estava sem co¬ mer, tanto mais crueis dores, ancias, tremores, & febre padecia, de maneira que nem huma hora podia estar sem comer, mas tanto que comia qualquer cou sa, se diminuhiaon logo as dores, os tremores , a febre, & os mais symptomas. O segundo sinal, por onde jul¬ guei
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98 Obʃervações Medicas Doutrinaes . guei tinha lombrigas , & que ellas eraõ a cauʃa de taõ lamentavel tragedia , foy , porque ʃoube que comendo bons alimentos , & em boa quantidade , eʃtava taõ magra , & desfigurada , que parecia o retrato da morte ; indicio certo de que as lombrigas comiaõ , & roubavaõ todo o alimento , de que a doente ʃe avia de ʃuʃtentar : nem faltàraõ outros sinaes , que confirmàraõ ʃer eʃta a doença ; porque humas vezes tinha o roʃto mui córado , & em breve eʃpaço de tempo ʃe transformava em denegrido ; outras vezes tinha a barriga dura como hũa pedra , & taõ inchada como hum odre ; outras vezes a tinha taõ molle , & branda como ʃe naõ tiveʃʃe tripas , nem ventre ; humas vezes tinha camaras muito ʃoltas , & exceʃʃivamente fedorentas ; outras vezes eʃtava taõ dureira , & impedernida , como hum seixo : entre dia , & noite lhe repetiaõ quatro , ou cinco inʃultos de febre com frialdade de extremos ; mas tudo ʃem ordem , nem regra certa : tinha alienações , & fatuidades no juizo por cauʃa dos vapores , que da materia corrupta , & reteùda no ventre ʃubiaõ à cabeça : padecia toʃʃe ʃecca , & alguns deʃmayos , quando as lombrigas ʃubindo ao eʃtomago , & naõ achando que comer picavaõ as tunicas delle : & para mayor certeza de que na tal doente avia lombrigas , ʃe ajuntava o ʃerem os mantimentos , de que uʃava , capazes de ʃe gerarem delles muitos bichos ; porque uʃava de muitas fruitas , de iguarias guiʃadas com muito aʃʃucar , & de todo o genero de doces , que a gula inventou para iʃca do goʃto , & liʃonja do appetite. 4 . Na cura deʃta enfermidade poʃto naõ duvidei ʃe avia de acudir com igual cuidado à febre , & às lombrigas ; acudi primeiro , & com mayor preʃʃa a deitar fóra as lombrigas , porque temi que ʃe me deʃcuidaʃʃe , poderiaõ romper os inteʃtinos , ou ferir os nervos , & cauʃar huma convulʃaõ , como certifica Paulo Gineta ; ( 2 . ) & para obviar todos eʃtes perigos , mandei pòr ʃobre o ventre o emplaʃtro ʃeguinte . Tomem de folhas de loʃna , fel da terra , artemija , & ortelãa , de cada couʃa deʃtas huma mão cheya , tudo ʃe pize
98 Obfervações Medicas Doutrinaes. guei tinha lombrigas, & que ellas erao a caufa de tao lamentavel tragedia, foy , porque foube que comen- do bons alimentos , & em boa quantidade, eftava taõ magra , & desfigurada, que parecia o retrato da mor- te ; indicio certo de que as lombrigas comiaõ, & rou- bavao todo o alimento , de que a doente feavia de fuf- tentar : nem faltarao outros finaes, que confirmarao fer efta a doença; porque humas vezes tinha o rofto mui córado, & em breve efpaço de tempo fe trans- formava em denegrido; outras vezes tinha a barriga dura como hua pedra, & tao inchada como hum odre; outras vezes a tinha tao molle, & branda comofe nao. tiveffe tripas, nem ventre; humas vezes tinha camaras muito foltas, & exceffivamente fedorentas ; outras vezes eftava taõ dureira , & impedernida, como hum feixo : entre dia, & noite lhe repetiao quatro , ou cin- co infultos de febre com frialdade de extremos ; mas , tudo fem ordem, nem regra certa: tinha alienações, & fatuidades no juizo por caufa dos vapores, que da; materia corrupta, & reteùda no ventre fubiao à cabe- ça : padecia toffe fecca, & alguns defmayos, quando as lombrigas fubindo ao eftomago, & nao achando que comer picavaõ as tunicas delle: & para mayor certeza de que na tal doente avia lombrigas, fe ajun- tava o ferem os mantimentos, de que ufava, capazes de fe gerarem delles muitos bichos ; porque ufava de muitas fruitas, de iguarias guifadas com muito affu- car , & de todo o genero de doces, que a gula inventou para ifca do gofto, & lifonja do appetite. 4. Na cura defta enfermidade pofto naõ duvi- dei fe avia de acudir com igual cuidado à febre, & as lombrigas ; acudi primeiro, & com mayor preffa a deitar fóra as lombrigas , porque temi que fe me def- cuidaffe, poderiaõ romper os inteftinos, ou ferir os nervos , & caufar huma convulfao , como certifica Paulo Gineta ; (2.) & para obviar todos eftes perigos, mandei por fobre o ventre o emplaftro feguinte. To- mem de folhas de lofna , fel da terra, artemija, & or- telãa , de cada coufa deftas huma mão cheya, tudo fe- pize . -
9s Obfervacoes Medicas Doutrinaes. guei tinha lombrigas, & que ellas era a caufa de ta Ilamentavel tragedia, foy , porque foube que comen- do bons alimentos , & em boa qnantidade, eftava ta magra , & desfigurada , que parecia o retrato da mor- te ; indiciocerto de que as lombrigas comia6, & rou- bava todo o alimento , de que a doente fe;avia de fuf tentar :.nem faltara outros finaes , que: confirmara fer efta a doenca; porque humasvezes tinhaorofto mui c6rado, & ein breve efpaco de tempo fe trans-: formava em denegrido; outras vezes tinha a barriga: dura como húa pedra, & ta inchada como hum odre; outras vezes a tinha ta molle, & branda comofe na tiveffe tripas, nem ventre; humas vezes tinha camaras muito foltas, & exceffivamente fedorentas : outras vezeseftava taödureira, & impedernida, como hum feixo : entre dia , & noite lhe repetia quatro , ou cin- co infultos de febre com frialdade de extremos ; mas . tudo fem ordem, nem regra certa: tinha alienacöes, & fatuidades no juizo por caufa dos vapores, que da. materia corrupta, & reteuda noventre fubiaö.acabe @ ga : padeciatoffe fecca, & alguns defmayos , quanda as lombrigas fubindo ao eftomago, & na achando que comer picava as tunicas delle: & para mayor certeza de que na tal doente avia lombrigas, fe ajun- tavaoferem os mantimentos, de que ufava, capazes de fe gerarem delles muitos bichos ; porque ufava de muitas fruitas, de iguarias guifadas com muito affu- car , & de todo o genero de doces, que a gula inventou para ifca do gofto, & lifonja do appetite. 4. : Na cura defta enfermidade pofto na duvi- dei fe avia deacudir com igual cuidado a febre, & as lombrigas ; acudi primeiro, & com mayor preffa a deitar fora as lombrigas , porque temi que fe me def. cuidaffe, poderia romper os inteftinos, ou ferir os nervos , & caufar huma convulfa , como certifca Paulo Gineta ; (2.) & para obviar odos eftes perigos mandei por fobreoventre oemplaftro feguinte. To- mem de folhas de lofna, fel da terra, artemija, & or-. telaa , de cada coufa deftas huma maocheya, tudofe pize
98 Obfervações Medicas Doutrinaes. guei tinha lombrigas, & que ellas eraô'a caufa de taó” lamentavel tragedia , foy , porque foube que comen- do bons alimentos , & em boa quantidade , eftava raõ magra , & desfigurada , que parecia o retrato da mor- te ; indicio certo de que as lombrigas comiaõ, & rou- bávaô todo o alimento , de que a doente fe.avia de fuf- tentar : nem faltãraô outros finaes, que confirmàraõ fer efta a doença; porque humas vezes tinha o rofto mui córado, & em breve efpaço de tempo fetrans-, formava em denegrido ; outras vezes tinha a barriga= dura como hãa pedra, & taô inchada como hum odre;. outras vezes a tinha taô molle, & branda comofe naõ. tiveíle tripas, nem ventre; humas vezes tinha camaras muito foltas, & exceflivamente fedorentas ; outras vezes eftava taô dureira , & impedernida , como hum feixo : entre dia , & noite lhe repetiaô quatro , ou cin- co infultos de febre com frialdade de extremos ; mas . tudo fem ordém , nem regra certa: tinha alienações, & fatuidades no juizo por caufa dos vapores, que da: materia corrupta , & reteida no ventre fubiao.à cabe-F ça: padeciatofle fecca , & alguns delmayos, quando as lombrigas fubindo ao eftomago, & naõ achando que comer picavaô as tunicas delle: & para mayor certeza de que na tal doente avia lombrigas, fe ajun-= tava o ferem os mantimentos, de que ufava, capazes de fe gerarem delles muitos bichos ; porque ufava de muitas fruitas, deiguarias guifadas com muito affu= car , & de todo o genero de doces, que a gula inventou para ifca do gofto , & lifonja do apperite. t 4. Nacura defta enfermidade poíto naô duvi- dei fe avia de acudir com igual cuidado à febre, &ãs lombrigas ; acudi primeiro, & com mayor preffa a deitar fora as lombrigas , perque temi que fe me def. cuidafle, poderiaô romper os inteftinos, ou ferir oz nervos , & caufar huma convulfaô , como certifica Paulo Ginera ; (2.) & para obviar todos eftés perigos, mandei pôr fobre o ventre o emplaftro feguinte. To- mem de folhas de lofna , fel da terra , artemija, & or-, telãa , de cada coufa deftas huma mão cheya , tudo fe- prê con Í Li !
98 Observaçones Medicas Doutrinaes. guei tinha lombrigas, & que ellas eraon a causa de taon lamentavel tragedia, foy, porque soube que comen- do bons alimentos, & em boa quantidade, estava taon magra, & desfigurada, que parecia o retrato da mor- te; indicio certo de que as lombrigas comiaon, & rou¬ bavaon todo o alimento, de que a doente se avia de sus- tentar: nem faltàraon outros sinaes, que confirmàraon ser esta a doença; porque humas vezes tinha o rosto mui corado, & em breve espaço de tempo se trans¬ formava em denegrido; outras vezes tinha a barriga¬ dura como huma pedra, & taon inchada como hum odre; outras vezes a tinha taon molle , & branda como se naon tivesse tripas, nem ventre; humas vezes tinha camaras muito soltas, & excessivamente fedorentas; outras vezes estava taon dureira, & impedernida, como hum seixo: entre dia, & noite lhe repetiaon quatro , ou cin- co insultos de febre com frialdade de extremos; mas tudo sem ordem, nem regra certa: tinha alienaçones, & fatuidades no juizo por causa dos vapores, que da materia corrupta, & reteùda no ventre subiaon à cabe- ça: padecia tosse secca, & alguns desmayos, quando as lombrigas subindo ao estomago, & naon achando que comer picavaô as tunicas delle: & para mayor certeza de que na tal doente avia lombrigas, se ajun- tava o serem os mantimentos, de que usava, capazes de se gerarem delles muitos bichos; porque usava de muitas fruitas, de iguarias guisadas com muito assu¬ car , & de todo o genero de doces, que a gula inventou para isca do gosto , & lisonja do appetite. 4. Na cura desta enfermidade posto nao duvi¬ dei se avia de acudir com igual cuidado à febre, & as lombrigas; acudi primeiro, & com mayor pressa a deitar fora as lombrigas, porque temi que se me des¬ cuidasse, poderiaon romper os intestinos, ou ferir os nervos, & causar huma convulsaon, como certifica Paulo Gineta; (2.) & para obviar todos estes perigos, mandei por sobre o ventre o emplastro seguinte. To- mem de folhas de losna, fel da terra, artemija, & or- telana, de cada cousa destas huma mano cheya, tudo se pize
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Obʃervaçaõ XV . 99 pize muito bem ; & se miʃture com hum pouco de vinagre forte , ajuntando a eʃta maʃʃa , de pò de myrrha , de azevre , de ʃemente de alexandria , de biʃnaga , de colloquintidas , & ferrugem de chaminè , de cada couʃa deʃtas meya oitava ; ordenandolhe que repetiʃʃe eʃte remedio cinco , ou ʃeis dias , & que toda a agua , que bebeʃʃe , foʃʃe cozida em panela de barro com duas mãos cheyas de folhas de eʃpinheiro alvar , a que os Latinos chamão Rhamnus ; & que às duas canadas da tal agua coada ajuntaʃʃem duas oitavas de limadura de corno de veado , & de ʃemente de biʃnaga , ou de pò de oʃʃo de canela de caõ , porque qualquer deʃtes oʃʃos tem grande virtude para matar lombrigas ; com tal condiçaõ , que naõ ʃejaõ queimados , porque ʃe o forem, jà naõ tem preʃtimo mais que para alimpar os dentes . Deʃta bebida lhe fiz uʃar muitos dias , eʃperando que mortos os bichos , ʃe tiraʃʃem as dores , convulʃoẽs , & a febre ; porèm foi a ʃorte taõ contraria ao intento que naõ lhe aproveitou a minha diligencia. Appellei entaõ para tres colheres de oleo de amendoas amargosas, em q eʃtiveraõ de infuʃaõ ʃeis grãos de pò subtilissimo de trociʃcos de Alandal : mas como nem eʃte remedio lhe valeʃʃe , foi preciʃo appellar para o ʃeguinte , que tenho por melhor de quantos inventou a Arte. Tomem de mercurio precipitado lavado meya oitava , de azevre ʃuccotrino huma oitava , de ʃemente de alexandria meya oitava , de pò de ortelãa dous eʃcropulos , de açafraõ hum eʃcropulo , de mechoacaõ , & ruibardo , de cada couʃa deʃtas oitava , & meya , de diagrydio ʃulphurado hum eʃcropulo , tudo ʃe miʃture muito bem , & ʃe façaõ pilulas , q ʃe repartiraõ em ʃeis partes iguaes , para ʃe tomarem ʃeis vezes em dias alternados mas como tambem eʃta diligẽcia foʃʃe baldada , ou porque as lombrigas eraõ tenazes , ou porque eʃtavaõ taõ eʃcondidas , & em lugares taõ diʃtantes , q zombàraõ de taõ admiravel remedio , appellei para a agua cozida com eʃcordio , grama , & meya onça de azougue : & porque finalmente vi que nem eʃte remedio obrava conforme a grande confiança , que nelle tinha , recorri
.99 Obfervação XV. pize muito bem, & fe mifture com hum pouco de vi- nagre forte, ajuntando a efta maffa , de pò de myrrha, de azevre, de femente de alexandria, de bifnaga , de colloquintidas, & ferrugem de chaminè, de cada cou- fa deftas meya oitava ; ordenandolhe que repetiffe ef- te remedio cinco, ou feis dias, & que toda a agua ; que bebeffe , foffe cozida em panela de barro com duas mãos cheyas de folhas de efpinheiro alvar, a que os Latinos chamão Rhamnus ; & que as duas canadas da tal agua coada ajuntaffem duas oitavas, de limadura de corno de veado, & de femente de bifnaga, ou de pò de offo de canela de cao, porque qualquer deftes offos tem grande virtude para matar lombrigas ; com tal condição, que nao fejao queimados, porquefeo forem , ja nao tem preftimo mais que para alimpar os dentes. Defta bebida lhe fiz ufar muitos dias, efperan- do que mortos os bichos, fe tiraffem as dores, convul- foes , & a febre; porem foi a forte tao contraria ao in- tento; que nao lhe aproveitou a minha diligencia. Ap- pellei então para tres colheres de oleo de amendoas amargofas, emy eftiverao de infufao feis grãos de pò fubtiliftimo de trocifcos de Alandal : mas como nem efte remedio lhe.valeffe, foi precifo appellar para o fe- guinte , que tenho por melhor de quantos inventou a. 'Arte. Tomem de mercurio precipitado lavado meya oitava,de azevre fuccotrino huma oitava, de femente dealexandria meya oitava, de pò de ortelãa dous ef- cropulos,de açafrão hum efcropulo,de mechoacào,& ruibarbo, de cada coufa deftas oitava & meya, de dia- grydio fulphurado hum efcropulo , tudo fe mifture muito bem, & fe façao pilulas , q fe repartirao em feis pa agiguaes, para fe tomarem feis vezes em dias alter- nabus? mas como tambem efta diligecia foffe baldada, ou porque as lombrigas eraõ tenazes , ou porque efta- vao tao efcondidas,& em lugares taõ diftantes, q zom- baraő de tañ admiravel remedio, appellei para a agua cozida com efcordio,grama, &meya onça de azougue: & porque finalmente ri que nem efte remedio obrava conforme a grande confiança, que nelle tinha , recor- ri
Obfervacao XV. i99 pize muito bein, & fe mifture com hum pouco de vi- nagreforte, ajuntandoa efta maffa , de po de myrrha, de azevre, dé femente de alexandria, debifnaga, de colloquintidas, & ferrugem de chamine, de cada cou- fa deftas meya oitava ; ordenandolhe que repetiffe cf- te remedio cinco, ou feis dias, & que toda a agua ; que bebeffe , foffe,cozida em panela de barro com duas maos cheyas defolhas de efpinheiro alvar, a que os Latinos chamao Rhamuus ; & que as duas canadas da tal agua coada ajuntaffem duas oitavas. de liinadura de corno dc veado, & defemente debifnaga, oude pö deoffo decanela de ca, porquc qualquer deftes offos temgrande virtude para matar lombrigas ; com tal condica, que nafeja qucimados, porquefco forem,ja natem preftimomais que paraalimpar os dentes.Deftabebida lhe fiz ufar muitos dias, efperan- do que mortos os bichos, fe tiraffem as dores, convul- fots, & a febre, porém foi a forte ta contraria ao in- tent,que na lhe aproveitou a minha diligencia. Ap- pellei ata paa tres colheres de gleo de amcndoas amargafas , enfg eftivera dinfufa feis graos de p fubtilitmo de trocifcos de Alandal : mas como nem efteremedio lhe.valeffe,foi precifo appellar para o fe- guinte,que tenho pormelhor dequantos inventou a Arte. Tomem de mercurio precipitado lavado meya oitava,de azevre fuccotrino huma oitava, de femente dealexandria meya oitava , de po de ortelaa dous ef- cropulos,de atafra hum efcropulo,de mechoaca,& ruibarbo , de cada coufa deftas oitava,& meya, de dia- grydio fulphurado hum efcropulo ; tudo fe mifture. nuitobem,& fe faca pilulas,qfe repartiraem feis. iguaes,para fe tomarem feis vezes em dias alter- naads. mas como tambem efta diligécia foffe baldada, Ou parque as lombrigas era tenazes , ouporgue efta- vaö taefcondidas,& em lugares ta diftantes, zom- bara de ta admiravel remedio , appellei para a agu4 cozida com efcordio,grama,&meya onca de azougue: & porque finalmente yi que nem.efte remedio obrava conforme agrande contianca, que nelle tinha , recor-
. Obfervação — XV. 99 pize muito bem, & fe mmifture eom hum pouco de vi- nagre forte, ajuntandoa efta maffa ; de pô de myrrha, de azevre , dê femente de alexandria, de bifnaga , de colloquintidas, & ferrugem de chaminê, de cada cou- fa deftas meya oitava; ordenandolhe que repetifle cf te remedio cinco, ou feis dias, & que toda a agua ; que bebefle , fofle cozida em panela de barro com duas mãos chevyas defolhas de cfípinheiro alvar, a que os Latinos chamão Rhamnus ; & que às duas cariadas da . tal agua coada ajuntaflem duas oitávas de limadura de corno de veado, & de femente de bifniga, oude: pô de oflo de canela de caô, porque qualquer deftes “oflos tem grande virtude pará matar lombrigas ; com tal condiçao, que naó fejaó queimados, porquefeo forem , jà naô tem preftimo mais que para alimpar os dentes. Defta bebida lhe fiz ufar muitos dias, efperan- do que mortos os bichos, fetiraffem as dores, convul- « foês , & a febre; porém foi a forte taóô contraria aoin-= - tentb,que naó lhe aproveitou à minha diligencia. Ap- pellei ekhitão ÁBh tres colheres de geo de amcendoas amargofás , emty eltiverao désntulaõ feis grãos de pô Tubtiliflimo de trocifcos de Alandal: mas comonem eftérêmiédio lhe valefle,foi precifo appellar para o fez . guinte, que tenho por melhor de quantos inventou a Arte. Tomem de mercurio precipitado lavado meya oitava,de azevre fuccotrino huma oitava, de femente dealexandria meya oitava, de pô de ortelãa dous ef- cropulos,de açafraó hum efcropulo,de mechoacãõ, & ruibarbo, de cada coufa deftas oitavaç& meya, de dia- . grydio fulphurado hum efcropulo , tudo fe mifture tanito bem , & fe façaó pilulas ; fe repartirão em feis PiBligipuaes, para fe tomarem feis vezes em dias alter« nad! mas como tambem efta diligécia foffe baldada, Ou porque as lombrigas eraó tenazes , odporque efta- vaõ taô efcondidas,& em lugares taó diftantes,q zom- bàraô de taô admiravel remedio , appellei para a agua cozida com efcordio,grama,&meya ença de azougue: & porque finalmente Yi que nem.efte remedio abrava cónforme a grande confiança, que nelle tinha , Seo o
99 Observaçaon XV. pize muito bem, & se misture com hum pouco de vi¬ nagre forte , ajuntando a esta massa , de pò de myrrha, de azevre, de semente de alexandria, de bisnaga, de colloquintidas, & ferrugem de chaminè, de cada cou¬ sa destas meya oitava; ordenandolhe que repetisse es- te remedio cinco, où seis dias, & que toda a agua , què bebesse, fosse cozida em panela de barro com duas mamos cheyas de folhas de espinheiro alvar, a que os Latinos chamano Rhamnus; & que às duas canadas da tal agua coada ajuntassem duas oitavas de limadura de corno de veado, & de semente de bisnaga, ou de pò de osso de canela de cao, porque qualquer destes ossos tem grande virtude parà matar lombrigas; com tal condiçaon, que naon sejaon queimados, porque se o forem, jà naon tem prestimo mais que para alimpar os dentes. Desta bebida lhe fiz usar muitos dias, esperan¬ do que mortos os bichos, se tirassem as dores, convul¬ soës, & a febre; porèm foi a sorte taon contraria ao in¬ tento, que naon lhe aproveitou à minha diligencia. Ap¬ pellei entaon pe a tres colheres de oleo de amendoas amargosas, emquae estiveraon de infusaon seis gramos de pò subtilissimo de trociscos de Alandal: mas como nem este remedio lhe valesse, foi preciso appellar para o se¬ guinte, que tenho por melhor de quantos inventou a Arte. Tomem de mercurio precipitado lavado meya oitava, de azevre succotrino huma oitava, de semente de alexandria meya oitava, de pò de ortelaa dous es- cropulos, de açafraon hum escropulo, de mechoacaon, & ruibarbo, de cada cousa destas oitavas & meya, de dia¬ grydio sulphurado hum escropulo, tudo se misture muito bem, & se façaon pilulas, que se repartiràon em seis pagiguaes, para se tomarem seis vezes em dias alter¬ nados mas como tambem esta diligencia fosse baldada, ou porque as lombrigas eraon tenazes, où porque esta¬ vaon taon escondidas, & em lugares taon distantes, que zom¬ baraon de taon admiravel remedio, appellei para a agua cozida com escordio, grama, & meya onça de azougue: & porque finalmente pi que nem este remedio obrava conforme a grande confiança, que nelle tinha, recor- ri
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100 Obʃervações Medicas Doutrinaes . ri para a agua de Aʃpar , da qual bebeo huma canada cada dia em jejum por nove dias continuos ; porque tinha lido em Henrique ab Heers , ( 3 . ) & em Domingos Duclos ( 4 . ) as admiraveis virtudes , que a agua Spadana tem , naõ ʃó para matar lombrigas , mas para hydropeʃias Aʃciticas , & leucophlegmaticas , em quanto ʃaõ novas , para os azedumes do eʃtomago , para os arrotos , vomitos , & ʃoluços , para as oppilações do figado , do baço , & veas meʃaraicas , para as ictericias , & ʃcirrhos naõ confirmados , para a melancolia flatuoʃa , para as dores dos rins , & da bexiga , para confortar o eʃtomago , para provocar a conjunçaõ , quando he diminuta , & para a ʃuʃpender , quando he muita ; para enxugar as purgações da madre , emendar a eʃterilidade, que tiver por cauʃa a muita humidade , ou inchaçaõ do utero , para as chagas , & excoriaçoẽs do membro , para a ʃarna , morfea , & todos os achaques da pelle , & para mil outras queixas ; & fundado nellas dei a ʃobredita agua , & naõ me ʃahio baldada a diligencia ; porque na tarde do primeiro dia que a tomou , depois de deitar muitas pequenas , deitou huma lombriga redonda , que tinha dous covados de comprido, hum dedo de groʃʃura , & de cor branca ; & logo ʃe deʃvanecèraõ os tremores , a febre , as ancias , & os mais ʃymptomas , & teve perfeitiʃʃima ʃaude . 4 . Deʃta Obʃervaçaõ aprendaõ os Medicos modernos duas couʃas. A primeira , que nos caʃos perigoʃos chamem logo aos Medicos velhos , & experimentados ; porque aos moços, & faltos de experiencia ( diz Hippocrates ) ( 5 . ) lhes ʃuccede o meʃmo , que aos máos pilotos , que quando governaõ a nào em mar bonança ʃe lhes naõ conhecem os erros que commettem , ainda que ʃejaõ grandes ; porèm quando a tempeʃtade he desfeita , conhecem logo todos os erros que fizeraõ , & que por ʃua culpa ʃe perdeo a nào , que lhes entregàraõ . Iʃto meʃmo ʃuccede aos Medicos principiantes , que quando curaõ achaques leves , & livres de perigo , ainda que façaõ alguns erros , naõ ʃe conhecem ; mas quando as doenças saõ grandes , & peri
100 Obfervações Medicas Doutrinaes. ri para a agua de Afpar, da qual bebeo huma canada cada dia em jejum por nove dias continuos; porque tinha lido em Henrique ab Heers , (3.) & em Domin- gos Duclos (4.) as admiraveis virtudes, que a agua Spadanà tem, naõ fó para matar lombrigas, mas para hydropefias Afciticas , & leucophlegmaticas , em quanto fao novas, para os azedumes do eftomago, para os arrotos, vomitos , & foluços, para as oppilações do figado,do baço,& veas mefaraicas, para as ictericias, & fcirrhos nao confirmados , para a melancolia flatuofa, para as dores dos rins, & da bexiga, para confortar o eftomago, para provocar a conjunção , quando he di- minuta, & para a fufpender , quando he muita ; para enxugar as purgações da madre, emendar a efterilida- de,que tiver por caufa a muita humidade, ou inchaçaõ do utero, para as chagas , & excoriaçoes do membro, para a farna, morfea, & todos os achaques da pelle, & para mil outras queixas ; & fundado nellas dei a fo- bredita agua, & nao me fahio baldada a diligencias porque na tarde do primeiro dia que a tomou, depois de deitar muitas pequenas , deitou huma lombrigare donda, que tinha dous covados de comprido, hum dedo de groffura, & de cor branca ; & logo fe defvat neceraõ os tremores, a febre, asancias, & os mais fymptomas, & teve perfeitiffima faude .. 4. Defta Obfervaçaõ aprendaõ os Medicos mo- dernos duas coufas. A primeira, que nos cafos perigo- fos chamem logo aos Medicos velhos, & experimen- tados ; porque aos moços , & faltos de experiencia (diz Hippocrates ) (5.) lhes fuccede o mefmo, que aos máos pilotos, que quando governaõ a nào em mar bo- nança, fe lhes nao conhecem os erros que commet- tem, ainda que fejao grandes ; porem quando a tem- peftade he desfeita, conhecem logo todos os erros que fizerao, & que por fua culpa fe perdeo a nào , que Lhes entregarao. Ifto mefmo fuccede aos Medicos principiantes , que quando curao achaques leves, & livres de perigo, ainda que façaõ alguns erros, nao fe conhecem ; mas quando as doenças fao grandes , & peri-
1oo Obfervacoes Medicas Doutrinacs. ri paraa agua de Afpar , da qual bebeo huma canada cada dia em jejum por nove dias continuos ;: porqua tinha lido em Henrique ab Heers , (3.) & em Domin gos Duclos (4.) as admiraveis virtudes, que a.agua Spadana tem, na fo para matar lombrigas , inas para hydropefias Afciticas , & leucophlegmaticas , em quantö fa novas,para os azedumes do eftomago,para os arrotos, vomitos , & folucos, para as oppilaces do figado,do baco,& veas mefaraicas,para as ictericias,& para as dores dos rins, & da bexiga, para confortar eftomago, para provocar a conjuncaö , quando he di- minuta, &para a fufpendcr , quando he inuita ; para enxugar as purgacöes da madre, emendar a efterilida- de,que tiver por caufa a muita humidade,ou inchaca do utero , para as chagas , & excoriacoés do membro, para a farna, morfea, & todos osachaques da pelle, & para mil outras queixas ; & fundado nellas dei a fo- bredita agua, & na me fahio baldada a diligencias porque na tardedo primeiro dia que a tomou, depois donda, que tinha dous covados decoinprido, Hum dedo de groffura, & de cor branca ; & logofedefva necérao os tremores, a febre, asancias, & os mais fymptomas,& teve perfeitiffima faude. 4: : Defta Obfervaca aprendaos Medicos mo- dernos duas coufas. A primeita, que nos cafos perigo- fos chamem logoaos Medicos velhos, & experimen- tados; porque aos mogos ,& faltos de experiencia (diz Hippocrates) (5.) hes fuccede o mefmo, que aos maos pilotos , que quando governaö a nao.em mar bo- nanca, fe lhes.naö conhecem os erros quc cormet- tem, ainda que fejaö grandes ; porem quando a tem-- peftade:he d&sfeita, conhecem logo todos os erros quc fizera,& que por fua culpa fe perdco a nao, que lhes cntregarao. Ifto mefmo fuccede aos Medicos principiantes, que quando cura achaques leves, & livrcs de perigo, ainda que faca alguns erros, na fc conhecem ; mas quando as doencas faógrandes , & peri-
: “100 Oblervações Medicas Doutrinaes. ri para agua de Afpar , da qual bebeo huma canada cada dia em jejum-por nove dias continuos;. porque tinha lido em Henrique ab Heers , (3.) & em Domin- gos Duclos (4.) as admiraveis virtudes, que a agua Spadana tem , naô fó para marar lombrigas, mas para hydgopefias Afciticas , & leucophlegmaticas , em quanto faô novas,para os azedumes do eftomago,para os arrotos, vomitos , & foluços, para as oppilações do figado,do baço,& veas mefaraicas,para as tétericias, & fcirrhos naô confirmados , para a melancolia flaruofa; para as dores dos rins, & da bexiga, para confortar á eltomago, para provocar a conjunçao, quando he di- minuta , & para a fufpender , quando he muita ; para enxugar as purgações da madre, emendar a efterilida- de,que tiver por caufa a muita humidade,ou inchaçaã do utero , para as chagas , & excoriaçoês do membro, para a farna, morfea, & todos os achaques da pelle, & para mil outras queixas ; & fundado nellas dei a fo- bredita agua, & naó me fahio baldada a diligenciã | porque na tarde do primeiro dia que a tomou, depois de deitar muitas pequenas , deitou huma lombrigáfé donda, que tinha dous covados de comprido, hum dedo de groflura, & de çor branca ; :& logo fe delval necerao os tremores, à febre, asancias, & os mais fympromas, & teve perfeitiflima faude.. ' 4: Defta Obfervaçaô aprendaõô os Medicos mo. dernos duas coufas. À primeifa, que nos cafos perigo". fos chamem logo aos Medicos velhos , & experimen-= tados; porque aos moços , & faltos de experiencia (diz Hippocrates) (5.) lhes fuccede o mefimo, que aos mãos pilotos, que quando governaô a não em mar bo- nança, fe lhes naô conhecem os erros que cormmert. tem, ainda que fejaô grandes ; porêm quando a tem- peftade:he dêsfeita, conhecem logo todos os erros que fizeraõ , & que por fua culpa fe perdeo a não, que lnes entregàraõ. Ito melmo fuccedé aos Medicos principiantes, que quando curaô achaques leves, & livres de perigo, ainda que façãô alguns erros, naõ feconhecem; mas quando as doenças faógrandes ,'& a o - peri ' (58M
100 Observaçones Medicas Doutrinaes. ri para a agua de Aspar, da qual bebeo huma canada cada dia em jejum por nove dias continuos; porque tinha lido em Henrique ab Heers, (3.) & em Domin- gos Duclos (4.) as admiraveis virtudes, que a agua Spadanà tem, naon só para matar lombrigas, mas para hydropesias Asciticas, & leucophlegmaticas, em quanto saon novas, para os azedumes do estomago, para os arrotos, vomitos , & soluços, para as oppilaçones do figado, do baço, & veas mesaraicas, para as ictericias, & scirrhos naon confirmados, para a melancolia flatuosa, para as dores dos rins, & da bexiga, para confortar o estomago , para provocar a conjunçao , quando he di- minuta, & para a suspender, quando he muita; para enxugar as purgaçones da madre, emendar a esterilida¬ de, que tiver por causa a muita humidade, ou inchaçaon do utero, para as chagas , & excoriaçoes do membro, para a sarna, morfea , & todos os achaques da pelle, & para mil outras queixas; & fundado nellas dei a so¬ bredita agua, & nao me sahio baldada a diligencia, porque na tarde do primeiro dia que a tomou , depois de deitar muitas pequenas, deitou huma lombrigare donda, que tinha dous covados de comprido, hum dedo de grossura, & de cor branca ; & logo se desva- necèraô os tremores, à febre, as ancias, & os mais symptomas, & teve perfeitissima saude. 4. Desta Observaçaon aprendaon os Medicos mo¬ dernos duas cousas. A primeifa, que nos casos perigo¬ sos chamem logo aos Medicos velhos, & experimen¬ tados; porque aos moços, & faltos de experiencia (diz Hippocrates) (5.) lhes succede o mesmo, que aos maos pilotos, que quando governaon a nào em mar bo¬ nança, se lhes naô conhecem os erros que commet¬ tem, ainda que sejaon grandes; porèm quando a tem- pestade he desfeita, conhecem logo todos os erros que fizerao , & que por sua culpa se perdeo a nâo , que lhes entregàrao. Isto mesmo succede aos Medicos principiantes, que quando curaon achaques leves, & livres de perigo, ainda que façaon alguns erros, naon se conhecem; mas quando as doenças saon grandes, & peri¬
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Obʃervaçaõ XV. 101 perigosas , ʃe conhecem logo os erros , & faltas que obràraõ. A ʃegunda couʃa , que devem aprender os principiantes , he , que quando virem que os remedios mais louvados , & qualificados com a experiencia , naõ fazem os effeitos , que delles ʃe eʃperaõ , lancem maõ de outros , aindaque ʃejaõ mais humildes , & menos affamados ; porque ʃuccede muitas vezes , que aquelles , de que ʃe faz menor caʃo , tiraõ a paz , & ʃalvo ao doente , & ao Medico , como ʃe deixa conhecer por eʃta Obʃervaçaõ , pois o que naõ puderaõ conʃeguir tantos , & taõ ʃingulares medicamentos , conʃeguio a agua de Aʃpar , que comparada com os admiraveis remedios , que acima tenho dito , parece couʃa de menor virtude . 6 . No meʃmo tempo em que eʃtava imprimindo eʃtas Obʃervaçoens, me chamàraõ para curar a huma doente , que àlem de ter huma febre ardentiʃʃima , padecia taõ terriveis ancias de coraçaõ , que naõ cabia na cama ; tinha a lingua taõ aʃpera , ʃecca , & denegrida, que parecia torrada; ajuntavaõse a estes symptomas humas dores no ventre de taõ deʃmedida grandeza , que lhe tiravaõ o ʃomno , & lhe cauʃavaõ hũ faʃtio indizivel , ainda as couʃas mais agradaveis ao palato ; e vendo eu que todas as diligencias da Arte ʃe tinhaõ baldado , ʃuʃpeitei que todos eʃtes ʃymptomas eraõ effeitos de lombrigas : & naõ me enganei ; porque dandolhe oito copos de huma agua , que inventou Joaõ Bautiʃta Leitaõ , deitou vinte & cinco , de comprimento de hum palmo , & algumas mayores , & foy o ʃucceʃʃo taõ prodigioʃo , que ʃe tirou a febre , as ancias , o faʃtio , & as dores , & ficou perfeitamente boa . A agua que lhe fiz tomar , & que foy ʃegredo meu , quero enʃinar agora para bem de todos , & he a ʃeguinte . Em huma canada de agua da fonte mandei cozer huma onça de raizes de grama machucada , & depois de coada a dita agua , lhe mandei ajuntar duas oitavas de pó de oʃʃo das canelas de caõ , huma oitava de ʃemente de biʃnaga , & outra de alexandria , & deʃta bebida bem vaʃcolejada mandei bebeʃʃe em jejum cinco onças , & ao ʃol poʃto outras cinco . Ad
Obfervaçaõ XV. 1 10İ perigofas , fe conhecein logo os erros, & faltas que obràraõ. A fegunda coufa, que devem aprender os principiantes, he, que quando virem que os remedios ' mais louvados , & qualificados com a experiencia, nao fazem os effeitos, que delles fe efperaõ, lancem maõ de outros , aindaque fejao mais humildes , & menos affa- mados; porque fuccede muitas vezes, que aquelles,de que fe faz menor cafo , tirao a paz , & falvo ao doente; & ao Medico, como fe deixa conhecer por efta Obfer- vaçaõ, pois o que naõ puderaõ confeguir tantos, & taỡ fingulares medicamentos, confeguio a agua de Afpar, que comparada com os admiraveis remedios, queaci- ma tenho dito, parece coufa de menor virtude. 6. "No mefmo tempo em que eftava imprimindo eftas Obfervaçoens , me chamaraõ para curar a huma doente, que àlem de ter huma febre ardentiffima , pa- decia tao terriveis ancias de coraçaõ, que naõ cabia na cama ; tinha a lingua tao afpera, fecca , & denegri- da, que parecia torrada ; ajuntavàofe a eftes fympto- mas humas dores no ventre de tao defmedida grande- za, que lhe tiravao o fomno, & lhe caufavao hű faftio indizivel , ainda as coufas mais agradaveis ao pala- to ; & vendo eu que todas as diligencias da Arte fe ti- nhao baldado, fufpeitei que todos eftes fymptomas eraõ effeitos de lombrigas : & naõ me enganei ; por- que dandolhe oito copos de huma agua , que inventou Joaõ Bautifta Leitao, deitou vinte & cinco, de com- primento de hum palmo, & algumas mayores, & foy o fucceffotao prodigiofo, que fe tirou a febre, as an- cias , o faftio , & as dores, & ficou perfeitamente boa. A agua que lhe fiz tomar, & que foy fegredo meu, quero enfinar agora para bem de todos, & he a feguin- te. Em huma canada de agua da fonte mandei cozer huma onça de raizes de grama machucada, & depois de coada a dita agua, lhe mandei ajuntar duas oitavas de pò de offo das canelas de cao, huma oitava de fe- mente de bifnaga, & outra de alexandria, & defta be- bida bem vafcolejada mandei bebeffe em jejum cinco onças, & aofol pofto outras cinco. Ad- 3 :
Obfervacao XV. 101 perigofas ;. fe conhecein logo os erros, & faltas que obrarao. A fegunda coufa, que devem aprender os princip iantes, he, que quandovirem que os remedios mais louvados, & qualificados com aexperiencia, na fazem os effeitos,que delles fe efpera,lancem ma de outros, aindaque feja mais humildes , & menos affa- mados; porque fuccede muitas vezes, que aquelles,de que fe faz menorcafo, tirao a paz, & falvo ao doente; & ao Medico, coino fe deixa conhecer por efta Obfer- vaca, pois o que na pudera confeguir tantos, & ta fingulares medicamentos,confeguio a agua de Afpar, que comparada com os admiraveis rémedios, que aci- ma tenho dito , parece coufa de menor virtude. 6. Nomefmo tempo emque eftava imprimindo eftas Obfervacoens , me chamara para curar a huma doente, que alem de ter huma febre ardentiffima , pa- decia taó terriveis ancias de coraca, que nacabia na cama ; tinha a lingua tao afpera , fecca , & denegri- da,queparecia torrada ; ajuntavafe aeftes fympto- mas humas dores no ventre de tao defmedida grande- za, que lhe tiravao fomno, & lhe caufava hu faftio indizivel , ainda as coufas mais agradaveis ao pala- to ; & vendo eu que todas as diligencias da Arte fe ti- nhao baldado, fufpeitei que todos eftes fymptomas era effeitos de lombrigas : & name enganei ; por- qae dandolhe oito copos de huma agua , que inventou Joa Bautifta Leita , deitou vinte & cinco , de com- primentode hum palmo, & algumas mayores, & foy ofucceffota prodigiofo, quefe tirou afebre, as an- cias, o faftio ,& as dores,& ficou perfeitainente boa: A agua que lhe fiz tomar, & quefoy fegredo meu, queraenfinar agora para bem de todos, & he afeguin- te. Em huma canada de agua dafonte mandei cozer huma onca de raizes de grama machucada, & depois de coada a dita agua , lhe mandeirajuntar duas oitavas de po de offo das canelas de ca, huma oitava defe mente de bifnaga, & outra de alexandria, & defta be- bida bem vafcolejada mandei bebeffe em jejum cinco onεas, & aofol pofto outras cinco. Ad-
1 N , Obliervaçãõ XV, 1OÍ perigofas ; fe conhecem logo 6s erros , & faltas que obràraó. A fegunda coufa, que devem aprender os princigiantes, he, que quando virem que os remedios mais lóuvados , & qualificados com a experiência, naõ fazemos effeitos,que delles fe efperãõ,lancem mas de “outros , aindaque fejãó mais humildes , & menos affa- inados; porque fuccede muitas vezes, que aquelles,de ue fe faz menor cafo, tiraô a paz , & falvo ao doente; & ao Medico, como fe deixa conhecer poi efta Obfer- vaçaõ, pois o que naó puderaóô confeguit tántos, & taõ fingulares medicamentos,confeguio a agua de Afpar, que comparada com os admiraveis remedios, que aci- má tenho dito, parece coufa de menor virtudes 6. “Nomelmo tempo em que eftava imprimindo eftas Obfervaçoens , me chamàraõ para curar a huma doente, que àlem de ter huma febre ardentiflima, pa- decia taô terríveis ancias de coraçaó, que naõ cabia nacama;; tinhãa lingua taô afpera , fecca , & denegri- dns que parecia torrada ; ajuntavãófe a eftes Í(ympro- mas humas dores no ventre de taô defmedida grande- za, que lhe tiravaõ o fornho , & lhe canfavaõ hã faftio indizivel , ainda as coufas mais agradaveis ao pala- to ; & vendo eu que todas as diligencias da Arte fe ti- nhaõ baldado, fis que todos eftes fymptomas - eraô effeitos de lombrigas: & naô me enganei; por- | «que dandolhe oito copos de huma agua , que inventou Joaô Bautifta Leitaô , deitou vinte & cinco , de com: primento de hum palmo , & algumas mayores, & foy o fucceffotaô prodigiofo, que fe tirou a febre, às an: cias , o faftio ,& as dores , & ficou perfeitâmente boa, A água que lhe fiz tomar, & quefoy fégredo meu, quero enfinar agora parabem de todos, & he afeguin-- - te. Em huma canada de agua da fonte mandei cozer huma onça de raizes de grama machucada, & depois de coada a dita agua , lhe mandeirajuntar duas oitavas . de pô deoflo das canelas de caó, huma oitava de ffe- mente de bifnaga , & outra dealexandria , & defíta be- bida bem valcolejada mandei bebefle em jejum eineo onças, & aolol pofto ontras cinco. . .+ ad nm - "
101 Observaçao XV. perigosas, se conhecem logo os erros, & faltas que obràrao. A segunda cousa, que devem aprender os principiantes, he, que quando virem que os remedios mais louvados, & qualificados com a experiencia, naon fazem os effeitos, que delles se esperaon, lancem maon de outros, aindaque sejaon mais humildes, & menos affa¬ mados; porque succede muitas vezes, que aquelles, de que se faz menor caso , tiraó a paz, & salvo ao doente, & ao Medico, como se deixa conhecer por esta Obser- vaçaon, pois o que naon puderaon conseguir tantos, & taon singulares medicamentos, conseguio a agua de Aspar, que comparada com os admiraveis remedios, que aci- ma tenho dito, parece cousa de menor virtude. 6. No mesmo tempo em que estava imprimindo estas Observaçoens, me chamàraon para curar a huma doente, que àlem de ter huma febre ardentissima , pa- decia taon terriveis ancias de coraçaon, que naon cabia na cama; tinha a lingua taon aspera, secca, & denegri- da, que parecia torrada; ajuntavaose a estes sympto¬ mas numas dores no ventre de taon desmedida grande¬ za, que lhe tiravaon o somno , & lhe causavaon hum fastio indizivel, ainda as cousas mais agradaveis ao pala¬ to; & vendo eu que todas as diligencias da Arte se ti- nhaon baldado, suspeitei que todos estes symptomas erao effeitos de lombrigas: & nao me enganei; por- que dandolhe oito copos de huma agua, que inventou Joaon Bautista Leitaon, deitou vinte & cinco, de com- primento de hum palmo, & algumas mayores, & foy o successo taon prodigioso, que se tirou a febre, as an¬ cias, o fastio, & as dores, & ficou perfeitamente boa. A agua que lhe fiz tomar, & que foy segredo meu, quero ensinar agora para bem de todos, & he a seguin¬ te. Em huma canada de agua da fonte mandei cozer huma onça de raizes de grama machucada, & depois de coada a dita agua, lhe mandeiajuntar duas oitavas de pò de osso das canelas de caó, huma oitava de se- mente de bisnaga , & outra de alexandria , & desta be- bida bem vascolejada mandei bebesse em jejum cinco onças, & ao sol posto outras cinco. Ad¬
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102 Obʃervações Medicas Doutrinaes . 7 . Advirto aos Medicos principiantes , que quando virem que as doenças naõ obedecem aos remedios bem applicados, conʃiderem que podem ʃer procedidas de lombrigas , & que levados deʃta conʃideraçaõ podem tentar algũs remedios contra ellas taõ ʃeguros , que ʃe naõ aproveitarem , não damnifiquem ; porque na minha conʃideraçaõ , a oitava parte da gente morre de lombrigas , como tenho obʃervado de muitos annos a eʃta parte , vendoas ʃair depois de mortos a hũs pelas ventas do nariz como formigueiros , a outros pela via trazeira . OBSERVAÇAM XVI De hum pleuriz baʃtardo de taõ rebelde , que deʃprezou aos remedios mais ʃingulares da Arte ; e depois de eʃtar a doente ungida, e ʃem acordo , lhe ʃobreveyo hum vomito de colera , com que ʃentio taõ grande alivio , que me animei a ʃeguir o meʃmo intento da natureza , dandolhe para iʃʃo tres onças de agua benedicta vigorada ; e obrou com ella taõ felizmente , que no meʃmo dia ʃarou , como ʃe foʃʃe obra de milagre. 1. Naõ poʃʃo deixar de referir hum caʃo , que me paʃʃou pelas mãos ha poucos dias , o qual quero dizer , naõ por vaidade , nem por moʃtrar , que com hum remedio , de quem os Medicos Portuguezes tem tanto medo, como ʃe foʃʃe refinada peçonha , curei a huma mulher eʃtando eʃpirando ; mas o refiro tão ʃómente para advertir aos profeʃʃores deʃta Arte , quam injuʃtamente procedem os que vendo os doentes em grandes perigos , os deʃemparaõ, & lhes naõ querem pòr maõ , como ʃe foʃʃem obrigados a dar vida a todos ; devendo os taes Medicos advertir , que a meʃma natureza buʃca muitas vezes caminhos por onde ʃe livra de graviʃʃimos perigos , ʃem que os Medicos intervenhaõ niʃʃo. Ma
102 Obfervações Medicas Doutrinaes. 7. Advirto aos Medicos principiantes, que quan- do virem que as doenças naõ obedecem aos remedios bem applicados, confiderem que podem fer procedi- das de lombrigas, & que levados defta confideraçao podem tentar algus remedios contra ellas tao feguros, que fe nao aproveitarem, não damnifiquem ; porque na minha confideraçao, a oitava parte da gente morre de lombrigas , como tenho obfervado de muitos an- nos a efta parte, vendoas fair depois de mortos a hus pelas ventas do nariz como formigueiros , a outros pela via trazeira. OBSERVAÇAM XVI. De bumpleuriz baftardo tao rebelde , que desprezou aos remedios mais fingulares da Arte ; ds depois de eftar a doente ungida, & fem acordo , the fobreveyo bum vo- mito de colera , com que fentio tao grande alivio, que me animei a Seguir o mefmo intento da natureza, dan- dolbe para iffo tres onças de agua benedicta vigorada; & obrou com ella tao felizmente, que no mefino dia farou, como fe foffe obra de milagre. I. N Ao poffo deixar de referir hum cafo, que me paffou pelas mãos ha poucos dias, o qual quero dizer , nao por vaidade, nem por moftrar, que com hum remedio, de quem os Medicos Portu- guezestem tanto medo, como fe foffe refinada peço- nha, curei a huma mulher eftando efpirando ; mas o refiro tão fomente para advertir aos profeffores defta Arte, quam injuftamente procedem os que vendo os doentes em grandes perigos, os defemparao, & lhes nao querem por mao , como fe foffem obrigados a dar vida a todos ; devendo os taes Medicos advertir, que a mefma natureza bufca muitas vezes caminhos por onde fe livra de graviffimos perigos , fem que os Medicos intervenhao niffo. Ma- -- - - 1 --
1o2 Obfervacoes Medicas Doutrinaes. 7. Advirto aos Medicos principiantes, que quan- do virem que as doencas naobedecem aos remedios bem applicados, confiderem que podem fer procedi- das de lombrigas, & que levados defta confideraca podem tentar algús remedios contra ellas ta feguros, que fe na aproveitarem, náo damnifiquemn ; porque na minha confideracao, a oitava parte da gente morre de lombrigas, como tenho obfervado de muitos an- nos aefta parte,vendoas fair depois de mortos a hus pelas ventas do nariz como formigueiros , a outro9 pela via trazeira. $$0 c0$$09$$0 0$5$SG 0$$0 $50 0$$0 09$005$6 9$80 $$0 OBSERV ACAM.XVI. De humpleuriz baftardo ta rebelde, que defprezou aos remedios mais /ngulares da Arte ; depois de eftar doente ungida; &fem acordo, lbe fobreveyo bum ve- mito de colera , com que.fentio ta grande alivio, que. mc.animei a feguir o mefmo intento da natureza, dan- dolbe para ifo tres ongas de agua benedica vigorada3 öbrou com ella ta felizmente, queno mefino dia farou, como fe foffe obra de milagre. A poffo deixar de referir hum cafo,que 1. N me paffou pelas maos ha poucos dias , qual quero.dizer , na por vaidade, nem por moftrar, que com hum remedio, de quem os Medicos Portu. guezestem tanto medo, como fe foffe refinada peco- nha, curei a huma mulher eftandoefpirando; mas refiro tao fomente para advertir aos profeffores defta Arte, quam injuftamente procedem os que.vendo os doentes em grandes perigos, os defempara, & lhes na querem por ma , como fe foffem obrigados a dar vida a todos; devendoos taes Medicos advertir, que a mefma natureza bufca muitas vezes caminhos por onde fe livra de graviffimos perigos , fem que os. Medicos intervenhao niffo. Ma-
102 Obfervações Medicas Doutrinaes. 7. Advirtoaos Medicos principiantes, que quan= do virem que as doenças naó obedecem aos remedios bem applicados, confiderem que podem fer procedi- das delombrigas , & quelevados defta confideraçaõ podem tentar algãs remedios contra ellas taô feguros, que fe naó aproveitarem, não damnifiquem ; porque . naminhaconfideraçaõ, a oitava parte da gente morre — delombrigas, como tenho obfervado de muitos an- nos a efta parte, vendoas fair depois de mortos a hãs pelas ventas do nariz como formigueiros , a eutros pela via trazeira. ' OBSERVAÇAM XVI. De bumpleuviz baflardo tao rebelde , que defbrezou aos. remedios mais fingulares da Arte ; & depou de eftar a doente ungida , & fem acordo , lhe fobreveyo bumves Imnito de colera , com que fêntio tao grande alivio, que me animei a feguir o mefino intento da natureza, dasr- dolbe para 1/fo tres onças de agua benedicta vigorada, & obrou com ella tao felizmente , quenomelino dia Savou, como fe folfe obra de milagre. 1. N Aô poífo deixar de referir hum cafo,que me paílou pelas mãos ha poucosdias, o qual quero dizer , naõ por vaidade, nem por moíltrar, que com hum remedio, de quem os Medicos Portu- ' guezestem tanto medo , como fe fofle refinada peço- nha, cureia huma mulher, eftando efpirando; mas a refiro tão fómente para advertir aos profeflores defta Arte, quaminjuftamente procedem os que vendo os doentes em grandes perigos , os defemparaóõ , & lhes naóô querem pôr maó , como fe foflem obrigados a dar vida atodos; devendo os taes Medicos advertir, que a mefma natureza bufca muitas vezes caminhos por onde fe livra de graviflimos perigos , fem que os Medicos intervenhao niflo. Ma- o TEA EEE a =
102 Observaçones Medicas Doutrinaes. 7. Advirto aos Medicos principiantes, que quan¬ do virem que as doenças naon obedecem aos remedios bem applicados, considerem que podem ser procedi¬ das de lombrigas, & que levados desta consideraçaon podem tentar alguns remedios contra ellas taon seguros, que se naon aproveitarem, nano damnifiquem; porque na minha consideraçaon, a oitava parte da gente morre de lombrigas, como tenho observado de muitos an¬ nos à esta parte, vendoas sair depois de mortos a hus pelas ventas do nariz como formigueiros, a outros pela via trazeira. OBSERVAQAM XVI. De hum pleuriz bastardo taoo rebelde, que desprezou aos remedios mais singulares da Arte; & depois de estar a doente ungida, & sem acordo, lhe sobreveyo hum vo¬ mito de colera, com que sentio tao grande alivio, que me animei a seguir o mesmo intento da natureza, dan¬ dolbe para isso tres onças de agua benedicta vigorada, & obrou com ella tao felizmente, que no mesino dia sarou, como se fosse obra de milagre. 1. NAon posso deixar de referir hum caso, que me passou pelas manos ha poucos dias, o qual quero dizer, nao por vaidade, nem por mostrar, que com hum remedio, de quem os Medicos Portu¬ guezes tem tanto medo , como se fosse refinada peço¬ nha, curei a huma mulher estando espirando; mas o refiro tamo somente para advertir aos professores desta Arte, quam injustamente procedem os que vendo os doentes em grandes perigos, os desemparaon, & lhes nao querem pòr mao, como se fossem obrigados a dar vida a todos; devendo os taes Medicos advertir, que a mesma natureza busca muitas vezes caminhos por onde se livra de gravissimos perigos, sem que os Medicos intervenhaon nisso. Ma¬
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Observaçaõ XVI. 103 2. Maria da Silva , moradora aos poyaes de Saõ Bento , teve huma pontada agudiʃʃima , que lhe tomava o lado eʃquerdo , & a naõ deixava deitar ʃobre elle hum ʃó inʃtante : para curarʃe da tal pontada mandou chamar (como he coʃtume da gente ordinaria) a hum barbeiro , o qual tanto que ouvio fallar em pontada de ilharga acompanhada com febre , & toʃʃe ʃecca , & difficuldade de eʃtar ʃobre a dor , conheceo que era hu pleuriz baʃtardo , & por iʃʃo a ʃangrou logo no braço enfermo , tres vezes no meʃmo dia , dandolhe outras tres no ʃegundo , continuando depois diʃʃo com duas cada dia , atè chegar ao numero de vinte ; & como o dito barbeiro visse que nem a dor, nem a febre, ou tosse aplacavaõ com huma evacuaçaõ taõ copiosa, antes se augmentavaõ, entendeo que a mulher morria; & porque lhe naõ imputaʃʃem o mào ʃucceʃʃo , nem o culpaʃʃem do ʃiniʃtro acontecimento , que juʃtamente receava , pedio com grande inʃtancia chamaʃʃem algum Medico , para que com o ʃeu conʃelho ʃe reʃolveʃʃe o que mais ʃe devia fazer. Chamouʃe logo hum ; o qual porque reconheceo o grande perigo da doença , ʃe retirou , & deʃpedio ʃem compaixaõ , nem piedade ; & por eʃta razaõ me chamàraõ , porque ouviraõ dizer que eu tinha particulares remedios , com que curava alguas doenças deʃeʃperadas. Chamáraõme : fui com effeito ver a miʃeravel enferma , & pondo os olhos nella , a achei com a reʃpiraçaõ preʃa , o roʃto incendido , o coraçaõ apertado , & affligida com dores : grande foy a duvida que tive para reʃolver ʃe a doença era pleuriz , ou peripneumonia , porque ʃaõ eʃtas duas doenças taõ parecidas , & ʃemelhantes entre ʃi , que algumas vezes ʃe enganàraõ com ellas Medicos de grande nome ; porque (como dizem muitos Doutores ) (1.) naõ he concedido a qualquer Medico ʃaber diʃtinguir as deʃʃemelhanças das couʃas ʃemelhantes , como nem das deʃʃemelhantes as ʃemelhanças : valeome porèm o ʃaber que ambas eʃtas doenças procedem das meʃmas cauʃas , como ʃaõ inflammações internas occaʃionadas de humores acidos exaltados de ponto , &
Observação XVI. 101 2. Maria da Silva, moradora aos poyaes de Sad Bento, teve huma pontada agudiffima , que lhe toma- va o lado efquerdo, & a nao deixava deitar fobre elle hum fó inftante : para curarfe da tal pontada mandou chamar (como he coftume da gente ordinaria ) a hum barbeiro, o qual tanto que ouvio fallar em pontada de ilharga acompanhada com febre, & toffe fecca, & difficuldade de eftar fobre a dor , conheceo que era hű pleuriz baftardo, & por iffo a fangrou logo no braço enfermo, tres vezes no mefmo dia, dandolhe outras tres no fegundo, continuando depois diffo com duas cada dia, atè chegar ao numero de vinte; & como o di- to barbeiro viffe que nem a dor , nem a febre, ou toffe aplacavao com huma evacuaçaõ tao copiofa, antes fe augmentavao, entendeo que a mulher morria; & por- que lhe nao imputaflem o mào fucceffo , nem o cul- paffem do finiftro acontecimento, que juftamente re- ceava, pedio com grande inftancia chamaffem algum Medico, para que com o feu confelho fe refolveffe o que mais fe devia fazer. Chamoufe logo hum; o qual porque reconheceo o grande perigo da doença , fe re- tirou, & defpedio fem compaixao, nem piedade ; & por efta razaõ me chamàraõ, porque ouviraõ dizer que eu tinha particulares remedios, com que curava alguas doenças defefperadas. Chamáraome : fui com effeito ver a miferavel enferma, & pondo os olhos nella, a achei com a refpiraçaõ prefa, o rofto incen- dido, o coraçaõ apertado, & affligida com dores: gran- de foy a duvida que tive para refolver fe a doença era pleuriz , ou peripneumonia , porque fao eftas duas doenças tao parecidas, & femelhantes entre fi, que algumas vezes fe enganaraõ com ellas Medicos de grande nome; porque (como dizem muitos Douto- res ) (1.) nao he concedido a qualquer Medico faber diftinguir as deffemelhanças das coufas femelhantes, como nem das deffemelhantes as femelhanças: valeo- me porèm o faber que ambas eftas doenças procedem das mefmas caufas, como fao inflammações internas occafionadas de humores acidos exaltados de ponto, -
Obferva$ao XVI. 103 2. Maria da Silva, moradora aos poyaesdeSa Bento, teve huma pontada agudiffima, que lhe toma- wa o ladoefquerdo, & a na déixava deitar fobre elle hum foinftante : para curarfe da tal pontada Bandou chamar (como he. cofrume da gente ordinaria ) a hum barbeiro, o qual tanto que ouvio fallar em pcntada de ilharga acompanhada com febre, & toffe fecca, & difficuldade de eftar fobre a dor , conheceo que era hü pleuriz baftardo, & por iffo a fangrou logo nobraco enfermo, tres vezesno mefino dia, dandolhe outras .tres no fegundo, continuando depois diffo com duas cada dia, até chegar ao numero de vinte;& como o di- to barbeiro viffe que neim a dor , nem a febre, ou toffe. aplacava com huma cvacuaca taö copiofa, antes fe augmentava; entendeo que a inulher morria; & por- que lhe na imputaffem omao fucceffo, nem ocul- paffem do finiftro acontecimento , que juftamente re. ceava , pedio com grande inftancia Chamaffém algum Medico, para que com ofeu confelho ferefolveffe que mais fe devia fazer. Chamoufe logo hum, oqual porque reconheceo o grande perigo da doenga , fe re- tirou,& defpediofemcompaixa, nein piedade; & por efta raza me chamara, porque ouvira dizer que eu tinha particulares remedios, com que curava alguas doencas defefperadas. Chamaraome : fui com cffeito ver a. miferavel enferma, & pondo os olhos nella, a achei com a refpiraca: prefa , o rofto incen- dido, o. coraca apertado,& affligida com dores: gran- de foy a duvida que tive para refolver'fea doenca era pleuriz , ou peripneumonia , porque fa eftas duas doencas ta parecidas, & femelhantes entre fi, que aigumas vezes fe enganarao com eilas Medicos de grande nome; porque (como dizem muitos Douto- res ) (1.) nao he concedidoaqualquer Medicofaber diftinguir as deffemelhancas das.coufas femelhantes, como nem das deffemelhantes äs feinelhancas: valeo. me porem o faber que ambas eftas doencas procedem das mefmas caufas , como fao iriflammacocs internas occafionadas de humores acidos exaltados de ponto, &
Oblervação XVI. fre) 2. Maria daSilva, moradora aos poyaes de Sad Bento , teve huma pontada agudiflima, que lhe tomas va o lado efquerdo, & a naó déixava deitar fobre elle hum fó inftante : para curarfe da tal pontada nsandou chamar (como he coftume da gente ordinaria )a hum barbeiro, o qual tanto que ouvio fallar em pentada deilharga acompanhada com febre, & tofletecca, & difficuldade de eítar fobre a dor , conheceo que era hú : pleuriz baftardo, & poriflo a fangrou logo no braço | enfermo, tres vezes no melmo dia , dandolhe outras tres no fegundo , continuando depois diflo com duas : cada dia, atê chegar ao numero de vinte;& como o di- to barbeiro vifle que nem a dor , nem a febre, ou toffe. aplacavaão com huma evacuaçaõ taô copiola, antes fe * augmentavaõ, entendeo que a mulher morria; & por- que lhe naó imputaflem o mão fucceflo ; nem o cul- paflem do finiftro acontecimento, que juftamente rem ceava, pedio com grande inftancia chamaflem algum . Medico, para que com ofeu confelho fe refolvefle o que mais fe devia fazer. Chamoufe logo hum; o qual porque reconheceo o grande perigo da doença , fere- ' S tirou, & defpedio fem compaixaô, nem piedade ; & ! por efta razaô me chamàraô, porque ouviraóô dizer que eutinha particulares remedios, com que curava algãas doenças defelperadas. Chamaáraôme: fui com effeito ver a. miferavel enferma, & pondo os olhos nella, a achei coma refpiraçaô prefa, o rofto incen* dido, ocoraçaó apertado,& affligida com dores: gran- “ defoy a duvida que tive para refolver'fe a doença era pleuriz , ou peripneumonii » porque faõ eftas duas. doenças taó parecidas, & femelhantes entre fi, que algumas vezes fe enganàraô com ellas Medicos de grande nome; porque (como dizem muitos Douto- res ) (1.) naó he concedido a qualquer Medico faber diftinguir as deflfemelhánças das coufas femelharites, como nem das deflemelhantes às femelhanças: valeo- me porém o faber que ambas eftas doenças procedem - das mefmas caufas, como faô iniflammações interrias occafionadas de humores ácidos exaltados de ponto, ! ! &
Observaçaon XVI. 103 Maria da Silva, moradora aos poyaes de Sao Bento, teve huma pontada agudissima, que lhe toma¬ va o lado esquerdo , & a naon déixava deitar sobre elle hum so instante: para curarse da tal pontada niandou chamar (como he costume da gente ordinaria) a hum barbeiro, o qual tanto que ouvio fallar em pontada de ilharga acompanhada com febre , & tosse secca , & difficuldade de estar sobre a dor, conheceo que era hû pleuriz bastardo, & por isso a sangrou logo no braço enfermo, tres vezes no mesmo dia, dandolhe outras tres no segundo, continuando depois disso com duas cada dia, atè chegar ao numero de vinte; & como o di- to barbeiro visse que nem a dor , nem a febre , ou tosse aplacavaon com huma evacuaçaon taon copiosa, antes se augmentavaon, entendeo que a mulher morria; & por- que lhe nao imputassem o mào successo, nem o cul¬ passem do sinistro acontecimento, que justamente re¬ ceava, pedio com grande instancia chamassem algum Medico, para que com o seu conselho se resolvesse o que mais se devia fazer. Chamouse logo hum; o qual porque reconheceo o grande perigo da doença , se re tirou, & despedio sem compaixao, nem piedade ; & por esta razaon me chamàrao, porque ouviraon dizer que eu tinha particulares remedios, com que curava alguas doenças desesperadas. Chamáraome: fui com effeito ver a miseravel enferma, & pondo os olhos nella, a achei com a respiraçaon presa, o rosto incen¬ dido, o coraçaon apertado, & affligida com dores: gran¬ de foy a duvida que tive para resolver se a doença era pleuriz, ou peripneumoniâ, porque saon estas duas doenças taô parecidas, & semelhantes entre si, que algumas vezes se enganàrao com ellas Medicos de grande nome; porque (como dizem muitos Douto¬ res ) (1.) naon he concedido a qualquer Medico saber distinguir as dessemelhanças das cousas semelhantes, como nem das dessemelhantes as semelhanças: valeo¬ me porèm o saber que ambas estas doenças procedem das mesmas causas, como saon inflammaçones internas occasionadas de humores acidos exaltados de ponto,
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104 Obʃervações Medicas Doutrinaes. & faltos da circulaçaõ neceʃʃaria , & que com os meʃmos remedios de ʃangrias , abʃorbentes , antacidos , & outros medicamentos volatilizantes , que reʃpeitem igualmente a ambas eʃtas doenças , ʃe devem curar ; por eʃta razão lhe ordenei o ʃeguinte cordeal ; ʃegredo que até eʃte tempo naõ quiz revelar a alguem ; porèm agora o quero publicar em ʃerviço do bem cõmum , por ʃer hum dos grandes remedios , com que tenho livrado a muitos de pleurizes mortaes. Tomai de caʃcas de raiz de bardana , que produz a flor vermelha , huma onça , machuquemʃe , & cozaõʃe a fogo brando, em panela de barro, com tres quartilhos de agua da fonte, & quando quizerem tirar a panela do fogo, lhe ajuntem huma maõ cheya de flores de papoulas , & como a agua eʃtiver vermelha , ʃe tire logo logo a panela do lume; por quanto a virtude da bardana , & das papoulas conʃiʃte nas partes volateis , & ʃuperficiaes das ditas ervas, & ʃe ferverem muito tempo, perdem a virtude , porque evapora com o fervor da agua : coada entaõ a agua com forte expreʃʃaõ, ʃe desfazem nella duas oitavas de coral preparado, huma onça de lambedor de flores de papoulas vermelhas , & duas oitavas do meu Bezoartico ; & deʃte maravilhoʃo cordeal lhe mandei beber , cade ʃeis horas, cinco onças : porèm como o tal remedio naõ fizeʃʃe aquelle grande proveito , que a experiencia me tinha moʃtrado infinitas vezes na cura dos pleurizes , entendi que as dores , & pontadas procediaõ de humor embebido na ilharga enferma, & levado desta racional conjectura, & dos conʃelhos de graviʃʃimos Authores , (2.) mandei ʃarjar a parte queixoʃa , & que em cima das ʃarjaduras freʃcas ʃe lhe applicaʃʃem, quatro vezes , ventoʃas com muito fogo , ou huma duzia de ʃanguiʃugas , para tirar o humor , que eʃtava reprezado no lugar doente : porque ʃe avemos de dar credito aos melhores Medicos do mundo , & às experiencias , naõ tem a Arte remedio mais efficaz para vencer aos pleurizes teimoʃos , do que ʃaõ as ventoʃas sarjadas, ou as ʃanguiʃugas , principalmente nos pleurizes baʃtar
104 Obfervações Medicas Doutrinaes. & faltos da circulação neceffaria , & que com os mef- mos remedios de fangrias, abforbentes, antacidos, & outros medicamentos volatilizantes, que refpei- tem igualmente a ambas eftas doenças, fe devem cu- rar ; por efta razão lhe ordenei o feguinte cordeal ; fe- gredo que até efte tempo naõ quiz revelar a alguem ; porèm agora o quero publicar em ferviço do bem cõ- mum, por fer hum dos grandes remedios, com que tenho livrado a muitos de pleurizes mortaes. Tomai de cafcas de raiz de bardana, que produz a flor ver- melha, huma onça, machuquemfe , & cozaofe a fo- go brando, em panela de barro, com tres quartilhos. de agua da fonte, & quando quizerem tirar a panela do fogo, lhe ajuntem huma maõ cheya de flores de papoulas, & como a agua eftiver vermelha, fe tire lo- go logo a panela do lume; por quanto a virtude da bardana, & das papoulas confifte nas partes volateis, & fuperficiaes das ditas ervas, & fe ferverem muito tempo, perdem a virtude, porque evapora com o fer- vor da agua : coada entaõ a agua com forte expreffao, fe desfazem nella duas oitavas de coral preparado, huma onça de lambedor de flores de papoulas verme- lhas , & duas oitavas do meu Bezoartico; & defte ma- ravilhofo cordeal lhe mandei beber, cada feis horas, cinco onças : porèm como o tal remedio naõ fizeffe aquelle grande proveito, que a experiencia me tinha moftrado infinitas vezes na cura dos pleurizes, enten- di que as dores , & pontadas procediaõ de humor em- bebido na ilharga enferma, & levado defta racional. conjectura, & dos confethos de graviffimos Autho- res, (2. ) mandei farjar a parte queixofa, & que em cima das farjaduras frefcas fe lhe applicaffem , quatro vezes, ventofas com muito fogo., ou huma duzia de fanguifugas, para tirar o humor, que eftava repreza- do no lugar doente : porque fe avemos de dar credito aos melhores Medicos do mundo, & às experiencias, nao tem a Arte remedio mais eficaz para vencer aos pleurizes teimofos, do que fao as ventofas farjadas, ou as fanguifugas , principalmente nos pleurizes baf- tar-
'1o4 Obfervacoes Medicas Doutrinaés. & faltos da circulatao neceffaria , & que com os mef- : mos remedios. de fangrias, abforbentes, antacidos, & outros medicamentos volatilizantes, que refpei- tem igualmente a ambas eftas doengas, fe devem cu- rar ; por efta razao lhe ordenei o feguinte cordeal ; fe- gredo que atéefte tempo naö quiz revelar a alguem ; porem agora o quero publicar em fervico do ben cö- mum, por fer hum dos grandesremedios, com que tenho.livrado a muitos de pleurizes mortaes. Tomai de cafcas de raiz debardana, que produz a flor ver- melha, huma onca, machuquemfe, & cozaofc a fo- go brando, em panela de barro, com tres quartilhos de agua dafonte, & quando quizerem tirar a panela dofogo, lhe ajuntem huma ma cheya de flores de papoulas, & conoa aguaeftiver vermelha , fe tire lo- go logo a panela do lume ; por quanto a virtude da bardana , & das papoulas confifte nas partes volateis, & fuperficiaes das ditas ervas, & feferverem muito tempo, perdem a virtude , porque evapora com o fer- vor da agua : coada entaö aagua com forte expreffa, fe desfazem nella duas oitavas de coral preparado, huma onca de lambedor de flores de papoulas verme- lhas, & duas oitavas do meu Bezoartico; & defte ma- ravilhofo cordeal lhe mandei beber, cada feis horas, cinco oncas: porém como o tal remedio nao fizeffe aquelle grande proveito, que a experiencia me tinha moftradoinfinitas vezes na cura dos pleurizes, enten- di que as dores , & pontadas procedia de humor em- bebido na ilharga enferma, & levado defta racional.: conjectura, & dos confelhos de graviffimos Autho- res, (z.) mandei farjara parte queixofa,& que em cima das farjaduras frefcas fe lhe applicaffem , quatro vezes, ventofas com muito fogo., ou huma duzia de fanguifugas , para tirar o humor , que eftava repreza- do no lugar doente : porque fe avemos de dar credito aos melhores Medicos do mundo, & as experiencias, naötem a Arte remedio mais efficaz para vencer aos pleurizes teimofos, do que faas ventofas farjadas, ou as fanguifugas , principalmente nos pleurizes baf-, tar-
104 Obfervações Medicas Doutrinaes. & faltos da circulaçaô neceffaria , & que com os mef- - mos remedios de fangrias, abforbentes , antacidos, & outros medicamentos volatilizantes, que refpei- tem igualmente a ambas eftas doenças, fe devem cu- rar ; por efta razão lhe ordenei o feguinte cordeal ; fe- gredo que até efte tempo naô quiz revelar a alguem; porêm agora o quero publicar em ferviço do bem cô- mum, por fer hum dos grandes remedios, com que tenho livrado a muitos de pleurizes mortaes. Tomai de cafcas de raiz de bardana, que produz a flor ver-' melha, huma onça, machuquemfe, & cozaóle a fo- go brando, em panela de barro, com tres quartilhos de agua da fonte , & quando quizerem tirar a panela do fogo, lhe ajuntem huma maõ cheya de flores de papoulas, & comoa agua eftiver vermelha , fe tire lo- go logo a panela do lume ; por quanto a virtude da ardana , & das papoulas confifte nas partes volateis, & fuperficiaes das ditas ervas, & fe ferverem muito tempo, perdem a virtude , porque evapora com o fer- vor da agua : coada entaô a agua com forte expreífaõ, fe desfazem nella duas oitavas de coral preparado, huma onça de lambedor de flores de papoulas verme- lhas , & duas oitavas do meu Bezoartico; & defte ma- ravilhofo cordeal lhe mandei beber, cada feis horas, cinco onças: porêm como o tal remedio naó fizefle aquelle grande proveito, que a experiencia me tinha. moltrado infinitas vezes na cura dos pleurizes, enten- di que as dores , & pontadas procediaô de humor em- bebido na ilhaiga enferma , & levado defta racional conjeétura, & dos confethos de graviflimos Autho- res, (2.) mandei farjara parte queixofa, & que em cima das farjaduras frelcas fe lhe applicaflfem, quatro vezes , ventofas com muito fogo, ou huma duzia de fanguifugas, para tirar o humor , que eftava repreza- do no lugar doente: porque fe avemos de dar credito aos melhores Medicos do mundo , & às experiencias,. naótem a Arte remedio mais efficaz para vencer aos pleurizes teimofos, do que faõas ventofas farjadas, ” ouas fanguilfugas, principalmente nos pleurizes baf-. tar
104 Observaçones Medicas Doutrinaes. & faltos da circulaçaon necessaria, & que com os mes¬ mos remedios de sangrias, absorbentes, antacidos, & outros medicamentos volatilizantes, que respei¬ tem igualmente a ambas estas doenças, se devem cu¬ rar ; por esta razao lhe ordenei o seguinte cordeal ; se- gredo que até este tempo nao quiz revelar a alguem; porèm agora o quero publicar em serviço do bem con- mum, por ser hum dos grandes remedios, com que tenho livrado a muitos de pleurizes mortaes. Tomai de cascas de raiz de bardana, que produz a flor ver- melha, huma onça, machuquemse, & cozaôse a fo¬ go brando , em panela de barro , com tres quartilhos de agua da fonte, & quando quizerem tirar a panela do fogo , lhe ajuntem huma mao cheya de flores de papoulas , & como a agua estiver vermelha , se tire lo- go logo a panela do lume; por quanto a virtude da bardana , & das papoulas consiste nas partes volateis, & superficiaes das ditas ervas, & se ferverem muito tempo, perdem a virtude, porque evapora com o fer- vor da agua : coada entaon a agua com forte expressaon, se desfazem nella duas oitavas de coral preparado, huma onça de lambedor de flores de papoulas verme- lhas, & duas oitavas do meu Bezoartico; & deste ma- ravilhoso cordeal lhe mandei beber , cada seis horas, cinco onças. porèm como o tal remedio nao fizesse aquelle grande proveito , que a experiencia me tinha mostrado infinitas vezes na cura dos pleurizes, enten¬ di que as dores , & pontadas procediaô de humor em- bebido na ilharga enferma, & levado desta racional conjectura, & dos conselhos de gravissimos Autho¬ res, (2.) mandei sarjar a parte queixosa, & que em cima das sarjaduras frescas se lhe applicassem, quatro vezes, ventosas com muito fogo, ou huma duzia de sanguisugas, para tirar o humor, que estava repreza¬ do no lugar doente : porque se avemos de dar credito aos melhores Medicos do mundo , & às experiencias, naon tem a Arte remedio mais efficaz para vencer aos pleurizes teimosos, do que sao as ventosas sarjadas, ou as sanguisugas, principalmente nos pleurizes bas¬ tar¬
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Observaçaõ XVI. 105 tardos, qual era eʃte ; pois o doente naõ podia eʃtar ʃobre a pontada : mas como naõ lhe aproveitaʃʃem as ventoʃas , entrei em conʃideraçaõ , que nem todas as pontadas de ilharga procedem de huma meʃma cauʃa , nem obedecem todas ao meʃmo remedio ; & por iʃʃo , aʃʃim como ʃerà erro o naõ ʃangrar algumas vezes , ʃerà outras vezes erro o ʃangrar ʃempre : vendo pois que as dores deʃta enferma humas vezes offendiaõ as coʃtelas mendoʃas , outras vezes o peito , outras vezes as claviculas , humas vezes o lado eʃquerdo , outras o direito , conjecturei que dores taõ eʃpalhadas , & errantes naʃciaõ de flatos, & vapores acrimonioʃos , & por iʃʃo mandei ʃe fomentaʃʃe a parte offendida com eʃpirito de vinho alcanforado , polvorizado por cima com incenʃo , & pòs de cominhos , por quanto eʃte remedio he admiravel reʃolutivo de flatos : mas como tambem ʃe baldaʃʃe eʃta diligencia , lhe aconʃelhei que tomaʃʃe , duas vezes no dia , vinta grãos de antimonio diapleuritico bem-reverberado , & miʃturado com outros vinte de pò de flores de papoulas , tres onças de agua de cardo ʃanto , & trinta grãos de almiʃcar finiʃʃimo ; porque àlem da grande virtude , que eʃte remedio tem , de deʃcoalhar o ʃangue , promove a circulaçaõ dos humores , abre os pòros , facilita a tranʃpiraçaõ , & provoca copioʃamente o ʃuor ; o que tudo he mui util , & conducente para curar o pleuriz : mas como nem eʃte remedio , nem os que ʃe tinhaõ feito aproveitaʃʃem , appellei para o mais admiravel medicamento que os homens ʃouberaõ depois que Deos creou o mundo , qual he o oleo da entrecaʃca da abobora , cuja receita enʃinei a fazer na Obʃservaçaõ quarta fol. 33. porem foy a dor taõ teimoʃa, q ʃe naõ rendeo à minha diligencia ; daqui fiquei entendendo que a doença era incuravel , ou deʃconhecida , & com muita razaõ o cuidei aʃʃim ; porque , como diz Galeno , (3.) quanto os remedios , que coʃtumaõ aproveitar a todos , naõ fazem o proveito , que delles ʃe eʃpera , o temos por mào sinal , aindaque nem por iʃʃo avemos de deʃemparar aos doentes , nem perder as eʃperanças ; antes devemos buʃ
Obfervaçao: XVI. IOS tardos, qual era efte; pois o doente nao podia eftar fobre a pontada : mas como nao lhe aproveitaffem as ventofas, entrei em confideraçao, que nem todas as pontadas de ilharga procedem de huma mefma caufa, nem obedecem todas ao mefmo remedio; & por iffo, affim como ferà erro o nao fangrar algumas vezes , fe- .rà outras vezes erro o fangrar fempre : vendo pois que as dores defta enferma humas vezes offendiao as cof- telas mendofas , outras vezes o peito, outras vezes as claviculas , humas vezes o lado efquerdo , outras o di- reito , conjecturei que dores tao cfpalladas , & er- rantes nafciao de flatos, & vapores acrimoniofos ; & por iffo mandei fe fomentaffe a parte ofendida coin efpirito de vinho alcanforado, polvorizado por cina com incenfo, & pos de cominhos , por quanto efte re- medio he admiravel refolutivo de fatos: mas como tambem fe baldaffe efta diligencia , lhe aconfelhei que tomaffe, duas vezes no dia, vinte grãos de anti- monio diapleuritico bem-reverberado, & mifturado com outros vinte de pò de flores de papoulas , tres on- ças de agua de cardo fanto, & trinta grãos de almifcar finiffimo; porque,àlem da grande virtude, que efte re- medio tem,de defcoalhar o fangue, promove a circula- çaõ dos humores , abre os pòros , facilita a tranipira- çao, & provoca copiofamente ofuor ; oque tudo he mui uril , & conducente para curar o pleuriz : mas co- mo nem efte remedio, nem os que fe tinhao feito apro- veitaffem,appellei para o mais admiravel medicamen- to que os homens fouberao depois que Deos creou o mundo, qual he o oleo da entrecafca da abobora, cuja receita enfinei a fazer na Obfervaçao quarta fol. 33. port foy a dor tao teimofa , q fe nao rendco à minha diligencia; daqui fiquei entendendo que a doença era incuravel, ou defconhecida, & com muita razão o cai- dei affim; porque, como diz Galeno, (3.) quando os re- medios, que coftumaõ aproveitar a todos, nao fazem o proveito, que delles fe efpera, o temos. por mao fi- nal , aindaque nem por iffo avemos de defemparar aos doentes , nem perder as efperanças; antes devemos buf- . 1 1 ! 1 . .
Obfervacao: XVI. 10s tardos, qual era efte ; pois o doente napodia cftar fobre a pontada : mas como na lhe aproveitaffem .as ventofas, entreiem confideraca, que neni todas as pontadas de ilharga procedem dehuma mefma caafa; nemobedecem todas ao mefmoremedio; & por iffo: affim como fera erro o naö fangrar algumas vczes , fe- ra outras vezes erro:o fangrar fempre : vendo pois que .as dores. defta enferina humas vezes offendia as cof- telas mendofas,outras vezes o peito, outras vezcs as claviculas, humas vezes o ladoefquerdo, outras di- reito , conjecturei quc dores ta clpalladas , & cr- rantes nafcia de flatos,& vapores acrimoniofos ; & por iffo mandei fe fomentaffe a parte offendida coin efpiritode vinhoalcanforado, polvorizado por cinia com incénfo, & pos de cominhos , por quanto efte re- medio hc admiravel reiolutivo de Aatos : nas como tambem fe baldaffe eita diligencia , lhe aconfelhei que tomaffe, duas vezes no dia, vinte graos de anti- moniodiapleuritico bem-reverberado, & nifturado com outros vinte de po de ffores de papoulas , tres n- as de agua de cardofanto, & trintagraos de almifcat: finiffimo; porque,alem da grande virtude, que efte re- medio ten,de defcoalhar o fanguc,promove a circulaa Ga dos humores, abre os poros, facilita a tranipira- ca,:& provoca capiofamente qfuor ; oque tudo he mui util , & conducentepara'curar o pleuriz : mas co- mo nemefte remedio;nem os que fe tinhao fcito apro- veitaffein,appellei para o mais adiniravel mcdicainen- to que os homena foubera depois que Deos.crcou o mundo, qual he o oleo da entrecafca da abobora, cuja receita enfinei afazer na Obfervaca quarta fol. 33: por fa foy a dor ta tcimofa , q fe na rendco a minha diligencia, daqui fquei entendendoque a doenca cra incuravel,ou defconhecida,&.com muita razao o cui- dei affim;porque, como diz Galeno, (3.) quando os re medios, que coftuma aproveitar a todos, na fazem oproveito, que delles fe efpera, o temos. por mao fi- nal , aindaque nem por iffo avemos de defemparar aos doentes , nem perder as efpérangas; antes devemos buf-
tardos, qual era efte; pois o doente naó podia cftar fobre a pontada : mas como naó lhe arproveitaffem as ventofas, entreiem cônfideraçaõ, que nem todas as pontadas de ilharga procedem de huma nela caufa, nem obedecem todas ào melino remedio; & por iffo, aflim como ferà erro o naô fangrar alsumas vezes , fe- .rà outras vez& erro o fangrar fempre: vendo pois que .as dores defta enferma humas vezes offendiaô as cof- telas mendofas , outras vezes o peito, outras vezes as claviculas , humias vezes o lado efquerdo, outras o di reito , conje&turei que dores taô clpalizadas , & er- rantes nafciaô de flatos, & vanores áàcrimoniotos ; & por iflo mandei fe fomentafie a parte offendida coin efpirito de vinho alcanforado, polvorizado por einia com incênio, & pôs de cominhos , por quanto efte re- medio he admiravel refolutivo de datos: mas como tambem fe baldaffe eita diligencia , lhe aconfelhei que tomafle, duas vezes no dia, vinte grãos de anti- monio diapleuritico bem reverberado , & mifturado com outros vinte de pô de flores de papoulas , tres on- ças de agua de cardo fanto, & trinta grãos de almifcat finiflimo; porque,àlem da grande virtude, que efte re- medio tem,de defcoalhar o fangue,promovea circula. çaô dos humores , abre os pôros , tacilita á tranivira- çaô , & provoca copiofamente o fuor ; oque tudo he mui util, & conducente,paçá curar o pleuriz : mas co- mo nemefte remedio,nem os que fe tinhãô feito apro- veitaflem,appellei para o mais admiravel medicamen- to que os homens fouberaô depois que Deos creou o mundo, qual he o oleo da entrecafea da abobora, cuja receita enfinei a fazer na Obfervaçaõ quarta fol. 33. poftia foy a dor taô teimola , 4 fe naô rendeo à minha diligência ; daqui fiquei entendendo que a doença era a. incuravel, ou defconhecida,& com muita razã6 o cui- : dei aflim;porque, como diz Galeno, (3. ) quando os re- medios, que coftumaõ aproveitar a todos, naô fazem o proveito, que delles fe efípera , otemos. por mão fi- nal , aindaque nem por iffo avemos de defemparar aos doentes , nem 'perder às efpéranças ; antés devemos * : a buf. .
Observaçaon 105 XVI. tardos, qual era este; pois o doente naon podia estar sobre a pontada: mas como naon lhe aproveitassem as ventosas, entrei em consideraçaon, que nem todas as pontadas de ilharga procedem de huma mesma causa, nem obedecem todas ao mesmo remedio; & por isso, assim como serà erro o naon sangrar algumas vezes, se¬ rà outras vezes erro o sangrar sempre: vendo pois que as dores desta enferma humas vezes offendiaò as cos¬ telas mendosas, outras vezes o peito, outras vezes as claviculas, humas vezes o lado esquerdo, outras o di¬ reito, conjecturei que dores taô espalsiadas, & er¬ rantes nasciaon de flatos, & vapores acrimoniosos, & por isso mandei se fomentasse a parte offendida com espirito de vinho alcanforado, polvorizado por cima com incenso, & pòs de cominhos, por quanto este re¬ medio he admiravel resolutivo de flatos: mas como tambem se baldasse esta diligencia, lhe aconselhei que tomasse, duas vezes no dia, vinte graos de anti- monio diapleuritico bem reverberado, & misturado com outros vinte de pò de flores de papoulas, tres on- ças de agua de cardo santo, & trinta granos de almiscar finissimo; porque, àlem da grande virtude, que este re- medio tem, de descoalhar o sangue, promove a circula¬ çaon dos humores, abre os poros, facilita à tranipira¬ çaon, & provoca copiosamente o suor; o que tudo he mui util, & conducente para curar o pleuriz: mas co¬ mo nem estè remedio, nem os que se tinhaon feito apro¬ veitassem, appellei para o mais admiravel medicamen¬ to que os homens souberaon depois que Deos creou o mundo, qual he o oleo da entrecasca da abobora, cuja receita ensinei a fazer na Observaçaon quarta fol. 33. por foy a dor taon teimosa, que se naon rendeo à minhà diligencia; daqui fiquei entendendo que a doença era incuravel, ou desconhecida, & com muita razao o cui¬ dei assim; porque, como diz Galeno, (3.) quando os re¬ medios, que costumaon aproveitar a todos, nao fazem o proveito, que delles se espera , o temos. por mào si- nal, aindaque nem por isso avemos de desemparar aos doentes, nem perder as espéranças, antes devemos bus¬
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106 Obʃervações Medicas Doutrinaes. buʃcar outros caminhos, & fiar de Deos o bom ʃucceʃʃo ; pois ʃò elle póde remediar noʃʃos trabalhos , & reʃtituirnos da morte à vida. Vendo eu pois , que a doença tinha deʃprezado aos medicamentos mais efficazes , diʃʃe comigo : E ʃe quizeʃʃe Deos que eʃta dor procedeʃʃe de humores reteudos no estomago , como ʃe póde imaginar, pois a enferma ʃe queixa de grandiʃʃimo faʃtio , & amargor de boca , com deʃejos continuos de vomitar ! no qual caʃo a agua benedicta leva tanta ventagem a todos os mais remedios, quanta levaõ as luzes do Sol a todas as eʃtrellas. 3. Succedeo pois que eʃtando eu lutando com eʃtes penʃamentos, & com animo deliberado a darlhe a agua benedicta , lhe deo repentinamente hum vomito taõ copioʃo , que todos os que a eʃtavaõ ajudando a bem morrer , entendèraõ que acabava de eʃpirar ʃuffocada com o dito vomito ; mas taõ longe eʃteve de perigar , que antes teve logo taõ conʃideravel alivio , que me animei a darlhe tres onças de agua benedicta vigorada, com que evacuou taõ copioʃa, & felizmente que no mesmo dia ficou boa , & livre de toda a queixa. 4. Pela qual razaõ aconʃelho aos Médicos principiantes , que naõ receem, nem ʃe acovardem em fazer o que entenderem que convem para a ʃaude dos doentes , ainda que niʃʃo lhes cauʃem alguma dor , ancia , ou enfado ; principalmente quando virem que os naõ podem livrar da ʃepultura , ʃenaõ com remedios fortes , & efficazes porque verdadeiramente as doenças grandes, naõ ʃe podem curar com remedios pequenos ; antes ʃe devem uʃar os mais poderoʃos , paraque vençaõ a enfermidade , que ʃem iʃʃo ʃe naõ venceria ; ʃeguindo niʃto o conʃelho de Ugo (4.) 5. Naõ duvido que achamos algus enfermos taõ covardes, & melindroʃos , que antes querem morrer mil vezes , que tomar algum remedio deʃagradavel , ou que lhes cauʃe qualquer molʃtia ; & pelo contrario achamos outros , que ʃó a fim de ter ʃaude , & melhorar brevemente , ʃe ʃujeitaõ a qualquer grande traba
106 Obfervações Medicas Doutrinaes. bufcar outros caminhos, & fiar de Deos o bom fuc- ceffo ; pois fo elle pode remediar noffos trabalhos , & reftituirnos da morte à vida. Vendo eu pois, que a · doença tinha defprezado aos medicamentos mais ef- ficazes , diffe comigo : E fe quizeffe Deos que efta dor. procedeffe de humores reteùdos no eftomago, como fe pode imaginar, pois a enferma fe queixa de gran- diffimo faftio, & amargor de boca, com defejos con- tinuos de vomitar ! no qual cafo a agua benedicta leva' tanta ventagem a todos os mais remedios, quanta le- vao as luzes do Sol a todas as eftrellas. 3. Succedeo pois que eftando eu lutando com ef-" tes penfamentos , & com animo deliberado a darlhea agua benedicta, lhe deo repentinamente hum yomi- to taõ copiofo, que todos os que a eftavaõ ajudando a bem morrer , entenderao que acabava de efpirar fuf- focada com o dito vomito ; mas tao longe efteve de perigar , que antes teve logo taõ confideravel alivio, que me animei a darlhe tres onças de agua benedicta vigorada, com que evacuou tao copiofa , & felizmen- te, que no mesmo dia ficou boa, & livre de toda a queixa. 4. Pela qual razao aconfelho aos Medicos prin- cipiantes , que nao receem, nem fe acovardem em fa- zer o que entenderem que convem para a faude dos · doentes, ainda que niffo lhes caufem alguma dor, an- " cia, ou enfado; principalmente quando virem que os · naõ podem livrar da fepultura, fenaõ com remedios fortes , & efficazes ; porque verdadeiramente as doen- ças grandes nao fe podem curar com remedios pę- : quenos ; antes fe devem ufar os mais poderofos, para- que vençaõ a enfermidade, que fem iffo fe nao vence- ria ; feguindo nifto o confelho de Ugo (4.) 5. Naõ duvido que achamos algús enfermos ta@ covardes, & melindrofos, que antes querem morrer mil vezes, que tomar. algum remedio defagradavel, ou que lhes caufe qualquer molestia; & pelo contra- rio achamos outros, que fo a fim de ter faude, & me- lhorar brevemente , fe fujeitao a qualquer grande tra- ba-
1o* Obfervacoes Medicas Doutrinaés.: bufcar outros caminhos, & far de Deosobomfuc- ceffo , pois fo elle p6de remediar noffos trabalhos , & reftituirnos da morte a vida. Vendo eu pois, que a doenca tinha defprezado aos mcdicamentos mais ef- ficazes , diffe comigo : E fe quizeffe Deos que efta dor. procedeffe de humores reteüdos no eftomago, como fe póde imaginar, pois a enferma fe queixa de gran- diffimo faftio, & amargor de boca, com defejos con- tinuos de vomitar ! no qual cafoa agua benediata leva tanta ventagem a todos os imais remedios, quanta le- vaö as luzes do Sol a todas as eftrellas. Succedeo pois que eftando eu lutando com ef- - 3. tes penfamentos , & com animo deliberado a darlhea agua benedicta, lhe deo repentinamente hum yomi- to ta copiofo, que todos os que a eftava ajudando a bem,morrer , entendera que acabava de efpirar fuf focada com o dito vomito; mas ta longe efteve de perigar , que antes teve logota confideravel alivio, que me animei a darlhe tres ongas de agua benedicta vigorada , com que evacuou ta copiofa , & felizmen- te, que no mefmo dia fcou boa,& livre de todaa queixa. 4. Pela qual razaö aconfelhoaos Medicos prin- cipiantes , que na receem, nem fe acovardem em fa zer o que entenderem que convem para afaudedos doentes , ainda que niffolhescaufem alguma dor, an- : cia, ou enfado principalmentequandovirem que os na podemtivrar dafepultura , fena com remedios fortes, & efficazes; porque verdadeiramente as doen- quenos , antes fe devem ufar os mais poderofos, para- que vencao a enfermidade , que fem iffo fe na vence ria ; feguindo niftoo confelho de Ugo (4:) 5. Na duvidoque achamos algús enfermos ta covardes, & melindrofos, que antes querem morrer mil vezes, que tomar.algum remedio defagradavel, ou quelhes caufe qualquer moleftia; & pelcontra- rio achamos outros, que f6 a fim de ter faude, &:me- Thorar brevemente , fe lujeita a qualquer grande tra- ba-
* .106 Obfervações Medicas Doutrinaes.. bufcar outros caminhos, & fiar de Deos o bom fuc=-- ceflo ; pois fó elle póde remediar noflos trabalhos , & reftituirnos da morre à vida. Vendo eu pois, que a: . doença tinha defprezado aos medicamentos mais ef- ficazes , diffe comigo: E fe quizefle Deos que eltador - procedefle de humores reteúdos no eftomago, como fe póde imaginar, pois a enferma fe queixa de grân- diffimo faftio , & amargor de boca, com defejos con- tinuos de vomitar! no qual cafoa agua benedi&ta leva tanta ventagem a todos os mais remedios, quanta les vaõas luzes do Sol atodas as eftrellas. . 3. Succedeo pois que eftando eu lutando com ef= - tes penfamentos , & com animo deliberado a darlhea água benedi&ta , lhe deo repentinamente hum vomi- to taô copiofo, que todos os que a eftavaõ ajudando a bem,morrer , entendêraó que acabava de efpirar fuf.. focada com odito vomito; mas taó longe efteve de perigar , que antes teve logo taó confideravel alivio, que me animei a darlhe tres onças de agua benedi&ta. vigorada, com que evacuou taóô copiofa ; & felizmen+ , -te, que no mefmo dia ficou boa, & livre de todãa queixa. : : 4. Pela qual razaõô aconfelhoaos Medicos prin- cipiantes, que não receem , nem fe acovardem emfa- zer o que entenderem que convem para afaude dos * “doentes, ainda que niflolhescanfem alguma dor, an- * cia, ou enfado;; principalmente quando virem que os ; | - naõ podem livrar dafepultura, fenaô com remedios: fortes , & efficazes ; porque verdadeiramente as doen- ças grandes naô fe podem curar com remedios pe- ;; quenos ; antes fe devem ufar os mais poderofos, para» que vençaõ a enfermidade, que femiflo fe naó vehce- ria; feguindo nifto o confelho de Ugo (4.:) 5. “Naô duvido que achamos algús enfermos taã covardes, & melindrofos , que antes querem morrer mil vezes, que tomar algum remedio defagradavel, ou que lhes caufe qualquer moleftia; & pelô contra- rio achamos outros , que fó a im de ter faude, &:me- lhorar brevemente , fe futjeiraó a qualquer grande tra- - : ba-
106 Observaçones Medicas Doutrinaes. buscar outros caminhos, & fiar de Deos o bom suc¬ cesso; pois só elle pode remediar nossos trabalhos, & restituirnos da morte à vida. Vendo eu pois, que a doença tinha desprezado aos medicamentos mais ef¬ ficazes, disse comigo : E se quizesse Deòs que esta dor procedesse de humores reteùdos no estomago, como se pode imaginar, pois a enferma se queixa de gran- dissimo fastio, & amargor de boca, com desejos con- tinuos de vomitar! no qual caso a agua benedicta leva tanta ventagem a todos os mais remedios, quanta le¬ vaon as luzes do Sol a todas as estrellas. 3. Succedeo pois que estando eu lutando com es- tes pensamentos, & com animo deliberado a darlhe a agua benedicta, lhe deo repentinamente hum vomi- to taon copioso, que todos os que a estavaon ajudando a bem, morrer, entendèraon que acabava de espirar suf¬ focada com o dito vomito; mas taon longe esteve de perigar, que antes teve logo taô consideravel alivio, que me animei a darlhe tres onças de agua benedicta vigorada, com que evacuou tao copiosa , & felizmen- te, que no mesmo dia ficou boa, & livre de toda a queixa. 4. Pela qual razaon aconselho aos Medicos prin¬ cipiantes, que naon receem, nem se acovardem em fa¬ zer o que entenderem que convem para a saude dos doentes, ainda que nisso lhes causem alguma dor, an¬ cia, ou enfado; principalmente quando virem que os naon podem livrar da sepultura, senaon com remedios: fortes, & efficazes; porque verdadeiramente as doen- ças grandes naô se podem curar com remedios pe¬ quenos; antes se devem usar os mais poderosos, para¬ que vençaon a enfermidade, que sem isso se naon vence- ria; seguindo nisto o conselho de Ugo (4. 5. NNaon duvido que achamos alguns enfermos taon covardes, & melindrosos, que antes querem morrer mil vezes, que tomar algum remedio desagradavel, ou que lhes cause qualquer molestia; & pelò contra- rio achamos outros, que só a fim de ter saude, & me¬ lhorar brevemente, se sujeitaon a qualquer grande tra- ba¬
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Obʃervaçaõ XVI. 107 balho . Doente conheço eu , que com mais facilidade ʃofrerá que lhe cortem hum graõ inchado , ou hum lobinho deʃmedido , do que ʃofrer toda a vida andar com taes pezos. 6. Aquelles , a quem parecer que foi temeridade dar hua purga em hum pleuriz taõ perigoʃo , vaõ ver a minha Polyanthea da ʃegunda impreʃʃaõ no cap. 47. fol. 309 num.3 , & acharáõ os muitos Doutores que as deraõ, aʃʃim em pleurizes deʃcendentes como nos aʃcendentes , & em todos aquelles , em quem achavão carga no eʃtomago , ou grandes amargores na boca , ou deʃejos de vomitar : & ainda que (de regra ordinaria) o remedio mais louvado nos pleurizes ʃejaõ as ʃangrias , & meu Cordeal Antipleuritico , as ventoʃas ʃarjadas , & as ʃanguiʃugas applicadas ʃobre o lugar enfermo ; comtudo alguns pleurizes ha , nos quaes ʃaõ mais bem ʃuccedidas as purgas , principalmente as do quintilio , como por eʃta Observaçaõ ʃe deixa ver , & pelas authoridades , que eʃtão apontadas no lugar referido , ʃe acaba de confirmar. 7. Das ʃanguiʃugas deitadas ʃobre o lugar da pontada pleuritica tenho viʃto tantas maravilhas , que pudera eʃcrever livros inteiros ; baʃte por todas a q obʃervei na muito Religioʃa ʃenhora ʃoror Clara Maria da Aʃʃumpçaõ , a qual ʃendo Abbadeça do Calvario, teve hum pleuriz baʃtardo rebelde , & invencivel , que naõ lhe aproveitando dezanove ʃangrias , ʃarou por modo de milagre , com sanguisugas, que lhe deitei tres vezes ʃobre o lugar applicando na primeira vez quinze , na ʃegunda doze , & na terceira dez, & deʃte modo a livrei da morte no anno de 1703. OBSER-
Obfervação XVI. 107 balho. Doente conheço eu, que com mais facilidade fofrerá que lhe cortem hum grao inchado; ou hum lobinho defmedido, do quefofrer toda a vida andar .com taes pezos. 6. Aquelles, a quem parecer que foi remeridade dar hua purga cin hum pleuriz tao perigofo, vaõ ver a minha Polyanthea da fegunda impreflao no cap. 47. fol. 309.num. 3, & acharao os muitos Doutores que as derao, affim em pleurizes defcendentes , como nos af- cendentes , & em todos aquellesy em quem achavão carga no eftomago, ou grandes amargores na boca, on defejos de vomitar : & ainda que ( de regra ordina- ria ) o remedio mais louvado nos pleurizes fejaõ as Sangrias, du jeu Cordeal Antipleuritico, as ventofas farjadas , & as fanguifugas applicadas fobre o lugar enfermo ; comtudo alguns pleurizes ha , nos quaes lao mais bem fuccedidas as purgas , principalmente as do quintilio, como porefta Obfervaçao fe deixa ver, & pelas authoridades, que eftao apontadas no lugar referido, fe acaba de confirmar. 7. Das fanguifugas deitadas fobre o lugar da pon- sada pleuritica tenho vifto tantas maravilhas , que pudera efcrever livros inteiros; bafte por rodas a q ob- fervei na muito Religiofa fenhora Soror Clara Maria da Affumpçao, a qual fendo Abbadeça do Calvario, teve ham pletkiz baltar Safebelde , & invencivel, que nao lhe aproveitando dezanove fangrias, faron por modo de milagre, com languifugas, que lhe dei- tei tres vezes Sobre o lugar queixolo, applicando na primeira vez quinze, na fegunda doze, & na terceira dez , tedefte modo a livrei da morte no anno de 1703. , : 1 : : : . ; . S S 1 OBSER-
Obfervacao XVI: : 167 balho. Doente conheco eu,que com mais facilidade fofrera que lhe cortem hum gra inchado, ou hum lobinho defmedido, do quefofrer toda a vida andar .com taes pezos: 6. Aquclles, aquer parecer que foi temeridade dar húa purgacinhun pleuriz ta perigofo , va ver a minha Polyanthea da fegunda impreffa n cap. 47: fol. 309.num. 3: & achara os inuitos Doutores que as dera , affim em pleurizes defcendentes , como nos af- cendentes, & em todos aquelles,em quem achaväo carga no eftomago, qugrandes"amargores naboca, ou defejos dc vonitar : & ainda que ( de regra ordina- ria ) o remadio mais louvado nos.pleurizea feja as fangrias , &eu Cordeal Antipleuritico, as veatofas farjadas , & as fanguifugas applicadas fobre o lugar enfermo ; comtudo alguns pleurizes ha , nos quaes faö mais bemfuccedidas as purgas , principalmente as do quintilio, como por efta Obfervaca fe deixa ver. & pelas authoridades, que efta apontadas no lugar referido , fe acaba de confrmar. 7. Das fanguifugas deitadasfobre.o lugar da pon. tada pleuritica renho vifto tantas maravilhas , :que pudera efcrever livros inteiros; bafte por todas a g ob- Tervei na muito Religiofa fenhora Soror Clara Maria da Aflumpca, a quat fendo AbbadecadoCalyario, teye lum ptetaz baftar arebelde,&invencivel, que na lft aproveirant dezanove fangrias, faron por modo demilagre, cotn fanguifugas, quc lhe dei- tei tres vezesfobre:oiugar seixofo.applicando na primeira ycz quimze, nafegunda doze, & na trceira dez,&deftcmodoalivrei damorreno anno de1703- OBSER-
' primeira vez quinze, na fegunda doze, Obfervação XVI: 1657 balho. Doente conheço eu , que com mais facilidade fofrerá que lhe correm hum graô inchado ; ou hum lobinho defmedido, do quefofrer toda a vida andar com taes pezos. : | | 6. Aqielles, aquem parecer que foi retieridade dar ha purga'ém hum pleuriz taô perigolo y VaG ver a minha Polyanthea da fegunda impreflaô no cap. 47: fol. 309.num. 3, & acharãó os muitos Doutares que as degaô , aflim em pleurizes defcendentes, como nos al. cdllentes , & em todos aquellesisem quem achavão carga no eftomago, ou grândes'âmargores na boca, ou defejos de vomitar : & átnda que ( de regra ordina- ria )o remedio mais louvado nos pleurizes fejaô as fangrias , Meu Cordeal Antipleuritico, as ventofas farjadas , & asfanguifugas applicadas fobre o lugar enfermo ; comtuda alguns pleurizes ha , nos quaes - 1aô mais bem fuccedidas as purgas , principalmente as do quintilio , como por efta Obfervaçaõ fe deiza ver, & pelas authoridades , que eftaó apontadas no lugar referido ; feacaba deconfirmar. — 7. Dasfanguifugas deitadas fobre o lugar da pon- tada pleuritica tenho vifto tantas maravilhas , .que pudera elcrever livros inteiros; bate por rodas a q ob- fervei na mnito Religiofa fenhora Soror Clara Maria da Aflumpçaõ, a qual fondo Abbadeçãdo Calvario, teve hum plengis baita ebelde , & invencível, que nao UM aproveitanti dezanove fangrias, farou por modo de milagre, com. epnguilfugas, ue lhe dei- tei tres vezes fobee olugar Beta: Masarr icando nº na terceira dez, fêdefie modo a livrei damorreno anno de 1703.
Observaçao XVI. 107 balho. Doente conheço eu, que com mais facilidade sofrera que lhe cortem hum grao inchado, ou hum lobinho desmedido, do que sofrer toda a vida andar com taes pezos. 6. Aquelles, a quem parecer que foi temeridade dar huma purga em hum pleuriz taon perigoso, vaon ver a minha Polyanthea da segunda impressaon no cap. 47. fol. 309. num. 3. & acharaon os muitos Doutores que as deraon, assim em pleurizes descendentes, como nos as¬ cendentes, & em todos aquelles em quem achavamo carga no estomago, ou grandes amargores na boca, ou desejos de vomitar: & ainda que (de regra ordina¬ ria) o remedio mais louvado nos pleurizes sejaon as sangrias, oseu Cordeal Antipleuritico, as ventosas sarjadas, & as sanguisugas applicadas sobre o lugar enfermo; comtudo alguns pleurizes ha, nos quaes saon mais bem succedidas as purgas, principalmente as do quintilio, como por esta Observaçaon se deixa ver. & pelas authoridades, que estaon apontadas no lugar referido, se acaba de confirmar. 7. Das sanguisugas deitadas sobre o lugar da pon¬ tada pleuritica tenho visto tantas maravilbias, que pudera escrever livros inteiros; baste por todas a que ob¬ servei na muito Religiosa senhora Soror Clara Maria da Assumpçaon, a qual seudo Abbadeça do Calvario, orebelde, & invencivel, teve hum pleuciz bastar que naon Ilie aproveitano dezanove sangrias, saron por modo de milagre, com sanguisugas, que lhe dei¬ tei tres vezes sobre olugar queixoso, applicando na primeira vez quinze, na segunda doze, & na terceira dez, & deste modo a livrei da morte no anno de 1703. OBSER¬
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108 Observações Medicas Doutrinaes. OBSERVAÇAM XVII. De huma respiraçaõ difficultosa , acompanhada com estertor na garganta , hydropesia universal , intercadencias de pulsos , somno interrompido , & outros symptomas , que representavaõ aver hum turberculo no bofe . 1. Os casos que acontecem na Medicina fóra de toda a esperança , & raras vezes vistos , costumaõ causar grande admiraçaõ a todos : porque quem visse a Antonio Paes de Sande padecer dous annos huma difficuldade de respiraçaõ , acompanhada de hum estertor no peito taõ frequente , que nem podia fallar com pressa , nem moverse com ligeireza , aindaque fosse pela planicie mais lhana : quem visse que toda a circunferencia do corpo estava igualmente inchada , & tumorosa : quem visse que naõ podia estar deitado sem suffocarse : quem visse os pulsos intercadentes , & a respiraçaõ taõ presa , que a naõ podia tomar sem ter a cabeça erguida , & o corpo levantado , entenderia que este enfermo combatido de tanto inimigos juntos nem poderia ter saude , nem deixar de morrer às mãos de tão poderosos contrarios : porèm ainda que estes symptomas fossem todos mortaes , & o doente tambem entendesse que o eraõ , nem por isso perdeo as esperanças de cobrar a saude perdida , mayormente depois que ouvio dizer que eu tinha remedios particulares , com que curava algumas doenças , que estavaõ postas no rol das incuraveis : resolveose pois o sobredito enfermo a chamarme em quatorze de Abril de 1687 . Bem conheci a gravidade da doença , & que os symptomas , que padecia , eraõ mui proprios das hydropesias do bofe ; porque lhe naõ faltavá final algum daquelles, que costumaõ acompanhar a huma enfermidade taõ mortal , que ninguem escapa della , & muito menos os homẽs ve-
108 Obfervações Medicas Doutrinaes. OBSERVAÇAM XVII. De huma refiraçao difficultofa, acompanhada com ef- tertor na garganta, hydropefia univerfal, inter- cadencias de pulfos , fomno interrompido, outros Symptomas , que representavao aver bum tuberculo no bofe. 1. O S cafos que acontecem na Medicina fó- ra de toda a efperança, & raras vezes vif- tos , coftumao caufar grande admiraçao a todos : por- que quem viffe a Antonio Paes de Sande padecer dous annos huma difficuldade de refpiraçaõ, acompanha- · da de hum eftertor no peito tao frequente , que nem podia fallar com preffa , nem moverfe com ligeire- za , aindaque foffe pela planicie mais lhana: quem viffe que toda a circunferencia do corpo eftava igual- mente inchada , & tumorofa : quem viffe que nao podia eftar deitado fem fuffocarfe : quem viffe os pulfos intercadentes , & a refpiracao tao prefa, que a nao podia tomar fem ter a cabeça erguida, & o cor- po levantado, entenderia que efte enfermo combati- do de tantos inimigos juntos nem poderia ter faude, nem deixar de morrer às mãos de tão poderofos con- trarios : porem ainda que eftes fymptomas foffem to- dos mortaes, & o doente tambem entendeffe que o erao, nem por iffo perdeo as efperanças de cobrar a faude perdida, mayormente depois que ouvio dizer que eu tinha remedios particulares, com que curava algumas doenças , que eftavao poftas no rol das incu- raveis: refolveofe pois o fobredito enfermo a chamar- me em quatorze de Abril de 1687. Bem conheci a gravidade da doença, & que os fymptomas, que pa- decia , eraõ mui proprios das hydropefias do bofe; porque lhe nao faltava final algum daquelles, que cof- tumao acompanhar a huma enfermidade taõ mortal, que ninguem efcapa della, & muito menos os homes ve- ! i !
108 Obfervacöes Medicas Doutrinaes. OBSERVACAM xV1I. De buma refpirasa difficultofa, acompanbada com ef- tertor na garganta, bydropefia univer/al, inter- cadcncias de pulfos, fomno interrompido, outros/ynptomas , que reprefentava aver bun tubercubo no bofe. S cafos que acontecem na Medicina f6. tos , coftumao.caufar grande admiracaöatodos : por- que quem viffe a Antonio Paes de Sandepadecer dous annos huma difficuldade de refpiraca, acompanha- da de humeftertor no peito ta frequente ,que nem podia fallar com preffa , nem moverfe.com ligeire- za , aindaque foffe pela planicie mais lhana: quem viffe que toda a circunferencia do corpo eftava iguai- mente inchada , & tumorofa : quem viffe quc.na podia eftar deitado.fem fuffocarfe :. quem viffe os pulfos intercadentes, & a refpiraga ta prefa, que a nao podia tomar fem ter a cabeca erguida , & o corr po levantado, entenderia que.efte enfermo. combati-- nem deixar de.morrer asmaos de tao poderofos con- trarios: porem ainda queeftes fymptomas foffem to- dos mortaes, & o doente tambem entendeffeque ° era, nem por iffo perdeo as efperancas decobrar a faude perdida, mayormente depois que ouvio.dizer que eu tinha remedios particulares , com qué curava algumas doencas , que eftava poftas.norol das incu- raveis: refolveofe pois o fobredito enfermo a chamar- me em quatorze de Abril de 1687. Bem conheci a gravidade dadoenca, & que os fymptomas, que pa- decia ; era mui proprios das hydropefias do bofe; porque lhe na faltava final algum daquelles,que cof tumaö acompanhar a humaenfermidade tao mortal, que ninguem efcapa della,& muito menos os hom&s ve
108 Obfervações Meticas Doutrinaes. AE 500 «0150 en S On ca S0r-a0 SS On an G Oo ans GOo co SS Om ans o cab Oo ao SED Ada OBSERVAÇAM XVII. De buma velbiraçao difficultofa , acompanhada com ef. tertor na garganta , hydropefia. univer/al, inter. - cadencias de pulfos , Somno interrompido, & — outros /ymptomas, que rveprefêntavao aver bum tubercubonobofe. Cc > 1. S cafos que acontecem na Medicina fó- | O ra detoda a efperança,& raras vezes vif- tos , coftumaõ caufar grande admiraçaáa todos: Por que quem vifle a Antonio Paes de Sande padecer dous annos huma difficuldade de refpiraçaô, acompanha- -« da dehumetftertor no peito taô frequente , que nem podia fallar com preffa , nem moverfe com ligeire- za , aindaque forle pela planicie mais lhana: quem vifle que toda acircunferencia do corpo eftava igual. mente inchada , & tumorofa : quem vifle que. naõ podia eftar deitado fem fuffocarfe : quem vifle os 'pulfos intercadentes , & a refpiraçaõ taó prefa, que a naô podia tomar fem ter a cabeça erguida , &ocor- .. polevantado, entenderia que efte enfermo combari- do de tantos inimigos.) nem poderia ter faude, nem deixar de morrer àstiãos de tão poderofos con- trarios: porêmainda queceftes fymptomas foflem to- dos mortaes, & o doente tambem entendefle que o eraô, nem por iflo perdeo as efperanças de cobrar a faude perdida, mayormente depois que ouvio dizer que eu tinha remedios particulares , com que cnfava, algumas doenças , que eftavaô poftasnorol dasincu- raveis: refolveofe pois o fobredito enfermo a chamar- me em quatorze de Abril de 1687. Bem conheci a gravidade dadoença, & que os fymptomas, que pa- decia , eraô mui proprios das hydropefias do bofe; porque lhe naô faltavá final algum daquelles,que cof-. tuma6 acompanhar a huma enfermidade taô mortal, que ninguem efcapa della , & muito menos os homês ; vês »
108 Observaçones Medicas Doutrinaes. OBSERVAQAM XVII. De huma respiragaon difficultosa, acompanhada com es¬ tertor na garganta, hydropesia universal, inter¬ cadencias de pulsos, somno interrompido, & outros symptomas, que representavaon aver hum tuberculo no bofe. S casos que acontecem na Medicina fo¬ ra de toda a esperança, & raras vezes vis- tos, costumaon causar grande admiraçaon a todos: por que quem visse a Antonio Paes de Sande padecer dous annos huma difficuldade de respiraçaon, acompanha¬ da de hum estertor no peito tao frequente, que nem podia fallar com pressa, nem moverse com ligeire¬ za, aindaque fosse pela planicie mais lhana: quem visse que toda a circunferencia do corpo estava igual- mente inchada, & tumorosa: quem visse que naon podia estar deitado sem suffocarse: quem visse os pulsos intercadentes, & a respiraçaon taon presa, que a naon podia tomar sem ter a cabeça erguida, & o cor¬ po levantado , entenderia que este enfermo combati- do de tantos inimigos juntos nem poderia ter saude , nem deixar de morrer às maos de tano poderosos con¬ trarios: porèm ainda que estes symptomas fossem to¬ dos mortaes, & o doente tambem entendesse que o eraô, nem por isso perdeo as esperanças de cobrar a saude perdida, mayormente depois que ouvio dizer que eu tinha remedios particulares, com que curava algumas doenças, que estavaon postas no roi das incu¬ raveis: resolveose pois o sobredito enfermo a chamar¬ me em quatorze de Abril de 1687. Bem conheci a gravidade da doença, & que os symptomas, que pa- decia, eraôn mui proprios das hydropesias do bofe; porque lhe nao faltava sinal algum daquelles, que cos- tumaon acompanhar a huma enfermidade taon mortal, que ninguem escapa della , & muito menos os homens ve¬
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Observaçaõ XVII. 109 velhos , como era o do presente caso ; comtudo pelo naõ desalentar ; lhe naõ dei a entender o grande perigo , em que estava ; & para me certificar melhor se a doença era , ou naõ era tuberculo , ( como os sinaes o attestavaõ ) lhe tomei o pulso , & por largo espaço de tempo estive observando os seus movimentos, & achei que as pulsações humas vezes se percebiaõ , outras vezes se occultavaõ , porèm nem sempre , nem ao mesmo tempo ; mas humas vezes faltavaõ às trinta pancadas , outras vezes às oitenta , outras vezes às vinte , & outras vezes às cem ; & desta variedade de faltas vim a entender que as intercadencias dos pulsos naõ procediaõ de tuberculo , ou hydropesia do bofe , (como erradamente presumiraõ alguns Doutores da mayor esfera ) porque se destas causas procedessem , seria necessario que os pulsos faltassem sempre ao mesmo tempo , & guardassem sempre a mesma desigualdade ; porque sendo as causas fixas , & permanentes , tambem os effeitos deviaõ ser permanentes , & fixos ; pois ( como diz o proloquio dos Filosofos ) ( 1. ) huma causa em quanto he a mesma , sempre faz o mesmo effeito . Assentei pois comigo que esta doença procedia de flatos mais , ou menos grossos , mais , ou menos permanentes , & que conforme a mayor , ou menor grossura , ou permanencia delles vinhaõ , ou deixavaõ de vir as intercadencias mais cedo , ou mais tarde ; & pesadas bem estas razoẽs na balança do discurso , disse ao enfermo que estivesse de bom animo , porque eu esperava que brevemente cobraria saude , pois tinha conhecido que a difficuldade da respiraçaõ , & o estertor do peito , & as intercadencias dos pulsos não procedião de hydropesia, ou tuberculo no bofe ; mas de obstrucçoes do ventre inferior , onde se fazião cozimentos viciosos , & destes se geravão humores depravados , & flatos perversos , os quaes se corrião para o ambito do corpo , causavão inchação , ou cachexia ; se corriaõ para o peito , & orgãos da respiraçaõ , fazião estertor , & angustia no respirar ; se corrião para as arterias leves do bofe , causavão intercadencias , & inter-
Obfervaçaõ XVII. 109 velhos, como era o do prefente cafo; comtudo pelo naõ defalentar ; lhe naõ dei a entender o grande peri- go, em que eftava ; & para me certificar melhor fe a doença era, ou nao era tuberculo, (como os finaes o atteftavao ) lhe tomei o pulfo., & por largo efpaço de tempo eftive obfervando os feus movimentos, & achei que as pulfações humas vezes fe percebiao , outras ve- zes fe occultavao, porem nem fempre, nem ao mef- mo tempo ; mas humas vezes faltavaỡ às trinta panca- das, outras vezes às oitenta , outras vezes às vinte, & outras vezes às cem ; & defta variedade de faltas vim a entender que as intercadencias dos pulfos naõ pro- cediao de tuberculo, ou hydropefia do bofe ; (como erradamente prefumirao alguns Doutores da mayor esfera ) porque fe deftas caufas procedeffem , feria ne- ceffario que os pulfos faltaffem fempre ao mefmo tempo, & guardafem fempre a mefma defigualdade; porque fendo as caufas fixas; & permanentes, tam+ bem os efeitos deviao fer permanentes ; & fixos ; pois (cómo diz o proloquio dos Filofofos ) (1.) huma cau- fa em quanto he a mefma , fempre faz o mefino effei- to. Affentei pois comigo que efta doença procedia de flatos mais, ou menos groffos, mais, ou menos perma- nentes', & que conforme a mayor , ou menor groffu- ra , ou permanencia delles vinhao., ou deixavão de vit as intercadencias mais cedo, ou mais tarde ; & pefa- das bem eftas razoes na balança do difcurfo, diffe ao enfermo que eftiveffe de bom animo , porque eu efpe; rava que brevemente cobraria faude , poistinha co- nhecido que a difficuldade da refpiraçao ; & o eftertor do peito, & as intercadencias dos pulfos não proce- dião de hydropefia, ou tuberculo no bofe; mas de obf- trucçoes do' ventre inferior; onde fe fazião cozimen- tos viciofos, & deftes fe geravão humores deprava- dos, & flatos perverfos, os quaes fe corrião para o am- bito do corpo , caufavão inchação ; ou cachexia; fe corriao para o peito, & orgãos da refpiraçaõ, fazião eftertor ; & anguftia no refpirar .; fe corrião para as arterias leves do bofe , caufavão intercadencias, & inter- - : : . .
Obfrvacao XVII:. : 109 velhos,com erao do prefente cafo; comtude pela nadefalentar , lhe na dei a entender o grande peri- go, em que eftava ; & parame certificar melhor fea doenca era; ou naera tuberculo , (comoos finaes. atteftava ) lhetomei o pulfo, & por largoefpaco de tempoeftive obfervando os.feus movimentos,& achei que as pulfacöes humas vezes fe pércebia , outras ve-- zes fe occultava, porem nem fempre,'nemao mef- mo tempo ; mas humas vezes faltavaa as trinta panca-- das,outras vezes as oitenta,outras vezes as vinte, & outras vezes as cem ; & defta variedade:de faltas vim a entender que as irtertadencias dos pulfös na pro- cedia de tuberculo, ou hydropefia dobofe, (com erradamente prefumiraö alguns Doutores da mayor esfera ) porque fe deftas caufas procedeffen , feria ne- ceffario que os pulfos faltaffem fempre ao mefmo tempo., & guardaffem fempre a mefima defigualdade? .porque fendo ascaufas fixas, & permanentes, tam bem os effeitos devia fer permanentes ; & fixos ; pois (cómo diz o proloquio dos Filofofos ) (1.) htma cau- fa em quanto he a mefma , femprc faz mefino effei- to. Affentei pois camiga queefta doenca procedia de flatos mais, ou menos groffos, mais, ou menos permat nentes, &que conforme a mayor , u rmenor groffu- ra , ou permanencia delles vinha., ou deixavao de vir as interaadencias mais cedo; ou.mais tarde ; & pefa- dasbemeftas razotena balanca do difcurfo, diffe aó enfermo que eftiveffe de:bom.animo , porque éu efp@: rava que breveminte cobraria faude , poistinha co- nhecido que a diflruldade darefpiraca., &oeftertr do peito, & as intercadencias dos pulfos nao proce- diao de hydropefia, ou tuberculo no bofe, masde obf- truccoεs do' ventre inferior:j onda fe faziao:cozimen- tos viciofos, & deftes fe geravao humores :deprava- dos, & flatos perverfos, os quacs fe corriao para o am- bito da corpo .caufavao inchacao , ou cachexia ; fe corria para peit , & orgaos da refpiraca, faziá eftertor, & anguftia no refpirar.; fe corriaa para as arterias:leves do bofe ; caufavao.intercadencias, & intera
Obfervaçao XVII. - 109 velhos , como era o do prefente cafo; comtude pela naô defalentar; lhe naó dei a entender o grande peti- go , em que eftava ; & para me certificar melhor fe à doença era; ou nao era tuberculo ; (como os finaes atreftavaô ) lhetomei o pulfo., & por largo eípaço de tempoeftive obfervando osfeus movimentos;& achei + que as pulfações humas vezes fe percebiaô , outras ve- zes feoceultavao, porém nem fempre,'némao mefa ano tempo ; mas humas vezes faltava às trinta panca- das , outras vezes às oitenta , outras vezes às vinte, & Outras vezes às cem ; & defta variedade de faltas vim a entender que as intertadencias dos pulfoós naó pro- 'cediaô de tuberculo, ou hydropefia do hofe, (como erradamente prefumiraó alguns Doutores da mayor esfera ) porque fe deftas caufas procedeflem , feria ne- ceflario que os pulos faltaflem fempre ao meimo tempo, & guardaflem fempre a mefma defigualdade; porque fendo ascaufas fixas, & permanentes, tam* bem os effeitos deviaô fer permanentes ; & fixos ; pois (cómo diz o proloquio dos Filófofos ) (1.) huma cau- Ta em quanto he a mefma , fempre faz o mefino effei- to. Aflentei pois camigo quee a doença procedia de flatos mais, ou mentos groflos, mais, ou mehos permar nentes , «& que canforme a mayor, du menor groflu- - ra, ou permanericia delles vinhaó , ou deixavão de vir as intervadencias mais cedo, ou mais tarde ; & pefa- das bem-eftas razóésna balança do difenrfo, diffe 46 enfermo que eftivefle de:bom.animo ; porque eu elpe- rava que brevemiênte cobrarnia faude ,-poistinha cos nhecido que a difficuldade da refpiraçao ; & vn eltertor do peito, & as intercadencias dos pulfos não proce: dião de hydropelia, ou tuberêénlono bofe; mas de ubf: trucçoês do ventre inferior:; onde fe faziãu.cozimern- - tos Viciofos, & deftes fe geravão humores deprava- dos , & flatos perverfos, os quaesfe corrião para o am biro do corpo ;.caufavão inchação ; ou cachexia ; fe corriaó pára o peito , & orgãos da refpiraçaõ, fazião eftertor ; & anguítia no refpitar; fe corrião para as artterias leves do bofe ; caufavão .intercadencias, & . CENA inters *
Obfervaçao XVII. 109 velhos, comò era o do presente caso; comtudo pelo naon desalentar; lhe nao dei a entender o grande peri- go, em que estava; & para me certificar melhor se a doença era, ou naon era tuberculo, (como os sinaes o attestavao) lhe tomei o pulso, & por largo espaço de tempo estive observando os seus movimentos, & achei que as pulsaçones humas vezes se percebiaon, outras ve¬ zes se occultavaô, porèm nem sempre, nem ao mes¬ mo tempo; mas humas vezes faltavaon às trinta panca¬ das, outras vezes às oitenta, outras vezes às vinte, & outras vezes às cem; & desta variedade de faltas vim a entender que as intertadencias dos pulsos naon pro- cediao de tuberculo , ou hydropesia do bofe , (como radamente presumirao alguns Doutores da mayor esfera) porque se destas causas procedessem , seria ne- cessario que os pulsos faltassem sempre ao mesmo tempo, & guardassem sempre a mesma desigualdade porque sendo as causas fixas, & permanentes, tam¬ bem os effeitos deviaon ser permanentes, & fixos; pois (como diz o proloquio dos Filosofos) (1.) huma cau¬ sa em quanto he a mesma, sempre faz o mesmo effei¬ to. Assentei pois comigo que esta doenęa procedia de flatos mais, ou menos grossos, mais, ou mehos perma¬ nentes, & que conforme a mayor, ou menor grossu- ra, ou permanencia delles vinhaon, ou deixavamo de vit as interuadencias mais cedo, ou mais tarde; & pesa¬ das bem estas razomes na balança do discurso, disse ao enfermo que estivesse de bom animo, porque eu espe¬ rava que brevemente cobraria saude, pois tinha co¬ nhecido que a difficuldade da respiraçaon, & o estertor do peito, & as intercadencias dos pulsos namo proce¬ diamo de hydropesia, ou tuberculo no bofe; mas de obs- trucçoes do ventre inferior, onde se faziano cozimen¬ tos viciosos, & destes se geravamo humores deprava¬ dos, & flatos perversos, os quaes se corriamo para o am¬ bito do corpo, causavamo inchaçamo, où cachexia; se corriaon para o peito, & orgamos da respiraçao, faziamo estertor, & angustia no respirar; se corriamo para as arterias leves do bofe, causavamo intercadencias, & inter¬ *..
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110 Observações Medicas Doutrinaes . interrupçoes nos pulsos ; se finalmente corriaõ para outras partes , causavão outros symptomas differentes , proporcionados com as partes para onde corrião ; & aindaque este mal no principio seja menos perigoso , comtudo se se despreza, ou dura tanto tempo, que se deprave a nutrição , costuma causar affectos lastimosos. 2. A indicação pois que tomei para curar esta enfermidade , foi purgar os humores superfluos ; abrir as obstrucçoes , & emendar as intemperanças das entranhas : para purgar os humores usei do seguinte remedio , que he muito seguro , & fiel. Tomem de passas sem grainha huma onça , de polypodio de carvalho machucado dez oitavas , de folhas de losna , centaurea menor , & agrimonia , de cada cousa destas huma oitava , tudo se coza conforme as regras da Arte em panela de barro com tres quartilhos de agua commua, até que fique em ametade ; & neste cozimento deitem de infusaõ quatro oitavas de folhas de sene de Lapata, & passadas seis horas, se coe tudo por hum panno bem tapado , & então se desatem neste cozimento tres oitavas de trociscos de Fioravanto subtilissimamente polvorizados , & se reparta esta bebida em tres partes iguaes , tomando a primeira pela madrugada ; & com ella purgou huma materia viscosa , & feculenta , que estava pegada às paredes do estomago , & intestinos, & experimentou conhecido alivio. Na madrugada seguinte lhe mandei tomar outra parte do sobredito remedio , & teve mui feliz successo . Finalmente com a terceira porção do remedio experimentou a mesma utilidade . E porque tive por impossivel que os sobreditos tres xaropes bastassem para acabar de vencer toda a doença , mayormente em hum corpo cheyo de cruezas , & obstrucçoes, me resolvi ( passados tres dias ) a purgallo outras tres vezes em dias alternados , dandolhe cada dia huma onça de espirito da vida aureo, feito do sal volatil , & fixo das coloquintidas , circulados tantas vezes , atè que destes dois saes resulte hum arcano omogenio . Os doutos , & os que não temem
110 Obfervações Medicas Doutrinaes. interrupções nos pulfos; fe finalmente corriaõ para outras partes, caufavão outros fymptomas differen- tes , proporcionados com as partes para onde corrião; & aindaque efte mal no principio feja menos perigo- fo, comtudo fe fe defpreza, ou dura tanto tempo, que fe deprave: a nutrição , coftuma caufar affectos lafti- mofos. * 2. : A indicação pois que tomei para curar efta en- fermidade , foi purgar os humores fuperfluos; abrir as obftrucçoes, & emendar as intemperanças das entra- nhas : para purgar os humores ufei do feguinte reme- dio, que he muito feguro, & fiel. Tomem de paffas fem grainha huma onça, de polypodio de carvalho machucado dez oitavas , de folhas de lofna, centau- rea menor, & agrimonia, de cada coufa deftas huma oitava, tudo fe coza conforme as regras da Arte em panela de barro com tres quartilhos de agua commua; até que fique em ametade ; & nefte cozimento deitem de infufao quatro oitavas de folhas de fene de Lapata, & paffadas feis horas, fe coe tudo por hum panno bem tapado , & então fe defatem nefte cozimento tres oi- tavas de trocifcos : de Fioravanto fubtiliffimamente polvorizados, & fe reparta efta bebida em tres partes iguaes, tomando a primeira pela madrugada ; & com ella purgou huma materia vifcofa, & feculenta', que eftava pegada às paredes do eftomago, & inteftinos, & experimentou conhecido alivio. Na madrugada fe- guinte lhe mandei tomar outra parte do fobredito re- medioy & teve mui felizfucceffo. Finalmente com a terceira porção docemedio experimentou a mefma utilidade. E porque tive por impoffivel que, os fobre- ditos tres xaropes baftaffem para acabar de vencer to- da a doença., mayormente em hum corpo cheyo de cruezas,& obftrucçoes, me refolvi (paffados tres dias) a purgallo outras tres vezes em dias alternados, dan- dolhe cada dia huma onça de efpirito da vida aureo, feito do fal volatil , & fixo das coloquintidas, circu- lados tantas vezes , atè que deftes dous faes refulte hum arcano omogenio. Os doutos, & os que não te- mem !
11o Obfervacoes Medicas'Doutrinaes. interrupcots nos pulfos; fe finalmentecorria para outras partes , caufavao outros fymptomas differen- t s., proporcionados com as partes para onde corriao; & aindaque efte mal no principio feja menos perigo- fo, comtudofe fe defpreza, ou dura tanto tempo, que fe deprave:a nutricao, coftuma caufar affectos laiti- mofos. 2. : A indicacao pois que tomei para curarefta en- fermidade , foi purgar os humores fuperfluos;abrir as obftruccoés, & emendar as intemperancas das entra- nhas : para purgar os humores ufei do feguintereme- fem grainha huma onca, de polypodio de: carvalho machucado dez oitavas , defolhas de lofna., centau- rea menor, & agrimonia, de cadacoufa deftas huma oitava, tudo fe coza conforme as regras da Arte em até que.fique cm ametade ; & nefte.cozimento deitem & paffadas feis horas,fe coe tudopor hum panno bem tapado , & entao fe defatem nefte cozimento.tres oi- tavas de trocifcos : de: Fioravanto:fubtiliffimamente polvorizados, & fe reparta efta hebida em tres partes iguaes , tomandoaprimeira pelamadrugada ; & cöm & experimentou conhecido alivio. Na madrugada fe- guinte lhe mandei tomaroutra parte do fobredito re- medio,& teve mui.feliz:fucceffo:Finalmente .com a terceira pörgao döremedio experimentou a mefma utilidade. Epörque:tive por impoffivel que.os fobre- .ditos.tres xaropes baftaffem para acabar dé ve'ncer to- da a doenca:;: mayormente em :hum corpo:cheyo: de cruezas,& obftruccots, me refolyi (paffados tresdias) apurgallo outras tresvezes em dias?alternados, dan- dolhe cada dia huma: onca de efpiritoda vida aureo, teito dofal.volatil , & fixo das coloquintidas:, cirta- lados tantas:vezes, ate: que deftes'dous faes refulte huin arcano :omogenio: Os doutos, & os que nao te- incin
r11o Obfervações Medicas Doutrinaes. intermupçoês nos pulfos; fe finálmente*corriaõ pâra outras partes , caufavão outros fympromas differens ts, proporcionados com as pattes para onde corrião; & aindaque efte mal no principio feja menos perigo- fo, comtudo fe fe defpreza, ou dura tanto tempo, que fe deprave:a nutrição , coftuma caufar affe&tos latti. mofos. .., e: | | 2. :A'indicação pois que tomei para curar'efta en- fermidade , foi purgar os humores fuperfluos;.abrir as obftrnceçoês, & emendar asintemperanças das entra- nhas: para purgar os humores ufei do feguinte reme- dio, que he muito feguro, 8 fiel. Tomem de paffas fem grainha huma onça, de polypodio de carvalho machucado dez oitavas , de folhas de lofna, centau- rea menor , & agrimonia , de cada coufa deftas huma oitava, tudo fe coza conforme as regras da Arte em panela de batro com tres quartilhos de agua commua; até que. fique emametade ; & nefte cozimento deitem de infufaã quatro oitavas de folhas de fene de Laparta, & paíladas feis horas, fe coetudo por hum panno bem tapado , & então fe defatem nefte cozimento tres oi= - tavas de trocifcos : de Fioravanto fubtiliflimamente polvorizados, -& fe repartá efta bebida em tres partes iguaes , tomando a primeira pela madrugada ; & com ella. Purgonu huma materia viícofa ; & feculenta”, que eftava pegada às paredes do eftomago, & inteítinos, & experimentou conhecido alivio: Na madrugada fe. guinte lhe mandei tomar outra parte do fobredito re- . medio y& teve mui feliz fucceffo::!Finalmente com a terceira porção doremedio experimentou a mefma utilidade. Eporque:tive por impoífivel que. os fobre- * ditos tres xaropes baftaffem para acabar dé vencer to. da a doença-;: mayormente em hum corpo. cheya de cruezas,& vbitrucçoês, me refolvi (pafflados tres dias ) —apurgallo ontras três vezes em dias/alternados, dart- dolhe cada dia huma ónça' de efpirito da vida aureo; feito do fal volatil ,-& fixo das coloquintidas ; citta. dados tantás vezes ; até: que deftes dous faes refulte hum arcano omogenio.: Os doutos, .& os que não te:
110 Observaçones Medicas Doutrinaes. interrupçoes nos pulsos; se finalmente corriaon para outras partes, causavamo outros symptomas differen¬ tes, proporcionados com as partes para onde corriano, & aindaque este mal no principio seja menos perigo¬ so , comtudo se se despreza, ou dura tanto tempo, que se deprave a nutriçano, costuma causar affectos lasti¬ mosos. 2. A indicaçamo pois que tomei para curar esta en¬ fermidade, foi purgar os humores superfluos, abrir as obstrucçoes, & emendar as intemperanças das entra¬ nhas: para purgar os humores usei do seguinte reme¬ dio, que he muito seguro , & fiel. Tomem de passas sem grainha huma onça, de polypodio de carvalho machucado dez oitavas, de folhas de losna, centau- rea menor, & agrimonia, de cada cousa destas huma oitava, tudo se coza conforme as regras da Arte em panela de barro com tres quartilhos de agua commua, até que fique em ametade ; & neste cozimento deitem de infusao quatro oitavas de folhas de sene de Lapata, & passadas seis horas, se coe tudo por hum panno bem tapado, & entamo se desatem neste cozimento tres oi¬ tavas de trociscos de Fioravanto subtilissimamente polvorizados, & se reparta esta bebida em tres partes iguaes, tomando a primeira pela madrugada; & com ella purgou huma materia viscosa, & feculenta, que estava pegada às paredes do estomago, & intestinos. & experimentou conhecido alivio. Na madrugada se¬ guinte lhe mandei tomar outra parte do sobredito re¬ medio, & teve mui feliz succesto. Finalmente com a terceira porçamo docremedio experimentou a mesma utilidade. E porque tive por impossivel que os sobre¬ ditos tres xaropes bastastem para acabar de vencer to¬ da a doença, mayormente em hum corpo cheyo de cruezas, & ubstrucçoes, me resolvi (passados tres dias a purgalso outras tres vezes em dias alternados, dan¬ dolhe cada dia huma onça de espirito da vida aureo, feito do sal volatil, & fixo das coloquintidas, circu¬ lados tantas vezes, atè que destes dous saes resulte hum arcano omogenio. Os doutos, & os que namo te¬ mem
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Observaçaõ XVII. 111 mem tomar em as mãos alvas os carvoes negros , bem me entendem ; & os que não sabem cousa alguma da Arte Chymica , nem por isso devem desprezar os remedios , que não conhecem , mayormente depois de lhe constar que fazer effeitos maravilhosos ; antes se quizerem saber grandes remedios , & segredos estupendos , leaõ de dia , & de noite os livros , não se poupem ao estudo , nem desprezem as conferencias com os que se cansaõ , porque sem trabalho não quer Deos que saibamos cousa alguma. ( 2. ) E se por falta de retortas recipientes , alambiques , fornalhas, ou quaesquer outros instrumentos , ou pelas muitas occupaçoẽs , que sempre sosobrão aos Medicos , ou ( o que he mais certo ) por falta de mestre que ensine , não tiverem o sobredito espirito da vida aureo , não se envergonhem de pedirmo , porque se for para os pobres , o darei de graça . 3. Naõ he dizivel , nem ha palavras , que bastem para explicar o grande alivio , que o nobilissimo doente teve com o sobredito espirito da vida , que tomou em dias alternados ; porque evacuando com elle grande quantidade de humores tartareos , glaciaes , & viscosos , que oppilavão os orgãos da respiração , não só começou de respirar mais facilmente , mas logo pode deitarse de hum, & outro lado, não podendo atè aquelle tempo deitarse de alguma parte sem risco da vida. 4. Depois que por beneficio deste grande remedio entendi que o corpo estava bem purgado , puz toda a esperança da cura em abrir as obstucçoes , & confortar as entranhas , & para este fim lhe receitei os seguintes caldos , para tomar em vinte dias successivos . Tomem de cascas de raiz de lingua de vaca , de almeirão , de salsa das hortas , & de grama , de cada cousa destas duas oitavas , de folhas de pimpinella , de avenca , de fragaria , & de cerfolio , de cada cousa destas huma oitava , tudo se ponha a cozer em huma panela de barro com tres quartilhos de agua , & hum frangão , atè que fiquem sómente seis onças de cozimento , & coandose tudo com muita força , se ajunte a cada caldo
1 Obfervaçao XVII. mem tomar em as mãos alvas os carvoés negros, bem me entendem ; & os que não fabem coufa alguma da Arte Chymica, nem por iffo devem defprezar os re- medios, que não conhecem; mayormente depois de The conftar que fazem efeitos maravilhofos; antes fe quizerem faber grandes remedios, & fegredos eftu- pendos , leao de dia, & de noite os livros , não fe pou- pemaoeftudo, nem defprezem as conferencias com os que fe canfao, porque fem trabalho não quer Deos que faibamos coufa alguma. (2. ) E fe por falta de re- tortas , recipientes, alambiques, fornalhas, ou quaef- .. quer outros inftrumentos, ou pelas muitas occupa- çoes, que fempre fofobrão aos Medicos , ou ( o que he ·mais certo ) por falta de meftre que enfine, não tive- rem o fobredito efpirito da vida aureo, não fe enver- gonhem de pedirmo, porque fe for para os pobres , o darei de graça. 3. Nao he dizivel , nem ha palavras, que baftem para explicar o grande alivio, que o nobiliffimo doen- te teve com o fobredito efpirito da vida, que tomou em dias alternados ; porque evacuando com elle gran- de quantidade de humores tartareos , glaciaes, & vif- cofos, que oppilavão os orgãos da refpiração, não fó começou de refpirar mais facilmente, mas logo pode deitarfe de hum, & outro lado, não podendo atè aquel- Te tempo deitarfe de alguma parte fem rifco da vida. ,4. Depois que por beneficio defte grande reme- dio entendi que o corpo eftava bem purgado, puz to- da a efperança da cura em abrir as obftrucçoes, & confortar as entranhas , & para efte fim lhe receitei os feguintes caldos, para tomar em vinte dia's fucceffivos. Tomem de cafcas de raiz de lingua de vaca , de almei- rão, de falfa das hortas, & de grama, de cada coufa deftas duas oitavas , de folhas de pimpinella , de aven- ca, de fragaria, & de cerfolio, de cada coufa deftas huma oitava, tudo fe ponha a cozer em huma panela de barro com tres quartilhos de agua, & hum frangão, atè que fiquem fomente feis onças de cozimento, & coandofe tudo com muita força, fe ajunte a cada cal- do .- 1 - ? 1 n .
Obfervacao XVII. 111 mem tomar emas maos alvas os carvoes negros , bem me entendem ; & os que nao fabem coufa alguma da ArteChymica, nem por iffo devem defprezar os re- medios, que nao conliccem, mayormente depois de lhe conftar que fazem effeitos maravilhofos; antes fe quizerem faber grandes remedios, & fegredos eftu- pendos, lea de dia, & de noiteos livros, nao fe pou- pemaocftudo, nem defprezem as conferencias com os que fe canfa , porque fem trabalho nao quer Deos que faibamos coufa alguma. (2.) E fe por faltade re- tortas , recipientes, alambiques, fornalhas, ou quaef- ..quer outros inftrumentos, ou pelas muitas occupa- .$os , que fempre fofobrao aos Medicos , ou (0 que he --mais certo ) por falta de meftre que enfine, nao tive- !. rem ofobredito efpirito da vidaaureo, nao fe enver- 11: gonhem de pedirmo, porque fe for para os pobres ,0 r: darei de graca. Nao'he diziv&, nem ha palavras, que baftem 3: para explicar o grande alivio , que o nobiliffimo doen- te. teve com o fobredito.efpirito da vida, que tomou em dias alternados ; porque evacuando comelle gran- de quantidade de humores tartareos , glaciacs, & vif- cofos, que oppilavao osorgaos da refpiracao, nao fö comecou de refpirar mais facilmente, mas logo pode .deitarfe de hum,& outro lado,nao podendo ate aquel- Te tempo deitarfe de alguma parte fem rifco da vida. Depois que por beneficio defte grande reine- 4:. dioentendi que .corpo eftava bem purgado; puz to- da a efperanca da cura em abrir as obftruccots, & confortar as entranhas , & para efte fim lhe receitei os feguintes caldos,para tomar em vinte dia's fucceffivos: Tomem de cafcas de raiz de lingua de vaca , de almei- rao, de falfa das hortas, & de grama, de cada coufa deftas duas oitavas , de folhas de pimpinella , de aven- ca, defragaria, & de cerfolio, de cada coufa deftas humaoitava, tudofeponha acozer em huma panela de barro coin tres quartilhos de agua,& hum frangao, até quc fiquem fomente feis oncas de cozimento, & coandofe tudo com muita forca, feajunte a cada cal.- do
Obfervaçãôo XVII. 111 mem tomar emas mãos alvas os carvoês negros, bem me entendem; & os que não fabem coufa alguma da Arte Chymica, nem por iflo devem defprezar os re- medios, que não conhecem, mayormente depois de Ihe conftar que fazem effeitos maravilhofos; antes fe quizerem faber grandes remedios, & fegredos eftu- pendos, leaô de dia , & de noite os livros , não fe pou- pemaoeftudo, nem delprezem as conferencias com .os que fe canfaó, porque fem trabalho não quer Deos -que faibamos coufa alguma. (2.) E fe porfaltade re- tortas , recipientes, alambiques, tornalhas, ou quaef- quer outros inftrumentos , ou pelas muitas occupas .çoês , que fempre fofobrão aos Medicos ; ou (o que he “mais certo ) por falta de meftre que enfine, nãotive- rem o fobredito efpirito da vida aureo, não fe enver? gonhem de pedirmo, porque fe for para os pobres, o dáreide graça. 3: NaóhedizivMl, nem ha palavras, que baftem para explicar o grande alivio , que onobiliflimo doen= te teve com o fobredito. efpirito da vida , que tomou em dias alternados ; porque evacuando com elle gran- de quantidade de humores tartareos , glaciaes, & vift cofos , que oppilavão os orgãos da refpiração, não fó começou de refpirat mais facilmente, mas logo pode deirtarfe de hum,& outro lado,não podendo até aquel- le tempo deitarfe de alguma parte fem rifeo da vida. : 4. Depois que por beneficio defte grande reme- dio entendi que o corpo eftava bem purgado” puz tos da a eíperança da cura em abrir as obftrucçoês , & confortar as entranhas , & para efte fim lhe receitei os feguintes caldos, para tomar em vinte dias fucceflivos: “Tomem de cafcas de raiz de lingua de vaca , de almei- rão, de falfa das hortas, & de grama , de cada coufa deftas duas oitavas , de folhas de pimpinella , de aven= ca, de fragaria, & de cerfolio, de cada coufa deftas huma oitava, tado fe ponha a cozer em huma panela de barro com tres quartilhos de agua,& hum frarigão, até que fiquem fómente feis onças de cozimento, & coandofe tudo com muita força, feajunte a cada cab oo o
111 Observaçaon XVII. mem tomar em as manos alvas os carvoës negros, bem me entendem; & os que namo sabem cousa alguma da Arte Chymica, nem por isso devem desprezar os re¬ medios, que namo conliecem, mayormente depois de lhe constar que fazem effeitos maravilhosos; antes se quizerem saber grandes remedios, & segredos estu¬ pendos, leaon de dia, & de noite os livros, nao se pou- pem ao estudo, nem desprezem as conferencias com os que se cansaon, porque sem trabalho namo quer Deos que saibamos cousa alguma. (2.) E se por falta de re¬ tortas, recipientes, alambiques, fornalhas, ou quaes¬ quer outros instrumentos, ou pelas muitas occupa¬ çoes, que sempre sosobramo aos Medicos , ou (o que he mais certo) por falta de mestre que ensine , nâo tive- rem o sobredito espirito da vida aureo, nano se enver¬ gonhem de pedirmo, porque se for para os pobres , o darei de graça. 3. Naon he dizive, nem ha palavras, que bastem para explicar o grande alivio, que o nobilissimo doen- te teve com o sobredito espirito da vida, que tomou em dias alternados; porque evacuando com elle gran¬ de quantidade de humores tartareos, glaciaes, & vis- cosos, que oppilavamo os orgamos da respiraçamo, namo só começou de respirar mais facilmente , mas logo pode deitarse de hum, & outro lado, namo podendo ate aquel¬ le tempo deitarse de alguma parte sem risco da vida. 4. Depois que por beneficio deste grande reme- dio entendi que o corpo estava bem purgado, puz to¬ da a esperança da cura em abrir as obstrucçoes, & confortar as entranhas, & para este fim lhe receitei os seguintes caldos, para tomar em vinte dias successivos. Tomem de cascas de raiz de lingua de vaca, de almei- ramo, de salsa das hortas, & de grama, de cada cousa destas duas oitavas, de folhas de pimpinella, de aven- ca, de fragaria, & de cerfolio, de cada cousa destas huma oitava, tudo se ponha a cozer em huma panela de barro com tres quartilhos de agua, & hum frangamo, atè que fiquem somente seis onças de cozimento, & coandose tudo com muita força , se ajunte a cada cal- do
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112 Observações Medicas Doutrinaes. do destes cinco grãos de ouro diaphoretico , & vinte grãos de crocus martis , feito tudo por mãos de grande artifice ; pedindo encarecidamente ao sobredito enfermo , que se queria escapar da morte , bebesse a menos agua que pudesse , & que esta fosse cozida com tres oitavas de cerfolio , ou em falta deste com pimpinella ; & sem embargo que o ouro diaphoretico , & o crocus martis (sendo feitos por mão de grande Chymico ) sejaõ o meu segredo mimoso , assim para remedio das hydropesias universaes , como para as particulares do peito , nem por isso deixei de valerme do seguinte lenimento , que nas asthmas , & faltas de respiração costuma ser remedio celebrado . Mandei derreter huma enxundia de gallinha , & a este oleo derretido ajuntei outro tanto oleo de amendoas doces , & outro tanto oleo de lirios brancos , & oleo de Elefante , a que ajuntei huma pouca de cera bella , & formei hum unguento muito brando , & com elle quente fomentei muitas noites todo o peito , cobrindo-o com papel pardo, enfaixãdo com toalha pouco apertada ; & foi Deos servido q sarou de modo, que o elegeo El Rey por Governador da Bahia, aonde se occupou com tanto credito do seu nome , como utilidade da patria . 5. Desta Observação advirtão os Medicos modernos quatro cousas muito importantes assim para a saude dos enfermos , como para o seu credito. A primeira , que os achaques rebeldes , ( que quasi sempre tem as suas raizes escondidas em partes profundissimas do corpo ) não se podem curar de outro modo mais que com remedios , que conservaõ a sua virtude muito tempo, quaes saõ os mineraes, ou os metallicos ; porque estes como saõ improporcionados ao nosso calor , não se rendem à sua actividade, & chegaõ com todas as suas forças aos lugares , em q as doenças estão; por isso vemos cada dia successos felicissimos com o uso dos medicamentos metallicos , & mineraes. A segunda cousa que devem advertir he , q se os remedios, ou sejaõ metallicos, ou mineraes, ou vegetaveis, aproveitarem alguma cousa dando-os poucos dias , aproveita-
112 Obfervações Medicas Doutrinaes. do deftes cinco grãos de ouro diaphoretico , & vinte grãos de crocus martis, feito tudo por mãos de gran- de artifice ; pedindo encarecidamente ao fobredito enfermo, que fe queria efcapar da morte, bebeffe a menos agua que pudeffe , & que efta foffe cozida com tres oitavas de cerfolio, ou em falta defte com pimpi- nella ; & fem embargo que o ouro diaphoretico, & o crocus martis (fendo feitos por mão de grande Chy- mico ) fejao o meu fegredo mimofo , affim para-reme- dio das hydropefias univerfaes, como para as parti- culares do peito, nem por iffo deixei de valerme do feguinte lenimento , que nas afthmas , & faltas de ref- piração coftuma fer remedio celebrado. Mandei der- reter huma enxundia de gallinha , & a efte oleo derre- tido ajuntei outro tanto oleo de amendoas doces , & outro tanto oleo delirios brancos, & oleo de Elefan- te, a que ajuntei huma pouca de cera bella, & formei hum unguento muito brando, & com elle quente fo- mentei muitas noites todo o peito, cobrindo-o com papel pardo,enfaixado com toalha pouco apertada; & foi Deos fervido q farou de modo, que o elegeo ElRey por Governador da Bahia,aonde fe occupou com tan- to credito do feu nome, como utilidade da patria. 5. Defta Obfervação advirtão os Medicos mo- dernos quatro coufas muito importantes afim para a faude dos enfermos, como para o feu credito. A pris meira, que os achaques rebeldes, (que quafi fempre tem a's fuas raizes efcondidas em partes profundiffi- mas do corpo ) não fe podem curar de outro modo mais que com remedios , que confervaõ a fua virtude muito tempo, quaes faõ os mineraes, ou os metallicos; porque eftes como fao improporcionados ao noffo ca- lor, não fe rendem a fua actividade, & chegao com to- das as fuas forças aos lugares, em qas doenças eftão; por iffo vemos cada dia fucceffos feliciffimos como ufo dos medicamentos metallicos , & mineraes. A fe- gunda coufa que devem advertir he , q fe os remedios, ou fejao metallicos, ou mineraes, ou vegetaveis, apro- veitarem alguma coufa dando-os poucos dias , apro- veita- - 1
112 Obfervacoes Medicas Doutrinaes. do deftes cincograos deouro diaphoretico , & vinte graos de crocus martis, feito tudo por maos de gran- de artifice ; pedindo encarecidamente aa fobredito enfermo, que fe queria efcapar da morte, bebeffe a trés oitavas de cerfolio , ou em falta defte com pimpi- nella; & fem embargoque ouro diaphoretico, &o crocus martis (fendo feitos por maode grande Chy- mico ) feja o meu fegredo mimofo, affim para-reme- dio das hydropefias univerfaes, como para as'parti- culares do peito, nem por iffo deixei de valerme do feguinte lenimento , que nas afthmas , & faltas de ref- piracao coftuma fer remedio celebrado. Mandei der- reter huma enxundia de gallinha, & aefte oleo derre- tido ajuntei outro tantooleo de amendoas doces, & outrotantooleo delirios brancos, & oleo de Elefan- te, a que ajuntei huma poucade cerabella, &formei hum unguento muito brando, & coin elle quente fo- mentei muitas noites todo o peito, cabrindo-o com papel pardo,enfaixado com toalha pouco apertada; & foi Deos fervido farou de modo,que oelegeo ElRey βor Governador da Bahia,aonde fe occupou com tan- to credito dofeu nome, como utilidade da patria. 5. Defta Obfervacao advirtao os Medicos mo- dérnos quatro coufas muito importantes affim para a faude dos enferimos, como para o feu credito. A pri- meirag que os achaques rebeldes, (que quafi fempre tem as túas raizes efcondidas em partes profundiffi- mas do corpo) nao fe podem curar de outro modo mais que com remedios, que confervao a fua virtude. muito tempo, quaes fa os.imineraes,ou os metallicos; porque eftes como fa improporcionados ao noffo ca- for, nao fe rendem a fua actividade,& chega com to- das as fuas forsas aos lugares, em q as doencas cftao por iffo vemos cada dia fucceffos feliciffimos com o ufo dos medicainentos metallicos, & mineraes. A fe. gunda coufa que devem advertir he , fe os remedios, u feja metallicos, ou mineraes, ou vegetaveis, apro- veitarem alguma coufa dando-os poucos dias, apro- veita-
1m2 Obfervações Medicas Doutrinaes. do deftes cinco grãos de ouro diaphoretico , & vinte rãos de crogus martis , feito tudo por mãos de grana S- artifice ; pedindo encarecidamente aq fobredita enfermo, que fe queria efcapar da morte, bebeffe a menos agua que pudefle , & que efta fofle cozida com três oitavas de cerfolio, ou em falta defte com pimpi- nella ; & fem embargo que o ouro diaphoretico, & o crocus martis (fendo feitos por mão de grande Chy- mico )fejaó o meu fegredo mimofo, aflim para reme- dio das hydropefias univerfaes, como para asparti= culares do peito, nem poriflo deixeide valerme do feguinte lenimento , que nas afthmas , & faltas de ref piração coftuma fer remedio celebrado. Mandei der- reter huma enxundia de gallinha , & aefte oleo derre= tido ajuntei outro tanto oleo de amendoas doces, & outrotanto oleo delirios brancos, & oleo de Elefan- te, a que ajuntei huma poucade cera bella , & formei hum unguento muito brando , & com elle quente fo- mentei muitas noites todo o peito, cobrindo-o com papel pardo,enfaixádo comtoalha pouco apertada; & foi Deos fervido 4 farou de modo, que o elegeo ElRey Por Governador da Bahia,aonde fe occupou com tan- to credito do feu nome, como utilidade da patria. s. Defta Obfervação advirtão os Medicos mo.« dernos quatro coufãs muito importantes aflim para a faude dos enfermos , como para o feu credito. A pri” meira, ee os achaques rebeldes, (que quafi fempre tem 4$ Tuas raizes elcondidas em partes profundiffi- mas do corpó ) não fe podem curar de outro modo mais que com remedios , que confervaôõ a fua virtude muito tempo, quaes faô os mineraes,ou os metallicos; orque eftes como faó improporcionados ao noffo ca- lor, não fe rendem à fua aétividade,& chegaô com to. das as fuas forças aos lugares, em d as doenças cftão; por iflo vemos cada dia fucceffos feliciflimos como ufo dos medicamentos merallicos , & mineraes. A fe- gunda coufa que devem advertir he , q fe os remedios, ou fejaô metallicos, ou mineraes, ou vegetaveis, apro- veitarem alguma coufa dando-os poucos dias, apro“ veitas
112 Observaçones Medicas Doutrinaes. do destes cinco granos de ouro diaphoretico , & vinte granos de crocus martis, feito tudo por manos de gran¬ de artifice; pedindo encarecidamente ao sobredito enfermo, que se queria escapar da morte, bebesse a menos agua que pudesse , & que esta fosse cozida com tres oitavas de cerfolio , ou em falta deste com pimpi- nella ; & sem embargo que o ouro diaphoretico , & o crocus martis (sendo feitos por mao de grande Chy¬ mico ) sejao o meu segredo mimoso , assim para reme- dio das hydropesias universaes, como para as parti¬ culares do peito, nem por isso deixei de valerme do seguinte lenimento , que nas asthmas , & faltas de res- piraçamo costuma ser remedio celebrado. Mandei der¬ reter huma enxundia de gallinha , & a este oleo derre- tido ajuntei outro tanto oleo de amendoas doces , & outro tanto oleo de lirios brancos, & oleo de Elefan- te , a que ajuntei huma pouca de cera bella , & formei hum unguento muito brando, & com elle quente fo¬ mentei muitas noites todo o peito, cobrindo-o com papel pardo, enfaixando com toalha pouco apertada; & foi Deos servido quae sarou de modo, que o elegeo ElRey por Governador da Bahia, aonde se occupou com tan- to credito do seu nome , como utilidade da patria. 5. Desta Observaçamo advirtamo os Medicos mo¬ dernos quatro cousas muito importantes assim para a saude dos enfermos, como para o seu credito. A pri¬ meira, que os achaques rebeldes, (que quasi sempre tem as suas raizes escondidas em partes profundissi¬ mas do corpo ) nao se podem curar de outro modo mais que com remedios, que conservaon a sua virtude muito tempo, quaes saon os mineraes, ou os metallicos; porque estes como saon improporcionados ao nosso ca¬ lor, namo se rendem à sua actividade, & chegaon com to- das as suas forças aos lugares, em que as doenças estamo; por isso vemos cada dia successos felicissimos como uso dos medicamentos metallicos, & mineraes. A se¬ gunda cousa que devem advertir he, que se os remedios, ou sejaon metallicos, ou mineraes, ou vegetaveis, apro¬ veitarem alguma cousa dando-os poucos dias apro¬ veita¬
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Observaçaõ XVII. 113 veitaráõ muito mais continuando-os muitas vezes , com tanto que sejão applicados conforme a razão ; porque (como dizem Galeno , ( 3. ) & Hippocrates ) ( 4. ) não avemos deixar de fazer os remedios , aindaque logo naõ vejamos grande melhoria com elles . Mas este conselho se deve seguir quando as doenças forem chronicas , ou vagarosas , porque a largueza , & demora das taes enfermidades daõ tempo, & lugar a que hum mesmo remedio continuado faça os bons effeitos , que se desejão : mas se as doenças forem agudas , & apressadas , naõ devemos porfiar com hum mesmo remedio muitos dias , porque a grande pressa , com que os males agudos correm , naõ permitte dilações ; por isso tanto que virmos que hum remedio naõ aproveita , devemos deixallo , & lançar maõ de outro . Isto que Cornelio Celso ( 5 . ) nos aconselha sobre persistir muito tempo , ou pouco em hum remedio , aconselha tambem Valesio ( 6 . ) sobre acudir com mayor pressa , ou vagar a curar as doenças : se forem chronicas , ou dilatadas , poderemos escolher tempo para as curar ; mas se forem agudas , lhes devemos acudir a toda hora que o doente enfermar , & a necessidade o pedir . 6. A terceira cousa que os Medicos devem advertir he , que a respiraçaõ difficultosa procede muitas vezes da multidaõ de phlegmas pela mà disposiçaõ do figado ; outras vezes procede da dureza do baço , ou figado , que aperta o diaphragma pela copia de agua , que redunda no peito ; para as quaes cousas he utilissimo remedio o crocus martis repetido muitas vezes ; com tal condiçaõ que se applique depois do corpo bem evacuado . A quarta cousa he , que as faltas de respiraçaõ , que procedem de asthma , principalmente de asthma secca , & he aquella que naõ tem estertor , nem sibilo , ou pintainhos na garganta , se devem curar com remedios antipilepticos , & antispasmodicos ; porque me consta que a asthma naõ he outra cousa mais que huma gotta coral do bofe , ou hum affecto spasmodico , & convulsivo do mesmo bofe: assim
Obfervaçao XVII. İİİ veitaráó muito mais continuando-os muitas vezes, com tanto que fejão applicados conforme a razão; porque ( como dizem Galeno, (3.) & Hippocrates ) (4.) não avemos deixar de fazer os remedios, ainda- que logo naõ vejamos grande melhoria com elles. Mas efte confelho fe deve feguir quando as doenças forem chronicas, ou vagarofas, porque a largueza, & de- mora das taes enfermidades dao tempo, & lugar a que hum mefmo remedio continuado faça os bons effei- tos, que fe defejão : mas fe as doenças forem agudas, & apreffadas, nao devemos porfiar com hum mefmo remedio muitos dias, porque a grande preffa, com que os males agudos correm , naõ permitte dilações; por iffo tanto que virmos que hum remedio nao apro- veita , devemos deixallo, & lançar mao de outro. If- toque Cornelio Celfo (5.) nos aconfelha fobre per- fiftir muito tempo, ou pouco em hum remedio, acon- felha tambem Valefio (6.) fobre acudir com mayor preffa, ou vagar a curar as doenças : fe forem chroni- cas , ou dilatadas, poderemos efcolher tempo para as curar; mas fe forem agudas , lhes devemos acudir a toda a hora que o doente enfermar, & a neceffidade o pedir. 6. A terceira coufa que os Medicos devem ad- vertir he, que a refpiraçao difficultofa procede mui- tas vezes da multidão de phlegmas pela mà difpofi- çaõ do figado ; outras vezes procede da dureza do ba- șo, ou figado , que aperta o diaphragma pela copia de agua, que redunda no peito; para as quaes coufas he utiliffimo remedio o crocus martis repetido muitas vezes ; com tal condição que fe applique depois do corpo bem evacuado. A quarta coufa he, que as fal- tas de refpiraçaõ , que procederem de afthina , princi- palmente de afthma fecca, & he aquella que nao tem eftertor, nem fibilo, ou pintainhos na garganta, fe devem curar com remedios antipilepticos, & antifpaf- modicos ; porque me confta que a afthma naõ he ou- tra coufa mais que huma gotta coral do bofe , ou hum affecto fpafmodico , & convulfivo do mefmo bofe: affini . i - 1
Obfervacao XWII. : 113 veitara muito mais continuando-os muitas vezes, com tanto que Tejao applicados conforme a razao ; porque (comodizem Galeno, (3.)& Hippocrates) (4.) nao avemos deixar de fazer os remedios, ainda quelogo na vejamos grande melhoria com elles.Mas efte confelhofe deve feguir quando as doengas forem chronicas, ou vagarofas, porque a largueza, & de- mora das taes enfermidades da6 tempo, & lugar a que .hum mefmo remedio continuado faca os bonis effei- tos, quefe defejao: mas fe as doencas forem agudas, & apreffadas, na devemos porfiar com hum mefmo remedio muitos dias, porque a grande preffa, com que os males agudos correm, naö permitte dilacöes, por iffo tanto.que virmos que hum remedio na apró- veita,devemos deixallo, &lancar ma de outro. If- to:que Cornelio Celfo(5.) nos aconfelha fobre: per- fiftir muito tempo, ou pouco em hum remedio, acon- felha tambem Valefio (6.) fobre acudir com mayor preffa, ou vagar a curar as doencas : fe forem chroni- Cas, ou dilatadas, poderemos efcolher tempo para as curar; mas feforem agudas, lhes devemos acudir a toda ahora que odoente enfermar,& a neceffidade o pedir. 6. A terceira coufa que os Medicos devem ad- vertir he, que a refpiracaö diffcultofa proccde mui- tas vezes da multida de phlegmas pela ma difpofi- $a do figado , outras vezes procede da duréza do ba $o, ou figado , qué aperta o diaphragma pela copia de agua, que redunda no peito; para as quaes coufas he utiliffimo remedio o crocus martis repetido muitas vezes ; com tal condica que fe applique depois do corpo bem evacuado. A quarta coufa he , que as fal- tas de refpirasa , que procedérem de afthina, princi- palmente de afthma fecca, & he aquella que na tem eftertor, nein fibilo, ou pintainhos na garganta, fe devem curar. com remedios antipilepticos,& antifpaf- modicos ; porque.me confta que a afthma na he ou- tra cqufa mais que huma gotta coral do bofe, ou hum affe&to fpafmodico ,.& convulfivo do mefmo bofe : affini
“Oblervação Xv. ab oo veitarãoô muito mais continuando-os muitas vezes; com tanto que lejão applicados conforme a razão; porque ( comodizem Galeno, (3.) & Hippocrates ) (4.) não avemos deixar de fazer os remedios, ainda- quelogo naô vejamos grande melhoria comelles.Mas eíte confelho fe deve feguir quando as doenças forem Chronicas, ou vagarotas , porque alargueza, & de- mora das taes enfermidades daô tempo,'& lugar a que hum mefmo remedio continuado faça os boris effei- tos , que fe defejão: mas fe as doenças forem agudas, & apreífadas , naó devemos porfiar com hum mefimo remedio muitos dias, porque a grande preffa, com que os males agudos correm, nao permitte dilações) poriflo tanto que virmos que hum remedio naô apre- veita , devemos deixallo, & lançar maó de outro. If toque Cornelio Celfo (5.) nos aconfelha fobre per- fiftir muito tempo, ou pouco em hum remedio, acon- felha tambem Valefio (6.) fobre acudir com mayor prefífa, ou vagar a curar as doenças: fe forem chroni- Cas , ou dilatadas , poderemos efcolher tempo para as curar; mas fe forem agudas , lhes devemos acudir a toda a-hora que o doente enfermar, & aneceflidade o pedir. ” : 6. A terceira coufa que os Medicos devem ad- vertir he, que a refpiraçaô difficultofa procede mui- tas vezes da multidaô de phlegmas pela mà difpofi- çaõ do figado; outras vezes procede da durêza do ba- ço, ou figado , que aperta o diaphragma pela copia de agua , que redunda no peito; paraas quaes coufas he utilifimo remedio o crocus martis repetido muitas vezes ; com tal condiçaô que fe ápplique depois do corpo bem evacuádo. A quarta coufa he, que as fal- tas de refpiraçaô, que procedérem de afthima , princiz- * palmente de afthma fecea, & he aquella que naô rem eftertor , nem fibilo”, ou pintainhos na garganta, fe devem curar com remedios antipilepticos,& antifpaf» modicos ; porque me confta que a afthma naô he ou- tra coufa mais que huma gotra coral do bofe, ou hum affeéto f(palmodico , & convulfivo do mefmo bofe: | À athm * . ' -
Observaç ao XVII. 113 veitaráon muitò mais continuando-os muitas vezes, com tanto que sejano applicados conforme a razamo; porque (como dizem Galeno, (3.) & Hippocrates (4.) nao avemos deixar de fazer os remedios, ainda- que logo nao vejamos grande melhoria com elles. Mas este conselho se deve seguir quando as doenças forem chronicas, ou vagarosas, porque a largueza, & de¬ mora das taes enfermidades daon tempo, & lugar a que hum mesmo remedio continuado faça os bons effei¬ tos, que se desejao: mas se as doenças forem agudas, & apressadas, naon devemos porfiar com hum mesmo remedio muitos dias, porque a grande pressa, com que os males agudos correm, nao permitte dilaçones; por isso tanto que virmos que hum remedio naon apro¬ veita, devemos deixallo , & lançar maô de outro. Is- toque Cornelio Celso (5.) nos aconselha sobre per- sistir muito tempo, ou pouco em hum remedio, acon¬ selha tambem Valesio (6.) sobre acudir com mayor pressa, ou vagar a curar as doenças: se forem chroni- cas , ou dilatadas , poderemos escolher tempo para as curar; mas se forem agudas, lhes devemos acudir a toda a hora que o doente enfermar, & a necessidade o pedir. 6. A terceira cousa que os Medicos devem ad¬ vertir he, que a respiraçao difficultosa procede mui- tas vezes da multidaon de phlegmas pela mà disposi¬ çaon do figado; outras vezes procede da dureza do ba¬ ço, ou figado , què aperta o diaphragma pela copia de agua, que redunda no peito; para as quaes cousas he utilissimo remedio o crocus martis repetido muitas vezes; com tal condiçaô que se applique depois do corpo bem evacuado. A quarta cousa he, que as fal¬ tas de respiraçaon, que procedèrem de asthma, princi- palmente de asthma secca, & he aquella que nao tem estertor, nem sibilo, ou pintainhos na garganta, se devem curar com remedios antipilepticos, & antispas¬ modicos; porque me consta que a asthma nao he ou¬ tra cousa mais que huma gotta coral do bofe, ou hum affecto spasmodico, & convulsivo do mesmo bofe: assim
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114 Observações Medicas Doutrinaes . assim o diz Vanelmont , (7.) & eu digo o mesmo ; porque jà curei algumas com os mesmos remedios , com que se cura a gotta coral , como saõ a agua de cereijas negras , a que ajuntei pò de unha da graõ besta , pòs de guteta , de cranio humano , & pionia . Naõ faltaraõ pessoas , que estimuladas da inveja , ou malicia blasfemaraõ dos sobreditos remedios , & de mim , porque os appliquei ; mas a essas taes pessoas digo , que já tenho feito callo na paciencia , & que das suas detracções nem faço caso , nem os que me calumniáraõ por esta cura , deixaõ de conhecer que eu tenho alguns remedios especificos de grandes virtudes ; mas desprezaõnos , & dizem mal delles só a fim de mostrarem que sabem outros melhores : mas de semelhantes Aristarcos já Galeno ( 8.) se queixava . Poterio curou ( 9. ) huma difficuldade de respiraçaõ , complicada com hua palpitaçaõ do coraçaõ, purgando ao doente quinze vezes com medicamentos benignos , & dandolhe muitos dias aço alcoolizadissimo . OBSERVAÇAM XVIII . De huma dor de estomago continua acompanhada com muitas flatulencias , azedumes de boca , fastio invencivel , & magreza excessiva ; para remedio dos quaes symptomas se consultàraõ alguns Medicos doutos , sem que as suas diligencias aproveitassem ; & sendo eu consultado , appliquei , como remedio euporisto , & segredo maravilhoso , a hiera de Pachio , coroando a esta cura com as minhas pilulas absorventes , chamadas tambem antacidas ; com os quaes remedios se conseguio a saude desejada . 1 . TAõ horriveis , & formidaveis saõ alguas doenças , que nem os Medicos mais doutos , & acautelados , nem os mais resolutos , & destemidos se atrevem a curallas , receando contrahir algua inju-
114 Obfervações Medicas Doutrinaes. . affim o diz Vanelmont, (7.) & eu digo o mefmo ; por- que jà curei algumas com os mefmos remedios , com que fe cura a gotta coral, como faõ a agua de cereijas negras , a que ajuntei pò de unha da graõ befta, pòs de guteta , de cranio humano, & pionia. Nao falta- ráõ peffoas,que eftimuladas da inveja, ou malicia blaf- femarao dos fobreditos remedios , & de mim, porque os appliquei ; mas a effas taes peffoas digo, que já te- nho feito callo na paciencia, & que das fuas detrac- ções nem faço cafo, nem os que me calumniáraõ por efta cura , deixaõ de conhecer que eu tenho alguns re- medios efpecificos de grandes virtudes ; mas defpre- zaonos, & dizem mal delles fó a fim de moftrarem que fabem outros melhores:mas de femelhantes Arif- tarcos já Galeno (8.) fe queixava. Poterio curou (9.) huma difficuldade de refpiração,complicada com hűa palpitaçaõ do coração, purgando ao doente quinze vezes com medicamentos benignos, & dandolhe mui -. tos dias aço alcoolizadiffimo. OBSERVAÇAM XVIII. De buma dor de eftomago continua acompanhada com muitas flatulencias, azedumes de boca , faftio invenci- vel, & magreza exceffiva; para remedio dos quaes Symptomas fe confultarao alguns Medicos doutos, fem que as fuas diligencias aproveitafem ; & fendo eu con- fultado , appliquei, como remedio euporifto, & fegre- do maravilhofo, a hiera de Pachio, coroando aefta cura com as minhas pilulas abforbentes , chamadas tambem antacidas; com os quaes remedios fe confeguia a faude defejada. 1. T Ao horriveis, & formidaveis faő alguas. doenças, que nem os Medicos mais dou- tos, & acautelados , nem os mais refolutos , & defte- midos fe atrevem a curallas, receando contrahir algua. inju-
114 Obfervacoes Medicas Doutrinaes. affim o diz Vanelmont, (7.) & eu digoo mefmo ; pora que ja curei algumas com os mefmos remedios , com que fe cura a gotta coral, como faa agua de cereijas negras, aque ajuntei p de unha dagra befta, pös deguteta, de cranio humano, & pionia. Na falta- rá peffoas,que eftimuladas da inveja,ou malicia blaf femara dos fobreditos remedios, & de mim, Forque os appliquei ; mas a effas taes peffoas digo, que ja te- nho feito callo na paciencia, & que das fuas detrac- cöes nem facocafo, nem os que me calumniara por efta cura , deixa de conhecer que eu tenho alguns re- medios efpecificos de grandes virtudes ; mas defpre- zanos, & dizem mal delles f6 afim de moftrarem que fabem outros melhores:mas de femelhantes Arif- tarcos ja Galeno (8.) fe queixava. Poterio curou (9.) huma difficuldade dérefpiraca,complicada com húa palpitaga do coraca, purgando ao doente quinze vezes coin medicamentos benignos, & dandolhe mui tos dias aco alcoolizadiffimo. .O B S E R V A C A M XVIII. De buma dor de eftomago continua acompanbada com.. inuit as flatulencias, azedunes de boca , faftio invenci- vel, & magreza exceffiva; para remedio dos.quaes Jyinptonas Jé confultara alguns Medicos doutos, fem que as fuas diligcncias aproveitaflem ; d fende eu con- Jultado , appliquei, como remedio euporifto , fegre- do maravilbof6, a hiera de Pachio, coroando aefta cura com as minbas pilulas ab/orbentes ; chamadas : tambem antacidas; com os qmaes reinediosfe confeguia a faude defejada. Ao horriveis, & formidaveis fa alguas doengas, que nem os Medicos mais dou- tos, & acautelados, nem os mais refolutos , & defte- midosfe atrevem a curallas,receando contrahir algúa. injuz
' e 114 Obfervações Medicas Doutrinaes. . aílim o diz Vanelmont, (7.) & en digo o melmo ; pora que jà curei algumas com os mefmos remedios , com que fe cura a gorta coral, como faõ a agua de cereijas negras , a que ajuntei pô de unha dagraô belta , pôs de guteta , de cranio humano, & pionia. Naô falta- ráô pefloas,que eftimuladas da inveja;ou malicia blaf- femarãáo dos fobreditos remedios , & de mim, Forque os appliquei ; «mas a eflas taes pefloas digo, que já te- nho feito callo na paciencia, & que das fuas dertrac- ções nem faço cafo , nem os que me calumniáraõ por efta cura , deixaô de conhecer que eu tenho alguns re- medios efpecificos de grandes virtudes ; mas defpre-" zaOnos, & dizem mal delles fó afim de moftrarem que fabem outros melhores:mas de femelhantes Arif. tarcos já Galeno (8.) fe queixava. Poterio curou (9.) huma dificuldade derefpiraçao,complicada com hãa palpitaçaô do coraçao, purgando ao doente quinze vezes com medicamentos benignos, & dandolhe mui tos diasaço alcoolizadiflimo. —| 09500 E SON EO af 9500 «OSSO ASS Or anSS00 a6 SS ON ab E SOS SO aa S 500 ant SO OBSERVAÇAM XVIII. De buma dor de eftomago continua acompanhada com. muitas flatulencias, azedumes de boca , faftio invenci- vel, E magreza exceliva; para remedio dos quaes Somptomas fé confultarao alguns Medicos doutos, fem que as fuas diligencias aproveitalfem; & fêndo eu con Seltádo , appliquei , como vemedio euporiflo , & fegres do maravilhofo, a hiera de Pachio , coroando aefia cura com as minhas pilulas abforbentes , chamadas * — tambem antacidas; com os quaes remedios fê conféguia. - afaude defejada. i | : O. T Aô horriveis, & formidaveis faõô algãas. ; doenças, que nem os Medicos mais dou» tos, & acautelados , nem os mais refolutos , & defte- midos/e atrevem a curallas,receando conrtrahir algãa. E : inju<
114 Observaçones Medicas Doutrinaes. assim o diz Vanelmont, (7.) & eu digo o mesmo; por- que jà curei algumas com os mesmos remedios, com que se cura a gotta coral, como saon a agua de cereijas negras, a que ajuntei pò de unha da grao besta, pòs de guteta , de cranio humano , & pionia. Naô falta- raon pessoas, que estimuladas da inveja,ou malicia blas- femaraon dos sobreditos remedios, & de mim, porque os appliquei; mas a essas taes pessoas digo, que jà te- nho feito callo na paciencia, & que das suas detrac- çones nem faço caso, nem os que me calumniáraon por esta cura, deixaon de conhecer que eu tenho alguns re- medios especificos de grandes virtudes; mas despre¬ zaonos, & dizem mal delles só a fim de mostrarem que sabem outros melhores: mas de semelhantes Aris- tarcos ja Galeno (8.) se queixava. Poterio curou (9., huma difficuldade de respiraçaon, complicada com huma palpitaçaon do coraçaon, purgando ao doente quinze vezes com medicamentos benignos, & dandolhe mui¬ tos dias aço alcoolizadissimo. OBSERVAQAM XVIII. De huma dor de estomago continua acompanhada com muitas flatulencias, azedumes de boca, fastio invenci¬ vel, & magreza exçessiva; para remedio dos quaes symptomas se consultaraon alguns Medicos doutos, sem que as suas diligencias aproveitassem; & sende eu con- sultado, appliquei, como remedio euporisto, & segre¬ do maravilhoso, a hiera de Pachio, coroando a esta cura com as minhas pilulas absorbentes, chamadas tambem antacidas; com os quaes remedios se conseguio a saude desejada. Aon horriveis, & formidaveis saon algumas doenças, que nem os Medicos mais dou¬ tos, & acautelados, nem os mais resolutos, & deste¬ midos se atrevem a curallas, receando contrahir alguma inju¬
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Observaçaõ XVIII. 115 injuria , ou nodoa indelevel na sua fama : mas porque serà impiedade desemparar aos doentes nos seus perigos , he muitas vezes preciso entrar em a batalha obrigado mais da compaixaõ , & lastima , que da esperança do premio. 2 . O Reverendo Padre Fr . Joaõ da Penitencia , Provincial da Serafica Ordem Terceira , padeceo mais de hum anno humas dores taõ excessivas de estomago , huns azedumes de boca taõ insofriveis , hum fastio taõ horrendo , & huma magreza taõ rara , que excediaõ a todo o encarecimento : vendose o pobre Religioso cercado de tantos , & taõ crueis symptomas buscou os Medicos de mayor fama , que naquelle tempo avia em Santarem , aonde elle estava morador. Trabalhàraõ elles quanto puderaõ em seguimento da saude , jà sangrando , jà purgando , jà apozemando , jà deitando ajudas purgativas humas , anodinas outras , & outras carminantes ; , usando outras vezes de sanguisugas , de fomentações , de emplastros , & de mil remedios interior , & exteriormente applicados ; naõ lhes esquecèraõ os amuletos , nem os medicamentos que curaõ por virtudes , & qualidades occultas , & sympateticas ; finalmente esgotáraõ a medicina sem alivio : em resistencia taõ porfiada perdéraõ os Medicos a esperança da saude , & por isso deixáraõ ao doente ao arbitrio da fortuna ; mas como a vida he muito amavel , naõ quiz o enfermo darse por rendido , nem largar as armas , antes animosamente quiz entrar em nova batalha , & procurar outros Medicos , em cujas mãos entregasse a defensa de huma cousa taõ importante como era a sua vida : succedeo pois que por erro , ou destino , quando vinha a Lisboa buscar homes taõ cheyos de annos , como de experiencias , encontrasse comigo , a quem huma , & outra cousa faltava , por ser ainda muito moço ; & dandome conta do que padecia , & dos muitos remedios , que lhe applicàraõ sem proveito , me veyo ao pensamento , que o estomago era o complice de tudo , porque dos maos cozimentos delle procediaõ as cruezas , & destas os flatos,
- Obfervação XVIII. injuria, ou nodoa indelevel na fua fama: mas porque ferà impiedade defemparar aos doentes nos feus peri- gos, he muitas vezes precifo entrar em a batalha obri- gado mais da compaixao , & laftima, que da efpe- rança do premio. 2. O Reverendo Padre Fr. Joao da Penitencia, ... Provincial da Serafica Ordem Terceira, padeceo mais de hum anno humas dores tao exceffivas de eftomago, huns azedumes de boca taõ infofriveis, hum faftio taỡ horrendo, & huma magreza tao rara, que excediaõ a todo o encarecimento: vendofe o pobre Religiofo cer- cado de tantos, & tao crueis fymptomas bufcou os Medicos de mayor fama, que naquelle tempo avia em Santarem, aonde elle eftava morador. Trabalha -. raõ elles quanto puderaõ em feguimento da faude , jà fangrando, jà purgando, jà apozemando, jà deitan- do ajudas purgativas humas , anodinas outras, & ou- tras carminantes ; ufando outras vezes de fanguifu- gas , de fomentações, de emplaftros, & de mil reme- dios interior , & exteriormente applicados; naõ lhes efqueceraő os amuletos, nem os medicamentos que curao por virtudes, & qualidades occultas, & fym- pateticas ; finalmente efgotárao a medicina fem ali- vio : em refiftencia taõ porfiada perdéraõ os Medi- cos a efperança da faude , & poriffo deixarao ao doen- te ao arbitrio da fortuna ; mas como a vida he muito amavel, naõ quiz o enfermo darfe por rendido , nem largar as armas, antes animofamente quiz entrar em nova batalha, & procurar outros Medicos, em cujas mãos entregaffe a defenfa de huma coufa tao impor- tante como era a fua vida i fuccedeo pois que por er- ro, ou deftino, quando vinha a Lisboa bufcar homes taõ cheyos de annos, como de experiencias, encon- "traffe comigo, a quem huma, & outra coufa faltava, por fer ainda muito moço ; & dandome conta do que padecia , & dos muitos remedios , que lhe applicarao fem proveito, me veyo ao penfamento, que o efto- mago era o complice de tudo; porque dos máos co- zimentos delle procediao as cruezas, & deftas os fla- tos, . * ;
Obfervacao XVIIl: irs injuria, ou nodoa indelevel nafua fama: mas porqúe fera impiedade defemparar aos doentes nos feus peri- gos, he muitas vezes precifo entrar.em a batalha obri- gado mais da. compaixa , & laftima, que da efpé- Tanca do premio. O Reverendo Padre Fr. Joa da Penitericia, 2. Provincial da Sérafica Orden Terccira,padeceo mais de hum anno humas dores taö cxceffivas deeftomago; huns azedumes de boca ta infofriveis, hum faftio ta horrendo , & humamagreza ta rara , que excediaö a todo o encarecimento: vendofe o pobre Religiofo cer- cado de tantos, &'ta crueis fymptomas bufcou os Medicos de mayor fama, que naquelle tempo avia em Santarem, aonde ellc eftava morador. Trabalha-. ra elles quanto pudera cm feguimento da faude, ja fangrandö, ja purgando, ja apozemando, ja deitan- do ajudas purgativas humas, anodinas outras , & ou- tras carminantes ; ufando outras vezes de fanguifu- gas, de foinentagöes, de emplaftros, & de mil reme- dios interior , & exteriormente applicados; na lhes efquecera os ainuletos, nem os medicamentos que curao por virtudes, & qualidades occultas, & fym- pateticas ; finalmente cfgotára a medicina fem ali- vio : em refiftencia ta porfada perdéra os Medi- cos a efperanca da faude , & poriffo deixara ao doen- te ao arbitrio da fortuna ; mas como a vida he muito amavel, naquiz oenferimo darfe pór rendido , nem largar as armas, antes animofamente quiz entrar em novabatalha, & procurar outros Medicos, em cujas maos entregaffe a defenfa de huma coufa taoimpor- tante como era afua vida : fuccedeo pois que por er- ro, ou deftino,quando vinha a Lisboa bufcar homês taöcheyos de annos, como de experiencias , encon- traffe comigo, a quem huma, & outra coufa faltava, porfer ainda muito imoco ; & dandoime conta do que padecia, & dos muitos remedios , que lhe applicara fein proveito, me veyo aopenfaménto, que o efto- inago era ocomplice de tudo, poique dos maos ca- zimentos delle procedia as cruezas , & deftas os fla tosg
CAR | | Í ' Obfervaçõó XVII às injuria, ou nodoa indelevel na fua fama: mas porque ferà impiedade defemparar aos doentes nos feus peri- Bos, he muitas vezes precifo entrarem a batalha obri- gado mais da compaixaô , & laftima, que da efpes Trançado premio. — 2. O Reverendo Padie Fr. Joaô da Penitencia, Provincial da Serafica Ordem Terceira, padeceo mais de hum anno' humas dores taô exceflivas de eftomago, huns azedumes de boca taô infofriveis, hum fáftio taã horrendo, & humamagreza taóô rara , que excediaô a todo o encarecimento: vendofe o pobre Religiolo cer- cado de tantos, & taô crueis fymptomas bufíeou os Medicos de mayor fama, que naquelle tempo avia em Santarem, aonde etle eftava morador. Trabalhã-. ra6elles quanto puderaô em feguitnento da faude , jà fangrando , jà purgando, jà apozemando,, jà deitans do ajudas purgativas humas , anodinas outras , & ou< tras carminantes ; ufando outras vezes de fanguifu*? gas , de fomentações , de emplaftros , & de mil reme- dios interior, & exteriormente applicados; naó lhes efquecêraõ os amuletos, nem os medicamentos que curaó por virtudes, & qualidades occultas, & fym- pateticas ; finalmente efbotáraõô a medicina fem ali- vio : em refiftencia taô porfiáda perdérao os Medi- €os a efperança da faude , & poriflo deixáraô ao doen- te ao arbitrio da fortuna; mas comoa vida hemuito | amavel, naô quiz o enfermo darfe por rendido , nem largar as armas, antes ânimofamente quiz entrar em - nová batalha, & ptocurar outros Medicos, em cujas mãos entregalle a defenfa de huma coufataõimpor- tante como era afua vida: fuccedeo pois que por er« ro , eu deftino ; quando vinha a Lisboa bufícar homês taô cheyos de annos, como de experiencias, encon- trafle comigo, a quem huma , & outra coufa faltava, porfer áinda muito moço ; & dandome conta do que Padecia , & dos muitos remedios , que lhe applicàraô - fem proveito, me veyo ao penfamento, que o efto- mago era ocomplice detudo, poique dos mãos 'co- zimentos delle procediaõ as cruezas ; & deftas os fla- me 1 tos;
Observaçao XVIII. 115 in juria, ou nodoa indelevel na sua fama: mas porque serà impiedade desemparar aos doentes nos seus peri- gos, he muitas vezes preciso entrar em a batalha obri¬ gado mais da compaixaô, & lastima, que da espe¬ rança do premio. 2. O Reverendo Padre Fr. Joaô da Penitencia, Provincial da Serafica Ordem Terceira, padeceo mais de hum anno humas dores taon excessivas de estomago. huns azedumes de boca taon insofriveis, hum fastio taon horrendo, & huma magreza taon rara, que excediaon a todo o encarecimento: vendose o pobre Religioso cer- cado de tantos, & taô crueis symptomas buscou os Medicos de mayor fama, que naquelle tempo avia em Santarem, aonde elle estava morador. Trabalhଠraon elles quanto puderaôn em seguimento da saude, jà sangrando , jà purgando , jà apozemando , jà deitan- do ajudas purgativas humas, anodinas outras, & ou¬ tras carminantes; usando outras vezes de sanguisu¬ gas, de fomentaçoes, de emplastros, & de mil reme- dios interior, & exteriormente applicados; naon lhes esqueceraon os amuletos, nem os medicamentos que curaô por virtudes, & qualidades occultas, & sym pateticas; finalmente efgotarao a medicina sem ali¬ vio: em resistencia tao porfiada perdéraon os Medi¬ cos a esperança da saude , & por isso deixáraon ao doen- te ao arbitrio da fortuna; mas como a vida he muito amavel, nao quiz o enfermo darse por rendido, nem largar as armas, antes animosamente quiz entrar em nova batalha, & procurar outros Medicos, em cujas mamos entregasse a defensa de huma cousa tao impor¬ tante como era a sua vida: succedeo pois que por er¬ ro, ou dęstino, quando vinha a Lisboa buscar homens tao cheyos de annos, como de experiencias, encon¬ trasse comigo, a quem huma, & outra cousa faltava, por ser ainda muito moço; & dandome conta do que padecia , & dos muitos remedios , que lhe applicàrao tem proveito, me veyo ao pensamento, que o esto¬ mago era o complice de tudo, porque dos maos co- zimentos delle procediaon as cruezas, & destas os fla¬ tos,
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116 Observações Medicas Doutrinaes. tos, as dores , os azedumes , a magreza , & o fastio , & por consequencia se eu lhe applicasse hum remedio , q juntamente alimpasse o estomago , & lho confortasse , cortaria com hum golpe a cabeça de tantos inimigos . Lembroume entaõ que eu tinha feito por minha curiosidade a hiera de Pachio , que parece estava destinada como em profecia para curar a doença do sobredito Religioso ; porque ( como diz Scribonio Largio ) (1.) nella se acha em summo gráo a virtude de alimpar , & confortar o estomago , de vencer as dores delle , de dissipar os flatos , de rebater as ancias , de curar as pontadas , & as dores de cabeça , a gotta coral , as parlesias , os tremores dos nervos , os caroços , & durezas dos peitos , & mil outras virtudes , que os curiosos poderaõ ver no sobredito Author , & por isso as naõ refiro aqui todas . Fundandome pois na grande virtude da sobredita hiera , animei muito ao doente , dizendolhe que brevemente teria a saude que desejava : & naõ se frustrou a minha promessa ; porque dandolhe seis vezes a hiera de Pachio em dias alternados , em quantidade de quatro escropulos , & em forma de pilulas , foi purgando com muita brandura , o estomago se foi fortificando , & fazendo melhores cozimentos , & se desvanecèraõ os flatos , as azìas , as dores , & todas as mais queixas ; & cobrou a saude , que lhe tinha vaticinado . 3 . Neste lugar me perguntaráõ os curiosos : E se succedesse que a hiera de Pachio naõ curasse ao doente com tanta felicidade como o curou , que remedio lhe avieis de fazer ? Respondo , que ainda sabia muitos , & entre elles dous singularissimos : porque (como ensina Galeno ) ( 2 . ) todo o Medico que quizer curar bem , & fazer curas de grande credito , deve ter preparados muitos remedios , ou ao menos dous , os mais efficazes que ouver naquelle genero , & os mais brandos , & benignos , paraque com hum , ou com outro , ou com ambos possa soccorrer aos enfermos : & sem embargo que ao doente , de que fallo nesta Observaçaõ , lhe naõ foi necessario outro mais que as sobre
. 11% Obfervações Medicas Doutrinaes. tos , as dores, os azedumes, a magreza, & o faftio, & por confequencia fe eu lhe applicaffe hum remedio, q juntamente alimpaffe o eftomago, & lho confortaffe, cortaria com hum golpe a cabeça de tantos inimigos. · Lembroume entaõ que eu tinha feito por minha cu- riofidade a hiera de Pachio, que parece eftava defti- nada como em profecia para curar a doença do fobre- dito Religiofo; porque (como diz Scribonio Largio) (1.) nella fe acha em fummo gráo a virtude de alim- par, & confortar o eftomago , de vencer as dores del -. le, de diffipar os flatos , de rebater as ancias , de curar as pontadas , & as dores de cabeça, a gotta coral, as parlefias, os tremores dos nervos , os caroços , & du- rezas dos peitos, & mil outras virtudes , que os curio- fos poderao ver no fobredito Author, & por iffo as nao refiro aqui todas. Fundandome pois na grande virtude da fobredita hiera , animei muito ao doente, dizendolhe que brevemente teria a faude que defeja- va: & nao fe fruftrou a minha promeffa; porque dan- dolhe feis vezes a hiera de Pachio em dias alternados, .em quantidade de quatro efcropulos, & em forma de pilulas , foi purgando com muita brandura, o eftoma- go fe foi fortificando, & fazendo melhores cozimen- tos, & fe defvanecerao os flatos, as azias , as dores , & todas as mais queixas ; & cobrou a faude, que lhe ti- nha vaticinado. 3. Nefte lugar me perguntarao os curiofos : Efe fuccedeffe que a hiera de Pachio nao curaffe ao doen- te com tanta felicidade como o curou, que remedio lhe avieis de fazer ? Refpondo, que ainda fabia mui- tos, & entre elles dous fingulariffimos : porque (co- mo enfina Galeno) (2.) todo o Medico que quizer cu- rar bem, & fazer curas de grande credito, deve ter preparados muitos remedios, ou ao menos dous , os mais eficazes que ouver naquelle genero, & os mais brandos , & benignos, paraque com hum, ou com' outro, ou com ambos poffa foccorrer aos enfermos: & fem embargo que ao doente , de que fallo nefta Ob- fervaçao , lhe nao foi neceffario outro mais que as fo- bre- .
1 Obfervacoes Medicas Doutrinaes. tos, as dores, os azedumes, a inagreza, & o faftio, & por confequencia fe eu lhe applicaffe hum remedio, juntamente alimpaffe eftomago , & lho confortaffe, cortaria com hum golpe a cabeca de tantos inimigos. . Lembroume entao que eu tinha feito por minha cu- riofidade a hiera de Pachio, queparece eftava defti- nada como em profecia para curar a doenca do fobre- dito Religiofo; porque (como diz ScribonioLargio) (1.) nella fe acha em fummo grao a virtude de alim- par , & confortar o eftomago , de vencer as dores del- le , de diffipar os flatos, de.rebater as ancias , de curar as pontadas, & as dores de cabeca, agotta coral , as parlefias, os tremores dos nervos, os carocos , & du- rezas dos peitos , & mil outras virtudes , que os curio- fas podera ver no fobredito Author, & por iffo as na refiro aqui todas.: Fundandome pois na grande virtude da fobredita hiera , animei muito ao doente, dizendolhe que brevemente teriaa faude que defeja- va : & na fe fruftrou a minha promeffa; porque dan- dolhe feis vezes a hiera de Pachio em dias alternados, em quantidade dequatro efcropulos, & em forma de pilulas , foi purgando com muita brandura, o eftoma- go fefoi fortificando, & fazendo melhores cozimen- tos , & fe defvanecera os flatos, as azias, as dores ,& todas as mais queixas, & cobrou a faude, quelhe ti- nha vaticinado. 3. Nefte lugar me perguntara os curiofos : E fa fuccedeffe que a hiera de Pachio nao curaffe ao doen- te com tanta felicidade como o curou, que remedio Ihe avieis de fazer? Refpondo, que ainda fabia mui- tos, & entre ellesdous fingulariffimos:. porque(co- mo enfina Galeno) (2.) todo o Medico que auizer cu-- rar bem, &fazer curas de grande credito, deve ter preparados muitos remedios, ou ao menos dous , os imaisefficazes'que ouver naquelle genero, & os mais brandos , & benignos, paraque com hum, ou com. outro, ou com ambos poffa foccorrer aos enfermos: & fem embargo que ao doente , de que fallo nefta Ob- fcrvaca, lhe nafoi neceffariooutro mais que as fo- bre
116 Obfervações Medicas Doutrinaes. tos , as dores , os azedumes, a magreza, & O faítio, & por confequencia fe eu lhe applicafle hum remedio, q Juntamente alimpaíle o eftomago , & lho conforrafle, . cortariacomhum golpea cabeça de tantos inimigos. : ' Lembroume entaô que eu tinha feito por minha cu- Ú riofidade a hiera de Pachio, que parece eftavá defti- nada como em profecia para curar a doença do fobre- dito Religiofo ; porque (como diz Scribonio Largio) (1.) nella fe acha em fummo grão a virtude de alim- ar, & confortar o eftomago , de vencer as dores del- e, dediflipar os flatos , de tebater as ancias , de curar as pontadas , & as dores de cabeça, a gotta coral, as parlefiaás, os tremores dos nervos , os caroços , & du- rezas dos peitos , & mil outras virtudes , que os curio- fas poderãõ ver no fobredito Author, & poriffo as naó refiro aqui todas. Fundandome pois na grande yirtude da fobredita hiera, animei muito ao doente, dizendolhe que brevemente teria a faude que defeja- va: & naô fe fruftrou a minha promeffa; porque dan- " : * — dolhefeis vezes a hiera de Pachio em dias alternados, . em quantidade de quatro eferopulos, & em forma de pilulas , foi purgando com myita brandura, o eftoma- go feFoi fortificando, & fazêndo melhores cozimen& tos, & fe defvanecêraô os flatos, as azias , as dores , && todas as mais queixas ; & cobrou a faude, quelhe ti- nha vaticinado. 3. Neftelugar me perguntaráo os curiofos: Ele fuccedefle que a hiera de Pachio naó curaffe ao doen- te com tanta felicidade como o curou, que remedio lhe avieis de fazer ? Refpondo, que ainda fabia mui- tos, & entre ellesdous fingulariffimos: porque (co- mo enfina Galeno) (2.) todo o Medico que quizer cu“ rar bem , & fazer curas de grande credito, deve ter preparados muitos remedios, ou ao menos dous, os mais eficazes 'que ouver naquelle genero, & os mais brandos , & benignos , paraque com hum, ou cont outro, ou com ambos poífa foceorrer aos enfermos: & fem embargo que ao doente , de que fallo nefta Ob- fervaçaô , lhe nao foi neceffario outro mais que as fo- bre NI |
116 Observaçones Medicas Doutrinaes. tos, as dores, os azedumes, a magreza, & o fastio, & por consequencia se eu lhe applicasse hum remedio, quae juntamente alimpasse o estomago , & lho confortasse, cortaria com hum golpe a cabeça de tantos inimigos. Lembroume entaô que eu tinha feito por minha cu¬ riosidade a hiera de Pachio, que parece estava desti- nada como em profecia para curar a doença do sobre dito Religioso; porque (como diz Scribonio Largio) (1.) nella se acha em summo gráo a virtude de alim- par , & confortar o estomago , de vencer as dores del- le, de dissipar os flatos, de rebater as ancias, de curar as pontadas, & as dores de cabeça, a gotta coral, as parlesias, os tremores dos nervos, os caroços, & du- rezas dos peitos, & mil outras virtudes, que os curio¬ sos poderaon ver no sobredito Author, & por isso as naon refiro aqui todas. Fundandome pois na grande virtude da sobredita hiera, animei muito ao doente, dizendolhe que brevemente teria a saude que deseja va: & naon se frustrou a minha promessa; porque dan¬ dolhe seis vezes a hiera de Pachio em dias alternados, em quantidade de quatro escropulos, & em forma de pilulas, foi purgando com muita brandura, o estoma¬ go se foi fortificando , & fazendo melhores cozimen- tos, & se desvanecèraon os flatos, as azias, as dores , & todas as mais queixas; & cobrou a saude, que lhe ti- nha vaticinado. Neste lugar me perguntaráon os curiosos: E se 3. succedesse que a hiera de Pachio naon curasse ao doen- te com tanta felicidade como o curou, que remedio lhe avieis de fazer? Respondo, que ainda sabia mui- tos, & entre elles dous singularissimos: porque (co¬ mo ensina Galeno) (2.) todo o Medico que quizer cu- rar bem, & fazer curas de grande credito, deve ter preparados muitos remedios, ou ao menos dous, os mais efficazes que ouver naquelle genero, & os mais brandos, & benignos, paraque com hum, ou com outro, ou com ambos possa soccorrer aos enfermos: & sem embargo que ao doente , de que fallo nesta Ob- servaçaon, lhe nao foi necessario outro mais que as so¬ bre¬
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Observaçaõ XVIII . 117 breditas pilulas de Pachio , quero eu agora , em serviço do bem commum , dizer os taes remedios ; hum dos quaes he a agua seguinte , que para excitar o appetite de comer , & tirar o fastio , he quasi milagrosa , & se prepara do modo seguinte . Tomai de folhas de agrimonia , de losna , & de centaurea menor , de cada cousa destas meya maõ cheya , tudo se coza em panela de barro com tres quartilhos de agua commua , & a este cozimento coado ajuntem tres onças de assucar , & cada dia dem ao doente meyo quartilho em jejum , & antes de seis vezes terá taõ grande fome , que naõ averà comer , que lhe baste , como tenho observado muitas vezes , principalmente em hum Cappellaõ do Embaixador de Carlos II . o qual teve hum fastio taõ grande , que nenhuma cousa podia comer , mas depois que por meu conselho tomou esta agua , comia com tal fome , que parecia fome canina ; & ficou taõ obrigado ao tal remedio , que me pedio a receita para levar para Castella . E se acontecer que esta agua falte por causa das acerbas aguajens , ou por causa dos flatos , & rugidos do ventre , & estomago , podem usar do pò da tunica da muela da gallinha , de que tenho visto maravilhosos effeitos ; ou se podem valer das minhas pilulas absorbentes , que indubitavelmente se tiraráõ os azedumes , & flatulencias , com tal condiçaõ , que em cada caldo de frangaõ , ou de gallinha , desatem dous escropulos das ditas pilulas ; mas com tal advertencia , que o caldo seja magro ; porque sendo gordo , ou manteiguento , lhe naõ aproveitaràõ as pilulas ; porque os azeites , as gorduras , & as manteigas , saõ a causa total das azìas , dos flatos , & dos máos cozimentos . 4 . Aqui he digno de reparar porque razão sendo o sobredito doente curado tanto tempo por Medicos doutos , nenhum alivio tivesse , melhorando com tanta brevidade nas minhas maõs só com as pilulas de Pachio . A esta pergunta respondo , que pára fazer huma cura boa , naõ basta só que o Medico seja grande letrado ; he tambem necessario que saiba grandes , & effica
1 Observação XVIII. breditas pilulas de Pachio, quero eu agora, em fervi- ço do bem commum, dizer os taes remedios ; hum dos quaes he a agua feguinte, que para excitar o appe- tite de comer, & tirar o faftio , he quafi milagrofa, & fe prepara do modo feguinte. Tomai de folhas de agrimonia , de lofna , & de centaurea menor , de cada coufa deftas meya maõ cheya , tudo fe coza em pane- la de barro com tres quartilhos de agua commua ; & a efte cozimento coado ajuntem tres onças de affucar, & cada dia dem ao doente meyo quartilho em jejum, & antes de feis vezes terá tao grande fome, que naỡ averà comer, que lhe bafte, como tenho obfervado muitas vezes, principalmente em hum Cappellaõ do Embaixador de Carlos II. o qual teve hum faftio tao grande, que nenhuma coufa podia comer , mas depois que por meu confelho tomou efta agua, comia com tal fome, que parecia fome canina ; & ficou tao obri- gado ao tal remedio, que me pedio a receita para le- · var para Caftella. E fe acontecer que. efta agua falte. por caufa das acerbas aguajens, ou por caufa dos fla- tos , & rugidos do ventre, & eftomago, podem ufar do pò da tunica da muela da gallinha,de que tenho vif- to maravilhofos effeitos ; ou fe podem valer das mi- nhas pilulas abforbentes , que indubitavelmente fe ti- raráõ os azedumes , & flatulencias, com tal condição, que em cada caldo de frangaõ, ou de gallinha, defa- tem dous efcropulos das ditas pilulas; mas com tal ad- vertencia, que o caldo feja magro ; porque fendo gor- · do, ou manteiguento, lhe naõ aproveitaràõ as pilulas; porque os azeites , as gorduras , & as manteigas , fao 2 çaufa total das azìas, dos flatos, & dos máos cozimen- tos. 4. Aqui he digno de reparar porque razão fendo o fobredito doente curado tanto tempo por Medicos doutos, nenhum alivio tiveffe, melhorando com tan- ta brevidade nas minhas maos fó com as pilulas de Pachio. A efta pergunta refpondo, que pára fazer hu- ma cura boa, nao bafta fó que o Medico feja grande letrado ; hetambem neceffario que faiba grandes, & effica- : ! :
Obfervacao XVIIl. 117 breditas pilulas de Pachio , quero eu agora , em fervi- $o do bem commum, dizer os taesreredios; hum dos quaes he a agua feguinte, que para excitar o appe- tite decomer , & tirar o faftio, he quafi milagrofa,& fe prepara do modo feguinte. Tomai de folhas de agrimonia, de lofna, & de centaurea menor ; de cada coufa deftas meya ma cheya , tudo fe coza em pane- la de barro com tres quartilhos de agua commua ; & a efte cozimento coado ajuntem tres oncas de affucar, & cada diadem ao doente meyo quartilho cm jejum, & antes de feis. vezes tera taógrande fome, que na avera comer, que lhe bafte, como tenho obfervado muitas vezes , principalmente cm hum Cappella do Embaixador de Carlos 11. o qual teve hum faftio ta grande , que nenhuma coufa podia comer , mas depois que por meu confelho tomou efta agua, comia con tal fome, que pareciafomecanina ; & ficou ta obri- gado ao talremedio, que me pedio a receita para le- .var para Caftella. E fe acontecer que efta agua falte por caufa das acerbas aguajens, ou por caufa dos fla- tos, & rugidos doventre, & eftomago, podem ufar do po da tunica da muela da gallinha,de que tenho vif- to maravilhofos effeitos, ou fe podem valer das mi- nhas pilulas abforbentes , que indubitavelmente fe ti- raraos azedumes , & fatulencias , com tal condicaö, que cm cada caldo de franga, ou de gallinha., defa- tem dous efcropulos das ditas pilulas, mas cem tal ad- -vertencia, que o caldo feja magro ; porque fendo gor- do, ou manteiguento, lhe na aproveitara as pilulass porque os azeites , as gorduras , & as manteigas , fa a caufa total das azias, dos flatos, & dos maos cozimen- tos. fobreditodoente curado tanto tempo por Medicos doutos, nenhum aliviativeffe, melhorando com tan- ta brevidade nas minas maos f6 com as pilulas de Pachio. A efta pergutta refpondo, que pára fazer hu- ma cura boa, na bafta f6queo Medico feja grande letrado; hetambem neceffario que faibagrandes, & efhca
—> . . / Oblervaçãôo — XVIII. 117 breditas pilulas de Pachio, quero eu agora , em fervi- ço do bem commum , dizer os taes reriedios ; hum dos ques he a agua feguinte, que para excitar o appe- tite de comer , & tirar o faftio , he quafi milagrofa, & fe prepara do modo feguinte.' Tomai de folhas de agrimonia , de lofha , & de centaurea menor ; de eada coufa deftas meya maô cheya , tudo fe coza em pane- la de barto com tres quartilhos de agua commiva ; & à | efte cozimento coado ajuntem tres onças de aflucar; & cada dia dem ao doente meyo quartilho em jejuri, & antes de feis- vezes terátaô grande fome, que naô averà comer, que lhe bafte, como tenho obfervado muitas vezes , principalmente em hum Cappellaô do Embaixador de Carlos II. o qual teve hum faftio taô grande, que nenhuma coufa podia comer ; mas depois” que por,meu confelho tomou efta agua, comia com tal fome , que parecia fomecanina ; & ficou taô obri- gado ao tal remedio, que me pedio a receita parale- «var para Caftella. E fe acontecer que .efta agua falte. por caufa das acerbas aguajens , ou por caufa dos fla-. tos , & rugidos do ventie, & eftomago, podem uíar do pô da tunica da muela da gallinha,de quetenho vif= to maravilhofos effeitos ; ou fe podem valer das mi- nhas pilulas abforbentes , que indubitavelmente fe ti- Farãõ os azedumes , & fatulencias , com tal condiçao, que em cada caldo de frangaô , ou de gallinha , dela- tem dous efcropulos das ditas pilulas; mas cemtal ad- «ertencia, que o caldo feja magro ; porque tendo gor= * do, ou maniteiguento, lhe naõ a proveitarãõ as pilulas; porque os azeites , as gorduras , & as manteigas , faõ a anta total das azias, dos flatos, & dos mãos cozimen- tos. . 4. Aqui hedignode tepatar porque razão fendo o fobredito doente curado tanto tempo por Medicos -— doutos, nenhum aliviggivele , melhorando com tan- ta brevidade nas minas maõos fó com as pilulas de Pachio. A efta pergunta refpondo, que pára fazer hu- Ma cura boa, naô bafta fó quê o Medico fejá grande letrado ; he tambem neceffario que faiba grandes, & SS S eficas
Observaçao XVIII. 117 breditas pilulas de Pachio, quero eu agora, em servi¬ ço do bem commum, dizer os taes remedios; hum dos quaes he a agua seguinte, que para excitar o appe- tite de comer, & tirar o fastio, he quasi milagrosa, & se prepara do modo seguinte. Tomai de folhas de agrimonia, de losna, & de centaurea menor, de cada cousa destas meya mao cheya, tudo se coza em pane- la de barro com tres quartilhos de agua commua, & a este cozimento coado ajuntem tres onças de assucar, & cada dia dem ao doente meyo quartilho em jejum, & antes de seis vezes terá taon grande fome, que naon averà comer, que lhe baste, como tenho observado muitas vezes, principalmente em hum Cappellao do Embaixâdor de Carlos II. o qual teve hum fastio tao grande, que nenhuma cousa podia comer, mas depois que por, meu conselho tomou esta agua, comia com- tal fome, que parecia fome canina; & ficou taon obri¬ gado ao tal remedio, que me pedio a receita para le- var para Castella. E se acontecer que esta agua falte por causa das acerbas aguajens, ou por causa dos fla¬ tos, & rugidos do ventre, & estomago, podem usar do pò da tunica da muela da gallinha, de que tenho vis- to maravilhosos effeitos; ou se podem valer das mi¬ nhas pilulas absorbentes, que indubitavelmente se ti¬ raraon os azedumes, & flatulencias, com tal condiçao. que em cada caldo de frangao, ou de gallinha, desa- tem dous escropulos das ditas pilulas; mas com tal ad¬ vertencia, que o caldo seja magro; porque sendo gor¬ do, ou manteiguento, lhe naon a proveitaràon as pilulas; porque os azeites, as gorduras , & as manteigas, sao a causa total das azias, dos flatos, & dos máos cozimen¬ tos. 4. Aqui he digno de reparar porque razáo sendo o sobredito doente curado tanto tempo por Medicos doutos, nenhum aliviqtivesse, melhorando com tan¬ ta brevidade nas minas maos so com as pilulas de Pachio. A esta pergunita respondo, que para fazer hu¬ ma cura boa, naon basta so què o Medic o seja grande letrado; he tambem necessario que saiba grandes, & effica¬ *
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118 Observações Medicas Doutrinaes . efficazes remedios ; porque na opiniaõ de Asclepiades , ( 3 . ) he Medico de duzias aquelle , que para qualquer achaque naõ tiver preparados alguns remedios selectos , porque com elles atè hum barbeiro , ou qualquer velha ignorante farà milagres ; & sem elles nem Hippocrates , nem Galeno faraõ curas , que boas sejaõ . 5 . Ultimamente , como nas cousas humanas , por mais boas , & experimentadas que sejaõ , aja tantas falencias ; digo que se qualquer dos sobreditos remedios faltar , appellem para abrir duas fontes em ambas as pernas , porque com ellas tenho visto maravilhosos proveitos em semelhantes queixas do estomago , de que pudera allegar infinitos exemplos , senaõ temèra enfadar aos leitores . OBSERVAÇAM XIX De huma diarrhea , ou camaras colericas , que depois de durarem seis meses , degeneràraõ em lientericas taõ rebeldes , que tres Medicos de grande nome perdèraõ as esperanças de curallas : neste aperto disseraõ à doente , que eu tinha curado a algumas pessoas de semelhante enfermidade ; & com esta noticia me chamáraõ , & dentro de hum mes livrei da morte a sobredita senhora , que viveo , depois desta cura , trinta annos , quando nem trinta dias esperava viver. 1 . Seis meses continuos padeceo a ilustre senhora Dona Maria , mulher de Dom Miguel Pereira , huma diarrhea , ou camaras colericas , para cujo remedio se chamàraõ tres grandes Medicos , & vendo elles naõ só as ourinas muito vermelhas , mas grandes amargores de boca , & excessivo fastio , & que a camara era retinta de cor muito amarella , assentàraõ entre si que tudo procedia de quentura do figado , & entranhas , & que para se refrescarem estas , era necessa
118 Obfervações Medicas Doutrinaes. eficazes remedios; porque na opiniaõ de Afclepia- des, (3.) he Medico de duzias aquelle, que para qual- quer achaque nao tiver preparados alguns remedios felectos, porque com elles ate hum barbeiro, ou qual- quer velha ignorante farà milagres ; & fem elles nem Hippocrates, nem Galeno farao curas, que boas fe- jaõ. 5. Ultimamente , como nas coufas humanas, por mais boas, & experimentadas que fejao, aja tantas fal- lencias; digo que fe qualquer dos fobreditos remedios faltar, appellem para abrir duas fontes em ambas as pernas, porque com ellas tenho vifto maravilhofos: proveitos em femelhantes queixas do eftomago, de que pudera allegar infinitos exemplos, fena8 temera enfadar aos leitores. OBSERVAÇAM XIX. De huma diarrhea , ou camar as colericas, que depois de durarem feis mefes, degeneraraõ em lientericas tao rebeldes, que tres Medicos de grande nome perderag as esperanças de cur allas : nefte aperto differao a doen te, que eu tinha curado a algumas pe ffoas de femelhan -... te enfermidade ; & com efta noticia me chamarao , & dentro de hum mes livrei da morte a fobredita fenho -. ra, que viveo, depois defta cura , trinta annos, quan- do nem trinta dias esperava viver. I. S Eis mefes continuos padeceo a illuftre fe nhora Dona Maria, mulher de Dom Mi- guel Pereira, huma diarrhea, ou camaras colericas, para cujo remedio fe chamarao tres grandes Medicos, & vendo elles nao fó as ourinas muito vermelhas, mas grandes amargores de boca, & exceffivo faftio, & que a camara era retinta de cor muito amarella, affentà- raõ entre fi que tudo procedia de quentura do figado, & entranhas , & que para fe refrefcarem eftas, era ne- cella-
118 Obfervacoes Medicas Doutrinaes. efficazes remedios ; porque na opinia de Afclepia- des , (3:) he Medico de duzias aquelle, que para qual- quer achaque na tiver preparados algunsremedios felectos, porque com elles ate hum barbeiro, ou qual- quer velha ignorante fara milagres ; & fem elles nein Hippocrates, nem Galenofara curas, que boas fe- jao. 5. Ultimamcnte , como nas coufas humanas, por mais boas, & experimentadas que fejaö, aja tantas fal- lencias; digo que fe qualquer dos fobreditos remedios faltar, appellem para abrir duas fontes em ambas as pernas , porque com ellas tenho vifto maravilhofos: :proveitos em femelhantes queixas do eftomago, de que pudera allegar infinitos exemplos, fena temra enfadar aos leitores. OBSERVACAM XIX. De huma diarrhea, ou cainaras colericas, qué depois de duraremfeis mefes, degenerara em lientericas taö rebcldes, que tres Medicos de grande nome perdera as cfperangas de curallas : nefte aperto differa a doer te, que.cu tinba curado a algumas pefjoas de femelhan: te enfermidade ; com efta noticia me chamara , dentro de bum mes livrci da morte afóbredita fenbo-. ra, que viveo, depois defta cura, trinta annos, quat do nen trinta dias efperava viver. 1. Eis mefes continuos padeceo a illuftre fe nhora Dona Maria, mulher de Dom Mi- para cujo remediofe chamara tres grandes Medicos, & vendo elles naö fo as ourinas muito vermelhas, mas grandes amargores de boca, & exceffivo faftio, & que a camara era retinta de cor muito amarella, affenta- ra entre fi que tudo procedia de quentura do figado, & entranhas, & que para fe refrefcarem eftas, era ne- ceffa-
N Ú 118 Obfeivações Medicas Doutrinaes. efficazes remedios ; porque na opiniaó de Afclepia- des , (3.) he Medico de duzias aquelle, que para qual. uer achaque naõ tiver preparados alguns remedios fleãos, porque com elles até hum barbeiro, ou qual- quer velha ignorante farà milagres ; & fem elles nem Hippocrates, nem Galeno faraó curas, que boas fe- jao. 5. Ultimamente,comonasconfas humanas, por mais boas, & experimentadas que fejaó, aja tantas fal- lencias; digo que fe qualquer dos fobreditos remedios faltar, appellem para abrir duas fontes em ambas as pernas , porque com ellas tenho vifto maravilhofos: proveitos em femelhantes queixas do eltomago, de que pudera allegar infinitos exemplos, fena6 temêra : enfadar aos leitores. CG 0930 ans On c01500 03 S 00 Sn a0S 500 ans SO ao SS Om SO aa SSD SS Oo aoSOm, OBSERVAÇAM xXIX. De buma diarrhea , oucamaras colericas , que depous de durarem feu mefes , dezenerarao em hentericas taó rebeldes, que tres Medicos de grande nome perderag asefberanças de curallas : nefte aperto differao à doerk. te, que eu tinha curado a algumas peffoas de femelhan- te enfermidade ; & com efta noticia me chamárao , & dentro de hum mes livres da morte a fobredita fenho-. va, queviveo, depou defta cura , trinta annos , quan" do nem trinta dias elberava viver. 1. Eis mefes continuos padeceo a illuftre fez S nhora Dona Maria, mulher de Dom Mi- guel Pereira, huma diarrhea, ou camaras colericas,. para cujo remediofe chamãraôõ tres grandes Medicos, & vendo elles naô fó as ourinas muito vermelhas, mas grandes amargores de boca, & exceflivo faftio, & que à camara era retinta de cor muito amarella, aflentà- rao entre fi que tudo ptôcedia de quentura do figado, & entranhas , & que para fe refrelcarem eftas, era ne- celas
118 Observaçones Medicas Doutrinaes. efficazes remedios; porque na opiniao de Asclepia¬ des , (3.) he Medico de duzias aquelle, que para qual- quer achaque naon tiver preparados alguns remedios selectos, porque com elles ate hum barbeiro, ou qual quer velha ignorante farà milagres; & sem elles nem Hippocrates, nem Galeno faraon curas, que boas se¬ jaó. Ultimamente, como nas cousas humanas, por mais boas, & experimentadas que sejaon, aja tantas fal¬ lencias; digo que se qualquer dos sobreditos remedios faltar, appellem para abrir duas fontes em ambas as pernas, porque com ellas tenho visto maravilhosos: proveitos em semelhantes queixas do estomago, de que pudera allegar infinitos exemplos, senañ temèra enfadar aos leitores. OBSERVAQAM XIX. De huma diarrhea, ou camaras colericas, que depois de durarem seis meses, degeneraraoo em lientericas taò rebeldes, que tres Medicos de grande nome perderaß. as esperanças de curallas: neste aperto disseraon à does- te, que eu tinha curado a algumas pessoas de semelhan¬ te enfermidade; & com esta noticia me chamaraon, & dentro de hum mes livrei da morte a sobredita senho-. ra, que viveo, depois desta cura, trinta annos, quan¬ do nem trinta dias esperava viver. 1. Eis meses continuos padeceo a illustre se¬ )nhora Dona Maria, mulher de Dom Mi¬ guel Pereira, huma diarrhea, ou camaras colericas, para cujo remedio se chamàraon tres grandes Medicos, & vendo elles naon só as ourinas muito vermelhas, mas grandes amargores de boca, & excessivo fastio , & que a camara era retinta de cor muito amarella, assentଠraon entre si que tudo procedia de quentura do figado, & entranhas, & que para se refrescarem estas, era ne¬ cessa¬
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Observaçaõ XIX. 119 cessario deitarlhe todos os dias duas ajudas attemperantes , & sangralla humas vezes nos pès em razaõ do sexo feminino , outras vezes no braço direito na vea d’Arca , naõ so para revellir os humores colericos , que cahiaõ nos intestinos , mas para temperar o fervor do sangue ; dandolhe finalmente tres sangrias na costa da maõ direita , na vea Salvatella : tudo isto se executou ; mas sem alivio : resolvèraõse a purgalla duas vezes com remedio corroborante ; mas tambem sem proveito : appelláraõ para os remedios incrassantes tomados pela boca , como foraõ geleas de mãos de carneiro , arroz cozido com sebo de bode , sorvas secas , caldos feitos de partes iguaes de farinha , de favas torradas , & de bolotas , caldos de amido feitos em agua cozida com alquitira , marmelada de çumos comida em jejum , & antes de jantar , & de cear , lambedor de sorvas , o pò das tunicas interiores das castanhas assadas , o pò da raiz da erva limonio , o pò da ova do peixe Anjo apanhado em Mayo : ordenaraõlhe ~q bebesse pouca agua , & ella que fosse cozida com meya onça de limadura de osso de veado , & meya oitava de pò de alquitira : fizeraõlhe tomar por baixo bafos de vinagre forte cozido com çumagre , & pinhas bravas : valeraõse dos fumos do cerol , & do esterco de burro : fomentaraõlhe o ventre com unguento da condeça ; ordenandolhe por ultimo refugio que lhe puzessem nas plantas dos pès a erva sempre viva bem pizada, & em falta da tal erva usassem das folhas de couve pizadas com huma onça de sabaõ, & outra onça de sal: porèm como todos estes remedios, sendo excellentissimos, & muito experimentados, lhe naõ aproveitassem; antes vissem que a enfermidade se augmentava, & se parecia com a erva Anthemis , que quanto mais se piza , tanto mais cresce ; & com a Palmeira , que quanto mais carregada de peso , tanto mais levanta as suas ramas ; ou com o fogo , que quanto mais o pertendem apagar com o sopro , tanto mais crescem as suas lavaredas ; entenderaõ certamente que a dita senhora morria , pois com taõ decantados remédios peyorava : com tudo ,
Obfervação XIX. 119 ? ceffario deitarlhe todos os dias duasajudas attempe- rantes , & fangralla humas vezes nos pès em razao do fexo feminino, outras vezes no braço direito na vca d'Arca, nao fó para revellir os humores colericos, que cahiao nos inteftinos, mas para temperar o fervor do fangue ; dandolhe finalmente tres fangrias na cof- ta da maõ direita, na vea Salvatella : tudo ifto fe exe+ cutou ; mas fem alivio : refolveraofe a purgalla duas vezes com remedio corroborante; mas tambem fem proveito: appellarao para os remedios incraffantes to- mados pela boca, como foraõ geleas de mãos de car- neiro., arroz cozido com febo de bode, forvas feccas, caldos feitos de partes iguaes de farinha, de favas tor- radas, & de bolotas, caldos de amido feitos em agua cozida com alquitira, marmelada de çumos comida em jejum , & antes de jantar , & de cear , lambedor de forvas , o pò das túnicas interiores das caftanhas affa- das, o pò da raiz da erva limonio, o pò da ova do pei- xe Anjo apanhado em Mayo : ordenaraolhe q bebeffe -pouca agua, & effa que toffe cozida com meya onça. de limadura de offo de veado , & meya oitava de pò de alquitira: fizeraolhe tomar por baixo bafos de vina- gre forte cozido com cumagre, & pinhas bravas : va- Teraofe dos fumos do cerol , & do efterco de burro: fo- mentara6lhe o ventre com unguento da condeça; or -. ; denandolhe por ultimo refugio que lhe puzeffem nas plantas dos pes a erva fempre viva bem pizada , & em falta da tal erva, ufaffem das folhas de couve pizadas com huma onça de fabao, & outra onça de fal : porem como todos eftesremedios , fendo excellentiffimos, & muito experimentados , lhe nao aproveitaffem ; antes viffem que a enfermidade fe augmentava, & fe pare- cia com a erva Anthemis, que quanto mais fe piza, tan- - to mais: crefce ; & com a Palmeira, que quanto mais carregada de pefo, tanto mais levanta as fuas ramas; ou com ofogo; que quanto mais o pertendem apa- gar com. o fopro, tanto mais crefcem as fuas lavare- das; entenderao certamente que a dita fenhora mor- ria, pois com tao decantados remedios peyorava: com tudo, - ,
Obfervacao XIX. 119 ceffari deitarlhétodos os dias dúasajudas áttempe- rantes , & fangralla humas vezes nos pés em raza do fexofeminino, outras, vezes nobraco direito na vea d'Arca, na f' para revellir os humores colericos, que cahia nos inteftinos, mas para temperar ofervor dofangue; dandolhe finalmente tres fangrias na cof: .ta da ina direita , na vea Salvatella : tudo ifto fe exe? cutou ; mas f m alivio: refolvcrafe.a purgalla duas vezes com remedio.corroborante; mas tambem fem proveito: appellára.para os.remedios incraffantes.to- 'mados pela boca , como fora geleas de maos de car- neiro., arroz cozido com febo de bode, foryas feccas, taldos feitos de.partés iguaes de farinha, de favas torr radas, &.de bolotas, caldos.:de amido feitos em agua cozida.com aiquitira ,: marmelada de cunos comida em jejum ., & antes de. jantar, & de cear, lambedor de forvas , po das tunicas interiores das caftanhas affa- das.,opoda raiz da erva limonio, o po da ova do pei xe Anjoapanhado em Mayo : ordenaraolhe & bebeffe poucaagua, &effa que.toffecozida com micya onca, delimadurade offo de veado, & meya oitava de pö de alquitira: fizerathe tomar por baixo bafos de vina- gre.forte tozidocom cumagre, & pinhas bravas : va- Iéraöfe dosfumos do cerol, & do efterco de burro: fo- mentaratlhe o ventre com unguento da condeca ; or-. : denandolhe por. ultimo refugio que lhe puzeffem nas plantas dos pes a ervafempre viva bem pizada , & em. faltada tal erva, ufaffem das folhas de couve pizadas com huma.oncadefabaö, & outta onca de fal : porem como.todos eftes:remedios , fendo excellentiffimos, & muito:éxperimentados , lhe na aproveitaffem ; antes viffemquea enferridade fe adgmentava, & fe pare- cia cam aerva Anthemis,quequanto mais fe piza, tan- - to inais: crefce ; & com a Palmeira, que quanto:nais carregada: de pefo, :tanto mais. levanta as fuas ramas; ou com fogo; que :quanto mais operténdem apa- gar com-ofopro,tanto mais crefcem as fuas lavare- das;:tntenderacertamentegue a dita fenhora mor- ria, pois com taö decantados rerhedios peyorava: coin. .tudo,
o Obfervação XIX nm o o ceffario deitarlhetodos os dias duas ajudas átternpe- rantes , & fangralla humas vezes nos pês em razaõ do fexo feminino , outras vezes no braço direito na vea d* Arca, naô f[ó para revellir os humores colerieos, que cahiaó nos inteftinos, mas para temperar o fervor do fangue ; dandolhe finalmente tres fatigrias na cof. ta da maõ direita, na vea Salvatella : tudoilto fe exe; cutou ; mas fem alivio: refolvêraófe.a purgalla duas - | Vezes com remedio corroborante; mas tambem fem = | ! proveito: appelláraô para os remedios ineraffantesto= = Tmados pela boca; como foraó geleas de mãos decars * neiro, arroz cozido com febo de bode , forvas feccas, taldaos feitos de partes iguaes de farinha, de favas tor- radas , :& de boloras, caldos. de amido feitos em agua cozida. com alquitira , marmelada de çumos comida ;em jejum, & antes de jantar, & de cear, lambedor de » — fTorvas,'b pô dastúnicasinteriores das cáftanhas afla- das, o pô dá raiz da erva limonio, o pô da ova do pei- xe Anjo apanhado em Mayo: ordenàraólhe á bebeffe : -pouca:agua, & eflà quetofle cozida com micya onça. de limadura de oflo de veado, & meya oitáva de pô de alquitira: fizeraóthe tomar por baixo bafos de vina- ' greforte cozido com çumagre , & pinhas bravas: va- JTéraófe dos fumos do cerol, & do efterco deburro:fo- — | ; mentira6lhe o ventre com unguento da condeça; or-- eo x denandolhe por ultime refugio que lhe puzeflem nas Hilantaás dos pês a erva fempre viva bem pizada 2&em : faltada tal erva, ufaflem das folhas de couve pizadas com humã onça. defabaõ, & outra onça de fal : porém como .todós eftes remedios , fendo excellentiffimos, & muito éxperimentados , lhe naô aproveitaffem ; antes viffemquea enfermidade fe augmentava, & fe pares cia coma erva Anthemis,quequanco mais fe piza,tan- - to mais:erefce ; & com a Palmeira, que quantomais carregada de pefo; .tanto mais levanta as fuas ramas; oi com ofogo; que (quanto tnais opetrtendem apa- gar com.ofopro, tanto mais crefcem as fuas lavare- das; entendêraó certamente que adita fenhora mor- ria, pois com taô decantados Temedios peyorava: come : ' . tudo, : [3
S Observaçaon XIX. 113 cessario deitarlhe todos os dias duas ajudas attempe¬ rantes, & sangralla humas vezes nos pès em razaon do sexo feminino, outras vezes no braço direito na vea d'Arca, naô só para revellir os humores colericos, que cahiaon nos intestinos, mas para temperar o fervor do sangue; dandolhe finalmente tres sangrias na cos- ta da mao direita, na vea Salvatella. tudo isto se exe¬ cutou; mas sem alivio: resolvèraose a purgalla duas vezes com remedio corroborante; mas tambem sem proveito: appelláraon para os remedios incrassantes to¬ mados pela boca, como foraon geleas de maos de car- neiro, arroz cozido com sebo de bode, sorvas seccas, caldos feitos de partes iguaes de farinha, de favas tor- radas, & de bolotas, caldos de amido feitos em agua cozida com alquitira, marmelada de çumos comida em jejum, & antes de jantar, & de cear, lambedor de sorvas, ò pò das tunicas interiores das castanhas assa¬ das, o po da raiz da erva limonio, o pò da ova do pei- xe Anjo apanhado em Mayo: ordenàraolhe que bebesse pouca:agua, & essâ que fosse cozida com meya onça. de limadura de osso de veado , & meya oitava de pò de alquitira: fizeraolhe tomar por baixo bafos de vina¬ gre forte cozido com çumagre, & pinhas bravas: va¬ leraonse dos fumos do cerol , & do esterco de burro: fo- mentàrablhe o ventre com unguento da condeça; or- denandolhe por ultimo refugio que lhe puzessem nas plantas dos pes a erva sempre viva bem pizada, & em falta da tal erva, usassem das folhas de couve pizadas com huma onça de sabaon, & outra onça de sal: porèm como todos ęstes remedios, sendo excellentissimos, & muito experimentados, lhe naon aproveitassem; antes vissem que a enfermidade se augmentava, & se pare- cia com a erva Anthemis, que quanto mais se piza, tan¬ to mais cresce; & com a Palmeira, que quanto mais carregada de peso, tanto mais levanta as suas ramas; ou com ofogo, que quanto mais o pertendem apa¬ gar com o sopro, tanto mais crescem as suas lavare¬ das; entendèraon certamente que a dita senhora mor¬ ria, pois com taon decantados remedios peyorava: com, tudo,
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120 Observações Medicas Doutrinaes . tudo , porque nada ficasse por experimentar , me chamaraõ a 16 . de Fevereiro de 1670 . 2 . Avendo de começar a cura , foi a primeira diligencia ver a camara , porque do conhecimento della pendia o acerto do remedio : conheci pois que as camaras naõ eraõ diarrhea , como até aquelle tempo tinhaõ sido , porque o excremento naõ era amarello como açafraõ ; nem eraõ dysentericas , porque não tinhaõ sangue ; nem eraõ tenesmodicas , porque nem avia puxos , nem ardores no sesso ; nem eraõ chylosas , porque naõ sahia o chylo , ou materia branca como caldo de farinha ; nem eraõ celiacas , porque o comer que sahia pela camara naõ vinha de todo cru , nem de todo cozido : conheci porèm que as camaras eraõ lientericas , porque na camara vinha todo o comer cru do mesmo modo , com que tinha entrado pela boca , sem mudança , nem alteraçaõ alguma. 3 . Assentado pois que as camaras eraõ lientericas , considerei que a lienteria procede , ou por fraqueza , & relaxaçaõ da faculdade retentiva do estomago , que naõ podendo reter os mantimentos todo o tempo necessario para se cozerem , & converterem em chylo , o deixaõ sahir por baixo cru , & inalterado ; ou procede por irritaçaõ da faculdade expulsiva do estomago , que por sentir dentro em si grande carga de humores damnosos , os quer deitar fóra , & a volta delles deitaõ o mantimento. E porque a doente estava muito fraca , & fastienta , entendi que as taes camaras mais procediaõ de fraqueza , & relaxaçaõ do estomago , que de irritaçaõ dos humores , & assim lhe appliquei remedios confortativos , paraque se apertassem as rugas , & dobrezes do dito estomago , que por relaxadas , & amolecidas eraõ occasiaõ do mantimento sahir fóra do corpo . Para isto appliquei o seguinte emplastro , de que tenho grande experiencia. Tomai de folhas de murta , de losna , & de ortelãa , de cada cousa destas huma maõ cheya : de cascas de romãa ; de maçãs de acipreste , & de cascas de castanhas , & de çumagre , de cada cousa destas meya maõ cheya , tudo
120 Observações Medicas Doutrinaes. tudo, porque nada ficaffe por experimentar , me cha- marao a 16. de Fevereiro de.1670. 2. Avendo de começar a cura, foi a primeira di- ligencia ver a camara , porque do conhecimento del- la pendia o acerto do remedio: conheci pois que as camaras nao eraõ diarrhea, como até aquelle tempo tinhao fido, porque o excremento nao era amarello como açafraõ ; nem eraõ dyfentericas , porque nao ti- nhao fangue; nem eraõ tenefmodicas, porque nem · avia puxos , nem ardores no feffo; nem erao chylofas, porque naõ fahia o chylo, ou materia branca como caldo de farinha ; nem eraỡ celiacas , porque o comer que fahia pela camara naõ vinha de todo cru, nem de todo cozido: conheci porèm que as camaras eraõ lientericas , porque na camara vinha todo o comer. cru do mefmo modo, com que tinha entrado pela bo- ca, fem mudança, nem alteraçaõ alguma. 3: Affentado pois que as camaras erao lienteri- cas, confiderei que a lienteria procede, ou por fra- queza , & relaxacao da faculdade retentiva do efto- mago, que nao podendo reter os mantimentos todo o tempo neceffario para fe cozerem, & converterem em chylo, o deixao fahir por baixo cru, & inaltera- do; ou procede por irritação da faculdade expulfiva do eftomago , que por fentir dentro em fi grande car- ga de humores damnofos, os quer deitar fora, & > volta delles deitao o mantimento. E porque a doente eftava muito fraca, & faftienta, entendi que astaes camaras mais procediaõ de fraqueza;, & relaxaçaõ do eftomago, que deirritação dos humores, & affim lhe appliquei remedios confortativos, paraque fe aper- taffem as rugas, & dobrezes do dito eftomago , que por relaxadas , & amolecidas eraõ occafiaõ do manti- mento fahir fóra do corpo. Para ifto appliquei o fe- guinte emplastro, de quetenho grande experiencia. Tomai de folhas de murta , de loina, & de ortelaa, de cada coufa deftas huma maõ cheya : de cafcas de ro- mãa; de maçãs de aciprefte, & de cafcas de caftanhas, & de çumagre , de cada coufa deftas meya mao cheya, tudo
2o Obfervacöes MedicasDoutrinaes. tudo, porque nada ficaffé por experimentar , me cha mara6a 16. de Fevereirode1670. 2. Avendo de comecar a cura, foi a primeira di- ligencia ver a camara , porque do conhecimento del- la pendia o acerto do remedio: conheci pois que as camaras na era diarrhea, como até aquelle.tempo tinha fido, porque o excremento naeraamarell como acafra ; nemera dyfentericas ,porque naó ti- nha fangue; nem era tenefmodicas, porque nem avia puxos , nem ardores nofeffo; nem cra chylofas, porque na fahia o chylo; ou materia branca como caldo de farinha ; nem era celiacas , porque o comer que fahia pela camara na vinha de todocru, nen de todocozido: conheci porem queas camaras era lientericas., porque na camara vinha todo o comer. cru do mefmo modo , com que tinha entrado pela bo- ca , fem mudanca, nem alteracao al'guma. 3: Affentado pois que as camaras era lienteri- cas, confiderei que a lienteria procede, ou por fra queza , & relaxaca da faculdade retentiva doefto- mago , que na podendo reter:os mantimentostodo o tempo ncceffario para fe cozerem, & converterem em chylo, odeixa fahir por baixo cru, & inaltera- do; ou procede por irritaca da faculdade expulfiva do eftomago , que por fentir dentro em fi grande car-- ga de humores damnofos, os. que'r deitar fóra, & volta delles deita .o mantimento. E porque a doente eftava muito fraca, & faftienta, entendi que:astaes camaras mais procediade fraqueza:, & relaxaca do .eftomago, que deirritaca dos humores, & affim lhe appliquei remedios confortativos, paraque fe aper- taffem as rugas, & dobrezes do dito eftomago , quc por relaxadas , & amolecidas era occafia domanti- mento.fahir fóra do corpo. Para ifto appliquei o.fe- guinte emplaftro, de quetenho grande experiencia. Tomai defolhas dé murta , deloina, & de ortelaa,de cada coufa deftashuma ma cheya: :de cafcas de ro. maa; de imacas de aciprefte, & de cafcas de caftanhas, .& de gumagre , de cada coufa deftas'meya ma cheya, tudo.
bl á 1206 Oblervações Medicas Doutrinaes. tudo , porque nada ficafle por experimentar, me cha» mãàraõa 16. de Fevereirode-1670. S 2. Avendodecomeçar açura, foi a primeira di- ligencia ver a camara , porque do conhecimento del- la pendia o acerto do remedio: conheci pois que as camaras naó eraô diarrhea, como até aquelle tempo tinhaô fido, porque o excremento naô era amarello como açafraô; nem eraô dyfentericas ,porque naô ti- nhaô fangue; nem eraô tenelmodicas, porque nem avia puxos , nem ardores no feflo; nem eraô chylofas, porque naô fahia o chylo, ou materia branca como caldo de farinha ; nem eraô celiacas , porque o comet ue fahia pela camara naõ vinha de todo cru, nerá de todo cozido: conheci porêm queas camaras eraó lientericas , porque na camara vinha todo o comer. cru do mefmo modo , com que tinha entrado pela bo- ca, fem mudança, nemalteraçaõ alguma. * 3 Aflentado pois que as camaras eraô lienteri-' cas, confiderei que a lienteria procede, ou por fras - queza , & relaxaçao da faculdade retentiva do efto- mago , que nao podendo reter.os mantimentos toda o tempo neceffario para fe cozerem , & converterem emchylo, odeixaõ fahir por baixo cru, & inaltera- do ; ou procede porirritaçaô da faculdade expulfiva do eftomago , que por fentir dentro em fi grânde car»: ga de humores damnofos, os: quer deitar fóra, & à volta delles deitaô o mantimento. E porque a doente eftava muito fraca, & faftienta , entendi queastaes camaras mais procediaô de fraqueza, & relaxaçao do eftomago, que deirritaçaó dos humores, & aflim lhe appliquei remedios conforrativos, paraque fe aper» taflem as rugas , & dobrezes do dito elftomago , que por relaxadas , & amolecidas eraóô occafiaô do manti-> mento fahir fórado corpo. Para ifto appliquei o fe- guinte emplaítro , de quetenho .graáhde experiencia. Tomaide folhas dê murta , deloína» & de ortelãa , de cada coufa deftas huma maô cheya: de cafcas de ro- mãa; de maçãs de acipreíte; & de cafícas de caftanhas, «8 de çumagre , de cada coufa deftas meya maô cheym : : o ” tudo cemcam ' '
120 Observaçones Medicas Doutrinaes. tudo, porque nada ficasse por experimentar, me cha¬ màrao a 16. de Fevereiro de 1670. 2. Avendo de começar a çura, foi a primeira di- ligencia ver a camara, porque do conhecimento del- la pendia o acerto do remedio: conheci pois que as camaras naô erao diarrhea, como até aquel se tempo tinhao sido, porque o excremento nao era amarello como açafrao; nem eraon dysentericas, porque naon ti¬ nhaon sangue; nem eraô tenesmodicas, porque nem avia puxos, nem ardores no sesso; nem eraon chylosas, porque nao sahia o chylo, ou materia branca como caldo de farinha; nem eraon celiacas, porque o comer que sahia pela camara nao vinha de todo cru, nem de todo cozido: conheci porèm que as camaras eraon sientericas, porque na camara vinha todo o comer cru do mesmo modo , com que tinha entrado pela bo¬ ca, sem mudança, nem alteraçaon alguma. 3: Assentado pois que as camaras eraon lienteri¬ cas, considerei que a lienteria procede, ou por fra- queza, & relaxaçaon da faculdade retentiva do esto¬ mago, què naon podendo reter os mantimentos todo o tempo necessario para se cozerem, & converterem em chylo, o deixaon sahir por baixo cru, & inaltera¬ do; ou procede por irritaçaon da faculdade expulsiva do estomago, que por sentir dentro em si grande car- ga de humores damnosos, os quer deitar fora, & à volta delles deitaon o mantimento. E porque a doente estava muito fraca, & fastienta, entendi que as taes camaras mais procediaon de fraqueza, & relaxaçaon do estomago, que de irritaçaon dos humores, & assim lhe appliquei remedios confortativos, paraque se aper¬ tassem as rugas, & dobrezes do dito estomago, que por relaxadas, & amolecidas eraon occasiaon do manti¬ mento sahir fora do corpo. Para isto appliquei o se¬ guinte emplastro, de que tenho grande experiencia. Tomai de folhas dê murta, de losna , & de ortelana , de cada cousa destas huma maon cheya: de cascas de ro¬ mana; de maçans de acipreste, & de cascas de castanhas, „& de çumagre, de cada cousa destas meya maon cheya, tudo
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OBSERVAÇAÕ XIX 121 tudo se machuque , & coza a fogo lento com tres quartilhos de vinho tinto , atè que fique ametade , & esta se guarde em garrafa bem fechada , & em tres onças do tal vinho mandei ensopar duas onças de codeas de paõ torradas , ajuntando ao tal biscouto outras tanta quantidade de marmelada de çumos , hum punhado de folhas de losna , outro de ortelãa , & em hum gral de pedra mandei pizar todas estas cousas , atè que ficasse huma massa igual , & uniforme , & desta estendi huma pouca sobre hum panno , & borrifandoa com o sobredito vinho , a polvorizei com pòs de murta , canela almecega , & aromatico rosado , applicando este emplastro quente sobre o estomago , & ventre duas vezes no dia : porèm como o effeito deste remedio naõ correspondesse ao meu desejo , appellei para fomentar o estomago , & ventre com o balsamo de copaíba , cuja virtude em semelhantes casos costuma ser maravilhosa ; mas como esta diligencia tambem se frustrasse , suspeitei que as camaras procediaõ de irritaçaõ , & carga do estomago , & que por isso peyorava com os confortativos , & adstringentes , porque naõ queria a natureza , que lhe retivessem os humores , que como fermento damnoso a irritavaõ , & perturbavaõ as suas obras . Assentando pois que os cursos naõ procediaõ de relaxação , ou fraqueza , mas de irritação , & copia dos humores , tratei de evacuallos , porque sem isso seria impossivel curar a doença , & para este fim fiz tomar à doente , tres dias successivos , o meu xarope , que juntamente he purgativo dos humores , & confortativo das entranhas , & se prepara do modo seguinte. Tomem de cascas de myrobalanos citrinos tres oitavas , de ruibarbo escolhido oitava & meya , façaõse estas duas cousas em pò grosso , & deitemse de infusaõ por tempo de doze horas em huma canada de agua de tanchagem bem quente , & passado o dito tempo , se deite fora a agua , & se sequem os pòs a fogo lento , & entaõ se farà hum cozimento fresco cordeal capaz de se repartir em tres partes iguaes , & no tal cozimento ( estando ainda quente , mas jà fora do lume ) mandei dei
Obfervaçao XXIX. rudo fe machuque , & coza a fogo lento com tres! ! quartilhos de vinho tinto , ate que fique ametade, & cita fe guarde em garrafa bem fechada, & em tres on- ças do tal vinho mandei enfopar duas onças de codeas de pañtorradas, ajuntando ao tal bifcouto outra tan- ta quantidade de marmelada de cumos , hum punha- do de folhas de lofna, outro de ortelaa , & em. hum gral de pedra mandei pizar todas eftas confas, atè que, ficaffe huma maffa igual, & uniforme , & defta eften- di huma pouca fobre.hum panno., & borrifandoa com ofobredito vinho, a polvorizei com pos de murta , ca- nela , almecega, & aromatico rofado, applicando ef- te emplaftro quente fobre o eftomago, & ventre duas vezes no dia: porem como o effeito defte remedio nao correspondeffe ao meu defejo,appellei para fomentar o eftomago, & ventre com o balfamo de cupaiba, cuja virtude em femelhantes cafos coftuma fer maravi- lhota; mas:como efta diligencia tambem fe fruftraffe, fufpeitei que as camaras procediao de irritação , & carga do eftomago, & que por ifo peyorava com os confortativos, & adftringentes, porque nao queria a natureza', que lhe retiveffem os humores, que como fermento damnofo a irritavao ; & perturbavao as fuas obras. Affentando pois que os curfos naõ procediaõ de relaxaçaõ;, ou fraqueza, mas de irritação , & co- pia doshumores , tratei de evacuallos, porque fem iffo feria impoffivel curar a doença, & para efte fim fiz to- mar à doente, tres dias fucceffivos, o meu xarope , que juntamente he purgativo dos humores, & confortati- vo das entranhas, & fe prepara do modo feguinte. To- mem decafcas de myrobalanos citrinos tres oitavas, de ruibarbo efcolhido: oitava & meya, façaofe eftas duas coufas em .pogroffo, & deitemfe de intufao por tempo de doze horas em huma canada de agua de tang chagem bem quente , & paflado o dito tempo, fe dei- tefóra a agua, & fe fequem os pos a fogo lento, & entao fe farà hum cozimento frefco cordeal capaz de fe re- partir emtres partes iguaes, & no tal cozimento ( ef- tando, ainda quente almas jà fora do lume.) mandei dei- 12F ! 1 · 3 3 e 0 . :
ObfervacaoX1X.:: 12r rudo fe imachuque, & coza.a:fogo lento:com tres: : quartilhos de vinho tinto, atequefique ametale, & cfta féguarde em garrafa bemfechada, & em tres on- as do tal vinho mandeienfopar duasoncas decodcas de patorradas, ajuntandoaotal bifcouto outra tan-- ta quantidade de marmelada de.cuinos , hum punha- do defolhas de lofna, outro de.ortelaa, &: ein. hum. gral de pedra mandéi pizar todaseftas coufas, até que. ficaffe huma maffa igual, & uniforme, & deftaeften- di huma poucafobre.hum pannio., & borrifandoa comi ofobredito vinho, a palvorizei:cam pos de murta , ca- nala, almecega, & aromatico rofado , applicando ef- te emplaftroquente fobre öeftomag, & ventre duas vezes no dia: porein como o effeito defte remedio na correfpondeffe ao:meu defejo;apptllei para fomentar oeftomago, & ventre com obalfamo de cupaiba, cuja virtude em femelhantes : cafos: coftuma: fer maravi- lhofa; mas:comoefta diligenciatambem:fefruftraffe, fufpeitei quas camavas procedia. de irritaca , & carga do eftomago; & que por iffo peyorava con os confortativos, & adftringentes, porque na queria a aatureza, que lhe retiveffem bs humores., que coino fermento damnofo a irritava , & perturbavaas fuas obras. Affentando pois.que os.curfos naprocedia de relaxaca:, ou fraqueza, mas.dc irritaca, .&. co- pia doshumores ,tratci de evacuallos, porque fem iffo feria impoffvel curar adoensa , &:paraefte fim fiz to-. mar a doente, tres dias:fusreffivos,amcu xarope , que juntamentehe purgativodos humores:, &.confortati- vodasentranhas,& fe prepara do:rhodofeguinte.To- . mem de'cafcas de myrobalanos. citrinos ties oitavas: de ruibarbo. efcolhido:oitava &meya, fagafeeftas t duas coufas.em.pgroffo, & deitemfe de infufa. por tempa de.doze horas:em huma.canada de:agua de tana chagem bem quente ,& paflado odito tempo:, fe dei-- te:fóra aagua,& fefequem osposa fogólentos& enta fe fara lhumcozimento. frefco cordeal capaz de fe re- partir: eurtraspartes iguaes, & no:tal cozimento ( ef- tando,ainda: quenta: mas ja:fóra do: lume.) mandei dei-
“a 3 COblervação XIX. O r12r mdo fe machuque, & coza.a.fogo lento:com tres. * quartilhos de vinho tinto ; ate que fique amera te , 8 cia fé guarde em garrafa bem fechada , & em tes on- ças do tal vinho mandei enfopar duasonças decodeas de paótorradas , ajuntando ao tal bifcouto outra tan- ta quantidade de marmelada de.çumos ; hum punha- do defolhas de lofna , outro de ortelãa , &' em. hum gral de pedra mandei pizar todas eftas confas; atê que, ficafle huma maffa igual, & uniforme, & defta eften- di huma pouca fobre.hum panno,, & borrifandoa comi ofobredito vinho, a polvorizeicôm pôs de muyta , ca“ — rnala,almecega, & aromatico rofado, applicando ef- > —teemplaftroquente fobre ó eftamago , & ventre duas ' Vezesnodia: porêm como o effeito defte remedio nao : —correfpondefle aomeu defejo;appellei para fomentar - —“oeftomago, & ventre com o balfamo de cupaiba, cuja vírtude em femelhantes cafos. coftuma-ter maravi> lhofa; mas:como efta diligencia tambem:fe fruftrafle, fufpeitei que.as camaras: procediao de irritação , &: carga do eftomago ; & que poriffo peyorava comi os conforrativos , & adftringentes , porque naó queria a ! narureza, quelhe retiveflem:os humores , que coiro . —fermentodamnofoairritavaô; & perturbava6'as fuas , obras. Affentando pois.que os curfos naõ procediaõO . derelaxação, oufraqueza, mas-de-irritação, & co“ ;j piddoshumores strarei de evacuallos, porque fem iflo « Teriaimpoflivelcurar adoença, & para efte fimfizto- ; maràdoente,tresdias e A Matonaaráa ;que juhtamenteéhe purgativo dos humares., & conforrati- vodas entranhas, & le prepara-dommodo feguinte.To- ) , mem de'cafcas de myrobalanos Gitrinos tres oitavas;, ; Ê de ruibarbo. efcolhido: oitava &meya, façadie eftas * dunas confagem pô-groflo, & deivernie de intuíaó por tempade doze horas.em humá canada de-água de tans chagem bem quente , & paflado adito tempo”, fedeêi- É tefóraaagua,& fefequem-aspôsa fogó lento; & entaô | >, fe fará lar cozimento. frefeo cordleal capaz dee re-. mo " partirêmerrespartés iguiaes.,'& no tal cozimento ( ef. : DNA ARA mandei ão : dei-
Observaçaon XIX. 121 tudo se machuque, & coza a fogo lento com tres quartilhos de vinho tinto, atè que fique ameta le, & esta se guarde em garrafa bem fechada, & em tres on¬ ças do tal vinho mander ensopar duas onças dęcodeas de pao torradas, ajuntando ao tal biscouto outra tan¬ ta quantidade de marmelada de çumos, hium punha¬ do de folhas de losna, outro de ortelana, & em. hum gral de pedra mandei pizar todas estas consas, atè que ficasse huma massa igual, & uniforme, & desta esten¬ di huma pouea sobre hum panno, & borrifandoa com o sobredito vinho, a polvorizei com pos de murta, ca¬ nela, almecega, & aromatico rosado , applicando el- te emplastro quente sobre o estomago, & ventre duas vezes no dia: porèm como o effeito deste remedio naon correspondesse ao meu desejo, appellei para fomentar o estomago, & ventre com o balsamo de cupaiba, cuja virtude em semelhantes casos costuma ser maravi¬ lhosa; mas como esta diligencia tambem se frustrasse, suspeitei que as camaras procediaon de irritaçaon, & carga do estomago, & que por isso peyorava com os confortativos, & adstringentes, porque nao queria a natureza, que lhe retivessem os humores, que como fermento damnoso a irritavaon, & perturbavaon as suas obras. Assentando pois que os cursos naon procediaon de relaxaçaon, ou fraqueza, mas de irritaçaô, & co¬ pia dos humores, tratei de evacuallos, porque sem isso seria imposswvel curar a doença, & para este fim fiz to¬ mar à doente, tres dias sugcessivos, o meu xarope, que juntamente he purgativo dos humores, & confortati¬ vo das entranhas, & se prepara do modo seguinte. To¬ mem de cascas de myrobalanos gitrinos tres oitavas, de ruibarbo escolhido oitava & meya, façaôse estas duas cousas em pò grosso, & deitemse de infusaon por tempo de doze horas em huma canada de agua de tan¬ chagem bem quente, & passado o dito tempo, se dei¬ te fora a agua, & se sequem os pòs a fogò lento, & entaon se farà llum cozimento fresco cordeal capaz de se re¬ partir em tres partes iguaes, & no tal cozimento (es¬ tando ainda quente, mas jà fora do lume) mandei dei¬
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122 Observações Medicas Doutrinaes . deitar os sobreditos pós preparados , & deixando-os ficar de infusaõ outras doze horas , se coe o cozimento , & se reparta em tres quinhoes iguaes , ajuntando a cada quinhaõ onça & meya de xarope chamado das nossas rosas. Acabados que foraõ de tomar os tres xaropes , teve a doente huma taõ grande melhoria , que todos cantàraõ a vitoria ; mas este gosto durou pouco , porque começou a ter camaras lientericas procedidas , a meu ver , de que o estomago com a excessiva evacuaçaõ que teve , se debilitou de modo , que não pode cozer os alimentos , & por esta razaõ precisamente sahiam fóra do corpo crus pela via da camara , & consequentemente naõ se cozendo os alimentos , naõ podia aver chylo , & naõ o avendo , faltava a materia de que se aviam de formar o sangue , os espiritos , o Ros , o Cambio , & o Gluten ; & por isso o corpo se hia emmagrecendo , & marasmando . Feito assim este juizo , resolvi que o unico remedio avia de ser o uso do aço , porque só este ( àlem de ser grande alcalico , & absorbente dos humores ácidos ) abre efficazmente as opilações , & ficando os caminhos desempedidos , naõ só parariaõ as camaras lientericas , mas se faria boa sanguificaçaõ , & nutriçaõ. Deilhe pois as pilulas de aço , (a que , vulgarmente chamamos de Paulo Antonio ) vinte manhãas ; porque nunca me pareceo boa pratica , & uso dar o aço à tarde ; porque naquellas horas naõ está o estomago taõ limpo , & despejado como nas manhãas : & foi o successo taõ admiravel , que pareceo obra de encantamento ; porque estando esta senhora já pranteada , quando me chamàraõ , logrou , por beneficio desta cura , trinta annos de vida . 4 . Duas cousas quero advertir aos Medicos principiantes . A primeira he , que quem ouver de curar camaras , as veja todos os dias , assim para conhecer a qualidade dellas , como para tirar a causa donde procedem , porque de outra sorte quem pertender curallas com emplastros adstringentes , ou com remedios engrossantes , farà hum erro sem desculpa ; pois naõ ha jà barbeiro taõ ignorante , nem velha taõ simplez , que naõ
122 Obfervações Medicas Doutrinaes. deitar os fobreditos pos preparados, & deixando-os ficar de infufao outras doze horas, fe coe o cozimento, & fe reparta em tres quinhoes iguaes , ajuntando a ca- da quinhaõ onça & meya de xarope chamado das nof- fas rofas. Acabados que forao de tomar os tres xaro- pes, teve a doente huma tao grande melhoria , que to- dos cantàraõ a vitoria; mas efte gofto durou pouco, porque começou a ter camaras lientericas procedi- das, a meu ver, de que o eftomago com a exceffiva eva- cua çaõ que teve, fe debilitou de modo , que nao pode cozer os alimentos, & por efta razao precifamente fa- hiam fora do corpo crus pela via da camara, & confe- quentemente nao fe cozendo os alimentos , naõ podia aver chylo, & nao o avendo, faltava a materia de que fe aviam de formar ofangue, osefpiritos, o Ros, o "Cambio, & o Gluten; & por iffo o corpo fe hia emma- grecendo, & marafmando. Feito affim efte juizo , re+ folvi que o unico remedio avia de fer o ufo do aço, porque fo efte (alem de fer grande alcalico, & abfor- bente dos humores ácidos ) abre efficazmente asop- pilações, & ficando os caminhos defempedidos, nao. fó parariaõ as camaras lientericas, mas fe faria boz fanguificação, & nutricao. Deilhe pois as pilulas de aço; (a que, vulgarmente chamamos de Paulo Anto- nio ) vinte manhãas; porque nunca me pareceo boa pratica , & ufo dar o aço à tarde; porque naquellas horas nao eftá o eftomago tao limpo, & defpejado co -.. mo nas manhãas : & foi o fueceffo tao admiravel , que pareceo obra de encantamento; porque eftando efta fenhora já pranteada, quando me chamarao, logrou, por beneficio defta cura, trinta anos de vida. 4. Duas coufas quero advertir aos Medicos prin- cipiantes. A primeira he, que quem ouver de curar ca- maras, as veja todosos dias, affim para conhecer a qua- lidade dellas , como para tirar a caufa donde proce- dem , porque de outra forte quem pertender curallas: com emplaftros adftringentes , ou com remedios en- groffantes, farà hum erro fem defculpa; pois nao ha ja : barbeiro tao ignorante, 'nem velha tao fimplezy que não 1 f C P
12 Obfervacöes Medicas Doutrinaés. deitar os.fobreditos pós preparados,& deixando-os ficar de infufa outrasdoze horas,fe coe o coziménto; & fe reparta em tres quinhos iguaes, ajuntando a ca- da quinha onca & meya de xarope chamado das nof-- fas rofas. Acabados que forade tomar os tres xaro- pes, teve a doente huma ta grande melhoria :que to- dos cantara a vi toria, mas efte gofto durou pouco, porque comecou a ter camaras lientericas procedi- das, a.méu ver, de que o eftomago com a exceffva eva cuaca que teve , fe debilitou de inodo, que na pode cozer os alimentos, & por efta raza precifamente fa- hiam fora do corpo crus:pela via da camara , & confe- quentemente nao fe.cozendo os alimentos , na podia aver chylo, & na oavendo, faltava a materia deque fe aviam de formar ofangue, osefpiritos, o Ros, & 'Cambio, & o Gluten; & por iffo o corpo fe hia emma grecendo, & marafinando. Feito affim efte juizo , re* folvi que o unico remedio avia de fer o ufo doaco, porquef6 efte (alem de fer grande alcalico., & abfor bente dos humores. ácidos ) abreefficazmente asop- pilacoes, & ficando os caminhos defempedidos., nao. fo pararia as.camaras lientericas , mas fe faria boa fanguificasa, & nutrica. Deilhe. pois as pilulas de aco, (aque vulgarmente chamamos de Paulo Anto- nio) vinte manhaas; porque nunca me pareceo boa pratica , & ufo dar oaco a tarde; porque naquellas horas na efta o eftomago ta limpo, & defpejado co--. mo nas manhaas :& foi o fu@reffo ta admiravel , que pareceo obra de encantamento ; porque éftando efta. :1 fenhora ja pranteada ; guando me chamara , iogrou, 0 por beneficio defta cura, trinta annos de vida. Duas coufas quero advertir aos Medicos prin-: 4. cipiantés. A primeira he, que quem.ouver de. curar ca .maras,as veja todosos dias, affim para conhécer a qua. Hidade dellas , como para.tirar: a caufa dondeproce-.. dem , porque deoutra forte quempertender curallas: com emplaftros'adftritgentes , ou com remdios en-: groffantes, fara humerrofem defculpa; pois na ha ja : barbeiro ta ignoranté , nem velha taö fumplez: que nao
122 Obfervações Medicas Doutrinaes. 'deitar os fobreditos pós preparados, & deixando-os ficar de infufaó outras doze horas, fe coe o cozimento; & fe reparta emtres quínhoês iguaes , ajuntando a ca- da quinhaõ onça & meya de xarope chamado das nof= fasrofas. Acabados que foraô de romar os tres xaro- pes, teve a doente huma taô grande melhoria ;queto- dos cantàraô a vitoria; mas efte gofto durou pouco, porque começou a ter camaras lientericas procedi- das, a méu ver, de que o eftomago coma excelfiva eva- cuaçaô que teve, fe debilitou de modo , que naó pode cozer og alimentos , & por efta razaó precifamente fa- hiam fóra do corpo crus-pela via da camara , & confe- . quentemente naô fe cozendo os alimentos, nao podia aver chylo, & naô oavendo, faltava a materia de que, fe aviam de fotmar ofangue, osefpiritos, o Ros, & "Cambio, & o Gluten; & por iflo o corpo fe hia emma- grecendo, & maraftnando. Feito afim efte juizo, re+ folvi que o unico remedio avia de fer o ufo doaço, porque fó efte (Alem de fer grande alcalico, & abfer bente dos humores. ácidos) abre eficazmente asop- pilações , & ficando os caminhos defempedidos , naõ. tó parariaõ as. camaras lientericas, mas fe faria boa fanguificaçaô , & nutriçaõ. Deilhe.pois as pilulas de aço; (a que vulgarmente chamamos de Paulo Anto-- nio ) vinte manhãas; porque nunca me pareceo boa pratica ; & nfo dar oaço à tarde; porque naquellas oras naô eftão eftomago taó limpo, & defpejado co-- mo nas manhãas :s& foi o fugte(lo taô admiravel , que pareceo obra de encantamento ; porque êftando efta, tenhora já pranteada ; quando me chamãraô , logrou, por beneficio defta cura, trinta. annos de vida. 4. “Duasconfas quero advertit aos Medicos prin: cipiantés. À primeira he, que quer ouver de enrar cas -maras,as veja todosos dias, aflim para conhécei a qua= Hdade dellas , como para tirar a caufa donde.proce-. dem , porque de outra forte quem-pertendes curallas: com emplaftros adfitringentes , ou com remedios en-: groflantes, farà hum erro fem defculpa; pois naô ha ja - arbeiro taô ignoránte ,'nem velha taó limplezy que | nao
122 Observaçones Medicas Doutrinaes. deitar os sobreditos pós preparados, & deixando-os ficar de infusaon outras doze horas, se coe o cozimento, & se reparta em tres quinhoës iguaes, ajuntando a ca¬ da quinhaon onça & meya de xarope chamado das nos- sas rosas. Acabados que foraon de tomar os tres xaro¬ pes, teve a doente huma taon grande melhoria , que to- dos cantàraô a vi toria; mas este gosto durou pouco, porque começou a ter camaras lientericas procedi¬ das, a meu ver, de que o estomago com a excessiva eva- cua çaon que teve , se debilitou de modo , que nao pode cozer os alimentos , & por esta razaon precisamente sa- hiam fora do corpo crus pela via da camara, & conse¬ quentemente naon se cozendo os alimentos , naon podia aver chylo, & naon o avendo, faltava a materia de quę se aviam de formar osangue, os espiritos, o Ros, o Cambio, & o Gluten; & por isso o corpo se hia emma¬ grecendo, & marasmando. Feito assim este juizo, re¬ solvi que o unico remedio avia de ser o uso do aço, porque só este (àlem de ser grande alcalico , & absor- bente dos humores acidos) abre efficazmente as op¬ pilaçones, & ficando os caminhos desempedidos, naon sò parariaon as camaras lientericas, mas se faria boa sanguificaçaon, & nutriçaon. Deilhe pois as pilulas de aço, (a que, vulgarmente chamamós de Paulo Anto- nio) vinte manhanas; porque nunca me pareceo boa pratica, & uso dar o aço à tarde; porque naquellas horas naon està o estomago taon limpo, & despejado co¬ mo nas manhanas: & foi o suęcesso taon admiravel, que pareceo obra de encantamento; porque estando esta fenhora já pranteada, quando me chamàraon, sogrou, por beneficio desta cura, trinta annos de vida. 4. Duas cousas quero advertir aos Medicos prin¬ cipiantes. A primeira he, que quem ouver de curar ca¬ maras, as veja todos os dias, assim para conhecer a qua¬ lidade dellas, como para tirar a causa donde proce- dem, porque de outra sorte quem pertender curallas com emplastros adstringentes, où com remedios en¬ grossantes, farà hum erro sem desculpa; pois naon ha jà barbeiro tao ignorante, nem velha tao simplez, que Dald
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OBSERVAÇAÕ XIX. 123 naõ saiba , que em quanto a causa dos cursos estiver dentro no corpo , sera mais prejudicial supprimillos , que deixallos correr à revellia ; porque de naõ applicar remedios , naõ se faz agravo à natureza , antes naõ a fatigando , póde ella acudir por si , & remediarse ; porèm , querendo reterlhe os humores dentro com os remedios adstringentes , lhe fazem hua grande violencia , repugnando às suas leys , que pedem se deite fóra o que he damnoso . Este parecer tem em seu favor a authoridade do grande Medico Valhes , ( 1 ) o qual diz que mayor erro he fazer algu remedio quando se naõ avia de fazer , que deixar de o fazer quando se devia obrar ; porque póde a natureza como douta , & mestra fazer aquella mesma obra , que o Medico por descuido , ou ignorancia deixou de fazer ; mas pelo contrário obrar , quando se devia naõ obrar , he ir contra os dictames da natureza : o que he erro de mayor grandeza . 5 . A segunda cousa , que quero advertir aos Medicos principiantes , he , que o aço naõ só curou as camaras sobreditas pela virtude absorbente , com que temperou a mordacidade dos humores irritantes , mas porque com o exercicio , que com elle se fez , se abriraõ os póros , & se fez melhor a transpiraçaõ ; o que he taõ conveniente para impedir as camaras , que gravissimos Authores nas camaras muito teimosas mandaõ dar suores de estufa . Claramente se deixa conhecer esta verdade ; pois experimentamos , que nos dias , & tempos muito frios , & nos homens de pelle muito grossa , como transpiraõ menos , ourinaõ , & cursaõ mais ; & pelo contrario experimentamos que no tempo quente , & os que tem a pelle muito delgada , como transpiraõ muito , por terem os póros mais abertos , ourinaõ , & cursaõ pouco ; assim o entendeo o insigne Medico Gabelchofero ; ( 2 . ) & daqui acabo eu de entender a razaõ , porque no fim do Estio , & no principio do Outono , reynaõ mais as camaras , que nas outras quadras do anno. OBSER-
Obfervação XIX .. 123 - ñao faiba, que em quanto a caufa dosturfos eftiver dentro no corpo, fera mais prejudicial o fupprimillos, que deixallos correr à'revellla ; porque de haõ ap- plicar remedios, naõ fe faz aggravo à natureza, an- res nao a fatigando, pode ella acudir por fi, & reme- diarfe ; porèm querendo reterlhe os humores dentro com os remedios adftringentes , lhe fazem hűa gran- de violencia , repugnando às fuas leys, que pedem fe deite fora o que he damnofo. Efte parecer tem em feu favor a authoridade do grande Medico Vathes, ( I.) o* qual diz que mayor erro he fazer algu remedio quan- do fe nao avia de fazer , que deixar de o fazer quando fe devia obrar .; porque póde a natureza como douta, & meftra fazer aquella mefma obra, que o Medico por defcuido, ou ignorancia deixou de fazer; maspe- lo contrario obrar , quando fe devia nao obrar, heir .contra os dičtames da natureza : o que he erro de ma- yor grandeza .. 5.3 : A fegunda coufa , que quero advertir aos Me- dicos principiantes, he, que o aço naõ fó curou as ca- maras fobreditas pela virtude. abforbente, com que temperou a mordacidade dos humores irritantes, mas porque com o exercicio, que com elle fe fez, fe abrirao os poros , & fe fezmelhor a tranfpiraçaõ; o que he tao conveniente para impedir as camaras, que graviffimos Authores nas camaras muito teimofas mandao dar fuores. dereftufa. Claramente fe deixa conhecef efta verdade ; pois experimentamos, que nos dias, & tem- pos muito frios, 80 nos homens de pelle muito groffa, como tranfpirao menos, ourinao, & curfao mais ; & pelo contrario experimentamos que no tempo queni te, & os que tema pelle muito delgada, como tranf- pirao muito , porterem os póros mais abertos , ouri+ nao, & turfao pouco; affim o entendeo o infigne Me- dico Gabelchofero; (2.) & daqui acabo eu de enten- der a razao, porque no fim do Eftio, & no principio do Outono, reynaỡ mais as camaras, que nas outras quadras daanno. OBSER- 1 1 1 1 ( ! i 1 1- , !
Obfervaca: XIX.:. 123 na faiba, queem quanto a caufa dosturfos eftiver dentro no corpo, feramais prejudicial o fupprimillos, que deixallos crrér a'revellia , prquedd ha ap- plicar remedios, na fe.faz aggravo a natureza, an- rsnaafatigando, p6deella acudir por fi, & rent. com osremedios. adftringentes, lhefazem hüa gr'an- de violencia , repugnandoas fuas.leys, que pedem fe . deite fórao que hedamnofo..Efte parecer tem cmfeu favor a authoridade.do grande.Medico Vathes , (1.) o qual.diz que.mayor erro he fazer algu remedio quan- dofe.naavia de fazer ,: que deixar de o fazer quando fe devia obrar.;, porque póde a natureza:comodouta, & meftra fazer aquella mefma obra, que o Medico por defcuido, ou ignorancia deixou de fazer's mas:pe- lo contrario.obrar , quando.fe.devia na brar , he ir 1 .contra os di tames da natureza : o.que he.erro de ma yor grandeza.. .: 5.. : Afegundacoufa, que:quero.advertir aos Me- dicos:principiantes , he, queoacona f6 curou as ca- imaras fobreditas:pela yirtude:abforbente', com que temperaua mordacidade dos humores irrirantes, mas 'porque com o exercicio, que com elle fe fez,fe abrira os pros,& fe fezmelhor a tranfpiraca; o que he ta converiiente paraimpedir as camaras,que graviffimos Authares: nas.camaras muito.teimofas mandao dar fuores. da:eftufa. Claramente fe deixa. conhecer efta verdade , pois experimentamos , que nos dias., & tem- pos muitofrios, &nos homens depelle muito groffa, como tranfpira:mends,0urina, & curfa mais, & pelo contrario experimentamos que no:tempo guenr te , & os quc ten.a pelle. muito.delgada., como tranf- piraö muito , por terem os póros mais abertos, ouri+ na, & curfa poucar;affim entendeo infigne Me- dico:Gabekchofero, (2.:) & daquiacabo eu de enten der araza, porque no fim doEftio, &nö .principio da.Outono, reyna&nais as,camaras, quenas outras quadras daanno. : :. :* OBSER.
Obfervação XD 123 ! haôfaiba, quicem quanto a caufa dosturios eftiver 1 — dentronocorpo,feramais prejudicial ofupprimillos, = que deixallos édrrer à revellia ;'porquedd haô ap« plicar remedios , nao fe faz aggravo à natureza, an +» —vesnadafatigando, pódeella acudirpor fi, & reme- »* - diarfe; porêem,querendo reterlhe os DM imores dentro * “com os remedios. adítringentes , lhe fazem hãa gran- .. + deviolencia, repugnandoàs fuas leys , que pedem fe deite fóra o que hedamnofo..Efte parecer tem em-feu * tivor a authoridade do grande Medico Valhes, (1.) o*º qual diz que mayor erro he fazer algá remedio quan- do fe naó'avia de fazer : que deixar de o fazer quando fe devia obrar.;, parque póde a úáturezaçomo doura, & melitra fazer aquella mefma obra, que o Medico : por defenido;, ou ignorancia deixou de fizer mas:pe- L 2 O contrario obtar, quando fe devia na6 dbrar, heir e; contra-os di&tamas da naturéza o que he erro de má» ' *yorgrandeza. +. da | «6 9.º :Afegundacoufa, que:quero advertir aos Mex . dicos principiantes ; he, queoaço nao fó curou as ca- | inaras fobreditas:pela virtude. abforbente, com que 1! temperouamordacidade dos humores irritantes, mas : —'porquecomo exercicio, que com elle fe fez, fe abriraõ . —ospóros,&fefezmelhoratranfpiraçaõ; o quê he taô 1 conveniente parvimpedir as camaras, que graviflimos Authares nas camaras muito teimolas mandao dar fuores. deeftufa. Claramente fe deixa conhecet efta . — verdáde; pois experimentamos, que nos dias, & tem« pos muito frios, &onos homens de pelle muito groffa; como tranípirao.meios , outinaõ, & curfaó mais ; & pelo contrario experimentamos que notempo quen; te, & os queten1a pélle muito delgada, como tranf- piraô muito , porterem os póros: mais abertos , ouri« hRaó, & turfa poucas; afim o entendeo o infigne Me- dica. Gabékchofero; (2.) &daqui acabo eu de entens der arazaó, porque-no fim do Eftio, & no principio da Outono, reyna&-mais as camaras , que. nas outras quadras daânno. 11 So cs o coro E,
Observaçao XIX. 123 naon saiba, que em quanto a causa dos cursos estiver dentro no corpo, sera mais prejudicial o supprimillos, que deixallos correr à revellia; porque de hao ap¬ plicar remedios, nao se faz aggravo à natureza, an- res naon a fatigando, pode ella acudir por si, & reme¬ diarse; porèm, querendo reterlhè os humores dentro com os remedios adstringentes, lhe fazem huma gran¬ de violencia, repugnando às suas leys, que pedem se deite fora o que he damnoso. Este parecer tem em seu favor a authoridade do grande Medico Valhes, (1.)o qual diz que mayor erro he fazer algum remedio quan¬ do se nao avia de fazer, que deixar de o fazer quando se devia obrar; porque pode a natureza como douta, & mestra fazer aquella mesma obra, que o Medico por descuido, ou ignorancia deixou de fazer; mas pe¬ lo contratio obrar, quando se devia nao obrar, he ir contra os dictames da natureza: o que he erro de ma¬ yor grandeza. 5. A segunda cousa, que quero advertir aos Me¬ dicos principiantes, hie, que o aço naon so curou as ca¬ maras sobreditas pela virtude absorbente, com que temperou à mordacidade dos humores irritantes, mas porque com o exercicio, que com elle se fez, se abriraon os poros, & se fez melhor a transpiraçaon; o què he taon conveniente para impedir as camaras, que gravissimos Authores nas camaras muito teimosas mandaon dar suores de estufa. Claramente se deixa conhecer esta verdade; pois experimentamos, que nos dias, & tem¬ pos muito frios, & nos homens de pelle muito grossa, como transpiraon menos, ourinaon, & cursaon mais; & pelo contrario experimentamos que no tempo queni te, & os que tema pelle muito delgada, como trans- piraon muito, por terem os poros mais abertos, ouri¬ naon, & cursaon poucor; assim o entendeo ò insigne Me¬ dico Gabelchofero; (2.) & daqui acabo eu de enten¬ der a razaon, porque no fim do Estio, & no principio do Outono, reynaon mais as camaras, que nas outras quadras do anno. ...... OBSER¬ .
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124 OBSERVAÇÕES MEDICAS DOUTRINAES . OBSERVAÇAM XX . De hum fluxo de almorreimas taõ grande , & continuo , que debilitou as officinas naturaes de maneira, que em lugar de gerarem sangue bom , & saudavel , geràraõ tanta quantidade de soros acres , que naõ podendo a natureza deitallos fora de si , se foraõ ajuntando , & crescendo de tal sorte , que fizeraõ huma hydropesia perigosissima , a que eu acudi com alguns remedios especificos , cujo effeito foi taõ feliz , que salvou o doente a vida , quando só se esperava a morte . 1 . Muitas pessoas ha , que em certos tempos do anno , ou em diversas horas do dia deitaõ sangue por differentes partes do corpo ; humas o deitaõ pelas almorreimas , outras pelo nariz , outras pela via da ourina , outras pela madre ; & taõ longe estaõ os ditos fluxos de ser damnosos , que algumas vezes saõ muito uteis , com tanto que naõ sejaõ excessivos , porque se o forem , se prostraráõ as forças , se enfraqueceráõ as officinas , & se extinguirà o calor natural de tal maneira , que os doente perderáõ a vida , ou , a bom livrar , perderaõ as cores , & ficaráõ languidos , molares , fastientos , balofos , inchados , & hydropicos ; no qual caso deve o Medico empenharse muito em suspender logo os ditos fluxos , ou diminuillos , sob pena de cõmetter hum erro sem desculpa . Em confirmaçaõ desta verdade me seja permittido referir o caso seguinte . 2 . O Muito virtuoso Padre Fr . Estevaõ , Dominicano Hybernio , tinha varias vezes no anno hum fluxo de sague hemorrhoidal , com que se achava muito aliviado , & lograva saude ; porèm ( naõ sei porque causa ) passados algus annos se lhe esquentou , & adelgaçou o sangue de tal modo , que o dito fluxo passou de interpolado a continuo , & de moderado a excessivo & como o doente estivesse costumado a ter a sobredi
124 Obfervações Medicas Doutrinaes. OBSERVAÇAM XX. De hum fluxo de almorreimas tao grande, do continuo, que debilitou as oficinas naturaes de maneira, que ems lugar de gerarem fangue bom , ds laudavel, gerardo 1 tanta quantidade de foros acres, que.nao podendo a natureza deitallos fora de fi , fe forao ajuntando, & crefcendo de tal forte, que fizerao huma hydropefa perigofiffima , a que eu acudi com alguns remedios.ef- pecificos , cujo efeito foi tao feliz, que falvou o doente a vida, quando fó fe esperava a morte. € I. M Uitas peffoas ha, que em certos tem- pos do anno, ou em diverfas horas do dia deitao fangue por differentes partes do corpo; hu- mas o deitaõ pelas almorreimas, outras pelo nariz; outras pela via da ourina, outras pela madre; & tao longe eftao os ditos fluxos de fer damnofos , que al+ gumas vezes faõ muito uteis, com tanto que naõfejaã exceffivos ; porque fe o forem , fe proftrarao as forças; fe enfraquecerao as officinas, & fe extinguira o calor natural de tal maneira, que os doentes perderáõ a vi» da, ou, a bom livrar, perderao as cores , &.ficarão lane guidos, molares, Faitientos , balofos, inchados, & hydropicos ; no qual cafo deve o Medico empenharfe muito em fufpender logo os ditos fluxos, ou diminuil. los , fob pena de cometter hum erro fem defculpa. Em confirmação defta verdade me feja permittido referin o cafo feguinte. . 2. O Muito virtuofo Padre Fr. Eftevao, Domini- cano Hybernio, tinha varias vezes no anno hum flu xo de fangue hemorrhoidal , com que fe achava mui- to aliviado, & lograva faude ; porem ( nao fei porque caufa ) paffados algus annos fe lhe efquentou, & adel- gaçou ofangue de tal modo, que o dito fluxopaffou de interpolado a continuo, & de moderado a exceffi- vo; & como.o doente eftiveffe coftumado a ter a fo- bredi- .. .
124 Obfervacoes Medica$ Doutrinaes. O.BS E.R.V A.C A.M.XX.. : De bum fluxode almorreimas ta grande, s.continuöj que debilitou as officinas.naturaes de waneira, qne em lugar de gerarem fangue bom , d laudauel,gerara : tanta quantidade defórosacres,:que.napodendo:a natureza deitallos föra def, fe fora ajuntando., s crefcendo.de talforte, que fizeraö buma bydropefa perigosfkma; a que cu acudi com alguns remadios.ef pecificos , cujo effeito foi ta feliz, que falvou o doente a vida, quando f6 fe efperava a morte. 1: Uitas pefloas ha, que em certos tem-- pos do anno, ou em diverfas.horas do dia deita fangue por differentes partes do corpo; hu- mas o deita pelas almorreiinas, outras pelonarizy outras pela via daourina, outras pelamadre; & ta longe efta .os ditos fluxos de fer damnofos.,: queal- gumas vezes fa muitouteis, com'tanto qúe naöteja exceffivos ; porque fe o forem , fe proftrará as forcasi fe enfraquecera as officinas , & fe extinguira calor natural de tal maneira, que os doentes perdera a vi. da, ou, a bom livrar, perdera as cores , &:ficarao lana guidos, inolares, faftientos, balofos, inchadas , & hydropicos ; no qual cafo deve o.Medico empenharfe muito em fufpender logo.os.ditos fluxos, ou:diminuil. ios , fob pena de cömetter hurm errofem defculpa. Em confirmaca defta verdade me fejapermittido: referin o cafofeguinte. :2. O Muito virtuofö Padre Fr Efteva, Domini . cano Hybernio, tinha varias vezes aoanno:humflu xo de fangue hemorrhoidal, coin.que feachava mui i to aliviado, & lograva faude, porem( na&feiporque caufa ) paffados algus annos fe Ihcefquentou, & adel-.. gacou ofangue de tal modo, que o dito fluxopaffou de interpolado a continuo, & de moderada a exceff-: vo; & como.o.doente eftiveffe coftumado a terafo: bredi-
124 Obfervações Medicas Doutrinaes. . GO AtSOo es GROcnS 500 OSSO aa» vaGdcs «ns Soo can dto ns Sto fit tEA OBSERVAÇAM XX. . De hum fluxo de almorreimas taô grande , & continso, - que debilizou as oficinas naturaes de wancira , que em lugar de gerarem fangue bom , & laudavel, gerarao x ' tanta quantidade de foros acres, que nabo podendo a natureza deitallos fóra de fi, fe forao ajuntando, & crefeendo de tal forte, que fizerao huma hydropefia perigofiflama , a que eu acudi com alguns remedios ef. - pecificos, cujo effeito foitao feliz, que [falvou o doente - avida, quando fó fe elberava a morte. : 1. . NÉ Uitas pefloas ha , que em certos tem. : pos do anno, ou em diverfas horas do “ diadeitao fangue por differentes partes do corpo; hu= * mas o deita pelas almorreiinas, outras pelo nariz, outras pelá via da ourina , outras pela madre; & raô longe eftaô os ditos fluxos de fer damnofos., que al» gumas vezes faô muito uteis, com'tanto que nao feja& exceflivos ; porque fe o forem , fe poliãa forças; fe enfraquecerão as officinas , & fe extinguirà à calor natural detal maneira, que os doentes perderáõ a vi» da, ou, a bom livrar, perderáõ as cores , &ficaraó lana guidos, molares;, Yaítientos , balofos , inchados ,-& hydropicos ; no qual cafo deve o Medico empenharfe “muitoem fufpender logo.osditos fluxos, ou:diminuile los , fob pena de cômerter hum erro fem defeulpa. Em confirmaçaõ defta verdade me fejapermitrido referi o cafo feguinte. | ES ERCCENS: “2. OMuitovirtuofo Padre Fr. Eítevaô, Dominis * canoHybernio, tinha varias vezes no anno hum flus — xodefangue hemorrhoidal, com que feachava muis - - toaliviado,& lograva faude ; porém ( naõ fei porque : caufa)paífados algús annos fe lhe efquentou, .& adel. ' gaçou ofangue de tal modo, que o dito fluxo paffou . deinterpolado a continuo, & de moderado a exceffi-- : vo; & como.o doente eftivefle coftumado ater.a fo- . Ro o brediz ” |
. ... 124 Observaçones Medicas Doutrinaes. ate arsgo aßease a aßoo arseaele aegeßeaden OBSERVAQAM XX. De hum fluxo de almorreimas taou grande, & continuo, que debilitou as officinas naturaes de manera, que em lugar de gerarem sangue bom, & laudavel, geraraon tanta quantidade de soros acres, que naq podendo a natureza deitallos fora de si, se foraon ajuntando, & crescendo de tal sorte, que sizeraon huma hydropesiu perigosissima, a que eu acudi com alguns remedios ef¬ pecificos, cujo effeito foi taon feliz, que salvou o doente a vida, quando so se esperava a morte. Uitas pessoas ha, que em certos tem¬ pos do anno, ou em diversas horas do dia deitaon sangue por differentes partes do corpo; hu¬ mas o deitaô pelas almorreimas, outras pelo nariz, outras pelà via da ourina, outras pela madre; & taon longe estao os ditos fluxos de ser damnosos, que al¬ gumas vezes saon muito uteis, com tanto que nao sejaon excessivos, porque se o forem, se prostraraon as forças, se enfraqueceraon as officinas, & se extinguirà ò calor natural de tal maneira, que os doentes perderaon a vi- da, ou, a bom livrar, perderaon as cores, & ficarion lan¬ guidos, molares, fastientos, balofos, inchados, & hydropicos; no qual caso deve o Medico empenharse muito em suspender logo os ditos fluxos, ou diminuil¬ los, sob pena de commetter hum erro sem desculpa. Em confirmaçaon desta verdade me seja permittido referir ò caso seguinte. 2. O Muito virtuoso Padre Fr. Estevaon, Domini¬ cano Hybernio, tinha varias vezes no anno hum flu¬ xo de sangue hemorrhoidal, com que se achava mui- to aliviado, & lograva saude; porèm (naon sei porque causa) passados alguns annos se lhe esquentou, & adel¬ gaçou o sangue de tal modo, que o dito fluxo passou de interpolado a continuo, & de moderado a excessi¬ vo; & como o doente estivesse costumado a ter a so- bredi¬
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OBSERVAÇAÕ XX . 125 bredita evacuaçaõ (postoque menos grande , & menos repetida ) sem que experimentasse damno , antes conhecido proveito , entendeo lhe naõ poderia fazer mal o consentilla , & assim a deixou continuar mui largos tempos sem querer suspendella , atè que enfraquecidos os espiritos , & debilitada a faculdade sanguificante ( pelo muito sangue que tinha evacuado ) cahio em huma cachexia , perdeo as cores , & se fez balofo , inchandolhe todo o corpo , como se estivesse hydropico ; ao que se ajuntou huma fraqueza taõ grande , que nem se podia ter em pè , nem dar huma passada sem muito trabalho . 3 . Neste aperto recorreo o dito enfermo ao meu conselho , paraque lhe acudisse ; & entendendo eu que a causa do sobredito fluxo procedia de copia de soros acres , & salsuginosos , que esquentavaõ , & irritavaõ o sangue , paraque sahisse por qualquer parte que pudesse , determinei purgar logo os taes humores , paraque deitado fóra do corpo o fermento acrimonioso , que irritava , & arrarava o sangue , se reprimisse o fluxo , & para este effeito lhe receitei , para tres dias , a seguinte purga , que para semelhantes casos he mui celebrada . Tomai de cascas de myrobalanos citrinos duas oitavas , de folhas de tanchagem huma maõ cheya, tudo se machuque levemente , & se coza a fogo lento em panela de barro com meya canada de agua da fonte , & em cinco onças deste cozimento coado deitei de infusaõ , por huma noite , dous escropulos de ruibardo escolhido , & vinte grãos de espicanardo , & coandose pela manhãa este licor , lhe mandei ajuntar tres onças de xarope das nossas rosas , & deste modo mandei se continuassem tres bebidas em dias successivos ; sem embargo porèm que a inchaçaõ , & fluxo hemorrhoidal se diminuiraõ muito com estas purgas repetidas , naõ sortiraõ effeito taõ feliz , que me desobrigassem de appellar para o seguinte cordeal , que para hua , & outra doença he mui appropriado . Tomai de raizes de pentafiláõ , ( a que a gente vulgar chama solda , ou tormentilla ) huma oitava , de folhas de tancha
124 OBfervaça6 XX. bredita evacuação (poftoque menos grande, & menos repetida ) fem que experimentaffe damno, antes co- nhecido proveito, entendeo lhe naõ poderia fazer mal o confentilla, & affim a deixou continuar mui largos tempos fem querer fufpendella, atè que enfraqueci- dos os efpiritos, & debilitada a faculdade fanguifican+ te (pelo muito fangue que tinha evacuado ) cahio em huma cachexia, perdeo as cores , & fe fez balofo, in+ chandolhe todo o corpo, como fe eftiveffe hydropi» co ; ao que fe ajuntou huma fraqueza tao grande, que nem fe podia ger em pe, nem dar huma paffada fem muito trabalho. 3. Nefte aperto recorreo odito enfermo ao meu confelho, paraque lhe acudiffe ; & entendendo eu que a caufa do fobredito fluxo procedia de copia de foros acres , '& falfuginofos, que efquentavao, & irritavao ofangue, paraque fahiffe por qualquer parte que pu defle , determinei purgar logo os taes humores, para- que deitado fóra do corpo o fermento acrimoniofo, que irritava, & arrarava o fangue, fe reprimiffe o flu- xo, & para efte effeito lhe receitei, para tres dias, a fe- guinte purga, que para femelhantes cafos he muice- lebrada. Tomai de cafcas de myrobalanos citrinos duas oitavas , de folhas de tanchagem huma mao che- ya, tudo fe machuque levemente, & fe coza a fogo lento em panela de barro com meya canada de agua ·da fonte, & em cinco onças defte. cozimento coado deixei de infufao , por huma noite, dous efcropulos de ruibarbo efcolhido , & vinte gtãos de efpicanardo, & coandofe· pela manhãa efte licor , lhe mandei ajuntar tres onças de xarope das noffas rofas, & defte modo mandei fe continuafem tres bebidas em dias fucceffi- vos ; fem embargo porem que a inchacao, & fluxo he- morrhoidal fe diminuirao muito com eftas purgas re- peridas, nao fortiraõ effeito tao feliz , que me defobri- gaffem de appellar para o feguinte cordeal , que para hua, & outra doença he mui appropriado. Tomai de raizes de pentafilão, ( a que a gente vulgar chama fol- da, ou tormentilla ) huma oitava, de folhas de tan- cha- : 0 : 1 e 1 1 - ----- !
OBfervacaoXX.. 124 bredita evacuacao (poftoque menos grarde, & menos repetida) fem que experimehtaffe damno, ántes co nhecido proveito, enterideo lhe na poderia fazer mal o conféntilla , & affim a deixou continuar imui largos tempos fen querer fufpendella, até que enfraqueci: dos os efpiritos, & debilitada a faculdade fanguifican- te (pelo muito fangue que tinha.evacuado ) cahio. em huma cachexia, perdeo as cores,& fe fez balofo, in chandolhe todo corpo, como fe eftiveffe hydropi- co ; aoque feajuntou humafraqueza taö grande, que nemfe podia ter em pe, nem dar huma paffada fem muito trabalho. 3: Nefteapertorecorreo @dito enfermo aomeu confelho, paraque lhe acudiffe ; & entendendó eu qu@ a .caufa do fobredito fuxo procedia de copia de foros acres, &falfuginofos, que efquentava, & irritava ofangue, paraque:fahiffle por qualquer parte que pu deffe, determinei purgar logo os taes humores, para* que deitado fora do corpo ofermento acrimoniofo, que irritava, & arrarava fangue., fe reprimiffe o fu- xo, & paraefte effeito lhe receitei, para tres dias, a fe- guintepurga, que para femelhantes cafos he mui ce- Tebrada. .Tomai de. cafcas de myrobalanos citrinos duas oitavas, de folhas de tanchagem huma ma'che- ya, tudo femachuque levemente, &: fecoza afogo lenta cm paneia de barro comi meya canada de agua .da. fonte , & em.cinco oncas defte: cozimento coado: deitei de infufa , por huma:noite, dous efcropulos de ruibarbo cfcolhido;& vinte gtaos decfpicanardo, & coandofe. pela manhaa cfte licor , lhe mandei ajuntar tres oncas de xarope das noffas rofas, & deftemodo mandei fe continuaffem trés bebidas em dias fucceffi- yo$ ; fem embarge porem que a inchaca, & fluxo he- morrhoidal fe diminuira muito comeftas purgas re- peridas, na fortira effeito ta feliz , que me defobri- gaffemde appellar :para o feguinte cordeal , que para hua, &outra doenca hemui appropriado. Tomai de raizes.de pentafilá, ( a.que a gente vulgar chama fol-. da, ou tormentilla ) huma oitava, de folhas de tan- cha-
“1 ObBfervação XX x bredita evacuaçaô (poftoque menos grande, & menos repetida ) fem que experimehrafle damno ; ántes co“ nhecido proveito, entendeo lhe naô poderia fazer mal o confêntilla , & aflim 1 deixou continuar nai lárgos tempos fem querer falpendella, até que enfraqueci* dos os efpiritos, & debilitada a faculdade fanguibeans te (pelo muito fangue que tinha evacuado ) cahio em huma cachexia , perdeo as cores , & fe fez balofo, inº chandolhe todo o corpo , como fe eftivefle hydropi» co ; ao'que feajuntou huma fraqueza taóô grande, que nem/fe podia ger em pê, nem dar huma-paífada fem . .« muitotrabalho. : ' 3: Nefteapertorecorreo átlito enfermo ao meu confelho, paraque lhe acudiffe ; & entendendo eu que a caufa do fobredito fluxo procedia de copia de foros acres ,' & falfugínolos , que elquentavaõo , & irritava6 o fangue , paraque fahifle por qualquer parte: que pus ' defle , determinei purgãr logo os taes humores, para» que deitado fóra do corpo o fermento acrimonio(o, — queirritava, & arrarava o fangue, fereprimifle o flu- : ? , xo, & para efte effeito lhe receitei, para tres dias, a fez inte purga , que para femelhantes cafos he mui ce- ebrada. Tomai de calcas de myrobalanos citrinos duas oitavas , de folhas de tanehagem huma mãô che- a, tudo fe machuque levemente , & fecoza a fogo enra em panela de barro com meya canada de agua "«dafonte, & em cinco onças defte. cozimento coade- deitei de infufaô , por huma noite, dous efcropulos de suibarbo efcolhido ;& vinte gtãos de elpicanardo , & coandofe. pela manhãa efte licor , lhe mandei ajuntar «res onças de xarope das noffas rofas , & defte modo mandei fe continuaflem tres bebidas em dias fuceeffia vos ; fem embargo porém que a inchaçaó, & fluxo he- amorthoidal fe diminuirao muito com eftas purgas re. peridas, naó fortiraó effeiro taó feliz , que me defobri- gaflem de appellar «para ofeguinte cordeal , que para bãa , & outra doeiça he muiappropriado. Tomai de taizes de pentafilãô , ( a qãe a gente vulgar chama fol- da, ou toxmentilla ) huma oitava, de folhas de tan” SA : cha- ê - ' | quam
Observaça6 XX. 125 bredita evacuaçaon (postoque menos grande, & menos repetida) sem que experimentasse damno, antes co¬ nhecido proveito, entendeo lhe naon poderia fazer mal o consentilla, & assim a deixou continuar mui largos tempos sem querer suspendella, atè que enfraqueci¬ dos os espiritos, & debilitada a faculdade sanguifican¬ te (pelo muito sangue que tinha evacuado) cahio em huma cachexia, perdeo as cores, & se fez balofo, in¬ chandolhe todo o corpo, como se estivesse hydropi¬ co; ao que se ajuntou huma fraqueza taon grande, que nem se podia ter em pè, nem dar huma passada sem muito trabalho. Neste aperto recorreo odito enfermo ao meu conselho, paraque lhe acudisse; & entendendo eu que a causa do sobredito fluxo procedia de copia de soros acres, & salsuginosos, que esquentavaon, & irritavaon o sangue, paraque sahisse por qualquer parte que pu¬ desse, determinei purgar logo os taes humores, para- que deitado fora do corpo o fermento acrimonioso, que irritava, & arrarava o sangue, se reprimisse o flu¬ xo, & para este effeito lhe receitei, para tres dias, a se¬ guinte purga, que para semelhantes casos he mui ce¬ lebrada. Tomai de cascas de myrobalanos citrinos duas oitavas, de folhas de tanchagem huma mao che¬ ya, tudo se machuque levemente, & se coza a fogo lento em panela de barro com meya canada de agua da fonte, & em cinco onças deste cozimento coado deitei de infusaon, por huma noite, dous escropulos de ruibarbo escolhido, & vinte granos de espicanardo, & coandose pela manhana este licor, lhe mandei ajuntar tres onças de xarope das nossas rosas, & deste modo mandei se continuassem tres bebidas em dias successi¬ vos; sem embargo porèm que a inchaçaon, & fluxo he¬ morrhoidal se diminuiraon muito com estas purgas re¬ petidas, naon sortiraon effeito taon feliz, que me desobri¬ gassem de appellar para o seguinte cordeal, que para huma, & outra doença he mui appropriado. Tomai de raizes de pentasilaon, (a que a gente vulgar chama sol¬ da, ou tormentilla) huma oitava, de folhas de tan¬ cha¬
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126 Observações Medicas Doutrinaes . chagem, & de polygono , (chamada por outro nome centinodia , & na lingua Portugueza erva andorinha , ) de cada cousa destas huma maõ chea , tudo se coza em panela de barro com duas canadas de agua commua , & a este cozimento coado ajuntei tres oitavas de coral bem preparado, & outras tres oitavas de crocus martis adstringente ; & deste cordeal mandei bebesse o doente , mas com grande moderaçaõ , por naõ acrescentar a inchaçaõ , nem o fluxo das almorreimas , porèm como as veas hemorrhoidaes estivessem muito enfraquecidas , & relaxadas , assim pela grande quantidade de sangue , que aviaõ deitado , como pela muita duraçaõ da doença , facilmente tornou a cahir no mesmo fluxo , para o que ajudavaõ muito as forças que fazia , quando cursava ; principalmente sendo os excrementos duros ; & vendome obrigado a acudir novamente ao sobredito fluxo , entendi que o modo mais seguro de suspendello era darlhe algum vomitorio ; porque ( como diz Galeno ) ( 1 . ) nenhum remedio aproveita tanto nos achaques das partes vergonhosas , & fluxos de humor que para ellas corre ; & por esta razaõ lhe dei tres onças de agua benedicta vigorada : & naõ me sahio baldada a esperança ; porque tomando o tal remedio vomitou , & divertio tanta quantidade de coleras , & humores serosos , que affirmou estava saõ ; mas como , passadas poucas semanas , lhe tornasse novo fluxo hemorrhoidal acompanhado com grandissimas dores , entendi que tudo procedia de acrimonia , & azedume dos humores , por estarem pervertidos , & affastados de sua natural temperança : porque (conforme o sentir dos Medicos modernos ) todas as dores , ou sejaõ de pleurizes , ou de almorreimas , ou de gotta , ou de dentes , ou rheumaticas , ou ictericas , procedem do acido errante ; ( 2.) nos quaes casos , para fixar , & rebater a acrimonia , & azedume dos taes humores ordenei o seguinte remedio . Tomem de coral vermelho , subtilissimamente preparado , huma onça , de folhas de polygono ( a que vulgarmente chamamos erva andorinha ) seis oitavas , de sangue de dragão meya
126 Obfervações Medicas Doutrinaes. chagem., & de polygono, ( chamada por outro nome centinodia , & na lingua Portugueza ervaandorinha, de cada coufa deftas huma mao chea, tudo fe coza em panela de barro com duas canadas de agua commua, & a efte cozimento coado ajuntei tres oitavas de co- ral bem preparado, &outras tres oitavas de crocus martis adftringente; & defte cordeal mandei bebefs fe o doente, mas com grande moderação, por nad acrescentar a inchaçao, nem o fluxo das almorreimas ;. porem como as veas hemorrhoidaes eftivefem muito enfraquecidas, & relaxadas, afim pela grande quan tidade de fangue, que aviao deitado , como pela mui? . ta duração da doença, facilmente tornou a cahir no mefmo fluxo , para o que ajudavaõ muito as forças que fazia, quando curfava ; principalmente fendo os excrementos duros"; & vendome obrigado a acudir. novamente ao fobredito fluxo, entendi que omodo. mais feguro de fufpendello era darlhe algum vomito-' rio ; porque (como diz Galeno) (1.) nenhum remedio aproveita tanto nos achaques das partes vergonhofas ;. & fluxos de humor que para ellas corre; & por efta ras zao lhe dei tres onças de agua benedicta vigorada: & nao me fahio baldada a efperança; porque tomando o tal remedio vomitou, & divertio tanta quantidade de coleras, & humores ferofos , que affirmou eftava faos mas como , paffadas poucas femanas , lhe tomaffe noi vo fluxo hemorrhoidal acompanhado com grandifi- mias dores , entendi que tudo procedia da acrimonia). & azedume dos humores, por eftarem pervertidos; & affaftados de fua natural temperança: porqueif con- forme o fentit dos Medicos modernos ) todas as dores, ou fejao de pleurizes , ou de almorreimas, ou de got . ta, ou de dentes , on rheumaticas, ou ictericasy pros cedem do acido errante ; (2.) nos quaes cafos , para fia xar, & rebater a acrimonia, & azedume dostaes hoy mores ordenei o feguinte remedios Tomem de corat. vermelho, fubtiliffimamente preparado , huma'onças de folhas de polygono (a que vulgarmente chamamos. erva andorinha ) feis oitavas , de fangue dexsagaa meya i
126 Obfervaces Medicas Doutrinaes. chagem., & de polygono, (. chamada poroutro noni& centinodia, & nalinguaPortugueza ervaandarinha,} de cadacoufadeftas: huma machea , tudofecoza:en panela debarro com duascanadas deagua commua, & a efte cozimiento coado ajuntei: tres.oitavasde co ral bem preparado , &outras tres itavas: de:crocas: martis adftringente ; & defte: cordeal maadeibebef fe o doente', mas com grande moderataö: por'na acrefcentar a inchaca , nem o fluxo das abmorréimass: porém como as veas hemorrhoidaes:eftiveffem:muiao enfraquecidas, & relaxadas, affm pelagrande.quar tidade defangue, que avia deitado, como pelamui ta duraca: da doenga, facilmente tornou acahir no mefmo fluxo ; para que ajudava muito.as forcas que fazia, quando curfava ; principalmente fendo osr: excrementos duros; & vendome obrigado a acudir: novamente ao fobredito fluxo., entendi que. omodo mais fegurode fufpendello era darlhe algum vomito-: rio ; porque (como diz Galeno) (1.) nenhum remedio aproveita tanto nos achaques das partes.vergonhofas, & fluxos.de:humor que para ellas corre; & por eftara: zalhe dei tres ongas de agua benedicta vigorada: & na me fahiobaldada a efperanca ; porque tomad tal remedio vomitou, & divertio tanta quantidade de coleras, & humöres ferofos, que affirmau eftava fa? mas como , paffadas poucas femanas , lhe toinaffe no. vo fluxo hemorrhoidal acompanhado com grandiffrs: nias dores , entendi quetudo procedia daacrinonia &. azedume dos humores, por eftarem pervertidos & affaftados de fua natural temperanca: porquel con . forme o fentir dos Medicos modernas) todas:as:dores eu feja de pieurizes , ou de almörreirbas, ou e got- ta , ou de dentes , ou rheumaticas, ou itericasy pro. cedem do acido errante ; (2.) nos quaes cafas , parafa xar , & rebater a acrimonia, & azedune. dos taes hu mores ordenei o feguinte remedioTomemdecorat vermelho, fubtiliffmamente preparado , kraa'onca dle folhas de polygono (a quévulgarmente chaimarmas: erva andorinha) feis oitavas , de fangue dedragaa meya
126 Obfervações Medicas Doutrinaes. chagem, & de polygono, ( chamdda potoptro nontá centinodia , & na lingua Portugueza ervanandotinha, ) de cada coufa deftas huma maôó chea , tudo fe cóza-em panela de barro com duas canadas de aguá commua, Sraefte cozimento coado ajuntei:tres.oiravasde-co=m ral bem preparado , &/outras tres ditavas: dê-crocas: martis aditringente; & defte cordeal mandei bebef3' fe o doente:, mas com grande moderaçaó, por naá: acrefcentar a inchaçaõ, nem o fluxo das almorreimass: - porêm como as veas hemorrhoidaeseftivefem muiso enfraquecidas, & relaxadas, afim pelagránde quan tidade defangue , que aviaó deitado , como pela muia ta duraçaô da doençã, facilmente tornou a éahir no meímo fluxo , para o que ajudavaó muito as forças que fazia, quando curfava ; principalmentefíendo os; excrementos duros-; & vendome' pbrigado a acudir. novamente ao fobredito fluxo, entendi que omodo. mais feguro de fufpendello era darlhe algum vomito-” tio ; porque (como diz Galeno) (1.) neahum remedio aproveita tanto nos achaques das partes vergonhofass. . & fluxos de-humor que para ellas corre; & por efta ras zaõlhe dei tres onças de agua benedi&ta vigoradu: ês nao me fahio baldada a efperança ; porque tomándo o - tal remedio vomitou, & divertio tanta quantidade de coleras , & humores ferofos , que affirmgau eftava 25; mas como , pafladas póucas femanas , lhe tornaíle moi vo fluxo hemmorrhoidal acompanhado com grandis mias dores , entendi quetudo procedia da acrimoniz, &. azedume dos humores ; por éftarem pervertidos; - & affaltados de fua natural tempetança: porqueiícons . forme o fentit dos Medicos modernos) rodas asdores, eu fejaó de pleurizes, oú de almórreishas ,; ou dê gorá . ta, ou de dentes , on rheumaticas, “ou idtericasy pros cedem do acido errante ; (2.) nos quaes cafos ; pára fia xar, & rebater a acrimonia , & azedume dos taes hua mores ordenei o feguinte remedio: Tomemidectorat. | vermelho, fubtilifimamente preparado ;huuma'onças de folhas de polygono (a quê vulgarmente chamamos: ervá andorinha ) feis oitavas , 'de-fangue dedwaçaã -
126 Observaçones Medicas Doutrinaes. chagem, & de polygono, (chamada porontro nonie centinodia, & na lingua Portugueza ervaandorinha,) de cada cousa destas huma maon chea, tudo se coza em panela de barro com duas canadas de agua commua, & a este cozimento coado ajuntei tres oitavas de co¬ ral bem preparado, & outras tres oitavas de crocus martis adstringente; & deste cordeal mandei bebess se o doente, mas com grande moderaçao, por nao acrescentar a inchaçaon, nem o fluxo das almorreimas; porèm como as veas hemorrhoidaes estivessem muino enfraquecidas, & relaxadas, assim pelagrande quan¬ tidade de sangue , que aviao deitado , como pela mui- ta duraçaô da doença, facilmente tornou a cahir no mesmo fluxo, para o que ajudavaon muito as forças que fazia, quando cursava, principalmente sendo os excrementos duros; & vendome obrigadò a acudir novamente ao sobredito fluxo, entendi que omodo mais seguro de suspendello era darlhe algum vomito¬ rio; porque (como diz Galeno) (1.) nenhum remedio aproveita tanto nos achaques das partes vergonhosas, & fluxos de humor que para ellas corre; & por esta ra¬ zao lhe dei tres onças de agua benedicta vigoruda: & naon me sahio baldada a esperança; porque tomaudo o tal remedio vomitou, & divertio tanta quantidade de coleras, & humores serosos, que affirmou estava saon; mas como, passadas poucas semanas, lhe tornasse no¬ vo fluxo hemorrhoidal acompanhado com grandissi¬ mas dores, entendi que tudo procedia da acrimonia, & azedume dos humores, por estarem pervertidos, & affastados de sua natural temperança: porque (con¬ forme o sentit dos Medicos modernos) todas as dores, ou sejaon de pleurizes, où de almorreimas, où de got¬ ta, ou de dentes, ou rheumaticas, ou ictericas, pro- cedem do acido errante; (2.) nos quaes casos, para si¬ xar, & rebater a acrimonia, & azedume dos taes hu¬ mores ordenei o seguinte remedio. Tomemde coral vermelho, subtilissimamente preparado, huma onça, de folhas de polygono (a que vulgarmente chamamos. erva andorinha) seis oitavas, de sangue dedragaa meya
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OBSERVAÇÃO XX. 127 meya onça, tudo se polvorize substilissimamente , & se misture , & reparta em trinta quinhões iguaes , & os tomarà o doente , em quinze dias sucessivos ; em jejum , & à noite duas horas antes de cear , misturados em seis onças de agua cozida com a erva polygono , ou com seis onças de agua de tanchagem misturada com hua onça de agua de claras de ovos bem batidas , ou em hum pouco de assucar rosado velho ; & foi cousa pasmosa ver a certeza com que os fluxos das almorreimas paràraõ , & a brevidade com que cobrou saude . 4 . Com este mesmo remedio curei a muitos doentes , que padeciaõ semelhantes dores ; & fluxos , assim hemorrhoidaes , como uterinos ; mas se algum dia succeder que o dito remedio falte com o seu bom effeito, o que raras vezes tenho visto , pendurem as pescoço hum sapo secco metido em hum saquinho de rafeta , de forte , que fique sobre o estomago ; nem tenho menos bom conceito de por sobre a regiaõ do figado , & plantas dos pès , folhas de ortigas pizadas com vinagre forte ; ou , o que tenho por muito melhor , a erva sempre viva , cujas folhas saõ mui semelhantes às folhas de ensayaõ , excepto que saõ mais compridas , & puntiagudas ; mas se todos estes remedios naõ bastarem para suspender os fluxos sanguineos , saibaõ que eu tenho hum segredo tão efficaz , & de virtude taõ admiravel , que excede a todos os remedios do mundo , para curar os fluxos de sangue de qualquer parte que sahir , como os curiosos poderaõ ver na minha Polyanthea nova fol. 853 . desde o numero 55 . até o número 66 . aonde acharão nomeadas muitas pessoas , que estando morrendo por causa de fluxos de sangue que deitavaõ , ja pela boca , já pelo nariz , já pela madre , já pelo cano , já pelas almorreimas , segurarão a vida com o meu segredo ; o qual darei de graça aos pobres , & o venderei aos ricos com huma condição taõ fidalga , que tornarei o dinheiro, se dentro de seis dias não estancar o sangue , por mais copioso que seja. 5 . Bem sei que a malicia dos Aristarcos ( 3 . ) ha de sentir mal desta minha offerta , dizendo q o total motivo
Oblervação XX .. ] 127 meya onça, tudo fe polvorize dabtiliffimamente, & fe mifture , & sepaoca em trinta quinhoes iguaes, & os tomat o doente, em quinze dias fuccefixos, em jejum, & andite duas horas antes deceat, miftarados em feis. onças deagua cozilla com a erva polygono., ou coin feis onças de agua de tanchagem.mifturada com hua onçarde agua de'claras de ovos bem batidas; du em hum pouco de affucar rofado velho ; & foi coufa paf- mofa ver a certezaicom que os fluxos das almorreimas pararao , & a brevidade com que cobrou faude. . .. 4. Com efter malmo remedio curei a muitos doen- tes, que padeciao femethanres dores , & fluxos, affim hemorrhoidaes, como uterinos; mas fe algum dia fuc- ceder que o dito remedio falte com o fou bam efeito, o queraras vezes tenho vifto;, pendurem aopetcoco hum fapo fecco metido em hum faquinho de rafeta, de forte, que fiquedobre oeftomago, nemtenho menos bom conceito de por fobre 's begiao do figado, & plan- sas dos pes, folhas de ortigas picadas com vinagre for- te; du, o que tenho por muito melhor ; a erva fempre visa ;. cujas folha's fo mui femelhantes as folhas de enfayao, excepto que fao mais compridas, & punti- agudas;mas fe todos eftes remedios nao baftarem para fufpanterior fluxos fanguineos, faibio que eu tenho hum fegredo tão efficaz , & de virtude tao admiravel, que excede a todosos remedios do mundo , para curar os fluxos de fangue de qualquer parte que fahir, como. os cumples poderio ver na minha Polyanchea nova fol. 893: defde o, namero 55. mé o numero 66. aon- de acharão nomeadas muitas peffoas., que eltando morrendo por caufa de fluxos de fangue que deitavao, já pela boca , já pelo nariz , já pela madre, já pelo ca- no, já pelas almorreimas, fegurárão a vida com o meu legreda; omial darei'de graça aos pobres, &o vende- rei aos ticos coni homa condicao tao fidalga, que tor- bareio dinheiro, fodentro de feis dias nao eftancar 6 Langue spor mais copiolo que foja. · - Ben fei que amalícia dos Ariftarcos (3.) ha de fentir mal defta minha offerta, dizendo q o total mo- 5 5 1 : 1 4º tivo 1.
.0blcrvacao XX: 127 meyaonca, tudo.fepplvorizrdabxiliffmamentc:, & fe mifura, &repaoa:em trirua:quinhes.igraes, & os tomara &doente,ern quinze dias fucceffxos,cm jejum & a nditr duas hqras antes decear, mifturados cm feis. oncasdeaguacozidt com a ervi polygono., ou coin feis. Qucas.deagua de tanchagemmiftarada con hua ongardeagua de'clarns de ovos ben batidas, u ern aum poutadeaffucar rofadovelho; &foi coufa paf- mofaver aserttzacom:quc os. fluxos das alinorreima parara , &a broidade com que cobrou faudt. :. 4: ::Com afta nafmo renedio:curei:a muitos docn tes ,que padeciar ftmethancs.dores ;: & fluxos , affin hemorrhoidaes, nomo uterinosy mas fe algum dia fuc- tederqus o'dito rumedio falte com ofau bain effeito, oqueraras vezes tealio.vifto,: perduren aopefcoco hum fapo feccometido cim:hun.faquinhode tafeta,de torre, que fiqueddbrxoeftomago, nein:tenho menos bom conceitodepar fobrea ixgiado.figado, & plan: sas dospes,folhas de ortigas piaadas con yinagre for- te; du, @que tanaa.por muitomelhor ya crvafempre viva,.cujas.folhas Ao mui feinellantes as folhas de enfaya, excepto que fa mais compridas., & punti- agudas;mas fe todos eftes remedios na baftarem para ffpaatersfuxaa fanguineoss.faiba que cu tenhe hum fegredo taoeffcaz,& devirtude taö adimiravel, que excedeafodoss renxdiosdo:mundo ,para curar os fluxos de fangue de qualquer parte que fahir, conmo oxcutiofes.podeaa ver na minha Polyanthea nova fol. &53s defde:.namero. $s.:are :o numero 66. aon- de :aChara nomeadas: muitastpeffoas..que.eftando murrendopor caufade fluxos de fangue que deitavaö, ja pela boca , ja pelo nariz, japalamadre ja pelo.ca. no, ja pelas almorreimas , fegurarao a vida con o meu fegredooqal darei'de graa:aaspobres, &o vende- rei aosriros coni homa condiaá.ta fida ga que tor- nareio.dinheiro fodentrodefeis daas na eftancar fangue ,por mais copiofo.quefeja. .:. Bm fei que.amalicia dos Ariftarcos.(.3.)ha de fentirmaldeftamiha:offerta : dizendo ö o. total nr tivo ::3
> " censo, Dblervaçãõoo XX 127 Ineyaidnça, tudo fe pólvorizedabeilifimamente:, & fe inifture , &vepavra. em trinta 'quinhões.iguaes, & os tomará odventozeim-quinze dias fuccellizoas, em jejúniz & à noite duás horas antes deceat, milturados em feis, ançds deagua cozitu com -2a evil dolyglóno;,. ou coin íeis owças:de agua de tanchagetnmilturada com hãs onçandte.aguaá declaras de ovos bem batidas) Qu em hum pouco de affucar rolado velho ; & foi coula paf- mola-ver a eertezaicom-que os. fluxos das-almorreimas paràraó , &a brevidadecom que cobrou faude. 2. q. Com efte nsolfmo remedio curei.a muitos doc tes , que padeciaú femelthantes dores ; & fluxos, afim hemorthoidaes, como uterinos; mas fe algum dia fuc- ceder que odito remedio falte com o feu bdtn -effeito, o quer raras vezes tenho vifto;,: perdurem ap pelcoço hum fapo fecco metido em:hram faquinho de rafetá, de forte; que fiquetobre o eftomagos nem'itenho menos bom cbnceito de-pôr fobre'a besriao do figado, & plan vas dos:pês, folhas de ortigas pizadas com vinagre for- te; du, oque tehio por muito melhor ya erva fempre viva cujas folhas São mui fernelhantes àsfolhas de enfayaõ, excepto que faóô mais compridas, & pubrci- agudas;mas fe todos elites remedios naô baftarem para &ifpenider sos Auxres fanpuineos-;faibao que eu renhe hum fegredo tão efficaz , & de virtude tao admiravel, que excedEá todos ás rensediosdo.mutidú pará curar os fluxos de fangue de qualquer parte que fahir, como. Gs cuniofos pbdetag der na minha Polyatthea' nova. : fol. 85: delde;o.namero 55..:22é “o numero 66. aon- de “achárão nomeadas: muitastpeíloas.;. que eltando enurcenido-.por caríade luxos de fangue que deitavaõ, já pela boca , já pelo nariz , japela madre, já pelo .ca- no , já pelas almorreimas, fegurarão a vida com o meu agiedoa; oquial darei de graça-aas pobres, &o vende- sei aossicos cont-huina condiçan taô fidalga;que ror- iarejo dinheiro, fedentro de fais dias naô eitancar à fangue spor mais copiolfo que lbja. + oc “ 5: Bpema fei que, azmalícia dos Ariltarcos (3.)ha de fentirmaldeftaminha.offerta , dizendo do. total mo. 2) | : tivo Fá: Us
... Observaçao XX. 127 meya onça, tudo se polvorize dubtilissimamente, & se misture, & reparta em trinta quinhones igines & os tomara o doente, em quinze dias successivos, em jesum, & à ndite duas horas antes decear, misturados em seis onças deagua coziliu com a erva polygono, ou coin seis onças de agua de tanchagem misturada com huma onça de agua de clarus de ovos bem batidas, ou em hum pouco de assucar rosado velho; & foi cousa pas¬ mosa ver a certezacom que os fluxos das almorreimas paràraon, & a brevidade com que cobrou saude. 4. Com este mesmò remedio curei a muitos doen tes, que padecianum semelhantes dores, & fluxos, assim hiemorrhoidaes, como uterinos; mas se algum dia suc¬ ceder que o ditò romedio falte com o sou bom effeito, o que raras vezes tenhio visto, pendurem ao pescoçi hum sapo secco metido em hum saquinho de rafeta, de forte, que siquedobre o estomago, nem tenho menos bom conceito de pur sobre a regiaon do figado, & plan¬ tas dos pès, folhas de ortigas piaadas com vinagre for¬ te; du, o que tentio por muito melhor, a erva sempre vixa; cujas folhas ston mui semelhantes às folhas de ensayaon, excepto que saon mais compridas, & punti¬ agudas; mas se todos estes remedios naon bastarem para duspender os fluxos sanguineos, saibaon quo eu tenho hum segredo tamo efficaz, & de virtude tao admiravel, que excede a todosos remedios do mundo, para curar os fluxos de sangue de qualquer parte que sahir, conio oe cutiosos poderion ver na minha Polyanthea nova fol. 853. desde o. namero 55. até o numero 66. aon¬ de acharaon nomeadas muitas: pessoas, que estando morrendo por causa de fluxos de sangue que deitavaon, jà pela boca, ja pelo nariz, ja pela madre, ja pelo ca- no, jà pelas almorreimas, seguraramo a vida com o meu sagredu; oqual darei de graça aos pobres, &o vende- rei aos ricos conshoma condiçaon taon fidalga, que tor¬ nareio diaheiro, sodentro de seis dias naon estancar ? sanguò ppor mais copioso que seja. 5. Bym sei que a malicia dos Aristarcos (3.) ha de sentir mal desta minha offerta, dizendo que o total mo¬ tivo ".*)
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128 Observações Medicas Doutrinaes . tivo porque louvo tanto a este , & a outros meus segredos , he por ambiçaõ de que mos comprem ; comtudo naõ desconfio que aja muitos homens de animo taõ bem intencionado , que ( à imitaçaõ das mellificas abelhas ) colhaõ desta minha inculca , como de flores salutiferas , suave mel , & louvem o bom animo , com que desejo valer aos enfermos nas doenças de mayor risco ; porque se eu louvàra os meus remedios só com os olhos no interesse , naõ ensinaria tanta immensidade de medicamentos efficacissimos , como ensino ; mas quem ensina primeiro tantos de graça , he paraque se valhaõ delles , & quando naõ aproveitem , parece que he serviço , que faço aos meus proximos , dizerlhes que se valhaõ dos segredos , que por serem mais prodigiosos , naõ fiei a composição delles de outras mãos , senão das minhas ; quem ainda assim presumir que a inculca que faço dos meus remedios he nascida de puro interesse não use delles , que sem os thesouros , que me avia de dar , posso viver ; advertindo que Enio ( 4.) sendo hum gentio dizia , que todo o bem , que se pudesse fazer sem damno proprio , se devia fazer até aos estranhos. OBSERVAÇAM XXI . De huma dor de colica taõ grande , & rebelde , que nem aos remedios frios , nem aos quentes , nem aos especificos , nem aos narcoticos quiz obedecer ; rendendose somente a huma purga de mannà desatado em oleo de amendoas doces feito sem fogo. 1 . O Visconde General Pedro Jaques de Magalhaens teve hua dor de colica taõ violenta , que cuidou perder a vida com ella , & em quanto se foi chamar o Medico , tomou huma ajuda de meyo quartilho de caldo de gallinha , cinco onças de assucar mascavado , & dous vintens de diaprunis ; & sem em
128 Obfervações Medicas Doutrinaes. tivo porque louvo tanto a efte, & a outros mens fegre- dos , he por ambiçaõ de que mos comprem ; comtu- do nao defconfio que aja muitos homens de animo .tao bem intencionado , que ( à imitaçaõ das mellificas abelhas ) colhao defta minha inculca, como de flores falutiferas , fuave mel , & louvem o bom animo, com que defejo valer aos enfermos nas doenças de mayor rifco; porque fe eu louvara os meus remedios fó com os olhos no intereffe,nao enfinaria tanta immenfidade de medicamentos efficaciffimos, como enfino; mas quem enfina primeiro tantos de graça, he paraque fe valhao delles , & quando nao aproveitem, parece que he ferviço, que faço aos meus proximos, dizerlhes que fe valhaodos fegredos, que por ferem mais pro- digiofos, naõ fiei a compofiçaõ delles de outras mãos, fenão das minhas ; quem ainda affim prefumir que a inculca que faço dos meus remedios he nafcida de puro intereffe, naoufe delles, que fem os thefouros, que me avia de dar , poffo viver ; advertindo que Enio (4. )fendo hum gentio dizia, que todo o bem, que fe pu- deffe fazer fem damno proprio, fe devia fazer até aos eftranhos. OBSERVAÇAM. XXI. De huma dor de colica tao grande, & rebelde , quenem aos remedios frios, nem aos quentes, nem aos especificos nem aosnarcoticos quiz obedecer ; rendendofe fomen, te a buma purga de mannà defatado em oleo de amen- doas doces feito fem fogo. 1. Vifconde General Pedro Jaques de Ma- galhaens teve hűa dor de colica ta vio- lenta, que cuidou perder a vida com ella, & em quan- to fe foi chamar o Medico, tomou huma ajuda de me- yo quartilho de caldo de gallinha, cinco onças de af- fucar mafcavado, & dous vintens de diaprunis ; & fem em- .
12s Obfervacoes MedicasDoutrinaes. tivo porque louvo:tanto a efte, & a outros meus fegre dos, he por ambicaöde que moscomprem; comtu- do nao defconfo que aja muitos homens.de:animo ta bem intencionado , que ( a imitaga das,mellificas abelhas ) colhao defta minha inculca, como de.flores falutiferas, fuave mel , & louvem obomanimo, com que defejo yaler aos enfermos nas doencas de mayor rifco; porque fe cu louvara os meus remedios fo com os olhos no intereffe,na enfinaria tanta immenfidade de medicamentos efficaciffimos , .como.enfino; mas quemenfina primeiro tantos de graca, he paraque fe valha delles, & qúandona aproveitem , parcce que he fervico, que fasg aos meus proximos, dizerlhes que fe valhados fégredos, que por ferem mais pro- digiofos , na fiei a cömpofica delles de outras maos; fenao das minhas ; quem ainda affim prefumir que a inculca que.faco dos meus remedios he'nafcida de puro intereffe, naoufe delles, que fem os thefouros, que meaviade dar , poffo viver ; advertindoque Eni (4.)fendo hum gentiodizia,que todo obem,que fe pu- deffe fazer fem damno proprio, fe deviafazer até aos eftranhos. OBSERV ACAM. : XXI. De buma dor de colicatagrande, &rebelde;quentm aos remedios frios,nem aos quentes, nem aos efpecifitos; nem aosnarcoticos quiz obedecer ;, rendendofe fomenr . te a buma purga demanna defatado em oteo de amen doas doces feito fem fogo. 0 Vifconde' General Pedro Jaques de:Ma galhaens teve húa dor de colica.ta vio- Ienta, que cuidou perder a vida com ella, & em quan-. to fe foi chamar o Medico, tomou huma ajuda de me- yo quartilho de caldode gallinha, cinco oncas de af- fucar mafcavadc, & dous yintens de diaprunis; &fem ema
128 Obfervações Medicas Doutrinaes. tivo porque lonvo tanto à efte, & a outros mens fegres. dos, he porambiçaó de que mos comprem ; comtru«+- do naõ defconfio que aja muitos homens de:animo .taô bem intencionado , que ( à imitaçaô dassmellificas abelhas ) colhaó defta minha inculca, como de flores falutiferas , fuave mel , & louvem o bomanimo, com que defejo valer ads enfermos nas doenças de mayor rifco ; porque fe eu louvãra os meus remedios fó com es olhos no interefle,naô enfinaria tanta immenfidade de medicamentos efficaciffimos , como enfino; mas quem enfina primeiro tantos de graça, he paraque fe valhaõ delles , & quandonaõ aproveitem, parece que . he ferviço, que ço aos meus proximos, dizerlhes que fe valhaórdos fegredos , que por ferem mais pro- . digiofos,naôfieia cómpofiçaõ delles de outras: mãos, 2. fenão das ninhas:; quem ainda aflim prefumir que a inculca que faço dos meus remedios he'nafeida de « puto interefle, nãonfedelles, que fem os thefouros, ue me avia de dar , poflo viver ; advertindoque Enio 4. )fendo hum gentio dizia, que todo o bem, que fe pus defle fazer fem damno proprio, fe devia fazer atéaos efíttanhos. - : EN , SMBNOAI ONÇA OBSERVAÇAM,. Xxl. De buma dor de colica tao grande , & rebelde, queném aos vemedios frios,nem aos quentes, nem aos efpecificos, - nem aosnarcoticos quiz obedecer ; rendendofe fomens te a buma purga de manu de/atado em oteo de amem doas doces feito fem fogo. SS : 1. O Vifconde: General Pedro Jaques de Ma | galhaens teve ha dorde colica taóvios | lenta, que cuidou perder a vida com ella, & ém quans : rofefoi chamar o Medico, tomou huma ajuda de me- . — Yoquartilho de caldo de gallinha , cinco onças de af« - fucârmafcavado, & dous vintens de diaprunis ; & fem : : em.
128 Observaçones Medicas Doutrinaes. tivo porque louvo tanto a este, & a outros meus segre¬ dos, he por ambiçaon de que mos comprem; comtu- do naon desconfio que aja muitos homens de animo taon bem intencionado, que (à imitaçaon das mellificas abelhas) colhaon desta minha inculca, como de flores salutiferas, suave mel, & louvem o bom animo, com que desejo valer aos enfermos nas doenças de mayor risco; porque se eu louvara os meus remedios só com os olhos no interesse, naon ensinaria tanta immensidade de medicamentos efficacissimos, como ensino; mas quem ensina primeiro tantos de graça, he paraque se valhaon delles, & quando naon aproveitem, parece que he serviço, que faço aos meus proximos, dizerlhes que se valhaon dos segredos, que por serem mais pro¬ digiosos, naon fiei a composiçaon delles de outras mamos, senamo das minhas; quem ainda assim presumir que a inculca que faço dos meus remedios he nascida de puro interesse, namo use delles, que sem os thesouros, que me avia de dar, posso viver; advertindo que Enio (4.) sendo hum gentio dizia, que todo obem, que se pu¬ desse fazer sem damno proprio, se devia fazer até aos estranhos. OBSERVACAM XXI. De huma dor de colica taon grande, & rebelde, que nem aos remedios frios, nem aos quentes, nem aos especificos, nem aos narcoticos quiz obedecer; rendendose somen¬ te a huma purga de mannà desatado em oleo de amen¬ doas doces feito sem fogo. Visconde General Pedro Jaques de Ma- galhaens teve huma dorde colica taon vio¬ lenta, que cuidou perder a vida com ella, & em quan¬ to se foi chamar o Medico, tomou huma ajuda de me¬ yo quartilho de caldo de gallinha, cinco onças de as- sucar mascavado, & dous vintens de diaprunis; & sem em¬
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Observaçaõ XXI . 129 embargo que obrou muito bem com ella , se exasperou a dor com tão grande excesso , que chamou o Confessor , & se dispoz para morrer : porque , dizia elle , que tendose achado em varios conflictos de guerra , se naõ vira taõ vizinho da morte , como naquella hora estava : neste tempo cheguei a visitar ao dito senhor , & em quanto estive ouvindo a sua informaçaõ , me lembrou ter lido em Galeno , ( 1 . ) & em outros muitos Doutores , que as dores de colica eraõ tão difficultosas de distinguir , que elles se enganaraõ muitas vezes com ellas , imaginando que erão dores nephriticas , sendo colicas ordinarias ; ou que eraõ colicas ordinarias , sendo dores nephriticas . Peloque julguei que era necessario conhecer primeiro se a tal dor era colica ordinaria , ou nephritica , porque se fora colica nephritica , avia a dor estar fixa no rim , & delle avia de estenderse até o testiculo , segundo o comprimento da uretera , & avia de ter continuas vontades de vomitar , & ourinar com ardores , & em pouca quantidade . Mas como a dor não era fixa , antes se espalhava por diversas partes do ventre , principalmente junto do embigo , subindo da parte direita até o fundo do estomago , & do fundo delle descendo pela parte esquerda atè a verilha , com arrotos continuos , adstricçaõ de ventre , & difficuldade na sahida das ventosidades , me persuadi que mais era dor de colica causada de cruezas , & fezes reteùdas , ou de flatos reprezados das cavidadades , & tunicas dos intestinos , ou de inflammações , ou lombrigas , do que de pedra , ou areas ; porque qualquer destas cousas podem aggravar , & distender a continuidade do intestino Colon : comecei pois a considerar qual destas seria a causa , para conforme a ella applicar o remedio , & me persuadi que as taes dores naõ procedião de inflammação , porque não tinha febre , nem calor grande junto do ventre : nem procedião de lombrigas , porque não tinha deitado alguma em sua vida : nem rangia com os dentes : nem tinha comichão no nariz : nem dormia com os olhos meyos abertos : nem tinha estremecimentos , nem
Obfervaçaõ XXI. 129 embargo que obrou muito bem com ella, fe exafpe- rou a dor com tão grande exceffo, que chamou o Con- feffor., & fe difpoz para morrer : porque, dizia elle, que tendofe achado em varios conflictos de guerra , fe não vira tao vizinho da morte, como naquella höra eltava: nefte tempo cheguei a vifitar ao dito fenhor, & em quanto eftive ouvindo a fua informação, me lembrou ter lido em Galeno, (1.) & em outros muitos Doutores, que as dores de colica erao tão difficulto- fas de diftinguir , que elles fe enganarao muitas vezes com ellas, imaginando que erão dores nephriticas; fendo colicas ordinarias ; ou que eraõ cólicas ordina- sias , fendo dores nephriticas. Peloque julguei que era neceffario conhecer primeiro fe a tal dor era coli- ca ordinaria, ou nephritica, porque fe fora colica ne- phritica; avia a dor eftar fixa no rim, & delle avia de eftenderfe até o tefticulo , fegando o comprimento da uretera, & avia de ter continuas vontades de vomi- tar , & ourinar com ardores , & em ponca quantidade. Mas como ador não era fixa, antes fe efpalhava por diverfas partes do ventre , principalmente junto do embigo , fubindo da parte direita até o fundo do efto- mago, & do fundo delle defcendo pela parte efquer -. da atè a verilha, com arrotos continuos, adftricçaõ de ventre , & difficuldade na fahida das: ventofidades, me perfuadi que, mais era dor de colica canfada de cruezas, & fezes reteùdas, ou de flatos reprezados das cavidades, & tunicas dos inteftinos, ou de inflam- mações , ou lombrigas, do que de pedra, ou areas; porque qualquer deftas coufas podem aggravar , & diftender a continuidade do intestino Colon : come- cei pois a confiderar qual deftas feria a caufa, para conforme a ella applicar o remedio , & me perfuadi que as taes dores nao procediao de inflamação, por- que não tinha febre, nem calos grande junto do ven- tre : nem procedião de lombrigas, porque não tinha deitado alguma em fua vida / nem rangia com os den- ses : nem tinha comichão no nariz : nem dormia com os olhos meyos abertos : nem tinha eftremecimentos; nem 5 - ---
..Obfervacao. XXI.. 129 embargo que obrou,muito bem com ella, fe exafpe- rou a dor com tao grande exceffo,que chamou o Con- feffor, & fe difpoz para morrer : porque, dizia clle, gue:tendofe athado em varios confi&tos de guerra , fe no vira ta.vizinho da morte, comnaquella höra eftava: nefte:tempo cheguei a vifitar ao ditofenhor, & em quanto eftive ouvindo:a fua informaca, me lembrou tér lido em Galeno, (1 :) & em outros muitos Doutores, :que: as dores de colica erao tao ditficulto- fas de diftinguir , que elles fe enganara muitas.vezes com ellas, inaginando que erao dores nephriticaš, fendocolicas ordinarias ; ou que cra.clicas rdina- xias , fendo dores nephriticas. Peloque julguei que era neceffario tonhecer primeiro fe a tal dor era coli ca ördinaria, ou nephritica , porque fe fra colica ne- phritica, aviaa doreftar fixa norim, & delle avia de eftendcrfe até tefticulo. , fegundo o.conprimento da uretera, &aviade:ter continuas vontades de vomi- tar ,&ourinar cam:ardores,& em poucaquantidade. Mas como ador : nao era fxa ,. antes fe efpalhava por diverfas partes do ventre , principalinente junto do embigo,fubindo da parte direira atéofundo do efto- mago, &do fundo delle defcendo pela parte éfquer- daate a verilha, comarrotos continuos, adftricca de ventre ;..&:diffituldade na fahida das: ventofidades, me perfuadi gue, mais. era dor. de colica caufada de cruezas, & fezes réteudas:, ou de flatos reprezados aas cavidadea,& tunicas dos inteftinos, Qu de inflam- maces , ou lombrigas, do.que de pedra., ou areast porque. qualquer. deftas coufas: podem 'aggravat.., & aiftender. a continuidadte. dointeftino Colon : come- cei pois a copfiderar qual: deftas feria a caufa, para conforracaella applicar o:remedio , & me perfuadi gue astacs doresnaprocediao de infammacao, por- que nao tinhafebre, nem calos grande junto do ven- : tre .: nem procediao de lombrigas , porque nao tinha deitadoalguma.cm fua vida :nem rangia com os denr tes :.nem tinha comichao no nariz : nem dormia com qs: 9llas meyos.abertos : nemtinlya. eftremecimentos nem
:'. Oblervação XXI. 29 embargo que obrou muito beri com ella, fe exaípe- | rou a dor com tão grande exceflo,que chámou o Con: E feifor., & (e difpoz para morrer: porque ; diziá elle; que rtendofe áthado em vatios confli&tos de guerra , fe não vira taó vizinho da morte, como naquella horá . eftava: neftetempo cheguei à vifitar ao dito fénhot, & em quanto eftive ouvindo:a fua informaçaõô, me lembrou ter lido em Galeno, (z 1) & em outros muitos “QRourores, que: às dores de colica eraó tão difficulto- fas de diftinguir, que elles fe enganãraó muitas vezes com cllas, imaginando que erão dores nephriticas; fendo coliças ordinarias ; ou quê eraó colicas ordina= sias , fendo dores nephriticas. Peloque julguei que era neceflario conhecer primeiro featal dor erá coli- ca ordinaria, ou nephritica, porque fe fora colicane- phritica; avia a dor eftar fixa no rim, & delle ávia de eltender(e até o tefticulo , fegundo o comprimento daurertera, &aviade ter coritinuas vontades de vomiº tar ,& onrinar com:ardores , & éem poncê quantidade. Mas como ador não era fixa , antes fe efpalhava por diverfas partes do ventre , principalmente junto do. embigo , fubindo da parte direita até o fundo do efto- mago, &do fundo delle defcendo pela parte éfquer”. Ja até a verilha , com artotos continuos, adítrieçaó de ventre ;. & dificuldade na fabida das: ventofidades, | » me perfuadi que. mais era dor de colica canfada de | cruezás, & fezes rételidas , eu de flatos reprezados. stat cavidades, & tunicas dos inteítinos, ou de inflam- mações , ou lombrigas, do. de pedra. ou areas; porque qualquer. deftas cotfas podem aggravar , & diftender a contimidade do inteftino Colon : come- gei pois a copfiderar qual deftas feria à caufa, para contorme a ella applicat o'remeédio , & me perfuadi gue astaes doresniaó'procedião de inflaminação, por= que não tinha febre , nem calos grande junto do vens, tre : nem procedião de lombrigas, porque não tinha deitado alguma em fua vida nem rangia com os den - tes : nem tinha comichão no nariz : nem dormia com as olhos meyos.abertos : nemtinha, efiremecimentos; : É 5 . ' nem x. " SEDA - ES a
129 Observaçaon XXI. embargo que obrou muito bem com ella, se exaspe¬ rou a dor com tamo grande excesso, que chamou o Con¬ fessor, & se dispoz para morrer: porque, dizia elle, que tendose achado em varios conflictos de guerra, se nano vira taon vizinho da morte, como naquella hora estava: neste tempo cheguei à visitar ao dito senhor, & em quanto estive ouvindo a sua informaçaon, me lembrou ter lido em Galeno, (1.) & em outros muitos Doutores, que as dores de colica eraon tamo difficulto¬ sas de distinguir, que elles se enganàrao muitas vezes com ellas, imaginando que eramo dores nephriticas, sendo colicas ordinarias; ou que eraon colicas ordina¬ xias, sendo dores nephriticas. Peloque julguei que era necessario conhecer primeiro se a tal dor era coli¬ ca ordinaria, ou nephritica, porque se fora colica ne- phritica, avia a dor estar fixa no rim, & delle avia de estenderse até o testiculo, segundo o comprimento da uretera, & avia de ter continuas vontades de vomi¬ tar, & ourinar com ardores, & em pouca quantidade. Mas como a dor namo era fixa, antes se espalhava por diversas partes do ventre, principalmente junto do embigo, subindo da parte direita até o fundo do esto¬ mago, & do fundo delle descendo pela parte esquer¬ da atè a verilha, com arrotos continuos, adstricęaon de ventre, & difficuldade na sahida das ventosidades, me persuadi que mais era dor de colica causada de cruezas, & fezes reteûdas, ou de flatos reprezados nas cavidades, & tunicas dos intestinos, ou de inflam maçones, ou lombrigas, do que de pedra, ou areas; porque qualquer destas cousas podem aggravar, & distender a continuidade do intestino Colon: come¬ cei pois a considerar qual destas seria a causa, para conforme a ella applicar o remedio, & me persuadi que as taes dores naon procediamo de inflammaçamo, por¬ que namo tinha febre, nem calor grande junto do ven¬ tre. nem procediamo de lombrigas, porque namo tinha deitado alguma em sua vida: nem rangia com os den¬ tes: nem tinha comichamo no nariz: nem dormia com os olhos meyos abertos: nem tiuha estremecimentos, nem
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130 Observações Medicas Doutrinaes. nem outros sinaes que andaõ annexos aos que as tem : mas conheci que as taes dores procediaõ de fezes endurecidas , ou de humores crus , ou de flatos gérados pelos taes humores ; porque tinha adstricção , & dureza de ventre , com grandes rugidos de tripas , & por isso ( para abrandar as fezes , & as deitar fóra ) preparei huma ajuda emolliente , na fórma seguinte . Tomem raizes de malvaisco machucadas , folhas de alfavaca , violas ; & ortigas mortas , de cada cousa destas huma maõ cheya , de macella , & de coroa de Rey , de cada cousa destas meya maõ cheya , de erva doce meya oitava , tudo se coza com hum frangaõ , & em cinco onças deste cozimento mandei soltar huma onça de benedicta com duas onças de oleo de macella , & outras duas de amendoas doces , com huma oitava de salgema , que para dissolver as fezes duras tem grande virtude ; & com esta ajuda tibia evacuou copiosamente , mas com pouco alivio ; por cuja causa lhe mandei deitar outra carminativa preparada do modo seguinte . Tomem de aristoloquia machucada duas oitavas , de folhas de ortelãa , de arruda , palhas alhas , alfavaca , macella , & coroa de Rey , de cada cousa destas meya mão cheya , de semente de funcho , de alcorovia , & de açafrão , de cada cousa destas hum escropulo , de tudo se faça cozimento em partes iguaes de caldo de gallinha , & ourina de menino ; & coandose , tomei do dito cozimento cinco onças , de oleo de macella , & de amendoas doces , de cada cousa destas duas onças , de benedicta laxativa huma onça , de salgema huma oitava ; com a qual ajuda posto sentio grande alivio, foy para repetir com tal crueldade, que fez desesperar ao doente : neste aperto usei de huma ajuda de meyo quartilho de ourina de menino virgem fervida com huma oitava de raiz de aristoloquia : & como a dor nem a este remedio obedecesse , appellei para meya oitava de pó de raiz de parreira brava misturada com vinte grãos de flores de enxofre, fazendolho tomar em quatro onças de caldo de gallinha , ou de perdiz . Mas como tão grande remedio lhe não apro
130 Observações Medicas Doutrinaes. nem outros finaes que andao annexos aos que as tem: · mas conheci que as taes dores procediaõ de fezes en- durecidas, ou de humores crus, ou de flatos gerados pelos taes humores ; porque tinha adftricção , & dure za de ventre , com grandes rugidos de tripas, & por ifi fo ( para abrandar as fezes, & as deitar fora ) prepa- rei huma ajuda emolliente, na forma feguinte. To- 'mem raizes de malvaifeo machucadas , folhas de alfa- vaca, violas; & ortigas mortas , de cada coufa deftas : huma mao cheya , de macella , & de coroa de Rey , de cada coufa deftas meya mao cheya, de erva doce me- ya oitava, tudo fe coza com hum frangao, & em cin- co onças defte cozimento mandei foltar huma onça de benedicta com duas onças de oleo de macella, & outras duas de amendoas doces , com huma oitava de falgema, que para diffolver as fezes duras tem gran- de virtude; & com efta ajuda tibia evacuou copiofa- mente, mas com pouco alivio; por cuja caufa lhe man- dei deitar outra carminativa preparada do modo fe guinte. Tomem de ariftoloquia machucada duasoi- tavas, defolhas de ortelaa, de arruda, palhas alhas alfavaca , macella, & coroa de Rey, de cada coufa deftas meya mão cheya, de femente de funcho, de alcorovia, & de açafrão, de cada coufa deftas hum ef- cropulo, de tudo fe faça cozimento em partes iguaes de caldo de gallinha, & ourina de menino; & coan- dofe, tomei do dito cozimento cinco onças, deoleo de macella, & de amendoas doces, de cada coufa def- tas duas onças , de benedicta laxativa huma onça, de falgema huma oitava; com a qual ajuda pofto fentio grande alivio, foy para repetir com tal crueldade, que tez defefperar ao doente : nefte aperto ufei de huma ajuda de meyo quartilho de ourina de menino virgem fervida com huma oitava de raiz de ariftoloquia: & como a dor nem a efte remedio obedeceffe, appellei para meya oitava de po de raiz de parreira brava mif- .turada com vinte grãos de flores de enxofre, fazendo- . lho tomar em quatro onças de caldo de gallinha, ou de perdiz. Mas como tão grande remedio lhe não apro; ! 1
13 Obfervacoes Medicas Doutrinaes. 'nem outros finaes que anda annexos aos queas témr: mas conheci que as taes dores procedia de fezesen- durecidas, ou de humores crus, ou de flatos gérados pelos taes humores ; porque tinha adftricca , & durei za de ventre, com grandes rugidos de tripas, & por if fo ( para abrandar as fezes , & as deitar fora ) prepa- rei huma ajuda emolliente , na forma feguinte. To- mem raizes de malvaifeo machucadas , folhas de aifa- vaca, violas; & ortigas mortas, de cadacoufadeftas huma ma cheya, de macella, & de coroa de Rey , de cada coufa deftas meya ma cheya, de erva doce me- yaoitava, tudofe coza com hunfranga&, & emcin- co oncas defte cozimento mandei foltar huma.onca debenedita com duas oncas de oleo de macella, & outras duas de amendoas doces, com huma:oitava de falgema, que para diffolver as fezes duras tem gran- de virtude, & com efta ajudatibiaevacuou copiofa- -mente, mas com pouco alivio;por cuja caufa lhe man- dei deitar outra carminativa preparada do modo fe guinte. Tomem de ariftoloquia machucada duas oi- tavas, defolhas de ortelaa, de arruda, palhas alhas, alfavaca , macella, & coroa deRey , de cada coufa deftas :meya mao cheya, de femente de funcho , de alcorovia, & de acafrao, de cada coufa deftas hum ef- .cropulo, de tudo fe faca cozimento em partes iguaes de caldo degallinha,& ourina de menino; &coan- dofe, tomei do ditocozimento cinco oncas, deoleo de macella, & de amendoas doces, de cada:coufa def- tas duas oncas , de.benedicta laxativa huma onga, de falgema huma oitava com a quabajuda.poftofentio grande alivio, foy para repetir Com:tatcrueldade, que .tez defefperar aodoente : nefte apert& ufei dehuma ajuda de meyo quartilho de ourina de meninovirgem. fervida com huma oitava de raiz de ariftoloquia: & :como a dor nem a efte ramedio obedeceffe , appellei para meya oitava de p de raiz de parreirabrava mif apr
t30 Obfetvações Medicás Doutrinaes. nem outros finaes que andaõ anúexos aos ques cem: nas conheci que as taes dores procediaó de fezes en- durecidas , ou de humores crus , ou de flatos gérados pelos taes humores ; porque tinha adítritção, & dure zade ventre, com grandes rugidos detripas, & porafi. fo ( para abrandar as fezes, & as deitar fóra ) prepa- rei huma ajuda emolliente , na fórma feguinte. To» 'mem raizes de malvaifeo machucadas , folhas de alfa- . Vaca, violas; & ortigas mortas , de cada'coufa deftas ; huma maô cheya, de macella , & de coroa de Rey ; dê cada coufa deftas meya maõ cheya , de erva doce me» : yaoitava, tudofe coza com hum frangaô , & em cin- co onças defte cozimento mandei foltar huma.onça de benedi&a com duas onças de oleo de macella, & outras duas de amendoas doces , com huma oitava de falgema, que para diflolver as fezes duras tem gran- de virtude; & com efta ajuda tibia evacuou copiofa- mente; mas com pouco alivio;por cuja caufa lhe man» dei deitar olitra carminativa preparada do modo fez guinte. Tomem de ariftoloquia machucada duas oi- tavas , defolhas de ortelãa, de arruda , palhas alhas; alfavaca , macella, & coroa de Rey , de cada confa deftas meya mão cheya ;:de femente de furicho, de . : alcorovia, & deaçafrão, de cada coufa deftas hum ef. cropulo , de tudo fe faça cozimento em partes iguaes de caldo de gallinha, & ourina de menino; & coan- dofe, tomei do dito cozimento cinco onças, deoleo de macella , & de amendoas doces, de cada-coufa def. tas duas onças , de benediéta laxativa huma onça ; de falgema huma oitava; com a qual ajuda pofto fentio grande alivio, foy para repetir comital crueldade, que dez defefperar ao doente: nefte apertó; nei de huma ajuda de meyo quartilho de ourina de meninowirgem fervida com huma citavá de raiz de. ariftoloquia: & «como a dor nem aefte remedio obedecefle, appellei . Para meya oirava de pô dé raiz de parreira brava mil. ' .turada com vinte grãos.de flores de enxofre, fazendo. . lhotomarém quatro onças de caldo de gallinha, ow de perdiz. Mas como tão grande remedio lhe não a aprôs
130 Observaçones Medicas Doutrinaes. nem outros sinaes que andaon annexos aos que as tem: mas conheci que as taes dores procediaon de fezes en- durecidas, ou de humores crus, ou de flatos gérados pelos taes humores; porque tinha adstricçamo, & dure¬ za de ventre, com grandes rugidos de tripas, & poris- so (para abrandar as fezes, & as deitar fora) prepa¬ rei huma ajuda emolliente, na forma seguinte. To¬ mem raizes de malvaiseo machucadas, folhas de alfa¬ vaca, violas; & ortigas mortas, de cada cousa destas huma maon cheya, de macella , & de coroa de Rey, dè cada cousa destas meya mao cheya, de erva doce me- ya oitava, tudo se coza com hum frangaon, & em cin¬ co onças deste cozimento mandei soltar huma onça de benedicta com duas onças de oleo de macella, & outras duas de amendoas doces, com huma oitava de salgema, que para dissolver as fezes duras tem gran¬ de virtude; & com esta ajuda tibia evacuou copiosa- mente, mas eom pouco alivio; por cuja causa lhe man¬ dei deitar outra carminativa preparada do modo se¬ guinte. Tomem de aristoloquia machucada duas oi¬ tavas, de folhas de ortelana, de arruda, palhas alhas, alfavaca, macella, & coroa de Rey, de cada cousa destas meya mao cheya, de semente de funcho, de alcorovia, & de açafrano, de cada cousa destas hum es- cropulo, de tudo se faça cozimento em partes iguaes de caldo de gallinha, & ourina de menino; & coan- dose , tomei do dito cozimento cinco onças, de oleo de macella, & de amendoas doces, de cada cousa del- tas duas onças, de benedicta laxativa huma onça, de salgema huma oitava; com a qual ajuda posto sentio grande alivio, foy para repetir com tal crueldade, que fez desesperar ao doente: neste aperto usei de huma ajuda de meyo quartilho de ourina de menino virgem fervida com huma oitava de raiz de aristoloquia: & como a dor nem a este remedio obedecesse, appellei para meya oitava de pò dé raiz de parreira brava mis- turada com vinte granos de flores de enxofre, fazendo¬ lho tomar em quatro onças de caldo de gallinha, ou de perdiz. Mas como tao grande remedio lhe nâo apro¬
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Observaçaõ XXI . 131 aproveitasse , mandei que sobre o embigo lhe applicassem huma cabeça de alhos assada , & bem quente , ou lhe puzessem sobre a barriga huma bexiga de vacca com tres partes de leite , & huma de mel quente , & q no mesmo tempo metesse os pès em hua bacia cheya de vinho taõ quente que mal o pudesse sofrer . Com estes remedios se tirou totalmente a dor por tempo de hua hora , mas foi para tornar a vir com mayor impeto . Neste conflicto appellei para o seguinte cataplasma , de que sempre vi maravilhosos effeitos . Tomem de oleo de macella , & de banha de flor , de cada cousa destas huma onça , tudo se ponha a ferver com huma mão cheya de ortelãa , & alfavaca , & nestes oleos coados se frija huma filhò de estopa ensopada em tres gemas de ovos batidas , & então se deite a dita filhó dentro nos oleos , que estão fervendo , & no espaço de huma Ave Maria se coalharáõ os ditos ovos , & logo tiraráõ a tal filhó , & a polvorizaráõ com pòs de canela , & alfazema , & a poráõ sobre o embigo : com a qual filhò desappareceo totalmente a dor ; mas antes de huma hora tornou a repetir mayor que dantes. Nesta variedade entrei em duvida se a tal dor procederia de humor , ou flato quente : & a razaõ q tive para duvidar foi , porque supposto se aliviava muito com as cousas quentes ; comtudo , como dentro de breve tempo tornava a padecer com mayor crueldade , ficavame lugar para presumir que de quentura procediaõ as taes dores , & por isso tentativamente lhe appliquei sobre o ventre hum prato frio , para examinar se a dor se augmentava , ou diminuhia ; & foi cousa pasmosa a brevidade com que se ausentou , ficando o doente totalmente livre. Com esta melhoria taõ grande tive para mim que a tal dor procedia de quentura, & que com remedios frios a avia de curar, & por isso lhe mandei deitar huma ajuda preparada de cinco onças de agua de tanchagem , & huma de vinagre com tres onças de assucar branco : o qual remedio cura por modo de encanto as dores de colica , que procedem de quentura, ou inflammaçaõ , ou dureza das fezes : & sem embargo
Obfervacao XXI. : 131 aproveitaffe , mandei que fobre o embigo lhe appli- caffem huma cabeça de alhos affada, & bem quente, ou lhe puzo fem fobre a barriga hura bexiga de vac- ca com tres partes de leite , & huma de mel quente, & q no mefmo tempo meteffe os pès em hua bacia cheya. * de vinho tao quente que mal o pudeffe fofrer. Com eftes remedios fe tirou totalmente a dor por tempo de hua hora, mas foi para tornar a vir com mayor impe- to. Nefte conflicto appellei para o feguinte cataplaf- ma , de que fempre vi maravilhofos effeitos. Tomem de oleo de macella, & de: banha de flor ; de cada cou- fa deftas huma onça, tudo fe ponha a ferver com hu- ma mão cheya de ortelãa , & alfavaca, & neftes oleos coados fe frija huma filho de eftopa enfopada em tres gemas de ovos batidas, & então fe deite a dita filho dentro nos oleos , que eftão fervendo., & no efpaço de huma Ave Maria fe coalharao os ditos ovos , & logo tiraráõ a tal filhó., & a polvorizaráõ côm pòs de ca- nela, & alfazema, & a poráõ fobre o embigo : com a qual filho defarpareceo totalmente a dor ; mas antes de huma hora tornou a repetir mayor que dantes. Nefta variedade entrei em duvida fe a tal dor proce- deria de humor , ou flato quente : & a razao q tive pa- ra duvidar foi , porque fuppofto fe aliviava muito com as coufas quentes; comtudo, como dentro de breve 'tempo tornava a padecer com mayor crueldade, fica- vame lugar para prefumir que de quentura procediao as taes dores, & por iffo tentativamente lhe appliquei fobre o ventre hum prato frio, para examinar fe a dor fe augmentava, ou diminuhia ; & foi coufa pafmofa a brevidade com que fe aufentou , ficando o doente to- talmente livre. Com efta melhoria tao grande tive pa- ra mim que a tal dor procedia de quentura, & que.com remedios frios a avia de curar, & por iffo lhe mandei ; deitar huma ajuda preparada de cinco onças de agua de tanchagem , & huma de vinagre com tres onças de. affucar branco ; o qual remedio cura por modo de ems canto as dores de colica , que procedem de quentura, ou inflammaçao, ou dureza das fezes : & fem embar go : . . 5 - . 1
Obfervacao XXE:: : :131 aprovéitaffe , mandei querfobre oernbigo lhe appli- caffem huinacabeca de alhos affada, & bem querte, ou lhe puze fem fobre a barriga hurhabexiga de vac- ca corn tres partesde leite , &.huma de mel quente, &. nomefmo tempometeffe os pes em hua bacia cheya.. devinho taö quente que mal.o. pudeffe fofrer. Com eftes remedios fe tirou totalmente a dor.por tempo dt hua hora, mas foi para tornara vir com mayor impe- 'to. Nefte confficto appellei para o feguinte cataplaf- ma ,de quefémpre vi maravilhofos effeitos. Tomem de oleo de macella, & de:banha de flor ; de cada cou fa deftas humaonca, tudofe ponha aferver com hu. ma maocheyade ortelaa,&alfavaca, & neftes olcos coados fé frija huma flho de eftopa enfopada em tres gemas de ovos batidas, & entao fe deite a dita flh6 dentro nos oleos, guc eftao fervendo, & no efpaco de huma Ave Maria fe coalhará os ditos ovos,& 1ogo tirara a tal flhó, & a polvorizara cm pös de ca- nela, & alfazema, & a porafobreo cmbigo: com a qual. flho defarpareceo totalmente a dor ; mas antes de huma hora tornou a repetir mayor que dantes. Nefta variedade entrei em duvida fe a tal dor proce- deria de humor , ou flato qtente : & a raza q tive pa-- ra duvidar foi , porque fuppofto fe aliviavamuito com ascoufas quentes, comtudo, como dentro debreve 'tempo tornava a padecer com mayor crueldade, fica- vamelugar para prefumir que de quentura procedia as taes dores, & por iffo tentativamente lhe appliquei fobre o:ventre hum prato frio ; paraexaminar fe a dor fe augmentaya, ou diminuhia , & foi coufa pafmofa a brevidadecon que fe aufentou: , ficandoo doente to- talmente livre. Com efta melhoria ta grande. tive pa ra mim que a tal dor procediadequentura, & que:com remedios frios aavia de curar , & por iffo lhe mandéi : deitar huma ajuda preparada de cincooncas de agua de tanthagem , & huma de vinagre com tres ongas de. affucar branco: o qual remediocuraporinodo deer canto as dores de colica , que procedem: de: quenturaj o inflammaca, oudurezadas fezes : & fem embar go
mono Obfervação XX dar aprovéirafle , mandei que-fobre oembigo lhe appli- . caflemhumacabeça de alhos affada , & bem quente, ou lhe puzeHem fobre a barriga hurha bexiga de vac- ca com tres partes. de leite ,& huma de mel quente, & Gnomefmo tempo metefle os pês em hãa bacia cheya. devinho taó quente que mal o pudefle fofrer. Com eftes remedios fe tirou totalmente a dor por tempo de hãa hora, mas foi para tormara vir com mayor impe- “to. Nefte conflito appellei para o feguinte cataplal: ma , de que fêmpre vi maravilhofos effeitos. Tomerm de oleo dé macella, & de:banha de flor ; de cada cous fa deftas huma onça, tudo fe ponha a ferver com hu- ma mãocheya de ortelãa , & alfavaca, & neftes oleos coados fé frija huma filho de eftopa enfopada em tres gemas de ovos batidas, & então fe deite a dita filho dentro nos oleos , que eftão fervendo, & no efpaço de huma Ave Maria fe coalharão' os ditos ovos , & logo tirarãô a tal filhó”, & a polvorizarãô côm pos de ca- nela; & alfazema , & a poráo fobre o embigo: coma qual filho defarpareceo totalmente a dor ; mas antes de huma hora tornou a repetir mayor que dantes. Nefta variedade entrei em duvida fê a tal dor proce- deria de humor , ou flato quente : & a razaô drive pa- ra duvidar foi, porque fuppofto fe aliviava muito com as coufas quentes; comtudo, como dentro de breve. 'tempo tornava a padecer com mayor crueldade, fica- vame lugar para prefumir que de quentura procediaô as taes dores, & por iflo tentativamente lhe appliquei fobre o-ventre hum prato frio , para examinar fe a dor fe augmentava, ou diminuhia ; & foi confa pafmofa a brevidade com que fe aufentou, ficando o doente to. tálmente livre. Comefta melhoria taó grande tive pa- = ra mim que a tal dor procedia de quêntura; & quecom remedios frios a.avia de curar, & poriflo lhe mandei deitar luna ajuda preparada de cinco onças de agua de ranchagem , & huma de vinagre com tres onças de. | aflucar branco : o qual remedio cura por modo de em tanto as dores de colica , que procedem-de: quentura; ou inflammaçaõ, :oudureza das fezes : & fem embara st * go
Observacao XXI. 131 aproveitasse, mandei que sobre oembigo lhe appli¬ cassem huma cabeça de alhos assada, & bem quente, ou lhe puzeslem sobre a barriga huma bexiga de vac¬ ca com tres partes de leite, & huma de mel quente, & que no mesmo tempo metesse os pès em huma bacia cheya de vinho tao quente que mal o pudesse sofrer. Com estes remedios se tirou totalmente a dor por tempo de huma hora, mas foi para tornar a vir com mayor impe¬ to. Neste conflicto appellei para o seguinte cataplas¬ ma, de que semprè vi maravilhosos effeitos. Tomem de oleo de macella, & de banha de flor, de cada cou- sa destas humà onça, tudo se ponha a ferver com hu¬ ma mao cheya de ortelana , & alfavaca , & nestes oleos coados se frija huma filhò de estopa ensopada em tres gemas de ovos batidas, & entao se deite a dita filhó dentro nos oleos , que estao fervendo , & no espaço de huma Ave Maria se coalharáon os ditos ovos, & logo tirarao a tal filhó, & a polvorizaraon côm pòs de ca¬ nela, & alfazema, & a poráon sobre o embigo: com a qual filhò desarpareceo totalmente a dor; mas antes de huma hora tornou a repetir mayor que dantes. Nesta variedade entrei em duvida se a tal dor proce- deria de humor, ou flato quente : & a razaon que tive pa- ra duvidar foi, porque supposto se aliviava muito com as cousas quentes; comtudo, como dentro de breve tempo tornava a padecer com mayor crueldade, fica¬ vame lugar para presumir que de quentura procediaon as taes dores, & por isso tentativamente lhe appliquei sobre o ventre hum prato frio, para examinar se a dor se augmentava, ou diminuhia; & foi cousa pasmosa a brevidade com que se ausentou, ficando o doente to- talmente livre. Com esta melhoria taon grande tive pa- ra mim que a tal dor procedia de quentura, & que com remedios frios a avia de curar, & por issò lhe mandei deitar huma ajuda preparada de cinco onças de agua de tanchagem, & huma de vinagre com tres onças de¬ assucar branco: o qual remedio cura por modo de en¬ canto as dores de colica, que procedem de quentura, ou inflammaçaon, ou dureza das fezes: & sem embar¬ go
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132 Observações Medicas Doutrinaes. go que a dita ajuda , em razaõ do vinagre, causasse grande medo aos circunstantes ; comtudo eu tenho grande conceito della ; porque o vinagre destemperado com a agua mollifica muito as fezes duras ; & tempera pera maravilhosamente as inflammações , & as dores quentes , como se deixa ver nos gargarismos , que se fazem com vinagre destemperado para inflammações da garganta ; & nas feridas ,que para se naõ inflammarem , se cobrem com pannos picados , molhados em vinagre destemperado com agua rosada ; & por esta causa julguei lhe seria utilissima a tal ajuda : & não me enganei ; porque tomandoa , lhe aplacou logo a dor , & facilitou a camara ; mas antes de passarem duas horas cresceo outra vez de maneira , que todos julgavaõ tinha chegado a morte. Neste conflicto lhe quiz dar hũa oitava de priapo de touro , ou dous escropulos de pò da tunica que està dentro na muela da gallinha ; porque me consta , que qualquer destes dous remedios tem obrado effeitos maravilhosos em curar dores de colica , & de estomago ; mas porque naquella hora naõ tinha em casa os taes remedios preparados , lancei maõ de huma oitava de pò de esterco de ratos , cuja virtude naõ he inferior aos mais decantados remedios ; mas vendo que naõ aproveitàra , me lembrou que Galeno , ( 1 . ) & Avicenna ( 2 . ) louvavaõ muito para as dores de colica , & de barriga ( não sendo causadas de inflammaçaõ ) huma ventosa de boca grande , deitada com muito fogo sobre o embigo ; appliqueilha , mas sem proveito ; nesta desesperaçaõ puz toda a esperança nos remedios narcoticos , começando pelos mais brãdos , & benignos , & assim lhe appliquei o seguinte , que he excellentissimo . Tomem de çumo de folhas de meimendro quatro onças , de leite de burra , ou de cabras meyo quartilho , misturese huma cousa com outra , ajuntandose tres gemas de ovos cruas , & neste licor ensopem o miolo de hum paõ tirado daquelle instante do forno , & se façaõ humas papas , que se ponhaõ sobre todo o ventre , & estomago . Neste tempo vendo vencidas humas dores taõ pertinazes , que nos dava
132 Obfervações Medicas Doutrinaes. go que a dita ajuda, ein razao do vinagre, caufaffe grande medo aos circunftantes ; comtudo eu tenho grande conceito della ; porque o vinagre deftempera- do com a agua mollifica muito as fezes duras ; & tem- ៛ pera maravilhofamente as inflammações , & as dores quentes, como fe deixa ver nos gargarifmos , que fe fazem com vinagre deftemperado para inflammações da garganta ; & nas feridas , que para fe nao inflamma; rem,fe cobrem com pannos picados, molhados em vi- nagre deftemperado com agua rofada ; & por efta cau- fa julguei lhe feria utiliffima a tal ajuda: & nao me en- ganei ; porque tomandoa, lhe aplacou logo a dor, & facilitou a camara ; mas antes de paffarem duas horas crefceo outra vez de maneira, que todos julgavaõ ti- nha chegado a morte. Nefte conflicto lhe quiz dar hűa oitava de priapo de touro, ou dous efcropulos de pò da tunica que eftà dentro na muela da gallinha ; por- que me confta, que qualquer deftes dous remedios tem obrado effeitos maravilhofos em curar dores de colica, & de eftomago; mas porque naquella hora nao tinha em cafa os taes remedios preparados , lancei maõ de huma oitava de pò de efterco de ratos, cuja virtude nao he inferior aos mais decantados reme- dios;mas vendo que naõ aproveitàra, me lembrou que Galeno, (1.) & Avicenna (2.) louvavao muito para as dores de colica , & de barriga (não fendo caufadas de inflammaçaõ ) huma ventofa de boca grande, deitada com muito fogo fobre oembigo; appliqueilha, mas fem proveito; nefta defefperaçao puz toda a efperança nos remedios narcoticos , começando pelos mais brã- dos, & benignos , & afim lhe applique ofeguinte, que he excellentiffimo. Tomem de cumo de folhas de meimendro quatro onças', de leite de burra , ou de ca- bras meyo quartilho, mifturefe huma coufa com ou- tra, ajuntandofe tres gemas de ovos cruas, & nefte li- +cor enfopem o miolo de hum pao tirado daquelle inf- tante do forno, & fe façao humas papas, que fe ponhao fobre todo o ventre, & eftomago. Nefte tempo ven- do vencidas humas dores tao pertinazes, quenos da- va- - t 1 1 n ( 1 --- . .
32 Obfervacoes Medicas Doutrinaes. go que a dita ajuda, ein raza dovinagre, caufaffe grande conceito della ; porque o vinagreaeftempera-- do com a agua mollifica muito as fézes düras ; & tem- pera maravilhofamente.as inflammacöes, & as dores quentes, como fe deixa ver nos gargarifimos , :que fe fazem comvinagre deftemperado para inflammacöes da garganta ; & nas feridas , que para fe nainflamma rem,fe cobrem com pannos picados, molhados em vi nagredeftemperado con agua rofada ; & por efta cau- fa julguei lhe feria utiliffimaa tal ajuda: & na me en- .: ganei; porque tomandoa, lhe aplacou logoa dor, & facilitou a camara ; mas antes de paffarem duas horas crefceo outra vez de maneira, que todos julgavaó ti- nha chegadoa morte.Nefteconflicto lhe quiz dar hüa oitava de priapö: detouro, ou dous efcropulos de p da tunica que efta dentro. na muela da gallinl'a ; por- que me confta, que qualquer deftes dous remedios tem obrado:effeitos maravilhofos em curar dores de colica, & de eftomago; mas porquenaquella hora na tinha em cafa os taes remedios preparados , :lancei mao de huma.oitava de p de efterco de ratos , cuja virtude nao he inferior aos mais decantados reme- dioš;mas vendoque na aproveitara, me lembrou que Galeno, (1.& Avicenna (2.) louvava muito para as dores decolica,& dc barriga (naofendocaufadas de inflammaca ) huma ventofa deboca grande, deitada . C com muito fogo fobre:0embigo; appliqueilha, mas fem proveito;nefta defefperaca puz toda a efperanca nos remedios narcoticos, comecanda.pelos imais bra- dos, &.benignos , &. affim lhe appliqt. ofeguinte, que he excellentiffimo. Tomem de cumo de folhas de meimendro quatro onšas', de leite de burra ,ou de ca- bras meyo quartilho, mifturefe huma coufa.coin ou- tra, ajuntandofe tres gemas de ovos cruas, &ncfte li- . cor enfopem o miolode hum paö tirado daquelle inf- tante do forno, & fe faca.humas papas,quefeponha fobre.todo.ö.ventré., & cftomago. Nefte tempo:ven- do vencidas humas dores ta pertinazes., quenos da- va-
132 Obfervações Medicas Doutrinaes.. “go que a dita ajuda, em razaóô do vinagre, caufaffe grande medo aos circunftantes ; comtudo eu tenho - grande conceito della ; porque o vinagredeltempera-- do com a agua mollifica muito as fezes duras; & tem- . + “pera maravilhofamente.asinflammações , & as dores uentes, como fe deixa ver nos gargarifmos ; que fe fazem comvinagre deftemperado para inlammações da garganta ; & nas feridas , que para fe naõinflamina, rem,fe cobrem com pannos picados, molhados em vi-. nagredeftemperado com agua rofada ; & por efta cau- fajulguei lhe feria utiliflima a tal ajuda: & naô me enº ganei ; porque tomandoa, lhe aplacou logo a dor, & facilitou a camara ; mas antes de paflarem duas horas crefíceo ontra vez de maneira, que todos julgavaõ th. nha chegado a morte. Nefteconfli&o lhe quiz dar hãa oitava de priapo: detonro, ou dous eferopulos de pô da tunica que eftà dentro. na muela da gallinha ; por-. que me confta, que qualquer deftes dous remedios tem obrado:-effeitos maravilhofos em curar dores de colica, & de eftomago; mas porque naquella hora naõ tinha em cafa os taes remedios preparados , lancei maô de huma oitava de pô de efterco dé ratos , cuja virtude nao he inferior aos mais decantados reme- dios;mas vendo que naô aproveitàra, me lembrou que Galeno, (1.) & Avicenna (2.) louvavaô muito para as dores de colica , & de barriga (não fendo caufadas de inflammaçaõ ) huma ventofa de boca grande, deitada com muito fogo fobre oembigo; appliqueilha, mas fem proveito;nefta defefperaçao puz toda a elperança, nos remedios narcoticos , começando pelos mais brã- dos, & benignos , &.aflim lhe a Ni. o feguinte, que he excellentiffimo. Tomem de çumo de folhas de meimendro quatro onças», de leite de burra pu de ca- bras meyo quartilho, mifturefe huma coufa-com ou- tra, ajuptandofe tres gemas de ovos cruas, & ncfte li- «corenfopern o miolo de hum paó titado daquelle inf... tante do forno, & fe façaô.humas papas,que teponhaõ tobre todo-6 ventre , & eftomago. Nelte tempo-ven- do vencidas humas dores taó pertinazes, que nos da- : ' VYa= ” ” . Ú " — .. > . o TT a
132 Observaçones Medicas Doutrinaes. go que a dita ajuda, em razaon do vinagre, causasse grande medo aòs circunstantes; comtudo eu tenho grande conceito della; porque o vinagre destempera- do com a agua mollifica muito as fezes duras, & tem¬ pera maravilhosamente as inssammaçones, & as dores quentes, como se deixa ver nos gargarismos , què se fazem com vinagre destemperado para inflammaçones da garganta; & nas feridas, que para se naon inflamma, rem, se cobrem com pannos picados, molhados em vi¬ nagre destemperado com agua rosada ; & por esta cau- ſa julguei lhe seria utilissima a tal ajuda : & naon me en- ganei; porque tomandoa , lhe aplacou logo a dor , & facilitou a camara; mas antes de passarem duas horas cresceo outra vez de maneira, que todos julgavaon ti- nha chegado a morte. Neste conflicto lhe quiz dar huma oitava de priapo de touro , ou dous escropulos de pò da tunica que està dentro na muela da gallinha ; por- que me consta, que qualquer destes dous remedios tem obrado effeitos maravilhosos em curar dores de colica, & de estomago; mas porque naquella hora nao tinha em casa os taes remedios preparados, lancei mao de huma oitava de pò de esterco de ratos , cuja virtude nao he inferior aos mais decantados reme¬ dios; mas vendo que naon aproveitàra, me lembrou que Galeno, (1.) & Avicenna (2.) louvavaon muito para as dores de colica , & de barriga (namo sendo causadas de inflammaçaon) huma ventosa de boca grande, deitada com muito fogo sobre oembigo; appliqueilha, mas sem proveito; nesta desesperaçaon puz toda a esperança nos remedios narcoticos, começando pelos mais bram¬ dos, & benignos, & assim lhe appliqu o seguinte, que he excellentissimo. Tomem de çumo de folhas de meimendro quatro onças, de leite de burra, ou de ca- bras meyo quartilho, misturese huma cousa com ou¬ tra, ajuntandose tres gemas de ovos cruas, & neste li- „cor ensopem o miolo de hum paon tirado daquelle ins¬ tante do forno, & se façaon humas papas, que se ponhaon sobre todo o ventre, & estomago. Nestę tempo ven- do vencidas humas dores tao pertinazes, que nos da¬ va¬
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Observaçaõ XXI . 133 vamos os parabens huns a outros ; mas (oh caducos gostos da vida humana , como sois falliveis , & nada perduraveis ! ) pouco a pouco tornáraõ a resuscitar as dores com tanta vehemencia , que fizeraõ delirar ao doente . 2 . Confesso que neste aperto naõ sabia resolverme no caminho que avia de seguir : porque porfiar com os mesmos remedios , de que naõ avia tirado fruto , seria teima indisculpavel : fazer outros à vista de tantos, taõ excellentes , & com tão bons fundamentos applicados , pareceria cegueira , ou deslumbramento do juizo : desemparar ao doente era especie de tyrannia . Em taõ apertado conflicto ja naõ achava outra amarra a que me apegar , senaõ aos remedios narcoticos mais activos , & valentões , quaes saõ o laudano opiado , ou o laudano liquido . Nem me acovardou o dizer Galeno ( 3 . ) que todas as vezes , que pudermos curar com os remedios communs , & ordinarios , fujamos dos opiados , & narcoticos : porque tambem elle diz que se virmos que pela vehemencia das dores , ou faltas do somno se vaõ prostrando as forças , & o doente se vay despenhando na sepultura , que em taes casos usemos confiadissimamente delles ; porque elle os dava nas grandes dores de colica , dos olhos , dos ouvidos , & em quaesquer outras vehementissimas . Fiado nesta doutrina , & na de Cornelio Celso , ( 4. ) em que nos aconselha , que nos grandes perigos he melhor fazer algum remedio , aindaque seja duvidoso , que deixar morrer ao doente com certeza ; & lembrandome que o grande Valhes diz , que naõ deixemos aos doentes nas mãos do inimigo , em quanto ouver algum soccorro na Arte , me deliberei a dar ao sobredito Visconde tres grãos de laudano opiado em forma de pilula ; para a qual resoluçaõ me animou muito a experiecia de Riverio , ( 5. ) o qual em outra dor semelhante usou do laudano opiado com successo maravilhoso . Mas como os remedios narcoticos sejaõ mal opinados entre os que naõ saõ Medicos , por isso alguns parentes , & amigos do enfermo naõ queriaõ estar
- Obfervação XXI. İ33 . vamos os parabens huns a outros ; mas ( oh caducos. goftos da vida humana, como fois falliveis, & nada perduraveis ! ) pouco a pouco tornarao a refufcitar as dores com tanta vehemencia, que fizerao delirar ao doente. - 2. 'Confeffo que nefte aperto nao fabia refolver; me no caminho que avia de feguir : porque porfiar com os mefmos remedios , de que nao avia tirado fru -. to, feria teima indifculpavel : fazer outros a vifta de tantos , tao excellentes, & com tão bons fundamen+ tos applicados , pareceria cegueira , ou deslumbra- mento do juizo : defemparar ao doente era efpecie de tyrannia. Em tao apertado conflicto ja nao achava ou- tra amarra a que me apegar, fenao aos remedios nar- coticos mais activos, & valentões, quaes fao o lau- dano opiado, ou o laudano liquido. Nem me acovar- dou o dizer Galeno ( 3.) que todas as vezes, que pu- dermos curar com os remedios communs, & ordina2 rios , fujamos dos opiados ; & narcoticos : porque tambem elle diz que fe virmos que pela vehemencia: das dores., ou faltas do fomno fovaõ proftrando as- forças , & o doente levay defpenhando na fepultura, que em taes cafos lufemos confiadiffimamente delles; porque: elle os dava nas grandes dores de colica, dos olhos , dos ouvidas , & em quaefquer outras vehe mentiffimas. Fiado nefta doutrina, & na de Cornelio Cello, (4) em que nos aconselha, que nos grandes pe- rigos he melhor fazer algum remedio, aindaque feja' duvidofo, que deixar morrer ao doente com certeza ;- lembrandome que o grande Valhes diz , que nağ deixemos aos doentes nas mãos doinimigo, em quan- to ouver algum foccorro na Arpe, me deliberei a dar, ao fobredito Vifcondei tres grãos de laudano opiado em formade pilula ; para a qual refoluçao me animou muitola experiencia de Riverio, (5. )o qual em outra dor ferhelhante dfou do lapdano opiado com fucceffo ma+ ravilhofo. Mas como os remedios narcoticos fejaõ mal opinados entre os que nao fao Medicos, por iffo alguns parentes, & amigos do enfermo nao queriao eftar 1 D -1 - ;
Obfervacao . XXf.. : 133 .vamos os parabens huns a outros; mas.( ohcaducos goftos da vida humana, comofois falliveis, & nada perduraveis ! ) pouc a pouco tornára arefúfcitar as dores com tanta vehemencia,.que fizera delirar ao. doente. 2. Confeffoquenefte aperto. na fabia refolver: me no caminho-que avia de feguir: porque porfar com os mefmos remedios , de que naavia tirado fru-- to , feria teima indiftulpavel : fazer outros avifta de tantos,taoexcellentes, & com tao bons fundamen- tos:applicados , pareceria cegueira , ou deslumbra- mentodojuizo:defeinparar aodoente era efpecie de tyrannia. Em ta apertado conffito ja na achava ou- tra amarra a que me apegar , fena aos remedios nar-. 1 coticos mais activos,: & valentoes, quaes fa olau- 0 dano opiado, ou o laudano liquido. Neim me acovar- dou o dizer Galeno( 3:) que todas .as vezes, que pu- dermos.curar com os remedios.communs, & ordina- nios , fujamos dos opiados , & narcoticos : porque tambem. elle. diz que: fe virmos:que pela vehemencia das dores, ou faltas do fomno .fcva proftrando as. forcas , & :o doente fevay defpénhando na fepultura, que em taes.cafos jufemos'confiadiffimamente delles;: porque: elle os-davanas grandes: dores de colica, dos lhos., :dos:ouvidas , & em quaefquer outras vehe- mentiffmas. Fiadonefta doutrina,. & na de Cornelio Celfo,(4) em qut nos aonfelha, que nos grandes pe- rigós.he melhor fazer algum rermedio, aindaque feja: duvidofo, que deixarimorrer: aadoentecom certeza;: &. lembrandome: que o grande Valhes diz , que na@ deixemos aos doentes nas maos doinimigö, em quan- toouver algum föccour na Arra : me deliberei a dar a9 :fobrédita Vifconde: tres graos de.laudauo piado: em formaxepilula;para a qual refoluca me animou muitoaexperiécia de Riverio,( s:o qualemoutra dor ferhelhanteufou doaatanbopiada.com fucceffo ma* ravilhofo.. Mas. cdma os remedios narcoticos: feja mal opinados entre os quc.nab fa Mcdicos , por iffo agns,pareites, & ánigos doenfermo na qucria eftar
: ” oco Obfervaçãôo "XX 33 «vamos os parabens huns a outros; mas ( oh eaducos. goftos da vida humana, como fois falliveis , & nada. perduraveis! ) pouco a pouco tornáraõ arefufcitar as dores com tanta vehemencia, que fizeraõ delirar ao- doente: esti NEL : 2: Confefloquenelte aperto nao fabia refolver« me no caminho.que avia de feguir: porque porfiar com os melmos remedios , de que naó avia tirado fruz- to , feria teima indifeulpavel: fazer outros à vilta de il tfantos,taóexcellentes, & com tão bons fundamen- tos.applicados , parêceria cegueira , ou deslimbra: merito do juizo: defemparar ao doente era efpecie de: &yrannia. Em taô apertado conifli€to ja naõ [sta ou: tra amarra a que me apegar, fenaãô aos remedios nar coticos mais activos, & valentões , quaes faô: o laws dano opiado,, ou o laudano liquido. Nein: me ácovat- ] douodizer Galeno ('3.) quetodas as vezes ; que pu- 4 dermoscurarcomosremedios.communs, & ordina” vios , fujamos dos opiados ; & narcoticos : porqud tambem elle diz que fe virmôs:que pela vehemencia das dores, ou faltas do fomno Íevaõ proftrando as forças ,-& o doente fecvay defpenhando na fepultura, que em tazs.cafos'ulfemos confiadiflimamente delles; orque: elle 0s-dava'nas grandes dores de colica, dos elhos .,;:dos ouvidas , -& em quaeíquer outras veheo mentiflimas. Fiado:nefta.doutrina;. & na de Cornelio Celfo,(4:) em que nos aconfelha, que nos grandes pe- rigós he melhor fazer algum rêmedio, aindaque feja' duvidofo, que deixar morrer aodóente com certeza; & lembrandome que ogrânde Valhes diz ; que nao deixemos aos doentes nas mãos dowitiimigo, em quan- só onver algum fóccorro na Arpe ;mne deliberei a dar 20 fobrédiva Vifconde: tres prãos de laudano opiado: em formazie pilula ;-para à qual refoluçaõ me animou ninitoa experiécia de Riverio,(5:)a-qual em eutra dor ferhelhantesfou do japdgnb'opiado.com fuceeflo mas raávilhofo. Mas cómo os remedios naricoticos fejaõ mal opinados entre os que nao fa Medicos, por iflo algans parentes, & ámigos do enfermo naô queriaô PE eftar TSE PE ECRORE VD
Observaçao XXI. 133 vamos os parabens huns a outros; mas (oh caducos gostos da vida humana, como sois falliveis, & nada perduraveis!) pouco a pouco tornáraon a resuscitar as dores com tanta vehemencia, que fizeraon delirar ao doente. 2. Confesso que neste aperto naon sabia resolver¬ me no caminho que avia de seguir: porque porfiar com os mesmos remedios, de que nañ avia tirado fru¬¬ to, seria teima indisculpavel: fazer outros à vista de taritos, taon excellentes, & com tamo bons fundamen¬ tos applicados, pareceria cegueira, ou deslumbra¬ mento do juizo: desemparar ao doente era especie de tyrannia. Em taon apertado conflicto ja naon achava ou¬ tra amarra a que me apegar, senaon aos remedios nar¬ coticos mais activos, & valentones, quaes saô o lau¬ dano opiado, ou o laudano liquido. Nem me acovar¬ dou o dizer Galeno (3.) que todas as vezes, que pu dermos curar com os remedios communs, & ordina¬ vios, fujamos dos opiados, & narcoticos: porque tambem elle diz que se virmos que pela vehemencia das dores, ou faltas do somno sevaon prostrando as forças, & o doente se vay despenhando na sepultura, que em taes casos lusemos confiadissimamente delles; porque elle os dava nas grandes dores de colica, dos olhos, dos ouvidas, & em quaesquer outras vehe- mentissimas. Fiado nesta doutrina, & na de Cornelio Celso, (4.) em que nos aconselha, que nos grandes pe¬ rigos he melhor fazer algum remedio, aindaque seja duvidoso, que deixat morrer ao doente com certeza; & lembrandome que o grande Valhes diz, que naë deixemos aos doentes nas manos do inimigò, em quan¬ to ouver algum soccorro na Arre, me deliberei a dar a0 sobredito Visconde tres granos de laudano opiado em formade pilula; para à qual resoluçaon me animou muito a experiencia de Riverio, (5. jo qual em outra dor semelhante usou do faudano opiadò com successo ma¬ xavilhoso. Mas como os remedios narcoticos sejaon mal opinados entre os que naon sao Medicos, por isso alguns parentes, & amigos do enfermo nao queriaon estar A
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134 Observações Medicas Doutrinaes. estar pelo meu voto. Comtudo o illustrissimo doente tinha em mim taõ grande crença , que logo tomou o sobredito laudano , com o qual se tirou a dor por espaço de vinte horas ; mas passadas ellas, tornou a repetirlhe com a mesma ferocidade que no principio . 3. Neste caso me foi preciso entender que as dores eraõ taõ porsiadas , porque sem duvida procediaõ de humores eterogenios , & de differentes naturezas , como saõ a colera , & a fleuma , & que por esta razão , quando applicava remedios quentes , se temperava por algum tempo a frialdade da fleuma , & se tirava a dor que ella causava ; mas se continuava com applicaçaõ dos taes remedios quentes , se irritava a colera , & crescia a dor que della procedia : pelo contrario , quando applicava os remedios frios , se temperava a quentura da colera , & se tirava por algum tempo a dor que ella fazia ; mas se continuava muito tempo com os remedios frios , se exasperava a frialdade da fleuma , & crescia a dor que ella causava ; & esta (a meu ver ) era a total razão porque as dores humas vezes obedecião aos remedios frios , outras vezes se exasperavaõ com elles , & por isso durariaõ as dores até tirarem a vida , se eu me naõ resolvera a purgar ao doente com remedios , que respeitassem aos humores colericos , & fleumaticos , dos quaes procedião certamente as sobreditas dores , porque de outra sorte, naõ se tirando a causa , naõ se tiraria a doença. Receiteilhe pois tres onças de mannà com duas oitavas dos meus trociscos de Fioravanto , desatando tudo em seis onças de caldo de gallinha ; & foi este remedio taõ bem succedido , & tirou a dor taõ presentaneamete , q mais pareceo obra divina , que humana ; & viveo o sobredito Visconde vinte annos depois que lhe fiz esta cura . Os que não quizerem usar dos trociscos , por ser segredo meu , desatem o mannà em cinco onças de oleo de amendoas doces feito sem fogo , que tambem o tenho experimentado muitas vezes com felicissimo successo na cura de semelhantes dores . 4 . Estimese muito este modo de curar as colicas, ou
134 Obforvações Medicas Doutrinaes. eftar pelo meu voto. Comtudo o illuftriffamo doente tinha em mim tao grande crença, que logo tomou a fobredito laudano, com o qual fe tirou a dor por efpa- co de vinte horas ; mas paffadas ellas, tornou a repres tirlhe com a mefma ferocidade que no principio. 3. Nefte cafo me foi precifo entender que as do- res erao tao porfiadas, porque fem duvida procediaõ de humores eterogenios , & de diferentes naturezas, como fao a colera , & a fleuma, & que por efta razão, quando applicava remedios quentes , fe temperava por algum tempo a frialdade da fleuma, & fe tirava a dor que ella caufava .; mas fe continuava com appli- caçaõ dos taes remedios quentes, fe irritava a colera, & crefcia a dor que della procedia : pelo contrario, quando applicava os remedios frios, fe temperava. a quentura da colera, & fe tirava por algum tempo a dor que ella fazia ; mas fe continuava muito tempo com os remedios frios, fe exafperava a frialdade da fleuma, & crefcia a dor que ella caufava; & efta (a meu ver ) era a total razão porque as dores humas ves zes obedeciao aos medios frios, outras vezes fe era afperavao comelles, & por iffo durariao as dores ate tirarem a vida , fe cu me nao refolvera a purgar ao doente com remedios, que refpeiraffem aos humores colericos, & fleumaticos, dos quaes procediao cer- tamente as fobreditas dores, porque de outra forte ;. nao fe tirando a caufa, nao fe tiraria a doença. Recei- teilhe pois tres onças de mannà com duas oitavas dost meus trocifcos de Fioravanto, defarando tudo em fois onçasds caldo de gallinha; & foi efte remedio tão bens fuccedido, & tirou a dor tao prefentaneamente,q mais Pareceo obra divina , que humana; & viveo o fobredia to Vifconde vinte anos depois que lhe fiz efta cura; Os que não quizerem ufar dos trocifcos, porder fegre- do meu , defatem o mannà em cinco onças de aleo do amendoas doces feito fem fogo, que tambemo tenho experimentado muitas vezes . com feliciffimo facceffa na cura de femelhantes dores. : : 4. Eftimefe muito efte modo de curar as colicas, ou - -
Obfarvacoes.Medicas Doutrinaes. 1347 eftar pelo meu voto.Comtudooilluftriffanodoente tinha em mimtaögrande crenea, que logotomau & fobredito laudano , com o qual fe tirou a dor por.elpa. co de.vinte horas; mas paffadas ellas, tornou a repe: tirlhe com a mefma ferocidade que no principio. 3..Nefte cafo me foi precifo. cntender que as do- res era ta porfiadas, porque fem duvida procediaá de humores eterogenias, & de differentes naturezas, como fa a colera, & a fleuma , & que por efta razao, quando applicava remedios quentes , fe temperava por algum tempo a frialdade da fleuma, & fetiravaa dor que ella caufava.; mas fecontinuava comappli- cacaö dos taes remedios quentes , fe irritava a calera,: & crefcia a dor que della procedia: * pelo cantraria, quando applicava osremedios frios,fe remperava.a quentura da colera, & fe tirava poralgum tempo a dor que ellafazia; masfe cantinuava muita tempo com os remedios frios, fe exafperava a frialdade da Aeuma, & crefcia a dor que ella canfava; :&. efta (: meu ver ) era a total razao porque as dores humas ve zes obedeciao aos remedios frios , outras vezcafe ex afperava camelles ,& por iffoduraria as dores at tirarem a vida , fe cu me na refolvera a pargar:ar .: doente com remedios, que refpeitaffemaos humores : colericos, & Aeumaticos, dos .quaesprocediaacer- tamente. as fobreditas dores, porque de outra: forte, na fe tirandoa caufa, na fe tiraria a docncar: Recei teilhe pois tres Qncas de manna com duas oitavas das? meus troeifcos de Fiaravanto , defatando.tudo emfois onras ds caldo de galinha;& foi efto remediota berrt fuccedido,& tirou ador ta prefentaneamcnto;q mais parecee obra divinaque humana; & viveoo fabredi ta Vifconde vinte. annos depois que lhe fiz efta curas Qs que:naa quizerem ufar dos.trocifcos,parferfegre doqu,defatemomannaem cinto oncas dealeo d amendoas docesfeito:femfogo,qué canbontenho experimentado muitas vezes.cam felicilfimafucccffo na cura de femelhantes dores. . : :131 4. Eftimefe muitoefte modode curarascolicas,: eu
134 Oblatváções Medicas Doutrinaes. eftar pelo meu voto. Comtudo 6 illuftriffirtmo doente tinha em mim .taó grande crença , que logo tomou à fobredito laudano , com o qual fe tivou a dor por efpas cade vinte horas; mas palladas ellas, tornou'a repes : tirlhe com a mefma ferocidade que no principio. . 3... Nefteçcafome foi precifo entender-quê as do. res eraô taó porfiadas, porque fem duvida procedia&ã de humores eterogenias , & de diferentes naturezas, ". como faõa colera , & a leuma , & que por efta razão; quando applicava remedios quentes , fe temperava por algum tempo a frialdade da fleuma, & fe tirava a dor que ella caufava; mas fecontinuava comappli- caçao dos taes remedios quentes , fe irritava a calera,; | & crefcia a dor que della procedia : pelo cantrario; Sos io 1. quando applicava osremedios frios, fe temperava. a PSPECSENCINDAS : quentura da colera, & fe tirava poralgum tempo & 2 | or que ellafazia; mas fe cohtinuava muito tempo ESSA SENDA . com os remedios frios, fe exalperava a frialdade da ao so. +, fleuma, 8 crefeia a dor que ella caufava; .& celta (a E To meu ver )era a total razão porque as dores humas veis zes obedecião aos semedios friós , outras veres fe exis : afperavad comelles , & por iflodurariaô as dores até . tirarem a vida , fe eu me naô refolvera a purgar-ag ; doente com remedios, que refpeira(lem aos humores - colericos , & fleumaricos, dos quaes procedião cer o tamente as fobreditas dores, porque de outra forte; 2 nao fetirando a caufa, naãô fe tiraria a doenças Recei i . teilhe pois tres onças de mannà com duas oitavas dos: meus trogifcos de Fioravanto, defarando tndo em foit “7, ençasde caldo da gatlinha;& foi efto remedio tdo besb 'fuceedido,ê tirou a dor taô prefenraneamente;ó mais -parecee obra divina , que humana; & viveo'o fobredis ta Vifeonde vinte. annos depois que lhe fiz: éfta cura; 4.1 Os quenáe quizerem ufar dos trocifcos,pôrferfepres 4 Vc is demen,defartemomannã em cinéa onças de oleo de : “ca amendoasdogesfeito.fem fogo. «qué tamberno-tenho: e 7: experimentado muitas vezes .cam felieillima fuccefta ENS * 4 Efltimefemuirocite modode curaras colicas; : eu
.... . ...) .. . .. 134 Obsor vacones Medicas Doutrinaes. estar pelo meu voto. Comtudo o illustrissimo doente tinha em mim taon grande crenęa, que logo tomou o sobredito laudano, com o qual se tirou a dor por espa¬ ço de vinte horas; mas passadas ellas, tornou a repe¬ tirlhe com a mesma ferocidade que no principio. 3. Neste caso me foi preciso entender què as do¬ res eraon taon porfiadas, porque sem duvida procediaem de humores eterogenios, & de differentes naturezas, como saon a colera, & a fleuma, & que por esta razano, quando applicava remedios quentes, se temperava por algum tempo a frialdade da fleuma, & se tirava a dor que ella causava; mas se continuava com appli¬ caçao dos taes remedios quentes, se irritava a colera, & crescia a dor que della procedia: pelo contrario, quando applicava os remedios frios, se temperava a quentura da colera, & se tirava por algum tempo a dor que ella fazia; mas se continuava muito tempo com os remedios frios, se exasperava a frialdade da fleuma, & crescia a dor que ella causava; & esta sa meu ver) era a total razamo porquę as dores humas ve¬ zes obedeciamo aos semedios frios, outras vexes se ex¬ asperavaon com elles, & por isso durariaon as dores ate tirarem a vida, se eu me naon resolvera a purgar ac doente com remedios, que respeitassem aos humores colericos, & fleumaticos, dos quaes procediamo cer¬ tamente as sobreditas dores, porque de outra sorte, naon se tirando a causa, naon se tiraria a doença. Recei¬ teilhe pois tres onças de mannà eom duas ortavas dos meus trociscos de Fioravanto, desatando tudo em fois onças de caldo de gallinha; & foi esto remedio taon bem succedido, & tirou a dor taon presentaneamente, quae mais pareceo obra divina, que humana; & viveo o fobredi¬ to Visconde vinte annos depois que lhe fiz esta cura. Os que nano quizerem usar dos trociscos, porsser segre¬ do meu, desatem o mannà em cinco onças de oleo de amendoas doces feito sem fogo, què tambemo tenho experimentado muitas vezes com felicissimo successo 5. na cura de semelhantes dores. 4. Estimese muito este modo de curaras colicas, ou
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OBSERVAÇAÕ XXII . 135 ou ellas sejaõ ordinarias , ou nephriticas , porque atè o dia presente raras vezes faltou com o seu bom effeito . Deste modo curei ao Illustrissimo Senhor Fr. Joaõ da Madre de Deos , que depois foi Arcebispo da Bahia : ao Capitaõ Francisco de Albuquerque & Castro : a Carlos Peres mestre de armas : a Domingos Varela , a Francisco da Cunha , & a muitos outros doentes , cujos nomes deixo de referir por não enfadar aos leitores . OBSERVAÇAM XXII De huma dor de ouvido taõ excessiva , que chegou a hum doente às portas da morte ; & por beneficio de humas gottas de oleo rosado fervido em huma casca de romãa com huma duzia de bichos chamados Mil-pès , deitando de quatro em quatro horas seis gottas mornas dentro no ouvido , teve o doente melhoria taõ admiravel que pareceo milagrosa ; mas porque passados doze annos tornou o dito doente a ter a mesma dor , & com mayor excesso , & naõ lhe aproveitando o dito oleo , nem as sangrias , purgas , pilulas , nem outros remedios celebres , appellei para huma ventosa de bocata grande , que coubesse dentro nella toda a orelha , & pondolhe muito fogo , a appliquei sobre o ouvido , & foi tal a actividade , com que atrrahio o humor , que estava dẽtro na cavidade , que no mesmo instante rebentou hum torno de materia , & ficou o doente saõ com grande credito da Arte , & do meu nome . 1. Rebelde , & teimosamente pertinaz foi a dor de ouvido , q atormentou ao Doutor Antonio Roballo Freire , o qual pela vehemencia , & sentimento que teve , não só passou algũas noites sem dormir , mas teve huma grande febre , & huma perturbaçaõ de juizo taõ grande , que por instantes esperava a morte ; & como nem as sangrias repetidas , nem
Obfervaçao XXII. 135 . ou ellas fejao ordinarias, ou nephriticas, porque atè o dia prefente raras vezes faltou com o feu bom effei- to. Defte modo curei ao Illuftriffimo Senhor Fr. Joao da Madre de Deos, que depois foi Arcebifpo da Ba- hia: ao. Capitao Francifco de Albuquerque & Caf- tro : a Carlos Peres meftre de armas: a Domingos Varela, a Francifco da Cunha, & a muitos outros doentes, cujos nomes deixo de referir por não enfa- dar aos leitores. OBSERVAÇAM XXII. De buma dor de ouvido tao excefiva, que chegou a bum : doente as portas da morte ; & por beneficio de bumas : gottas de oleo rofado fervido em buma cafca de romaa : com buma duzia de bichos chamados Mil-pes, deitando de quatro em quatro horas feis gottas mornas dentro no ouvido, teve o doente melhoria tao admiravel que. pareceo milagrofa; mas porque pafados doze annos - tornowo dito doente a ter a mefma dor , & com mayor: exceffo, & nao lhe aproveitando o dito oleo, nem as . fangrias, purgas , pilulas, nem outros remedios cele- bres, appelleipara huma ventofa de bocata ; grande, que coubeffe dentro nella toda a orelha, & pondolhe; : muito fogo, a appliquei fobre o ouvido, d foi tal a atti- . vidade,com que attrabio o humor, que cftava detrona : cavidade, que no mefino inftante rebentou bum torno' - de materia , & ficou o doente fao com grande credit o: : da Arte, & do meu nome. : 1. R Ebelde, & teimofamente pertinaz foi a - dor de ouvido, q atormentou ao Doutor Antonio Roballo Freire, o qual pela vehemencia , & fentimento que teve:, não fó paffou alguas noites fem dormir, mas teve huma grande febre, & huma per- turbaçao de juizo tao grande, que por inftantes ef- perava amorte ; & como.nem as fangrias repetidas, nem !
Obfervacao. : Xxit. : :1 3 t . ou ellas feja ordinarias , ou nephriticas , porque ate o:dia prefente raras vezes faltou com o feu.bom effei- to. Defte modo curei ao Illuftriffimo Senhor Fr. Joa da Madre de Deos, que depois foi Arcebifpo da Ba- hia: ao. Capita Francifco de Albuquerque & Caf- tro : a Carlos Peres meftre de armas: a Domingos Varela, a Francifco da Cunha, & a muitosoutros daentés, cujos nomes.deixo de referir por nao enfa- dar aosleitores. 1990:c0$508 0$50 :0550: 03$ca:9$0 0350 9330 c05$0 10350 103$0: 50 O B S E R V A C:A M XXII. De buma dor de ouvidota excefliva, que chegou a bum doente asportas da morte; d por bencficio tle bunas gottas de oleo rofadofervidocin buina tafca de'ronaa com buma duzia de bicbos cbamados Mil-pes, deitando de quatro em quatro horasfeis gottas mornas dontro no ouvido, teve o doente inelboria ta admiravel qie pareteo milagrofa; mas porque paffados doze annos tornotto:dito doente a tcr a mefma dor , com inayor exceffo, na lbe aproveitando o cito oleo, nem as Jangrias, purgas , pilulas', nem outros remedios cele-. . bres, appelleipara buma ventofa de bocata : grancle, que coubeffe dentro:nella toda a.orelba, pondolbe: : mito fogo,a appliquci fobre o ouvido,ds foi tal a acti-: . vidade,cam que attrabio o humor,que cftava détrona: : . cavidade , que no mefino inftante rebentou bum torno - de materia, s ficou o doentefa. com grande credit o: .. . da Arte, & do.meu nomc. R Ebelde, & teimofamente pertinaz foi a dor de ouvido, q atormentou ao Doutor Antonio Roballo.Freire, o quat pela vehemencia, & fentinento que teve:, nao fo paffou algüas noites fem dormir, mas teve humagrande febre, & huma per- turbaca de juizo ta grande, que por inftantes ef perava amorte ; &.comonem as fangrias repctidas, nem
o Obfetvação XX: 434 . ou ellas fejaó ordinarias, ou nephriticas, porque até | odia prefente raras vezes faltou com o feubom effeix 2 tó. Defte modo curei ao Iluftrilimo Senhor Fr. Joaô TR . da Madre de Deos, que depois foi Arcebifpo da Bas hia: ao. Capitaó Francifro de Albuquerque & Caf- tro a Carlos Peres meítre de armás: a Domingos PED Varela, a Francifco da Cunha, & a muitos outros - ' : doentes, cujos nomes-deixo de referir por não enfa- — dar aosleitores. | 4 « OBSERVAÇAM XXI. ' ' 1 De bruma dov de ouvido tao excelfiva , que chegou a bum : doente àsportas da morte; & por bencficio de bumas : gotas de oleo rofado fervido em buma cafca-de romãa com buma duzia de bichos chamados Mil-pes, deitando de quatro em quatro horas feis gottas moruas dentro no ouvido, teve o doente melhoria tao admiravel que. º pareceo milagrofa; mas porque palíados doze annos - tornomo:dito doente a ter a mefina dor , & commayor. excello, & nao lhe aproveitando o dito oleo , nem as fangrias, purgas , pilulas, nem outros remedios cole « bres, aphelleihara buma ventofa de bocata grande, ue s.. destro nella roda a-orelha, & pundolhe - mito foga,a appliquei fobre o owvido,& for tala aéti-* . - vidade,com que attrabio o hbumoç,que cflava detrona « cavidade , que no mefino inftante vebentou bum torno -* de materia, & ficou o doente-fao comgerande credito: E . « da Arte, & domeu nome. E Ebelde , & teimofamente pertinaz foi a SI R dor de ouvido, q atormentou ao Doutor Antonio Roballo Freire, o qual pela vehemencia, & fentimento que teve:, não fó paílou algãas noites fem dormir, mas reve huma grande febre, & huma per-. turbaçaô de juizo taô grande, que por inftantes ef. perava amorte; &.comanem as fangrias repetidas, : nem Dx
Observaçao XXII. 133 ou ellas sejaon ordinarias, ou nephriticas, porque atè o dia presente raras vezes faltou com o seu bom effei¬ to. Deste modo curei ao Illustrissimo Senhor Fr. Joaon da Madre de Deos, que depois soi Arcebispo da Ba- hia: ao Capitaon Francisco de Albuquerque & Cas¬ tro: a Carlos Peres mestre de armás: a Domingos Varela, a Francisco da Cunha, & a muitos outros doentes, cujos nomes deixo de referir por nao enfa¬ dar aos leitores. OBSERVAQAM XXII. De huma dor de ouvido tao excessiva, que chegou a hum doente às portas da morte; & por beneficio de humas gottas de oleo rosado fervido em huma casca de romam a com huma duzia de bichos chamados Mil-pes, deitando de quatro em quatro horas seis gottas mornas dontro no ouvido, teve o doente melhoria tuo admiravel que pareceo milagrosa; mas porque passados doze annos tornouo dito doente a ter a mesma dor, & com mayor excesso, & nao lhe aproveitando o dito oleo, nem as sangrias, purgas, pilulas, nem outros remedios cele¬ bres, appellei para huma ventosa de bocata grande, que coubesse dentro nella toda a orelha, & pondolhe muito fogo, a appliquei sobre o ouvido, & foi tal a acti¬ vidade, com que attrahio o humor, que estava dentro na cavidade, que no mesino instante rebentou hum torno de materia , & sicou o doente saon com grande credito da Arte, & do meis nome. Ebelde, & teimosamente pertinaz foi a Kdor de ouvido, que atormentou ao Doutor Antonio Roballo Freire, o qual pela vehemencia, & sentimento que teve, namo so passou algumas noites sem dormir, mas teve huma grande febre, & huma per¬ turbaçaon de juizo tao grande, que por instantes es¬ perava a morte; & como nem as sangrias repetidas, nem
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136 Observações Medicas Doutrinaes. nem as purgas , & pilulas muitas vezes tomadas , nem as ajudas revellentes , & purgantes , nem outros mil remedios especificos ; & anodynos , lhe aproveitassem , se teve por infallivel o perigo da vida , mayormente porque o mesmo doente tinha ouvido dizer que Hippocrates (1.) affirmava que a dor de ouvido , sendo grande , & acompanhada com febre , era mortal , ou ao menos ameaçava delirio , & frenesi perigosissimo por causa da inflammaçaõ do cerebro que suppunha , & paraque o doente pela desesperaçaõ em que a dor o tinha posto , se naõ matasse com suas proprias mãos , ( depois de o animar muito ) o mandei sangrar na vea da cabeça do braço da dor , repetindo este remedio dous dias successivos de manhãa , & de tarde , porque verdadeiramente tem estas sangrias tanta propriedade para aplacar semelhantes dores , que com muita razaõ se devem antepor a todos os remedios da Arte : & porque naõ imaginasse alguem que eu fiava toda a cura só das sangrias , lhe deitei dentro no ouvido enfermo o seguinte remedio , que he maravilhoso . Tomei huma duzia de bichos, chamads Mil-pès, deitei-os dentro de hũa casca de romãa com tanta quantidade de azeite rosado , quanta cubra aos ditos bichos , & sobre fogo brando , ou rescaldo se fervaõ , até que o oleo tenha recebido a virtude dos bichos , & da casca ; & deste oleo morno mandei deitar seis gottas no ouvido , de quatro em quatro horas , & com este remedio teve o doente huma melhoria quasi milagrosa ; & ao outro dia naõ avendo já dor , lhe dei a seguinte purga , que para os achaques da cabeça he muito proveitosa , & se faz do modo seguinte . Em seis onças de agua cozida com cardo santo fiz infundir , por doze horas , cinco onças de assucar rosado de Alexandria , meya oitava de bom ruibarbo , & dous escropulos de agarico trociscado , & huma oitava de sene , & tornando a coar a dita agua , lha fiz beber , & evacuou com boa conferencia , & tolerancia . E para confortar a cabeça receitei as seguintes pilulas , que de todos os Doutores saõ muito celebradas. Tomem de massa de pilu
. 136 Obfervações Medicas Doutrinaes. nem as purgas , & pilulas muitas vezes tomadas;, nem as ajudas revellentes, & purgantes, nem outros mil remedios efpecificos , & anodynos, lhe aproveitaf- fem, fe teve por infallivel o perigo da vida, mayormen- te porque o mefmo doente tinha ouvido dizer que Hippocrates (1.) affirmava que a dor de ouvido,fendo grande, & acompanhada com febre, era mortal , ou ao menos ameaçava delirio, & frenefi perigofiffimo por causa da inflammaçao do cerebro que fuppunha; & paraque o doente pela defefperaçao em que a dor o tinha pofto, fe nao mataffe com fuas proprias mãos, (depois de o animar muito ) o mandei fangrar na vea da cabeça do braço da dor, repetindo effe remedio dous dias fucceffivos de manhãa, & de tarde, porque verdadeiramente tem eftas fangrias tanta proprieda- de para aplacar femelhantes dores, que com muita razao fe devem antepor a todos os remedios da Arte: & porque naõ imaginaffe alguem que eu fiava toda a cura fo das fangrias, lhe deitei dentro no ouvido en- fermo o feguinte remedio, que he maravilhofo. To- mei huma duzia de bichos, chamados Mil-pès , dei- tei-os dentro de hűa cafca de romãa com tanta quan- tidade de azeite rofado, quanta cubra aos ditos bi -. chos, & fobre fogo brando, ou refcaldo fe fervao, até que o oleo tenha recebido a virtude dos bichos, & da cafca; & defte oleo morno mandei deitar feis gottas no ouvido, de quatro em quatro horas, & com efte , remedio teve o doente huma melhoria quafi milagro- fa ; & ao outro dia nao avendo ja dor, lhe dei a feguinte purga, que para os achaques da cabeça he muito pro- veitofa, & fe faz do modo feguinte. Em feis onças de agua cozida com cardo fanto fiz infundir, por doze horas, cinco onças de affucar rofado de Alexandria, meya oitava de bom ruibarbo, & dous efcropulos de agarico trocifcado , & huma oitava de fene, & tor- mando a coar a dita agua, lha fiz beber, & evacuou com boa conferencia, & tolerancia. E para confortar a cabeça receiteias feguintes pilulas, que de todos os' Doutores fao muito celebradas. Tomem de mafla de: pilu- --- ----- ! --
136. Obfervacoes Medicas Doutrinaes. nem as.pargas , & pilulas muitas vezes tomadas, nem as ajudas revellentes, & purgantes, nem: ourros.ril Eemedios efpecificos , & anodynas, lhe aproveitaf- fem,fe teve por infallivel o perigo da vida,mayormen- te porque o mefmo doente tinha ouvido:dizer que Hippocrates ( 1.) affirmava que a dor de ouvido,fendo ao menos ameacava delirio, & frenefi. perigofiffime por caufa da inffammaca do cerebro que fuppunha & paraquc o doente pela defefperaca cm que a dor tinhapofto., fe na mataffe con fuas proprias mao& depois de o animar muito ) o mandei fangrar na vea da cabeca do braco dador., repetindo efte remedio dous dias fucceffivos.demanhaa, & de tarde, porque verdadeiramente tam eftas fangrias tanta proprieda de para aplacar femelhantes dores, que'com muita razao fe devem antepor a.todos os remedios da Arte: & porque nao imaginaffe alguem queeu fiava toda a cura f6 das fangrias, lhe deitei dentro noouvido en- fermo ofeguinte remedia.,: que he maravilhofo: To- mei huma duzia de bichos, chamados Mil-pes.,. dei- tei-os dentro de hua cafca de romaa com taata quan- tidade de azeite rofado, quanta cubra aos.ditos bi-: chos, & fobre fogobrando, ou refcaldofeferva,até queooleo tenharecebidoa virtude dos bichos, & da cafca; & defte oleo morno mandei deitar feis gottas no ouvido, de quatro em quatro horas, & com efte ' renmedio teve o doente huma melhoria quafi milagro- fa ; & ao outro dia na avendo ja dor, lhe dei a feguinte purga, que para os achaques da cabeca he muitopro- veitofa, & fe faz domodo feguinte. Em feis oncas de agua cozida com cardo fanto fiz infundir , por. doze horas , cinco.ongas de:affucar rofado de Alexandria, meyaoitavade bom ruibarbo, &dous efcropulos de agarico trocifcado , & huma oitava de fene, & tor- nando a.coar a dita agua, lha fz beber, & cvacuou com boa confercncia , & tolerancia...E para conforrar. a cabeca receitei as faguintes.pilulas; que de todos os Doutores fa muito celebradas. Tameni de maffa de: pilu-
* | em - - " s. . | » Ú kJ À — 136 Obfervações Medicas Doutrinas: nem as purgas ,-& pilulas muitas vezes tormádas, nent as ajudas revellentes, & purgantes, nem: outros milk remedios efpecificos ; & anodynos, lhe aproveitafs fem,fe.teve por infallivel o perigo da vida,mayotrmens te porque o mefmo doente tinha ouvido dizer que Hippocrates ( 1.) afirmava que a dor de ouvido;fendo grande , & acompanhada com febre , era mortal , ou ao menos ameaçava delirio, & frenefi, perigofifimo por caufa da inflammaçaõ do cerebro que fuppunhasz & paraque o doente pela defefperaçaô em que a dor o tinha pofto, fe naô matafle com fuas proprias mãos, (depois de o animar muito ) o mandei fangrar na vea da cabeça do braço da dor, repetindo elte remedio dous dias fuccefTivos de manhãa , & de tarde, porque verdadeiramente tem eítas fangrias tanta propriedaz de para aplacar femelhantes dores, que'com muita razaô fedevem antepor a todos as remedios da Arte: & porque naô imaginafle alguem que eu fiava toda a cura dó das fangrias, lhe deitei dentro no ouvido en- fermo ofeguinte remedia,, que he maravilhofo. To- mei huma duzia de bichos, chamados Mil-pês,. dei- . tei-os dentro de hãa cafíca de romãa com tanta quan- tidade de azeite rofado, quanta cubra aos ditos bi-- chos , & fobre fogo brando, ou refcaldo fe fervaõ, até queo oleo tenha recebido a virtude dos bichos , & da cafca ; .& defte oleo morno mandei deitar feis górtas no ouvido , de quatro em quatro horas, & com efte , remedio teve o dognge huma melhoria quafi milagro- fa ; &ao outro dia naô avendo já dor, lhe dei a fegutnte — purga, que para os achaques da cabeça he muito pro- veitofa, & fe faz domodo feguinte. Em feis onças de agua cozida com cardo fanto fiz infundir, por. doze - horas, cinco onças de aflucar rofado de Alexandria, meya oitava de bom ruibarbo, & dous efcrogulos de agarico trocifcado , & huma oitava de fene, & tor« nando a coar a dita agua , lha fiz beber, & evacuou' com boa conferencia , & tolerancia. E para confortar a cabeça receiteias feguintes pilutas; que de todos os' Doutoresfao muito celebradas. Tomeni de maffa de: Evo pilu- ma '
136 Observaçones Medicas Doutrinaes. nem as purgas, & pilulas muitas vezes tomadas, nem as ajudas revellentes, & purgantes, nem outros mil remedios especificos, & anodynos, lhe aproveitas¬ sem, se teve por infallivel o perigo da vida, mayormen¬ te porque o mesmo doente tinha ouvido dizer que Hippocrates (1.) affirmava que a dor de ouvido, sendo grande, & acompanhada com febre, era mortal, ou ao menos ameaçava delirio, & frenesi perigosissimo por causa da inflammaçaon do cerebro que suppunha; & paraque o doente pela desesperaçaon em que a dor o tinha posto, se naon matasse com suas proprias manos, (depois de o animar muito ) o mandei sangrar na vea da cabeça do braço da dor, repetindo este remedio dous dias successivos de manhana, & de tarde, porquę verdadeiramente tem estas sangrias tanta proprieda¬ de para aplacar semelhantes dores, que com muita razaon se devem antepor a todos os remedios da Arte: & porque naon imaginasse alguem que eu fiava toda a cura so das sangrias, lhe deitei dentro no ouvido en¬ fermo o seguinte remedio, que he maravilhoso. To¬ mei huma duzia de bichos, chamados Mil-pès, dei¬ tei-os dentro de huma casca de romaa com tanta quan¬ tidade de azeite rosado, quanta cubra aos ditos bi- chos, & sobre fogo brando, ou rescaldo se fervaon, até que o oleo tenha recebido a virtude dos bichos , & da casca; & deste oleo morno mandei deitar seis gottas no ouvido, de quatro em quatro horas, & com este remedio teve o doente huma melhoria quasi milagro¬ sa; & ao outro dia naon avendo jà dor, lhe dei a seguinte purga, que para os achaques da cabeça he muito pro¬ veitosa, & se faz do modo seguinte. Em seis onças de agua cozida com cardo santo fiz infundir, por doze horas, cinco onças de assucar rosado de Alexandtia, meya oitava de bom ruibarbo, & dous escropulos de agarico trociscado, & huma oitava de sene, & tor¬ nando a coar a dita agua, lha fiz beber, & evacuou com boa conferencia, & tolerancia. E para confortar a cabeça receiteias seguintes pilulas, que de todos os Doutores saon muito celebradas. Tomem de massa de pilu¬
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Observaçaõ XXII. 137 pilula sine quibus Aureas de Nicolao ; & Agarico trociscado , de cada cousa destas hum escropulo , misturemse muito bem , & formese pilulas ; & destas tomou o doente cinco vezes , em dias alternados , a mesma quantidade, & com estes remedios teve saude perfeitissima . Passados doze annos tornou a ter outra semelhante dor , & porque se lembrou do maravilhoso successo , que avia tido com as sangrias , & oleo rosado fervido na casca de romãa com os sobreditos bichos Mil-pès , entendo que nesta segunda dor teria o mesmo bom successo , & por esta razaõ ( sem chamar Medico ) se sangrou logo seis vezes , & tornou a usar do sobredito oleo ; mas com taõ pouca sorte, que nenhum alivio teve ; & por isso me chamou , & dandome conta da dor , que padecia , & dos remedios , que tinha feito , presumi que o naõ lhe aproveitarem , procedera de que a segunda dor tivera por causa huma grande queda ; & porque entendi que os panniculos , ou meninges do cerebro aviaõ cobrado alguma inflammaçaõ , lhe deitei no ouvido humas gottas de leite de peito misturadas com quatro grãos de pò de incenso macho ; mas como de taõ soberano remedio naõ tirasse fruto , usei do oleo das gemas de ovo , que costuma obrar maravilhosos effeitos , quando as dores procedem de inflammaçaõ interior , ou de acrimonia , & mordacidade dos humores ; mas como nem assim aliviasse , mandei que lhe deitassem huas gottas de agua de clara de ovo fresco bem batida , & misturada com igual quantidade de leite de peito de mulher sadia ; & como a dor se naõ tirasse , lhe fiz tomar por hum funil o bafo de oleo de nozes , em que primeiro tivessem fervido humas flores de enxofre : mas tambem esta diligencia foi baldada . De tão grande obstinaçaõ vim a suspeitar que a dor procedia de algum abscesso , ou aposthema , que estava em alguma parte mais profunda do ouvido , & que difficultosamente se tiraria , sem que primeiro se madurasse o dito tumor ,& se rompesse o abscesso ; & levado desta consideração , appliquei sobre o ouvido o emplastro seguinte . Tomem huma ce
137. Observação XXII. pilulas fine quibus Aureas de Nicolao, & Agarico tro- cifcado, de cada coufa deflas hum efcropulo , miftu- remfe muito bem; & formafe pilulas; & deftas tomou o doente cinco vezes, em dias alternados, amefma quan- tidade, & com eftesiremedios teve faude perfeitiffimal Paffados doze annos tornou a ter outra femelhante dor, & porque fe lembrou do maravilhofo fucceffo; que avia tido com as fangriasy & oleo rofado fervido na cafea de romãa com os fobreditos bichos Mil-pès, entendeo que nefta fegunda dor teria o mefmo bom fucceffo; & por efta razao ( fem chamar Medico ) fe fangrou logo feis vezes , & tornou aufardo fobredito oleo; mas com tao pouca forte, que nenhum alivio teve; & por ifo' me chamou , & dandome conta'da dor, que padecia, & dos remedios, que tinha feito, prefumi que o nao lhe aproveitarem , procedera de que a fegunda dor tivera por caufa huma grande que- da ; & porque entendi que os panniculos, ou menin- gens do cerebro avião cobrado alguma inflammaçaõ; The deitei no ouvido humas gottas de leite de peito mifturadas com quatro grãos de pò de incenfo ma- cho; mas como de tao foberano remedio nao tiraffe fruto, ufei do oleo das gemas de ovo, que coftuina obrar maravilhofos efeitos, quando as dores proce- dem de inflammaçao interior, ou de acrimonia, & mordacidade dos humores ; mas como nem affim ali- viaffe , mandei que lhe deitaffem huas gottas de agua declara de ovofrefco bem batida, & mifturada com igual quantidade de leite de peito de mulher fadia ; & como a dor fe nao tiraffe , lhe fiz tomar por hum funil o bafo de oleo de nozes, em que primeiro tiveffem fer- vido humas flores de enxofre : mas tambem efta dili- gencia foi baldada. De tão grande obftinaçaõ vima fufpeitar que a dor procedia de algum abfceffo , ou apofthema, que eftava em alguma parte mais profun- da de ouvido, & que difficulcolamente fe tiraria , fem que primeiro fe maduraffe o dito tumor, & fe rompef- feoabfceffo ; & levado defta confideração, appliquei fobre o ouvido o emplaftro feguinte. Tomem huma 'ce- -
Obfervaca.Xxlf.7.: 137 pilulas fine quibus Aureas deicolao,& Agaricötro- cifcado, de cada coufa deftas hum efcropulo, miftu- remfe niuito btm,& formafe pilulas,& deftas tomou o doente'cinco vezes,em dias alternados,amefmaquans tidade, & com eftestremedios teve faude perfeitiffima: Paffados doze ánnos tornou a ter outra femielhante dor, & porque fe lembrou domaravillrofo fucceffo, que avia tidocom as fangrias & oleo rofado fervido entendeoque nefta fegunda dor teria omefmo bom fucceffo, & por éftarazao ( fcmchamar Medico) fa 4angroulogo feis vezes, & tornou aufardo fobredit :leo; mas com ta pöucaforte., que'nenhum alivio teve; & por iffo' me chamou , & dandome conta'da dor,quepadecia, & dos remedios, que tinha feito, queafegunda dor-tivera por caufa huma grande que- da ;: &:porque éntendi que.ospanniculos, :ou menin: gensdo cerebroaviacöbradalguma inflammacai The. deitei no óuvido humas gottas de leite de peita miftutadas com quatro graós. de po de incenfo ma- cho; mas como de ta foberano remediona tiraffe fruto, ufei do oleo das gemas de ovo, que coftuina obrar imaravilhofos effeitos, quandoas dores proce- dem de inflammaca interior , ou de acrimonia, & tmordacidade dos. humores , mas como'renr affim alis viaffe , mandei que lhe deitaffem huas gottas de agua declara de ovofrefco bembatida, &mifturada com igual quantidade deleite de peito demulherfadia, & coma dor fe na:tiraffe, IHe fiz tomar por hum funil obafo de oleo denozes,em que primeiro tveffem fer- vidokumas flores:de enxofre : mas tambem efta dili- gencia foi baldada. De ta grande obftinaca vim a fufpeitar que a dor procedia de algum abfceffo ; ou apofthema, que eftava em alguma parte mais: profun- dadoouvido, & que'difficulcofamente fe tiraria,fem que priieiro fe maduraffe a dito tumor, & fe rompef fe oabfceffo,& levado deftaConfideracao, appliquei fobre öouvido oemplaftro feguinte. Tomem huma .:.2 ce-
: et Oblervação KXIO O 137 Pilalás Me quibus' Aúreas dé Nicolao,& Agaáricó tros cifeado, de cada confa deftas Kim eféropulo ; miftu= xemle nítúito Beimn;& formafe pilulas;& deftas tomou'd “doertétinco vezes,em dias'a ternados,améfma:-quans tidade, & com eftésitemedios teve faude perfeitillimia;: Paffados doze ânnios tornou à ter outra fenielhante dor, & porque fe lembrou do-maravilhofo fucceffo;, que avia tido com as fangrias;& oleo rofado fervido nã caféa de roinãa com os fobreditos bichos Mil-pês) entendeo que néfta fegunda dor teria omelmo bom fucceflo, & por efta rázas (fem chamar Medico ) fe tangroulogo feis vezes , & tornou a.ufardo fobredito "oleo; mas com taõ pôncaforte, que nenhum alivio teve; & por iflo' me chamou, & dandome conta'da . dor, que padecia ; & dos remedios , que tinha feito, prefumi que o naô lhe aproveitarem , procedêra de queafegunda dor-tivera por canfa huma grande que: da ; &'porque êntendi que os panniculos, :ou menin- gensdo cerebroávião cobrado alguma inflammaçaõ; lhe deitei no óuvido hurmnas gottas de leite de peita milturadas com quatro grãos de pô de incenfo mas &ho;. mas como de taô foberano remedib.naô tiraffe fruto, ufei do óleo das gemas de ovo, que coftuma .. obrar maravilhofos efeitos, quandoas dores proce- dem de inflammaçaoõ interior, ou de acrimonia, ;& tmordacidade dos humores; mas comonenm allim ati Era viafle , mandei que lhe deitaflem hõas gorras deagua cc de'clãra de ovotreféo bem batida, & mifturada com ot igual quantidade deleite de peito de mulherfadia; & como a dor fe naótirafle , IHhê'fiz tomar: por hum funil - obafóde oleo de nôzes,em que primeiro tiveflem fer- vido limas flores:dé enxofre : mas tambem efta dili- genceia foi baldada. Detão: grande obftinaçaô vinia. fuípéitar que a'dor procedia de algum abíeceflo ; ou | apoíthema , que eftava em alguma parte mais: profuni - dadó ouvido, & quedifficulcolamente fe tiraria , fem 'que pritnieiro fe madurafle o dito tumor, & fe rompef 'o'abfceflo ; & levado defta confideração, appliquei fobre:é ouvido o mplaftra feguinte. Tomem huma EO . Do ces
Observaçao XXII. 137 pilulas sine quibus Aureas de Nicolao, & Agarico tro¬ ciscado, de cada cousa destas hum escropulo, mistu¬ remse muito bem, & formense pilulas; & destas tomou o doente cinco vezes, em dias alternados, a mèsma quan¬ tidade, & com estesiremedios teve saude perfeitissima. Passados doze annos tornou à ter outra semelhante dor, & porque se lembrou do maravilhoso successo, que avia tido com as sangrias, & oleo rosado fervido na casca de romana com os sobreditos bichos Mil-pes entendeo que nesta segunda dor teria o mesmo bom successo, & por esta razaon (sem chamar Medico) se sangrou logo seis vezes, & tornou a usar do sobredito oleo; mas com taon pouca sortę, que nenhum alivio teve, & por isso me chamou, & dandome conta da dor, que padecia, & dos remedios, que tinha feito, presumi que o nao lhe aproveitarem, procedèra de que a segunda dor tivera por causa huma grande que¬ da; & porque entendi que os panniculos, ou menin- gens do cerebro aviaon cobrado alguma inflammaçaon, Ihe deitei no ouvido humas gottas de leite de peito misturadas com quatro granos de pò de incenso ma¬ cho; mas como de taô soberano remedio naon tirasse fruto, usei do oleo das gemas de ovo, que costuma obrar maravilhosos effeitos, quando as dores proce¬ dem de inflammaçaon interior, ou de acrimonia, & mordacidade dos humores; mas como nem assim ali¬ viasse, mandei que lhe deitassem humas gottas de agua de clara de ovo fresco bem batida, & misturada com igual quantidade de leite de peito de mulher sadia; & como a dor se naon tirasse, lhie fiz tomar por hum funil o bafo de oleo de nozes, em que primeiro livessem fer¬ vido humas flores de enxosre: mas tambem esta dili¬ gencia foi baldada. De tamo grande obstinaçaon vim a suspeitar que a dor procedia de algum abscesso, ou aposthema, que estava em alguma parte mais profun¬ da do ouvido, & que difficulcosamente se tiraria, sem que primeiro se madurasse o dito tumor, & se rompes¬ se o abscesso; & levado desta consideraçamo, appliquei sobre ò ouvido o emplastro seguinte. Tomem huma ce¬
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138 Observações Medicas Doutrinaes. cebola assada , duas onças de manteiga crua, huma onça de oleo rosado , & outra de oleo de macella , tudo se misture muito bem com huma oitava de açafraõ , & quente se applique ao ouvido , porque demais de ser remedio muito especifico contra estas dores , desfaz os aposthemas , & os madura . Nada porèm foi bastante ; antes porque as dores se augmentáraõ muito , julguei que no ouvido estava jà materia feita , por quanto no dia antecedente avia tido grande febre , & dores pulsatorias , que saõ sinaes infalliveis , & antecedentes de materia gerada , como notou Hippocrates , (2.) & que por isso jà eraõ escusados os remedios maturativos ; mas necessitava somente de que se desse sahida à materia , que dentro estava , & para este effeito appliquei sobre a orelha hũa ventosa de boca grande com muito fogo ; seguindo nisso o conselho de Hippocrates , (3.) que na tal dor manda fazer este remedio: & foi o effeito quasi milagroso , porque no mesmo instante , em que o appliquei , rebentou o aposthema, do qual sahio tão grande quantidade de materia , que logo se tirou a dor , & ficou saõ o mesmo doente , que poucas horas antes esteve reputado por morto , & nunca mais tornou a padecer semelhantes dores. 2. Pessoa ouve , que condemnou por temeridade a applicaçaõ da ventosa sobre o ouvido ; mas nem a quiz redarguir , nem darme por sentido ; (4.) antes ao que estimulados da enveja , ou ignorancia tem por officio dizer mal dos que obraõ bem , os julgo mais por dignos de se lhes ter lastima , que de castigo , atè que conhecendo a verdade se livrem do purgatorio da enveja , que os atormenta , & no entretanto , por mais que a malicia queira fazer o seu officio , nem por isso entre os homens doutos , & bem intencionados hei de deixar de conseguir o credito de taõ gloriosa cura , & bem acertada resoluçaõ . 3. Visto que o sobredito doente deveo a vida a huma ventosa , se me permitta licença para fazer huma advertencia aos Medicos principiantes ; & he , que naõ sejaõ medrosos em applicar ventosas , assim seccas como
Ijs Obfervações Medicas Doutrinaes. cebola affada, duas onças de manteiga crual hama ença de olcorrofado, & outra de oleo de macella, tu- do fe mifture muitobem com huma oitava de açafrão, & quente fcapplique an ouvido, porque demais de fer remedio muito efpecifico contra eftas dores, def+ faz: os apofthemas , & os madura, Nada porem foi baftante ; antes porque as dores fe augmentarao mui- to, julguei que no ouvido eftava jà materia feita; por quanto no dia antecedente avia tido grande febre, & dores pulfatorias, que fao finaes infalliveis , & antece- dentes de materia gerada, como notou Hippocrates, (2.) & que por iffo ja erao efcufados os remedios ma- turativos ; mas neceffitava fomente de que fe deffe fa- hida à materia, que dentro eftava , & para efte effei. to appliquei fobre a orelha hua ventofa de boca gran- de com muito fogo; feguindo niffo o confelho de Hip- pocrates, (3.) que na tal dor manda fazer efte reme. dio: & foi o effeito quafi milagrofo, porque no mef- mo inftante, em que o appliquei , rebentou o apofthe- ma, do qual fahio tão grande quantidade de materia, que logo fe tirou a dor, & ficou fao o mefmo doente; que poucas horas antes efteve reputado por morto , & nunca mais tornou a padecer femelhantes dores, 2. Peffoa ouve, que condemnou por temeridade a applicaçao da ventofa fobre o ouvido ; mas nem a quiz redarguir, nem darme por fentido; (4. ) antesRon que eftimulados da enveja, ou ignorancia tem por of+ ficio dizer mal dos que obrao bem , os julgo mais por dignos de fe lhes ter lastima, que de caftigo, atè que conhecendo a verdade le livrem do purgatorio da en- veja , que os atormenta, & no entretanto, por mais que a malicia queira fazer o feu oficio, nem por iffo entre os homens doutos;, & bem intencionados hei de deixar de confeguir o credito de taogloriofa cura, & bem acertada refoluçao. 3. Vifto que o fobnedito doente devep a vida a homa ventola, fe me permitta licença para fazer hu- ma advertencia aos Medicos principiantes ; & he, que nao fejao medrofos em applicar ventolas, afim feccas, .como -
ris. Obfervac&es Medicas:Dgutrinaes. cebota affada, duas. oncas de manteiga cru? huma cnca de olcorofado, & outra de oleode macella. tu- do.fe mifture muitobem com humaoitavadeagafra, & quente feappliquc: a.ouvido, porque demais..de fer.remedio muitoefpecifico contra aftas dorss: def. faz:os apofthemas.,.& os :madura.. Nada por&m.foi baftante ; antes porqueas doresfe augmentara muir tö, julguci quc no ouyidoeftava ja materia feitas por quanto no dia antecedente avia tidogrande: febre, & dores pulfatorias, que fa finaes infalliyeis , & antecer dentes de materia gerada, como notou Hippocrates, (2.) & que por. iffo ja cra efcufados os remedios ma. turativos ; mas neceffitava fómente de Que fe deffe fa hida a materia, que.dentro eftava ,: & para efte effei. to appliquei fobre a orelha húa ventofa de boca gran. de com muito fogo; feguindo niffo o confelho de Hip- pocrates,(3.) que na tal dor manda fazer efte reme. dio: & foi .effeito quafi milagrofo, porque n9mef. mo inftante , em que o appliquei , rebentou o apofthe- ma, do qual fahio tao grande quantidade de materia; que logofe' tirou a dor., & ficou fao. omefmo doente; que poucas horas antes eftevereputado por morto , & nunca mais tornou a padecer femelhantes dores,. : 2. Peffoa ouve, que.condemnou por temeridade aapplicaca. da ventofa fobre o ouvido ; mas.nem a quiz redarguir, nem darme por.fentido;.(4.) antesaoa quc.eftimulados daenvéja, ou ignorancia tem por of? ficiodizer:mal dos que obrabem, os julgo: mais por, dignos de fe lhes ter iaftima, que de caftigo at qua tonhecendoa verdadefe livrem do :purgatoriosda en5 veja, que os atormenta, & noentretanto, por:maia que amalicia qucira fazer.o .feu.efficio, nempor iffo cntre os hamens doutos:, : & bem inténcionados hei de deixar de confeguir o credito de tagloriofa cura, & . bem acertada refolucao.. .:. 3- Vifto qe o fobndito doente devep avida a huma ventofa, fe me permitta licenca para fazer hu- ma advertencia aos Medicos principiantes ;.& he, que nafeja medrofos em applicar vantofas,affim feccas como
tis Obferváiçães Medicas'Drgutrinass. cebola aflada , duas onças de manteiga crua) huma ença de oleorafado , & ontra de oleo de macella , m+ do fe mifture muitobem com huma oitava de agafras, & quente feapplique.ao ouvido, porque demais. de: fer remedio muito efpecifico contra, eftas dores defs fan:os apofthemas., & os madura, Nada portm foi baftante; antes porque às dorésfe angmentárao mui tó, julguei que no ouvido eftava jà materia feita, por uanto no-dia antecedente avia tido grande febre," & dores pulfatorias, que faó finaes infalliyeis , & antece> dentes de materia gerada , como notau Hippocrates, (2.) & que por iflo jà eraó efcufados os remedios ma-- túrativos ; mas neceffitava fómente de que fe defle fa- hida à materia, que dentro eftava ,. & para efte effeis to appliquei fobre a orelha ha ventofa de bocagran- com muito fogo; feguindo niflo o confelho de Hip- pocrates , (3.) que na tal dor manda fazer elte reme- dio: & foi e efíeito quafi milagrofo, porque no mef. mo inftante , em que o appliquei, rebentou o apofthe- ma, do qual fahio tão grande quantidade de materia, que logo fe ritou a dor., -& ficou faô. o melmo doente; que poucas horas antes eftevereputado por morto , & . nunca mais tornou a padecer femelhantes dares, 2. Pefloa ouve, que.condemnou por temeridade aapplicaçao. da ventofa fobre o ouvido ; mas.nem a, quiz redarguir, nem darme por fentido; (4. ) antesaoa ue eftimulados da envéja , ou ignorancia tem por of» cio dizer mal dos que obraó bem ; os julga: mais por. . dignos de fe lhes ver laftirma , que decaltigo, atá que conhecendo a verdade:fe livrem do fmrgatorio da enº veja, que os arornienta, & no entretanto, por,mais que a malicia queira fazer o feu efficio , nempor iflo entre os hamens doutos: & bem inténcionadas hei de deixar de confegnir e crediro de raó-gloriofa cura, & - bem acertada refoluças, o ELA: - 3. Vifto queofobredito doente devep avida a. huma ventola ; fe me permitra licença para fazer hy- ina advertencia aos Medicos principiantes ;.&e-he, que na6fejaó medrofos em applicar ventofas,alim &ecas, E Er: ”* como | | | x
Observaçones Medicas Doutrinaes. 138 cebola assada, duas onças de manteiga crua, huma onça de oleo rosado, & outra de oleo de macella, tu¬ do se misture muito bem com huma oitava de agafraon, & quente se applique ao ouvido, porque demais de ser remedio muito especifico contra estas dores, des¬ faz os aposthemas, & os madura. Nada porèm foi bastante; antes porque as dores se augmentaraon mui¬ to, julguei que no ouvido estava jà materia feita, por quanto no dia antecedente avia tido grande febre, & dores pulsatorias, que saon sinaes infalliveis, & antece¬ dentes de materia gerada, como notou Hippocrates, (2.) & que por isso jà eraon escusados os remedios ma¬ turativos; mas necessitava somente de que se desse sa¬ hida à materia, que dentro estava, & para este effei- to appliquei sobre a orelha huma ventosa de boca gran¬ de com muito fogo; seguindo nisso o conselho de Hip- pocrates, (3.) que na tal dor manda fazer este reme¬ dio: & foi o effeito quasi milagroso, porque no mes¬ mo instante, em que o appliquei, rebentou o aposthe¬ ma, do qual sahio tamo grande quantidade de materia, que logo se tirou a dor, & sicou saon o mesmo doente, que poucas horas antes esteve reputado por morto, & nunca mais tornou a padecer semelhantes dores, 2. Pessoa ouve, que condemnou por temeridade a applicaçaon da ventosa sobre o ouvido; mas nem a quiz redarguir, nem darme por sentido; (4.) antes aos que estimulados da enveja, ou ignorancia tem por of¬ ficio dizer mal dos que obraon bem, os julgo mais por dignos de se lhes ter sastima, que de castigo, atè que conhecendo a verdade se livrem do purgatorio, da en¬ veja, que os atormenta, & no entretanto, por mais que a malicia queira fazer o seu officio, nem por isso entre os homens doutos, & bem intencionados hei de deixar de conseguir o credito de taon gloriosa cura, & bem acertada resoluçaon. .. Visto que o sobredito doente deveo a vida a huma ventola, se me permitta licença para fazer hu¬ ma ad vertencia aos Medicos principiantes; & he, que naon sejaon medrosos em applicar ventosas, assim seccas, SORO
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Observaçaõ XXII 139 como sarjadas ; porque Hippocrates , (5.) que foi o mayor Medico , que teve o mundo , usava dellas , & de cauterios de fogo para infinitas enfermidades , mayormente para todas as dores , quando eraõ taõ rebeldes , que naõ obedecião aos outros remedios . Nem sejaõ taõ faltos de valor , que naõ ousem a fallar em tal remedio , senaõ quando os doentes estão agonizando , porque jà entaõ melhor he naõ usar dellas , porque naõ servindo jà de alivio para o doente , servem de afronta para o Medico . Nem tambem sigaõ a doutrina daquelles , que dizem se naõ podem applicar as ventosas sem que o corpo esteja esgotado com sangrias , & purgas ; basta que esteja medianamente evacuado ; assim o aconselha Valesio , (6.) o qual em todas as dores , que não obedecem aos remedios universaes , usava de ventosas , jà seccas , já sarjadas . Confesso que naõ posso sofrer a demasiada severidade , & exacçaõ de alguns Medicos , que esperaõ que o doente esteja com trinta sangrias , & sem falla , nem acordo , para usar das ventosas : eu digo com o mesmo Valesio , (7.) que naõ estou bem com aquelles , que naõ se atrevem a fazer remedios , quando vem aos doentes em grande perigo nem com aquelles , que saõ taõ confiados , que sempre estaõ a fazer remedios por qualquer leve queixa ; porque todo o excesso he dannoso : (8.) se eu fosse do numero dos demasiadamente covardes , & ouvesse de aguardar que o doente tivesse trinta sangrias , duas purgas , quatro apozemas , seis dias de pilulas primeiro que applicasse a ventosa no ouvido , morreria o doente , sem chegar a usar do remedio , que lhe deu a vida ;mas porque me contentei com huma mediana descarga , por isso fiz huma cura taõ gloriosa como fica dito . OBSER-
Obfervaçaa XXII:0 139 tomo farjadas ; porque Hippocrates; (s.) que foi o mayor Medico, que teve o mundo, ufava dellas, & ' de cauterios de fogopara in Anivas enferndidades, ma- yormente para todas as dores, quando erao tao rebel- des, que não obedeciho sos autrustermedios: Nem fe- jao tao faltos de valor , que nao onfem a fallar em tal remedio, fenao quando os doentes eftao agonizando, porque jà entao melhor he nao ufar dellas, porque nao dervindo ja de alivio para o doente, ferven de afronta para o Medico. Nem tambem figao a doutrina da- quelles, que dizem fe nao podem applicar as ventofas, fem que o corpo effeja efgorado com fangrias; & pur- gas ; bafta que esteja medianamente evacuado; affim o aconfelha Valefio, (6. )o qual em todas as dores, que não obedecem aos remedios univerfaes , ufava de ven- tofas , já feccas , já farjadas. Confeffo quenao poffo Sofrer a demafiada feveridade, & exaccao de alguns Medicos, que efpdrao que o doente efteja com trinta" fangrias, & fem falla, nem acordo, para ufar das ven- tolas : eudigo com o mesmo Valerio, (7.) quenao ef- tou bem com aquelles , que nao fe atrevem a fazer re- medios, quando vem aos doentes em grande perigo: nem com aquelles, que fao tao confiados, que fem- pre eftao a fazer remedios por qualquer leve queixa; porque todo o excefto he dammofo : (8.) fe eu foffe do numero dos demasiadamente covardes , & ouvelle de aguardar que o doente tiveffa trinta fangrias , duas purgas , quatro apozemas , feis dias de pihilas primei- to que applicaffe a ventola no ouvido , morreria o doente, fem chegar a far do remedio, que lhe deu a vida; mas porque mo contenter com humdumediana defcarga, por iflo fiz auma cura tao gloriofa como fi- ca dito. OBSER- 1 --- - - ---
ObfervataacXXlO ai tomo faryadas : porque rippotratts , t5- que foi 0 mayor Medico, que teve o mundo, ufava dellas, & de cauteriosde fogsparainfinitasenfernsldades, ma- yormente para todas as dores, quando era ta rebel- des, quenadobedecin aos autrusketnadio's :. Alatn fe. ja ta fattos dc xalor , qua na aufem áfallar em tal . remedi, fena quanlo os doenter cfta agonivando, porquejaenta'melhorhe na ufar:dellas,rorquena fervindo ja de alivioparao doenta, ferven deafronta :para o Medico. Nem: tambem figaa a dultrina da- quelles, que dizem fe:na podem applicar as vantofas dem queocorpoeftejaefgotadocom fangrias,& pur- gas ; bafta que efteja medianamcnte.evacaado affim o aconfelha Valefio, (6.)oqual em todasas dores, que nao obedecem aos remedios univerfaes , ufava de ven- tofas , ja feccas, á farjadas..Canfeffo qtiena poffo fofrer a demafada feveridade;& exacca.de alguns Medicos, que cfpdra que o doenta..cfteja com trinta fangrias, &fem falla, ném xcordo, paraufardas.ven tofas: sudigocom9nefmoValefio,(7:) quena tf- tou bem com aquelfes , que na fe atrevem'a fazer re- medios, quando vemaos doentes em grande perigo: nem. com:aquelles, que fa.taconfiados, que fem- pre: cfta a fazer: nemedios por qualquer leve queixa; porqus todaoexceffohe.darnmofo.: (8.) feeufoffe do numerodos.demafiadamente:covardes, &euvefe de aguardar que o daönta tiyeffe trinta fangriay, duas purgas , quatro apozemas, fis diasde pihulas primei- to que :applicaffe a:yentofa noouvid:: morreria doente, fem chegari asfar dorenedio, que lhe deu a wida; mas porqut. npcontenter:com himaunediana defearga por iffo fz huma carata gloriofa como fi- .ca dito. OBSER-
nie: ObfervagãáocKXIDCO age tomo favjádas ; pôrque Mipgutrates ;-(5.) que foi-o mayor Medico, que teve o mundo, ufava dellas, & é * decauteribéde foi pdradnÂnivasênfernildalies, ma- Í yormente para todas as dores, quando eraó taô rebel= ; 4 [ es, que nãó abedecino sos aurrostértiedios: Nam fa- jaô taó faltos de malor , que iaá oníem a fallaremral 'femedãa, fenaó quando os doentes cftaôsgonizando, porquejâ entas melhor.he nas ufardeltas, porque naõ dervindojà de alivio para'o doente, ferveim demirohra para o Medico. Nem: tambem figaãá a Uducrina da: 'quelles, que dizer fe.naó podem apolicae as ventofas, dem que o corpo efPeja elgorado com fankrias;.& pur- as; baita que efteja medianamente evacuado; afim o aconfelha Valefio, (6.)o qual em todas as dores, que não obedecem aos remedios univerfaes , ufava de ven- tofas ; já-feccas, ja farjádas. Canfeflo'quepaõ pofto fofrer a demafiada foveridade; & exacção de alguns Medicos, que efparao que o doente efteja eom trinta fangriás, &cfem falla , ném acordo, para ufardas ven- tolas: eudigo com omnefmo Valefio, (3:) quenaõ ef* tou bem comaquelles ; que naõ fe atrevem'a fazer re" medios ;' vando vemaos doentes em grande perigo: nem com: aquelles, que faó .taó confiados, «que fem- pre citas a fazer: semedios por qualquer leve queixa; porque todo o excefto he dammnofo: (8.) feenfoftedo aumero dos demaliadamente covárdes , 8 ouveíle de aguardar que o doente tivelfa trinta fangrias ; duas - purgas quatro apozemas , leis diás' de pilulas primei: to que applicafie a ventafa no-oúvido:s; morreria O docente, fem chegar! aníardo remedio, que lhe deu-a Nida; mas porque mp contentei: com humdinediana dofrarga, por ido fiz burma cora taó glóriofà como fi- caádito, NANA ae ala To do ' -. Pa Po ANOS 20 OBSER-
..... Observaçaos XXIIOA3 como sarjadas; porque Mppocrates, (5.) que foi o mayor Medico, que teve o mundo, usava dellas, & de cauterios de fogopara infinitas ensermidades, ma¬ vormente para todas as dores, quando eraon taon rebel¬ des, que naon obedeciumò aos autrus remedios. Nem se¬ jaon taon faltos de valor, qua nañm ousem a fallar em tal remedio, senaon quando os doentes estaon agonixando, porque jà entaon melhor he naon usar dellas, rorque naon servindo jà de aliviò para o doente, servem denfronta para o Medico. Nem tambem sigaon a dbutrina da¬ quelles, que dizem se naon podem applicar as vontosas, sem que o corpo esfeja esgotado com sangrias, & pur¬ gas; basta que esteja medianamente evacuado; assim o aconselha Valesio, (6.)o qual em todas as dores, que namo obedecem aos remedios universaes, usava de ven tosas, ja seccas, ja sarjadas. Confesso queñaon posso sofrer a demasiada severidade, & exacçao de alguns Medicos, que esperaon que o doente esteja com trinta sangrias, & sem falla, nem acordo, para usardas ven¬ tosas: eu digo com o mesmo Valesio, (7.) que naon es¬ tou bem com aquelles, que naon se atrevem a fazer re¬ medios, quando vem aos doentes em grande perigo: nem com aquelles, que lao taon confiados, que sem pre estaon a fazer remedios por qualquer leve queixa; porque todo o excesso he damnoso: (8.) se eu fosse do numero dos demasiadamente covardes, & ouvesse de aguardar que o doente tivesta trinta sangrias, duas purgas, quatro apozemas, seis dias de pilulas primei¬ to que applicasse a ventosa no ouvido, morreria d doente, sem chegar ausar do remedio, que lhe deu à vida; mas porque me contentei com humdmediana descarga, por isso siz huma cura tao gloriosa como si¬ ca dito. ., . . OBSER¬ —
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140 Observações Medicas Doutrinaes. OBSERVAÇAM XXIII . De huma febre ardente , a que ʃobrevieraõ grandes faltas de ʃomno , puxos ardentes , & dores inʃoportaveis de ventre , & das pernas , tudo procedido de qualidade gallica : & porque o Medico aʃʃiʃtente atemorizado com ardencia da febre , & multidaõ dos ʃymptomas referidos ʃe naõ reʃolvia a purgar ao doente , chegou a eʃtar ungido , atè que por meu conʃelho tomou os pòs de mercurio doce , a que chamamos Calomelanos , & com elles ʃalvou a vida com admiraçaõ de todos , & credito da Arte . 1 . PArecerà incrivel , & que excede a todo o encarecimento a cura , que fiz em Franciʃco Dias de Araujo , morador na Bica de Duarte Bello . Quarenta dias avia que eʃte homem não podia dormir , nem ʃoʃʃegar por cauʃa de huma febre ardentiʃʃima , acompanhada de ardentes puxos , a que ʃe juntáraõ camaras continuas , acerrimas dores de ventre , & de ambas as pernas : & ʃuppoʃto que o ʃobredito enfermo , logo que adoeceo , chamou para director da ʃua cura a hum Medico bem famigerado ; comtudo , porque a doença , & os referidos ʃymptomas creʃciaõ de monte a monte , me chamàraõ aos vinte & ʃete dias da doença ; & ouvindo eu o proceʃʃo della , & dos remedios applicados , entendi que para acudir a taõ formidaveis ʃymptomas , quaes ʃaõ os referidos , era neceʃʃario dar logo remedios opiados , aʃʃim porque a terribilidade das dores o pedia ; como porque a grande falta de ʃomno os aconʃelhava. 2 . Naõ quiz o companheiro ʃeguir o meu conʃelho , ou por ʃer mais acautelado , ou por ter menos experiencia dos remedios narcoticos ; perʃuadindoʃe que para mitigar a ferocidade das dores , & provocar o ʃomno , baʃtariaõ humas amendoadas adoçadas ( em lugar de aʃʃucar ) com duas onças de lambedor de papou
. 140 Obfervações Medicas Doutrinaes. OBSERVACAM XXIII .. . De huma febre ardente, a que fobrevier ao grandes fat- tas de fomno, puxos ardentes, & dores infoportaveis de ventre , & das pernas , tudo procedido de qualidade gallica : & porque o Medico affiftente atemorizado com ardencia da febre, de multidao dos Symptomas referidos fe nao refolvia a purgar ao doente , chegou a eftar ungido , ate que por meu confelho tomou os pos de . mercurio doce , a que chamamos Calomelanos, & com elles fatvou a vida com admiração de todos, & credi- to da Arte. ! I. P Arecerà incrivel , & que excede a todo o encarecimento a cura, que fiz em Fran- cifco Dias de Araujo, morador na Bica de Duarte Bel- lo. Quarenta dias avia que efte homem não podia dor- mir, nem foffegar por.caufa de huma febre ardentiffi- ma, acompanhada de ardentes pukos , a que fe junta- rao camaras continuas , acerrimas dores de ventre, & de ambas as pernas : & fuppofto que o fobredito en- fermo, logo que adoeceo, chamou para director. da fua cura a hum Medico bem famigerado ; comtudo, porque a doença , & os referidos fymptomas crefciao de monte a monte ; me chamarao aos vinte & fete dias da doença ; & ouvindo eu o proceffo della ; & dos remedios applicados, entendi que para acudir a tao formidaveis fymptomas, quaes fao os referidos, era neceffatto dar logo remedios opiados, afim porque a terribilidade das dores o pedia y como porque a gran- de falta de fomno os aconfelhava. 2. Nao quiz o companheiro feguir o meu confe- lho, ou por fer mais acautelado , ou por ter menos ex- periencia dos remedios narcoticos ; perfuadindofe que para mitigar a ferocidade das dores , & provocar o fomno, baftariaõ humas amendoadas adoçadas (em lugar de affucar ) com duas onças de lambedor de pa- . pou- . :
4o Obfervacoes.Medicas Doutrinaes. .OBSER.V.A.CA.M xx111. De humafebre ardente', a que fobrevieraögrandes fat- tas de/omno,puxos árdentes,d dores infóportaveis: de ventre , s das pernas, tudo procedido dr gnalidade gallica : por`que o Medico aliftente atemorizado com ardencia da febre, multida dosfymptomas referidosfe na refolvia a purg ar ao.doente, chegou eftar ungido, ateque por meu confelbo tomou os pos de nercurio doce, a que'cbamamos Calomelanos, cor ellesfalvou a vidacom admirasa de.todos., s credi to da Arte.! .encarecimento a cura, que fiz'em Fran- cifco Dias de Araujo,morador na Bica de Duarte Bel- lo.Quarenta dias avia que efte homem nao podia dor- mir , nem foffegar por.caufa de huma febre: ardentiffi- .ma , acompanhada deardentes puxos , a que fe junta- ra camaras continuas., acerrimas dores de.ventre, & de ambas as pernas : & fuppofto queo fobredito en- fuacura a hum Medico bem famigerado; comtudo, porque a doenca , &.os referidos fymptomas crefcia de monte a monte :, me chamara aos vinte.& fete dias da doenca , &ouvindoeu oproceffo della; & dos remedios applicados, entendi quepara acudir a ta rformidaveis fymptomas:, quaes:faos referidos, cra neceffado dar logo remedios opiados , affn.porque a :terribilidade:das doresopedia cörno porgur: a gran- de falta de fomno os aconfelhava. 1.. 2. Naquiz o companheiro feguir omeu confe- Tho , ou por fer mais acautelado , ou por ter menos ex- periencia dos remedios narcoticos ; perfuadindofe que para mitigar a ferocidade das dores, & provocar o fomno, baftaria humas amendoadas adocadas (en lugar de affucar ) com duas ongas de lambedor de pa- pou=
to Obfervações Medicas Doutrinaes. | ” | O OBSERVAÇAM XXI. + + De huma febre avdente , a que fobrevierao grandes fat» tas de fomno,puxos ardentes, & dores infoportaveu de . ventre & das perna, tudo procedido de qualidade - gallica : & porque o Medico aliftente atemorizado : conm urdencia da febre, & multidão dos fyfptomas referidos fe naô vefolvia a purgar ao doente , chegou & eflar ungido , ate que por meu confelho tomou os pos de mercurio doce , a que chamamos Calomelanos , & coma — elles/atvou avida com admiração de todos , &' credi- to da Arte. : ' ue ' - o T . Arecerd incrivel, & que excede arodo o ! "s P encarecimento a cura, que fizem Frari- . «cifco Dias de Araujo, morador na Bica de Duarte Bel- : lo.Quarenta dias avia que efte homem não pódia dor- | “mir, nem foffegar por.caufa de huma febre: ardentifli= ma, acompanhada de ardentes púkos , 4 que fe juntá- raô camaras continuas , acerrimas dores de ventre, & de ambas as pernas : & fuppofto que o fobredito en= fermo, logo que adoeceo, chamou para dire&tor da fúa cura a hum Medico bem famigerado; comtudo, porque a doença , & osreferidos fymptontas crefeiaõ de monte a monte ; me chamàraõ aos vinte & fare - dias da doença ; & ouvindo eu oproceflo della ; & dos .semedios*applicados, entendi que para agudir a ta& rformidaveis (ymptomas, quaes faõos referidos, era neceffafio dar logo remedios opiados , aflim porque a terribilidade-das dores opedia ;, cómo porque a gran» de falta de fomno os aconfelhava. — + ENA | ” “2. Naóquizocompanheiro feguir omeu confe- lho, ou por fer mais acautelado , ou por ter menos ex« periencia dos remedios narcoticos ; perfuadindofe que para mitigar a ferocidade das dores , & provocar o fomno, baftariaô humas amendoadas adoçadas (em lugar de aflucar ) com duas onças de lambedor de pa- ooo pou-
140 Observaçones Medicas Doutrinaes. ealeaa a abe ee OBSERVAQAM XXIII. De huma febre ardente, a que sobrevieraom grandes fal¬ tas de somno, puxos ardentes, & dores insoport aveis de ventre, & das pernas, tudo procedido de qualidade gallica. & porque o Medico assistente atemorizado com u ardencia da febre, & multidaon dos symptomas referidos se naò resolvia a purgar ao doente, chegou a estar ungido, atè que por meu conselho tomou os pos de mercurio doce, a que chamamos Calomelanos, & com elles salvou a vida com admiraçaon de todos, & credi¬ to da Arte. DArecerà incrivel, & que excede a todo o 1. encarecimento a cura, que fiz em Fran¬ cisco Dias de Araujo, morador na Bica de Duarte Bel- lo. Quarenta dias avia que este homem namo podia dor¬ mir, nem sossegar por causa de huma febre ardentissi¬ ma, acompanhada de ardentes puxos, à que se junta¬ raô camaras continuas, acerrimas dores de ventre, & de ambas as pernas: & supposto que o sobredito en- fermo, logo que adoeceo, chamou para director da sua cura a hum Medico bem famigerado; comtudo, porque a doença, & os referidos symptomas cresciaon de monte a monte; me chamàraon aos vinte & sete dias da doença; & ouvindo eu oprocesso della, & dos remedios applicados, entendi que para acudir a taon formidaveis symptomas, quaes saon os referidos, era necessario dar logo remedios opiados, assim porque a terribilidade das dores opedia; como porque a gran¬ de falta de somno os aconselhava. 2. Naon quiz o companheiro seguir o meu conse¬ lho, ou por ser mais acautelado, ou por ter menos ex- periencia dos remedios narcoticos; persuadindose que para mitigar a ferocidade das dores, & provocar o somno, bastariaon humas amendoadas adoçadas (em lugar de assucar) com duas onças de lambedor de pa- pou¬
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Observaçaõ XXIII. 141 poulas , ou de dormideiras , & hum lenimento de unguento populeaõ ʃobre as fontes , & teʃta . Porèm ainda q eu reʃpeitava muito ao companheiro por ʃuas letras , & idade , reʃpeitei mais a minha conʃciencia , ( 1 . ) & por eʃta razão naõ quiz eʃtar pelo ʃeu voto , porque entendi que huma amendoada era remedio mui pequeno para vencer dores taõ grandes , & ʃymptomas tão terriveis . Comtudo era taõ notavel a confiança , que o doente tinha no outro Medico , que não quiz ʃeguir o meu voto , & aʃʃim tanto que chegaraõ as horas convenientes , mandou dar a amendoada , & fomentar as fontes com o unguento ʃobredito ; mas tudo ʃem alivio : porque as dores do ventre , & das pernas , as camaras , os puxos , & a febre , mais furioʃos que ʃerpentes , & mais aʃʃanhados que viboras , atormentáraõ ao miʃeravel enfermo de maneira , que naõ ʃoʃʃegou hum ʃó inʃtante , & por iʃʃo ʃe arrependeo muito de naõ aver ʃeguido o meu parecer ; mas logo me deo palavra , de que na ʃeguinte noite faria o que eu lhe mandaʃʃe : daqui tomei confiança para lhe receitar huma pilula de tres grãos de laudano opiado , com que dormio toda a noite com notavel quietaçaõ ; mas porque a febre , as dores , as faltas de ʃomno , & os mais ʃymptomas procediaõ de qualidade gallica , entendi que todos os remedios, que ʃe lhe applicaʃʃem , ʃeriaõ baldados em quanto lhe naõ deʃʃem os antidotos , que extinguiʃʃem a dita qualidade ; & fundado neʃta razaõ fiz outra conferencia com o companheiro , dizendolhe que eu dera o laudano opiado àquelle doente , ʃem embargo de ʃaber que elle não avia de tirarlhe a doença ; mas que obrigado das crueis dores , que padecia , & das màs noites que levava , entendi que era preciʃo ʃeguir o conʃelho de Valeʃio , ( 2 . ) o qual nos aconʃelha que muitas vezes he arte ʃaber affaʃtar da arte , acudindo primeiro aos ʃymptomas , que à cauʃa delles , & que por iʃʃo lhe dera o ʃobredito remedio , paraque dormindo , & ʃoʃʃegando cobraʃʃe esforço para poder com o peʃo da enfermidade , & para ʃe lhe applicarem os legitimos remedios , com que ʃe extirpaʃʃe a qualidade
141 Obfervação XXIII. poulas , ou de dormideiras , & hum lenimento de un- guento populeao fobre as fontes, & tefta. Porem ainda- q eu refpeitava muito ao companheiro por fuas letras, & idade, refpeitei mais a minha confciencia, (1.) & por efta razão naõ quiz eftar pelofeu voto, porque en- tendi que huma amendoada era remedio mui peque- no para vencer dores rao grandes , &fymptomas tão terriveis. Comtudo era tao notavel a confiança, que o doente tinha no outro Medico, que não quiz feguir o meu voto , & affim tanto que chegarao as horas con- venientes, mandou dar a amendoada , & fomentar as fontes com o unguento fobredito ; mas tudo fem'ali- vio : porque as dores de ventre, & das pernas, as ca- maras , os puxos , & a febre, mais furiotos que ferpen- tes, & mais affanhados que viboras, atormentarao ao miferavel enfermo de maneira, que nao foffegon hum fó inftante, & por iffo fe arrependeo muito de nao aver feguido o meu parecer ; mas logo me ded palavra, de que na feguinte noite faria o que en lhe mandaffe: da- qui tomei confiança para lhe receitar humà pilula de tres grãos de laudano opiado , com que dormio toda a noite com notayel quieraçaõ; mas porque a febre, as dores., as faltas de fomno , & os mais fymptomas pro- cedido de qualidade gallica, entendi que todos os re- medios ; que fe lhe applicaffem, feriao baldados em quanto lhe nao defem os antidotos, que extinguif- fem a dita qualidade ; & fundado nefta razao fiz outra conferencia com o companheiro , dizendolhe que eu dera o laudano opiado àquelle doente, fem embargo de faber que elle não avia de tirarlhe adoença; mas que obrigado das crucis dores, que padecia, & das mas noites que levava, entendi que era preciso feguir o confelho de Valerio, (2.) o qual nos aconselha que muitas vezes he arte faber affaftarda arte, acudindo primeiro aos fymptomas, que à caufa delles, & que por iffo lhe dera o fobreditoremedio, paraque dor- mindo , & foffegando cobraffe esforço para poder com opefo da enfermidade, &: para fe lhe applicarem os legitimos remedios , com que fe extirpaffe a quali- dade ) ---
Obfervacao. XX1I. 141 poulas, ou de dormideiras, & hum lenimento de un- guento populeafabre as fontes,& tefta.Porém aindar eu refpeitava muito ao companheiro por fuas letras, & idade,refpeitei mais a minha confciencia, (1.) & por efta razáo na quiztftar pelofeu vot, porque en- tendi que huma amendoadacra remedio mui peque nopara vencer dores ra grandes, &fymptomasta .terriveis. Comtudo era ta notavel a tonfianca , que o doente tinha no utro Medico, que nao:quiz feguir omeu voto ,& affim tanto que cheg:ura& as horascan. venientes, mandou dar: a amendoada,& fomentar as fontes com ounguento fobrédito ; mas tudo fem ali- via: porque.as dores doventre, &das pernas, as ca- maras , os puxs, & a febre, mais furiofos que ferpen- tes, & mais affanhados que viboras, atormentara ao miferavel enfermo de.maneira, que na foffegoa hum f6 inftante, & por iffo fe arrependeo muito de na aver feguido o meu parecer ; mas logo me'ded palavra, de que nafeguinte'noite fariaoque cu lhe mandaffe: da- qui tomeiconfiancapara lhe receitar hunra pilula de ires graos de laudano.opiado ; comqae dornio toda a noite com notayel quietacao'; mas porque a febre, as: dores., as faltas de fomno,&:os mrais fymptomas pro- cedia de qualidadegallica , entendi que todos os re- medios, qae fe lhe applicaffem, feriaa batdados cm quanto lhe na deffem os antidotos, que extinguif- km a dita qualidade : & fundadonefta raza fiz oatra conferencia com o conapanheirxt'i.dizendolhe. que eu deraolaudanoopiado &quelledotnte, fems embarga de faber que ellenao avia de tirarlhe adoenca; mas qae obrigado das crueis dores, :que padecia., & das mas noites.que levava, entendi que era precifo feguir oconfelho de Vatefio, (2.) qual nos aconfelha que muitas.vezes hc arte faber affaftarda arte , acudindo primeiro aos fymptonias, que caufa delles, &que por iffo lhe deraofobreditoremdio, paraque dor. mindo, & foffegando cobraffe.esforco para poder com opefodaentermidade, &: para fe lhe applicarem .os legitims xgmedios , com que fe extirpaffea quali dadc
Oblervação XXI 41 poulas , ou de dormídeiras, & hum lenimento de un guento populeaú fobre as fontes, & tefta. Porém aindas À eu refpeitava muito ao companheiro por fuas letras, : & idade , refpeitei mais a minha confeieneia, (1.) & por efta razão naô quieltar pelofeu voto, porque en- tendi que huma .amendoada-cra remedio mui peque- no para vencer dores faô grandes , &lymptomas tão terríveis. Comtudo era taóô notavel a confiança; que bp doente tinha ho outro Medico, que não:quiz feguir omeu voto , & affit tánto que chegíraú as horas con- venientes , mandou dar a amendoada , & fornentar as fontes com o unguento fobrédito; mas tudo fem ali- via : porque as dores dê ventre, & das pernas, as cas Tiaras ; os puxos , & a febre, mais furiofos que ferpen- tes, &mais aflanhados que viboras, atormentaras ao ; * Imiferavel enfermo de. maneira, que naó fofiegon hum i —fóinftante, & poriflofe arrependeo muito de naô aver h feguido o meu parécer; mas logo me dedpalavra, de que na feguinte noite fariao que ex he mandaíle: das qui tomei confiança para lhe receitar húma pilula de, tres grãos de laudano opiado ; com que dormio toda a noite com notayel quieraçao; mas porque a febre, as dores. as faltas de fomno , & os mais fymptomas pro- cediãô de qualidade gallica , entendi que todos os re-. medios ; que fe lhe applicaffem , feriaó baldados em anto lhe naó deflem os antidotos, queextinguif: — a dita qualidade ; & fundado nefta razaô fiz vatra = e C conferencia com o congpanheirna, dizendolhe queen UC a. dera o landano opiado àquelle doente , fem embargo de faber que ellenão avra de tirarlhe adoença; mas que obrigado das crneis dores, que padeéia , & das mas noités que levava, entendi que era precifo feguir econfelha de Vatefio, (2.):-o qual nos áconfelha que muitas vezes he atte faber affaftar da arte , acudindo primeiro a6s fymptoótilas, que àcaufa delles , & que por iflo lhe dera o fobredito remedio, paraque dor. mindo , & foffegando cobraffe esforço para poder com opefoda entermidade, & para fe lhe appliearem es legitimos gemedios , com que fe extirpaflea quali- o oe : dade '
Observaçao XXIII. 141 poulas, ou de dormideiras, & hum lenimento de un¬ guento populeaon sobre as fontes, & testa. Porèm ainda¬ que eu respeitava muito ao companheiro por suas letras, & idade, respeitei mais a minha consciencia, (1.) & por esta razano naon quiz estar pelo seu voto, porque en¬ tendi que huma amendoada era remedio mui peque¬ no para vencer dores raon grandes, & symptomas tamo terriveis. Comtudo era taon notavel a confiança, que o doente tinha no outro Medico, que namo quiz seguir o meu voto, & assim tanto que chegaraon as horas con¬ venientes, mandou dar a amendoada, & fomentar as fontes com o unguento sobredito; mas tudò sem ali¬ vio: porque as dores do ventre, & das pernas, as ca- maras, os puxos, & a febre, mais furiosos que serpen¬ tes, & mais assanhados que viboras, atormentaraon ao miseravel ensermo de maneira, que naon sossegon hum só instante, & por isso se arrependeo muito de naon aver seguido o meu parecer; mas logo me deo palavra, de que na seguinte noite fariao que eu lhe mandasse: da¬ qui tomei confiança para lhe receitar huma pilula de tres gramos de laudano opiado, com que dormio toda a noite com notavel quietaçaon; mas porque a febre, as dores, as faltas de somno, & os mais symptomas pro¬ cediaon de qualidade gallica, entendi que todos os re- medios, que se lhe applicassem, seriao baldados em quanto lhe naon dessem os antidotos, que extinguis¬ sem a dita qualidade; & fundado nesta razaon fiz outra conferencia com o companheir, dizendolhe que eu dera o laudano opiado àquelle doente, sem embargo de saber que elle nao avia de tirarlhe a doença; mas que obrigado das crueis dores, que padecia, & das màs noites que levava, entendi que era preciso seguir o conselho de Valesio, (2.) o qual nos aconselhia que muitas vezes he arte saber affastar da arte, acudindo primeiro aos symptomas, que à causa delles, & que por isso lhe dera o sobredito remedio, paraque dor¬ mindo, & sossegando cobrasse esforço para poder com opeso da enfermidade, & para se lhe applicarem os legitimos remedios, com que se extirpasse a quali¬ dade .2
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142 Observações Medicas Doutrinaes. dade gallica , pois ella era a total cauʃa de tudo o que o doente padecia , & que eu tinha por infallivel que elle naõ avia de ter ʃaude , em quanto lhe naõ deʃʃemos por dez , ou doze dias a panacea , chamada por outro nome , mercurio doce ʃublimado ; porque ʃós os remedios de azougue foraõ ʃempre a clava de Hercules , com que ʃe rende bem a hydra gallica : porèm o companheiro , ou por inflexivel , ( o que he mui prejudicial em negocio taõ importante , como he a vida de hum homem , ) ou por eʃtribado na authoridade de Avicenna , ( 3 . ) que condemna as purgas nos camarentos , recuʃou o generoʃo , & eʃpecifico remedio do mercurio que eu lhe apontava , dizendo que quem ʃe atrevia a dar medicamento purgativo a quem tinha camaras , ou puxos , ou qualquer outra queixa nos inteʃtinos , curava fóra da Arte , & eʃtava cego na luz do meyo dia : porèm eu fiado na razaõ , & experiencia naõ quiz ceder do meu voto , porque como eu (àlem da noticia , que o doente me tinha dado da ʃua vida , & de hum bubaõ que ʃe lhe recolhèra , tinha obʃervado que a febre , as camaras , & todas as mais queixas ʃe augmentavaõ no tempo da noite , tive por couʃa infallivel que os referidos ʃymptomas procediaõ da infecçaõ gallica , & conʃequentemente que com nenhum remedio ʃe deviaõ curar melhor que com o mercurio repetidas vezes tomado ; mayormente quando (como diz o proloquio commmum) ( 4 . ) tirada a cauʃa , ʃe tira o effeito : & como a cauʃa de taõ cruel eʃtrago foʃʃe o humor gallico , era neceʃʃario arrancallo primeiro , paraque os damnos , que delle procediaõ , ʃe arrancaʃʃem . Enʃurdeceoʃe o companheiro aos meus clamores , & de nenhuma razaõ minha quiz fazer caʃo , nem darʃe por convencido. Confeʃʃo ingenuamente que naõ alcancei a cauʃa , nem o fundamento , que o ʃobredito Medico tiveʃʃe para refutar outra vez a purga , dizendo , & proteʃtando ao doente que ʃe a tomaʃʃe , lhe ʃeria mais prejudicial que o meʃmo veneno , em razaõ da febre , & camaras que tinha. Eʃte medo , & carranca deʃvaneci logo com a repoʃta antecedente , dizendo
142 Obfervações Medicas Doutrinaes. dade gallica, pois ella era a total . caufa de tudo o que o doente padecia, & que eu tinha por infallivel que elle. nao avia de ter faude, em quanto lhe naõ deffe- mos por dez, ou doze dias a panacea, chamada por outro nome, mercurio doce lublimado; porque fos os remedios de azougue forao fempre a clava de Her- cules, com que fe rende bem a hydra gallica : porem o companheiro, ou por inflexivel, (o que he mui pre- judicial em negocio tao importante, como he «vida de hum homem, ) ou por eftribado na authoridade de Avicenna, (3.) que condemna as purgas nos camaren- tos,recufou o generofo, & efpecifico remedio do mer- curio que eu lhe apontava , dizendo que quem fe atre- via a dar medicamento purgativo a quem tinha cama- ras, ou puxos, ou qualquer outra queixa nos intefti- nos , curava fóra da Arte, & eftava cego na luz do me- yo dia: porèm eu fiado na razaõ, & experiencia nao quiz ceder do meu voto, porque como eu ( alem da noticia, que o doente me tinha dado da fua vida, & de hum bubao que fe lhe recolhera, tinha obfervado que a febre, as camaras, & todas as mais queixas fe augmentavao no tempo da noite , tive por coufa infal- livel que os referidos fymptomas procediao da infec -; çaõ gallica , & confequentemente que com nenhum. remedio fe deviao curar melhor que com o mercurio. repetidas vezes tomado ; mayormente quando (como diz o proloquio comminum )(4. ) tirada a caufa, fe tira o efeito: & como a caufa de mo cruel eftrago foffe o humor gallico, era neceffario arrancallo primeiro, pa- raque os damnos, que delle procediao,fe arrancaffem. Enfurdecdofe o companheiro aos meus clamores, & de nenhuma razao minha quiz fazer cafo, nem darfe por convencido. Confeffo ingenuamente que naõ al- cancei a caufa, nem o fundamento, que o fobredito Medico tiveffe para refutar outra vez a purga, dizen- do , & protestando ao doente que fe a tomaffe, lhe le- ria mais prejudicial que o. mefino veneno, em razão da febre, & camaras quetinha. Efte medo, & carran- ca defvaneci logo com a repofta antecedente, dizen- do -- : i
142 Obfervacoes Medicas Doutrinaes. dade gallica, poisella era a total caufa de tudo o.qte odoente padecia, & que eu tinha por infallivel que elle.na avia.de ter faude, em quantolhe nadeffe- mos por dez, ou doze dias apanacea, chamadapor outro nome, mercurio doce blimado; porque fös. os.remedios de azougue fora fempre a clava de Her cules, com que fe reridebem ahydra gallica : porém o companheiro, ou por inflexivel , (o que he mui pre judicial em negociota importante, como he avida de hum homem, ) ou por eftribado na authoridade de Avicenna, (3:) que condemna as purgas nos camaren- tos,recufou o generofo, & efpecificoremedio do mer- curio que eu lhe apontava , dizendo que quem fe:atre- via a dar medicamento purgativo a quem tinha cama-- ras, ou puxos, ou qualquer outra ;queixa nos intefti- nos , curava fora da Arte, & eftava cego na luz do ine-- yo dia: porem eu fado naraza, &.experiencia na quiz ceder do meu voto, porque como eu (alén da. noticia, que o doente me tinha dado da fua vida, & de hum bubaque fe lhe recolhera, tinha obfervado que a febre, as camaras , & todas as maisqueixas fe augmentavaö no tempo da noite , .tive por coufa infal-- livel que os referidos fymptomas : procedia da infec-.: ca gallica, &confequentemente que com nenhum. remedio.fe dévia curar melhor que com o mercurio . repetidas.vezes tomado; mayormente quando(como diz o proloquio comminum)(4.) tirada a caufa, fe tira: o.effeito: & como a caufa detacruel eftragofoffe humor gallico, era neceffario.arrancallo prineiro,pa-. raque os damnos, quedelle procedia,fearrancaffem- Enfurdec@ofe o companheiro aos.meus clamores, & de nenhuma raza minha quiz fazer caf, nemdarfa por convencido. Confeffo ingenuainente que naat- cancei a caufa, nem ofundamento, que o fobredito Medico tiveffe para:refutar outraveza purga, dizen- do , & proteftando ao doente quefe a to'maffe., lhele- ria mais prejudicial.que o. mefino veneno, em raza cadefvaneci lögo com a repofta antecedente., dizen- do
142 Obfervações Medicas Dôutrinaes. dade gallica, pois ellá era a tótal-caufa de tudo o que odoente padecia, & que eu tinha por infallivel que elle. naó avia deter faude, em quanto lhe naódeífe- mos por dez, ou doze dias a panacea, chamada por outro nome, mercurio doce tublimado ; porque fós. os remedios de azougue foraô Tempre aclava de Her. eules , com que fe reride bem a hydra gallica: porêm o companheiro, ou por inflexivel, (o que he mui pre- judicial em negocio taó importante, como he avida de hum homem, ) ou por eftribado" na authoridade de Avicenna, (3:) que condemna as purgas nos camaren- tos,recufou o generofo, & efpecifico remedio do mer. curio que eu lhe apontava , dizendo que quem fe-atre- via a dar medicamento purgativo a quem tinha cama- ras, oupuxos , ou qualquer outra queixa nosintefti- nos , curava fóra da Arte, & eftava cego na lúz do me-: yodia: porêm eu fiado na razao, & experiencia naõ quiz ceder do meu voto, porque como eu (àlem da. noticia, que o doente me tinha dado da fua vida, & . dehumbubaõôque fe lhe recolhêra, tinha obfervado que a febre, as camaras ; & todas as mais queixas fe augmentavaó no tempo da noite , tive por confa infal- livel que os referidos fymptomas procediaõ da infec-. çaó gallica , & confequentemente que com nenhum. remedio fe dêviaó curar melhor que com o mercurio - repetidas vezes tomado ; mayormente quando (como diz o proloquio comminum )(4. ) tirada a caufa, fe tira. oeffeito: & como a caufa de &mo cruel eftrago fofle o. humor gallico, era neceflario arrancallo primeiro,pa-. raque os damnos, que delle procediaó,fe arrancaflem. Enfurdec&ble o companheiro aos meus clamores , & de nenhuma razaô minha quiz fazer caíd', nemdarfe por convencido. Confefle ingenuamente que naó.atl- câncei a caufa, nem o fundamento, que o fobredita Medico tivelle para-refutar outra vez'a purga , dizen- do, & proteítando ao doente que fe a tomaíle, lhe fe- ria mais prejudicial.que o. melimo veneno ;-em raza& . dafebre, & camaras quetinha. Efte medo , & carran= cadefvaneci logo com a repolíta antecedente, dizen- de
142 Observaçones Medicas Doutrinaes. dade gallica, pois ella era a total causa de tudo o que o doente padecia , & que eu tinha por infallivel que elle nao avia de ter saude, em quanto lhe nao desse- mos por dez, ou doze dias a panacea, chamada por outro nome, mercurio doce sublimado; porque sos os remedios de azougue forao sempre a clava de Her- cules, com que se rende bem a hydra gallica . porèm o companheiro , ou por inflexivel , (o que he mui pre- judicial em negocio taon importante, como he avida de hum homem,) ou por estribado na authoridade de Avicenna, (3.) que condemna as purgas nos camaren- tos, recusou o generoso, & especifico remedio do mer- curio que eu lhe apontava , dizendo que quem se atre- via a dar medicamento purgativo a quem tinha cama¬ ras, ou puxos, ou quasquer outra queixa nos intesti- nos, curava fora da Arte, & estava cego na luz do me¬ yo dia: porèm eu fiado na razaon, & experiencia naon quiz ceder do meu voto, porque como eu (àlem da noticia, que o doente me tinha dado da sua vida , & de hum bubaon que se lhe recolhèra, tinha observado que a febre, as camaras, & todas as mais queixas se augmentavaon no tempo da noite , tive por cousa infal- livel que os referidos symptomas procediaon da infec¬ çaon gallica, & consequentemente que com nenhum remedio se deviaon curar melhor que com o mercurio repetidas vezes tomado; mayormente quando (como diz o proloquio comminum) (4.) tirada a causa, se tira o effeito : & como a causa de mon cruel estrago fosse o humor gallico, era necessario arrancallo primeiro, pa¬ raque os damnos, que delle procediao, se arrancassem. Ensurdeceose o companheiro aos meus clamores, & de nenhuma razaon minha quiz fazer casd, nem darse por convencido. Confesso ingenuamente que naon al- cancei a causa, nem o fundamento, que o sobredito Medico tivesse para refutar outra vez a purga, dizen- do , & protestando ao doente que se a tomasse , lhe le- ria mais prejudicial que o. mesmo veneno, em razaon da febre, & camaras quo tinha. Este medo, & carran- ca desvaneci logo com a reposta antecedente , dizen- do
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Observaçaõ XXIII. 143 do que tambem com o meʃmo remedio mercurial ʃe avia de curar a febre , que era gallica . Vendo eu pois que o Medico negava , que a doença creʃcia , & que o doente acabava , me deliberei a appellar a cauʃa para outro Juiz , porque me pareceo impiedade que huma contenda de tanta importancia eʃtiveʃʃe poʃta em dilaçaõ por tantos dias , ʃem ʃe dar ʃentença para livrar dos laços da morte ao atormentado enfermo . Mas (oh eʃperanças humanas como ʃois caducas , & enganoʃas! . ) vim a cahir em hum precipicio , quando queria evitar outro ; pois taõ longe eʃteve o meu voto de confirmarʃe com a chegada do novo Medico , que antes ʃe reprovou , & votou a froxo contra mim : & como ( por eʃtylo ordinario ) os votos nas conʃultas ʃe avaliaõ pelo numero , & não pelo peʃo , foraõ mais poderoʃos os mais votos , & de menos valor o de mais peʃo , & por iʃʃo aproveitaraõ pouco as minhas diligencias . Mas por iʃʃo me deʃpedi do enfermo , porque naõ tive animo para o ver morrer de huma doença taõ conhecida , como ʃe foʃʃe ignorada . Porèm como o doente eʃtiveʃʃe em ʃeu acordo , & perfeito juizo , & conheceʃʃe o zelo , & ancia , com que eu lhe deʃejava a ʃaude , me pedio por Deos immortal o naõ deʃemparaʃʃe em taõ grande perigo ; & para me obrigar com algum carinho , me pegou na maõ , dizendo que elle naõ queria obedecer a outros preceitos mais que ao meus , & por conʃequencia que ʃó avia de ʃeguir o que eu lhe mandaʃʃe . Pode tanto comigo eʃta boa fé , & me internecèraõ de modo os referidos rogos , que me encarreguei da cura , dandolhe principio com huma purga , que juntamente evacuaʃʃe os humores , reʃpeitaʃʃse a qualidade gallica , confortaʃʃe as entranhas relaxadas ; & enfraquecidas , fazedo-a do modo ʃeguinte. Em quatro onças de cozimento cordeal com huma oitava de ruibarbo , & quatro eʃcropulos de caʃca de myrobalanos citrinos mandei ajuntar onça , & meya de xarope magiʃtral pro morbo , & outra onça & meya de xarope das noʃʃas roʃas ; & depois que o doente tomou eʃte ʃingular remedio tres vezes em dias alternados, che-
Obtervação XXIII. 143 do que tambem com o mefmo remedio mercurial fe avia de curar a febre, que era gallica. Vendoen pois que o Medico negava, que a doença crefcia, & que o · doente acabava, me deliberei a appellar a caufa para outro Juiz , porque me pareceo impiedade que huma contenda de tanta importancia effiveffe pofta em di- "laçao por tantos dias, fem fe dar fentença para livrar dos laços da morte ao atormentado enfermo. Mas (oh esperanças humanas como fois caducas, & engano- fas !. ) vim a cahir em hum precipicio, quando queria evitar outro; pois tao longe efteve o meu voto de con- firmarfe com a chegada do novo Medico, que antes fe reprovou, & votou a froxo contra mim: & como (por eftylo ordinario :) os votos nas confultas fe avaliao pex lo numero , & não pelo pefo , forao mais poderofos os mais votos, & de menos valor o de mais pefo, & pot iffo aproveitarao pouco as minhas diligencias. Mas por iffo me defpedi do enfermo, porque nao tive ani- mo para o ver morrer de huma doença taõ conhecida, como fe foffe ignorada. Porem como o doente eftivef- fe em feu acordo., & perfeito juizo, & conheceffe o zelo, & ancia, com que eu lhe defejava a faude, me pedio por Deos immortal o naõ defemparaffe em taõ grande perigo, & para me obrigar com algum cari- nho, me pegou na mao , dizendo que elle nao queria obedecer a outros preceitos mais que aos meus , & por confequência que fo avia de feguir o que eu lhe man- daffe. Pode tanto comigo efta boafé, & me interne- cerao de modo os referidos rogos, qué me encarre- guei da cura, dandolhe principio com huma purga, que juntamente evacuaffe: os humores , refpeitaffe a qualidade gallica, confortaffe as entranhas relaxadas; & enfraquecidas, fazedo-a do modo feguinte. Em qua- tro onças de cozimento cordeal com huma oitava de ruibarbo, & quatrosfcropulos de cafca de myjoba+ lanos citrinosmandei ajuntar onça, & meya de xaro" po magistral promorbo, & olura onça & meya de xa! hope das noffas rolas , & depois que o doente tomou efte fingular remedio tres vezes em dias alternados; che+ -
Obfervacao XXIIL:: .143 do que tambem com o mefmo remediomercurial fe .avia:de curar a fébre, que era gallica. Vendoeu pois queo Mediconegava, quea.doensa crefcia,& que doente acabava , me deliberei a appellar a caufa para outroJuiz, porquemepareceoimpiedade que huna contenda de tanta importancia eftiveffe pofta em di- -laca por tantos dias , fem fe dar fentenca para livrar dos lacos da morte aoatorrnentadoenfermo. Mas(oh efperancas humanas como fois caducas', & engano- fas!i) vimacahir:em hum precipicio, quando queria evi tar outro; pois ta longeefteveo meu voto de con- firmarfe com a chegada donovoMedico, que antes fe. reprovou , & votou a froxocontra mim: & como (por eftylo ordinario: os votos nás confultas feavalia pe lo nunero , & náopelo pefo, fora mais poderofos os mais yotos, &.de menos valor ode mais pefo, & pot iffo aproveitarao pouco as minhas diligencias. Mas por iffome defpedi do enfermo, porque na tive ani- mo para o ver morrer de humadoencata conhecida, como fe foffe ignorada. Porem cono o doenteeftivef- fe em.feu acordo & perfeito juizo, &conheceffe: zelo,: & ancia, com qucéu lhe defejava a faude, me. pedio por Deosimmortal o na defemparaffe em ta grande perigor& para me. obrigar com. algum cari- nho,:me pegou na ma, dizendo que élle na qucria obedecer a outros preceitas inais queaos'meus , & por confequencia.:que f6avia de.feguir o.qute cu lhe.man daffe.-Pode: tanto:comigoeftaboafé & me interne- céra de modo:Gs r& eridos.rogos , qne. me encarre-. guei dacura, dandolhe principiö com huma purga, qic. juntamcntc.evacuaffc:os hu'mores , refpeitaffe a qualidadegallica, confortaffeas:entranhas relaxadas, & enfraqnecidasfazédo-adomadofeguintc.Em qua- tro oncas decozimtnto cordral com.hama oitava da ruibarbo, .& quatroafcropulas:de cafca de myrobat lanos:citrinosmandei ajuntar onca, & meya de xaro: ralpe:dasnoflas: rofas, & depois queodornte tomou pfte fingular remedio tres vezes. cin diasalternados; che. ..-
Obfervação XXI. 3 do que tamberá com o mefino remedio mercurial fe aviá-de curar a febre , que era gallica: Vendoeu pois que o Medico negava, quea doença crefeia & que O - doente acabava, me deliberei a appellar à caufa para outro Juiz , porque me-pareceo impiedade que huma contenda de tanta importancia eftiveife poíta em di: “laçaõ por tantos dias , fem fe dar fentença para livrar dos laços da morte ao atormentado enfermo. Mas (ok .elperanças humanas como fois caducas, & êngano- fas!) vit a cahir:em hum precipicio, quando queria evitar outro; pois raô longe efteveo meu voto de con- firmarfe com a chegada do novo Medico, que antes fe : : reprovon, & votou a froxo contra mir: & como (por eftyloordinario ) os votos nás confultas fenvaliaó per o ' lo numero ; & não pelo pefo ; foraô mais poderofos os . mais yotos , & de menos valor ode mais pefo , & por iflo aproveitáraô pouco as minhas diligencias. Mas - por iflo me defpedi do enfermo, porque naó tive ani mo para o ver morrer de huma doençataó conhecida, como fe foffe ignbrada. Porém como o doente eftivef- fe em feu acordo, & perfeito juizo , & conheceffe o zelo; & ancia., com que eu lhe defejava a faude, me pedio por Deosimmortato naó defemparafle em taô grande perigo; & para me obrigar com algum 'cari- nho,me pegon na maó, dizendo que élle naô queria obedecêr a outros preceitos inais que aos meus , & por confeguencia que fó avia de feguir o que eu lhemans daífe. Pode tanto: camigo eftaboa fé , & me interne” cêras de modo os ráféridos; rogos , quê me encarres. gueida cura , -dandolhe penéipio com hurtra purga; Qquie jantamente: evacua [eos humores , efpeitafie à . qualidade gallica, confortaffe as entranhas relaxadas; & enfraquecidas faizédo-a da modo feguinte.Em qua tro onçàs de cozimento cordeal com huma oitava de suibarbo, & quatrosfcropulas- de cafca de myroba* lanoscitrinos mandei ajuntar onça , & meya de xaros ie prabifiral promorba, & obra onça & meya deka! eipo: das nofias rofai; & depois que o do::nte tomou eftefingular remedio tres vezes cm: dias alternados NS ' cnes c=m '
143 XXIII. Observaçaon do que tambem com o mesmo remedio mercurial se avia de curar a febre, que era gallica. Vendo en pois que o Medico negava, que a doença crescia, & que d doente acabava, me deliberei a appellar a causa para outro Juiz, porque me pareceo impiedade que huma contenda de tanta importancia estivesse posta em di¬ laçaon por tantos dias, sem se dar sentença para livrar dos laços da morte ao atormentado enfermo. Mas (oh esperanças humanas como sois caducas, & engano¬ sas!.) vim a cahir em hum precipicio, quando queria evitar outro; pois taon longe esteve o meu voto de con¬ firmarse com a chegada do novo Medico, que antes se reprovou, & votou a froxo contra mim: & como (por estylo ordinario) os votos nas consultas se avaliaon pe¬ lo numero, & namo pelo peso, foraon mais poderosos os mais votos, & de menos valor o de mais peso, & pot isso aproveitaraon pouco as minhas diligencias. Mas por isso me despedi do enfermo, porque naon tive ani¬ mo para o ver morrer de huma doença tao conhecida, como se fosse ignorada. Porèm como o doente estives¬ se em seu acordo, & perfeito juizo, & conhecesse o zelo, & ancia, com que eu lhe desejava a faude, me pedio por Deos immortal o naon desemparasse em taon grandè perigo; & para me obrigar com algum cari¬ nho, me pegou na maon, dizendo que elle nao quoria obedecer a outros preceitos mais que aos meus, & por consequencia que so avia de seguir o que eu lhe man- dasse. Pode tanto comigo esta boa fé, & me interne¬ ceraon de modo os reseridos rogos, que me encarre- guei da cura, dandolhe principio com huma purga, que juntamente evacuasse os humores, respeitasse a qualidade gallica, confortasse as entranhas relaxadas, & enfraquecidas, fauendo a do modo seguinte. Em qua¬ tro onçàs de cozimento cordeal com huma oitava de ruibarbo, & quatro escropulos de casca de myroba¬ lanos citrinos mandei ajuntar onça, & meya de xaro¬ pe magistral pro morbo, & outra onça & meya de xa¬ rope das nossas rosas; & depois que odounte tomou este singular remedio tres vezes em dias alternados, che¬ .
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144 Observações Medicas Doutrinaes. cheguei ao uʃo do mercurio ʃublimado , chamado Calomelanos Turqueti , dando meya oitava delle em forma de pilula de tres em tres dias ; & foi couʃa digna de admiraçaõ ver que antes de acabar eʃte remedio , deʃapparecèraõ a febre , as camaras , os puxos , as dores , & as vigias , & conʃeguio perfeitiʃʃima ʃaude aquelle meʃmo homem , que jà eʃtava ʃentenciado à morte , & reputado por incuravel. 3 . Quatro couʃas de muita importancia quero advertir aos Medicos modernos , todas mui neceʃʃarias para o bom acerto das curas , & ʃaude dos enfermos . A primeira he , que nunca dem o mercurio , de qualquer ʃorte que ʃeja preparado , ʃem que o corpo eʃteja primeiro bem evacuado , porque ʃe , eʃtando o corpo cheyo de humores , derem remedios mercuriaes , póde ʃucceder que aquella grande copia de materiais , que o mercurio coʃtuma aballar , dè comʃigo na garganta , & affogue ao doente . A ʃegunda couʃa he , que ʃe as gingivas , a lingua , ou a garganta incharem , ou ʃe excoriarem , como coʃtuma ʃucceder aos que tomaõ unturas , ou mercurios , que naõ uʃem de gargariʃmos , nem de bochechas , feitos de aguas refrigerantes , ou repercuʃʃivas , porque fechandoʃe com ellas os póros , ou repercutindoʃe para dentro os humores malignos , mataráõ aos doentes : como já vi em certo doente , a quem hum Medico applicou gargariʃmos de aguas frias , & repercuʃʃivas , & porque com ellas ʃe ʃuʃpendeo a ʃalivaçaõ , morreo o miʃeravel doente . O que eu aconʃelho neʃte caʃo he , que uʃem de gargariʃmos ; & bochechas de leite de cabras , ou de vaccas morno , ou de bochechas de vinho branco aguado ; porque deʃte modo ʃe conʃervaõ abertos os ductos ʃalivaes , & ʃe continua a purgaçaõ ʃem riʃco da vida . A terceira couʃa he , que ʃe por cauʃa de muita ʃalivaçaõ ʃe alterar alguma febre , ( como muitas vezes ʃuccede ) que nem por iʃʃo deʃconfie o Medico , nem os doentes , nem ʃe ʃangrem ; porq a tal febre he symptomatica , & accidental , cauʃada da agitaçaõ dos humores , & ʃó ʃe deve curar , como enʃina Valhes , ( 5 . ) não fazendo remedios
- 144 Obfervações Medicas Doutrinaes. cheguei ao ufo do mercurio doce fublimado, chama- do Calomelanos Turqueti , dando meya oitava delle em forma de pilula de tres em tres dias ; & foi coufa .digna de admiraçaõ ver que antes de acabar efte reme -* dio, defappareceraõ a febre, as camaras , os.prixos , as · dores, & as vigias, & confeguio perfeitiffima faude aquelle mefmo homem, que jà eftava fentenciado à morte , & reputado por incuravel. 3. Quatro coufas de muita importancia quero ad- vertir aos Medicos modernos, todas mui neceffarias para o bom acerto das curas, & faude dos enfermos. A primeira he, que nunca dem o mercurio, de qual- quer forte que feja preparado, fem que o corpo efte- ja primeiro bem evacuado, porque fe ; eftando o cor- po cheyo de humores, derem remedios mercuriaes, pode fucceder que aquella grande copia de materias; que o mercurio coftuma aballar, de comfigo na gar- ganta, & afogue ao doente. A fegunda coufa he, que fe as gingivas, a lingua , ou a garganta incharem, ou fe excoriarem, como coftuma fucceder aos que tomaõ unturas, ou mercurios, que nao ufem de gargarifmos, nem de bochechas , feitos de aguas refrigerantes, ou repercuffivas, porque fechandofe com ellas os poros, ou repercutindofe para dentro os humores malignos; mataráő aos doentes: como já vi em certo doente, a quem hum Medico applicou gargarifmos de aguas frias , & repercuffivas, & porque com ellas fe fufpen- deo a falivaçao, morreo o miferavel doente. O que eu aconfelho nefte cafo he, que ufem de gargarifmos, & bochechas de leite de cabras ; ou de vaccas morno , ou de bochechas de vinho branco aguado, porque defte. modo fe confervao abertos :os ductos falivaes , & fe continua a purgaçao fem rifco da vida. A terceira coufa he, que.fe.por canfa de muita falivacao fe alte- raralguma febre, (como muitas vezes fuccede ) que nem por iffo defconfieo:Medico, nem os doentes; nem fe fangrem ; porq a tal febre he fymptomatica, & accit dental, caufada da agitação dos humores, &fó fe de- ve curar, como enfina Valhes, (5.) não fazendo reme -. dios. ! 1 :
.r44 Obfervacoes MedicasDoutrinaes. cheguei ao ufo do mercurio doce fublimado , chama- do Calomelanos Turqueti , dando meya oitava delle em forma de pilula de tres emtres dias ; & foi coufa .digna de admiraca ver que antes de acabar eftereme- dio , defapparecéra a febre, as camaras , os.puxos , as . dores, & as:vigias, & confeguio perfeitiffina faude aquelle mefmo homem, que ja .eftava fentenciado ä morte , & reputado por incuravel. ... 3.. Quatro coufas de muita importancia quero ad- vertir aos Medicos modernos, todas.mui neceffarias para.o bom acerto das curas, & faude dos enfermos. A primeira he , que nunca: dem o mércurio, de qual quer forte que feja preparado, fem que o corpo efte-- ja primeiro bem evacuado, porque fe; eftando cor- po cheyo de humores, derem remedios mercuriaes', póde.fucceder que aquellagrande copia de materias, que o mercurio coftuma aballar , de: comfigo na gar- ganta , &.affogue aodoente. A fegunda coufa he , que fe as gingivas., a lingua , ou a garganta incharer, ou fe excoriarem, como coftuma fucceder aos que toma unturas , ou mercurios, que na ufem de gargarifmos, nem de bochechas , feitos:de aguas refrigerantes, ou repercuffivas, porque feckandofecoin ellas os póros, ou.repercutindofepara dentro os humores malignos; matara aos doentes : como jávi emterto doente , a quem hum Medico applicou. gargarifmos: de aguas frias ,& repercuffivas,& porque comellas fefufpen-. deo a falivaca, morréoomiferaveldornte:O que cu aconfelhonefte cafo he ,que ufein dt gargarifmos:; & bochechas dé leite.de cabras, ou devaccasmorno, ou debochechas. de vinhabranco aguado, porquedefte. modo fe.confervao abertos :os.ductos falivaes,: & fe continua :æ purgacaofem rifco. da vida. A: terceira coufa he., que:fe.por caufa: de muita ifalivaga fe alte- rar alguma febre, (coma muitas vezesfuccede ) que nem:por iffo defconfieo:Medico,riem asdoéntes;nemi fe fangreim; porq atal febrehe fýmptomatica,& atcit dental, caufadada agitaca dos humoxes ,&fofe de- ve curar,.como enfina Valhes, (s ) naofazendoreme- dios
r44 Oblervações Medicás Doutrinaes. cleguei ao nfo do mercurio doce fublimado ; chama- do Calomelanos Turqueti, dando meya oitava delle em forma de pilula de tres em tres dias ; & foi confa digna de admiraçaõô ver que antes de acabar eftereme-* . dio , defappareceéraõ a febre, as camaras , os puxos , as : dores, & as-vigias, & confeguio perferiffima faude aquelle mefmo homem, que jà eftava fentenciado à morte , & reputado por incuravel. SS “3º Quatrocoufas de muita importancia quero ad- Vertir aos Medicos modernos , todas mui neceffarias para o bom acerto das curas , & faude dos enfermos. A primeira he, que nunca: dem o mércurio , de qual. quer forte que feja preparado, fem que o corpo efte- ja primeiro bem evacuado , porque fe ; eftando o cor- Po cheyo de humores, derem remedios mercuriaes, póde fucceder que aquellagrande copia de materias; queo mercurio coftuma aballar , dê comfigo na gar- nta , & affogne ao doente. A fegunda coula he , que Fo gingivas ; a lingua , ou a garganta incharem, ou, fe excoriarem; como coftuma fucceder aos que tomaõ : unturas, eumercurios, que naô ufem de gargarifinos, nem de bochechas , feitos de aguas refrigerantes, ou repercuílivas, porque fechandofe com ellas os póros, ou repercutindof/e para dentro os humores malignos; mataráô aos doentes: como jávi emcerto doente, a quem hum Medico applicou gargarifmos de aguas frias , & repercufífivas ; & porque convellas fe fufpen-. deo a falivaçaõ, morrêo o miferavel dwente; O que'ei aconfelho nefte cafo-he que ufem de gargarifmos; ào bochechas dé leite de cabras; ou de vaccas morno; on. debochechas de vinho branco aguado”, orque defte. modo fe cohfervao abertos os. dutos falivaes,''& fe continua a purgaçaáfem rifco. da. vida. A: terceira côufa he , quese.por éanfa.de muita falivaçaõ fe alte: raralguma' febre, (comi muitas vezes ficcede ) que . nem:por iflo defconfien Medico,niem os doêntes;ném fe fangrem; porá a tal febrehe ffmpromatica, & atcis dental, caufida da agiraçãõ-dos humones ; &ufó.fe de- ve curar, como enfina Valhes, (5.) nãofazendoreme-. dios
144 Observaçones Medicas Doutrinaes. cheguei ao uso do mercurio doce sublimado, chama¬ do Calomelanos Turqueti, dando meya oitava delle em forma de pilula de tres em tres dias; & foi cousa digna de admiraçaon ver que antes de acabar este reme- dio, desappareceraon a febre, as camaras, os puxos, as dores, & as vigias, & conseguio perfeitissima saude aquelle mesmo homem, que jà estava sentenciado à morte , & reputado por incuravel. 3. Quatro cousas de muita importancia quero ad¬ vertir aos Medicos modernos, todas mui necessarias para o bom acerto das curas, & saude dos enfermos. A primeira he, que nunca dem o mercurio, de qual¬ quer sorte que seja preparado, sem que o corpo este- ja primeiro bem evacuado, porque se, estando o cor¬ po cheyo de humores, derem remedios mercuriaes, póde succeder que aquellagrande copia de materias, que o mercurio costuma aballar, dè comsigo na gar¬ ganta, & affogue ao doente. A segunda cousa he, que se as gingivas, a lingua, ou a garganta incharem, où se excoriarem, como costuma succeder aos que tomaon unturas, ou mercurios, que naon usem de gargarismos, nem de bochechas, feitos de aguas refrigerantes, ou repercussivas, porque fechandose com ellas os póros, ou repercutindose para dentro os humores malignos, matarao aos doentes: como jà vi em certo doente, a quem hum Medico applicou gargarismos de aguas frias, & repercussivas, & porque com ellas se suspen¬ deo a salivaçaon, morreo o miseravel doente. O que eu aconselho neste caso he, que usem de gargarismos, & bochechas de leite de cabras, ou de vaccas morno, ou de bochechas de vinho branco aguado, porque deste modo se conservaon abertos os ductos salivaes, & se continua a purgaçaon sem risco da vida. A terceira cousa he, que se por causa de muita falivaçaon se alte¬ rar alguma febre, (comò muitas vezes succede) que nem por isso desconfie o Medico, nem os doentes, nem se sangrem; porque a tal febre he symptomatica, & acci¬ dental, causada da agitaçaon dos humores, & só se de¬ ve curar, como ensina Valhes, (5.) namo fazendo reme- dios
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Observaçaõ XXIV. 145 dio , antes deixando a cura por conta da natureza ; porque ʃe alguem ʃe ʃangrar por cauʃa de febre , que ʃobrevier aos que eʃtaõ babando , ʃe arriʃca a morrer , como já vi em certo doente , que naõ nomeyo , porque ʃenaõ venha a ʃaber quem foi o conʃelheiro de hum erro taõ craʃʃo , que cuʃtou a vida do enfermo . A quarta couʃa que quero advertir aos Medicos principiantes he , que nunca appliquem o mercurio , ( ou ʃeja o ʃublimado doce , a que huns chamaõ Pnacea , outros Calomelanos , outros Dragaõ mitigado , ou ʃeja o precipitado doce , ou ʃeja o Turbith minera) em forma de pò aos dentes , porque nunca deʃceo tambem ao eʃtomago , como quando ʃe dà em forma de pilula . OBSERVAÇAM XXIV . De huma dor de colica vehementissimas , a que se seguio hum adormecimento na perna direita com ancias mortaes , suores frios & vomitos continuos . 1. O Muito Religioso Padre Fr . Paulo da Silva, Carmelita Calçado, enfermou a vinte de Septembro de 1686. com humas dores vehementissimas de ventre; a que sobrevieraõ vomitos continuos , adormecimentos na pèrna direita , ancias de coraçaõ , & suores frios . Para rebater o impeto de tantas queixas juntas se chamou logo ao Doutor Antonio de Figueiredo, que naquelle tempo era o Medico do Cõvento o qual lhe applicou muitos, & mui excellentes remedios ; mas como os doentes naõ melhoraõ com tanta brevidade , quanta desejaõ, naõ só perdem o animo ,mas logo suspeitaõ que por erro, ou malicia se lhes deo algum veneno, mayormente quando vem que as medicinas mais efficazes se malograõ: nesta affliçaõ de dores , & de animo lhe chegou à noticia que eu preparava em minha casa hum bezoartico cordeal de virtude mui singular contra as febres malignas, & contra todo
Òbfervaçaõ XXIV. . 145 dio,antes deixando a cura por conta da natureza; por- que fe alguem fe fangrar por caufa de febre, que fo- brevier aos que eftao babando, fe arrifca a morrer, como já vi em certodoente, que nao nomeyo, porque fenao venha a faber quem foi o confelheiro de hum erro tao craffo, que euftou a vida ao enfermo. A quar- ta coufa que quero advertir aos Medicos principian- tes he, que nunca appliquem o mercurio, (ou feja o fu- blimado doce, a que huns chamao Pnacea, outros Ca- lomelanos , outros Dragao mitigado, ou feja o preci- pitado doce, ou feja o Turbith minera) em forma de pò aos dentes, porque nunca defceo tambem ao efto- mago, como quando fe dà em forma de pilula. OSS SSO OBSERVAÇAM XXIV. . Debuma dor de colica vehementifima, a que fe feguio 1 bum adormecimento na perna direita com ancias mortaes , fuores frios, & vomitos continuos. O Muito Religiofo Padre Fr. Paulo da Sil- va, Carmelita Calçado, enfermou a vin- te de Septembro de 1686. com humas dores vehemen- tiffimas de ventre", a que fobrevierao vomitos conti- nuos, adormecimentos na perna direita, ancia's de co- raçao , & fuores frios. Para rebater o impeto de tantas queixas juntas fe chamou logo ao Doutor Antonio de Figueiredo, que naquelle tempo era o Medico do Co- vento, o qual lhe applicou muitos, & mui excellentes "remedios ; mas como os doentes nao melhorao com tanta brevidade, quanta defejaõ, naõ fó perdem o ani- 'mo, mas logo fufpeitao que por erro, ou malicia fe lhes deo algum veneno, mayormente quando vem que as medicinas mais efficazes fe malograõ: nefta affliçaõ de dores , & de animo lhe chegou anoticia que eu pre- parava em minha cafa hum bezoartico cordeal de vir- fude mui fingular contra as febres malignas, & contras todo . 3 1 :
Obfervacao XXIV. .14$ dio,antes deixando a cura por conta da natureza;por brevier aos que efta babandö, fe arrifca amorrer, como ja vi em cértodoente , que na nomeyo, porque fena venha a faber quem foi o confelheiro de hum erró ta craffo, que cuftou a vida ao enfermo. A quar ta coufa que quero advertir aos Medicos principian- tes he, que nunca appliquem o mercurio, (oufejao fu- blimado doce, a que huns chama Pnacea, outros Ca- lomelanos , outros Draga mitigado, ou feja o preci- pitado doce, oufeja o Turbith minera) em forma de mago, como quando fe da em forma de pilula. OBSERVACAM XXIV. Debuma dor decolica vebementifima, a que fefegui bum adormecimento na perna direita com ancias mortaes ,fuores frios. d vomitos continuos. MuitoReligiofo Padre Fr. Paulo da Sil- 0 va, Carmelita'Calcado, enfermou a vin- te de Septembro de 1686. cöm humas dores vehemen- tiffimas de ventre, a que fobreviera vomitos conti- nuos, adormecimentos na pérna direita, ancia's de co- raca , & fuores frios. Para-rebater oimpeto de tantas queixas juntas fe chamou lggao Doutör Antonio de Figueiredo, que naquelle tempo era o Medico do Co-. vento , qual lhe applicou muitos, & mui excellentes remedios ; mas como os doentes na melhora com .tanta brevidade, quanta defeja, na f6 perdem o ani- 'mo,mas logöfufpeita que por erro,0u malicia fe lhes medicinas mais efficazes fe malogra: nefta afflica de dores, & deanimo lhe chegou anoticia que cu pre- parava em minha cafa hun bezoartico cordeal de vir- tude fhui fingular contra as febres malignas, & contra todo
o Obfervação XXIV, tas dio,arftes deixando a cura por conta da natureza;port . que fe álguem fe fangrar por caufa de febre, que fos Co brevier aos que eftaó babando, fe arrifca á morrer; — como já vi em cêrto doente, que naô romeyo, porque . : fenaô venha a faber quem foi o confelheiro deéehum — =» : errô taô craflo, que euftou a vida ao enfermo. A quar- | : ta coufa que quero advertir aos Medicos principians . tes he, que nunca appliquem o mercurio, (oufejao fu- ! blimado doce, a que huns chamaô Pnaceaá; outros Ca“ lomelanos , outros Drágaõ mitigado, ou feja o preci- pitado doce, onfeja o Turbith miner4kt) em forma de eo " pô aos dentes, porque nunca defceo tambem ao efto- mago, como quando fe dà em formatie pilula, o cositas so sito asso asso ate asso enssdo asfcn as Oo sãos : : OBSERVAÇAM XXIV.. CNS “ . . | Debuma dor decolica vebementifima, a que fefeguio — . bum adormecimento na perna diveiga com ancião mortaes , fuores frios, & vomitos contínuos. e . ” -. no MuitoReligiofo Padre Fr. Paulo da Sil- NAS o va, Carmelita'Calçado, enfermou a vin- oo tede Septembro de 1686. cóm umas dores vehemen- -— riflimas de ventre; a que fobrevieraó vomitos conti- —c à, nuos, adormecimentos na pêrna direita, ancias de co- raçaô , & fuores frios. Para rebater oimpeto de tantas . queixas juntas fe chamou loggao Doutor Antonio de Figueiredo, que naquelle tempao era o Medico do Cô-. vento, e qual lhe applicou muiros, & mui excellentes “*remedios; mas como os doentes naô melhoraô com tanta brevidade, quanta defejaó, naô fó perdem o ani- + mo,maslogo fufpeitaô que por erro,ou maliçia felhes + deoalgumveneno,mayormente quando ve queas : É medicinas mais eficazes fe malograõ: nefta afiliçaô de "” 1" “dores, & deanimo lhe chegou ânoticia que eu pre- e . paravaem minha cafa hum bezoarticó cordeal de vir- ' Yude mui fingular contra as febres malignas, & cogrraas ' | - . * todo — ——— a. "
•145 Observaçao XXIV. dio, antes deixando a cura por conta da natureza; por¬ que se alguem se sangrar por causa de febre , que so- brevier aos que estaô babando, se arrisca a morrer. como jà vi em certo doente , que nao nomeyo, porque senaon venha a saber quem foi o conselheiro de hum errò tao crasso, quę eustou a vida ao enfermo. A quar¬ ta cousa que quero advertir aos Medicos principian¬ tes he, que nunca appliquem o mercurio, (ou seja o su- blimado doce, a que huns chamaon Pnacea, outros Ca¬ lomelanos, outros Dragaon mitigado, ou seja o preci- pitado doce, ou seja o Turbith minera) em forma de pò aos dentes , porque nunca desceo tambem ao esto- mago, como quando se dà em formade pilula. OBSERVACAM XXIV. Dehuma dor de colica vehementissima, a que se seguio hum adormecimento na perna direita com anciâs mortaes, suores frios, & vomitos continuos. Muito Religioso Padre Fr. Paulo da Sil- 1. va, Carmelita Calçado, enfermou a vin¬ te de Septembro de 1686. com humas dores vehemen- tissimas de ventre; a que sobrevieraon vomitos conti¬ nuos, adormecimentos na perna direita, ancias de co¬ raçaon, & suores frios. Para rebater o impeto de tantas queixas juntas se chamou loggi ao Doutor Antonio de Figueiredo, que naquelle tempo era o Medico do Con- vento , o qual lhe applicou muitos, & mui excellentes remedios; mas como os doentes naô melhorao com tanta brevidade, quanta desejaon, naon só perdem o ani¬ mo, mas logo suspeitaon que por erro, ou maliçia se lhes deo algum veneno, mayormente quando vem que as medicinas mais efficazes se malograon: nesta affliçaon de dores, & de animo lhe chegou à noticia que eu pre¬ parava em minha casa hum bezoartico cordeal de vir¬ tude mui singular contra as febres malignas, & contraa todo «.
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146 Observações Medicas Doutrinaes. todo o genero de veneno ; & como a vida he mui amavel , me fez logo chamar, livrando (depois de Deos) na minha assistencia , & remedio a esperança da sua vida: & chegando eu à presença do enfermo , o achei quasi agonizando , tanto pela crueldade das dores , quanto pela desconfiança , & consternação do animo : & para o alentar , & fazer obedecer ao que lhe mandasse , lhe affirmei com juramento que nenhuma das queixas , q padecia , procedia de veneno ; mas eraõ taõ sómente , sinaes proprios & inseparaveis de dores nephriticas; porque como temos alguns nervos , que se ramificaõ , & estendem do estomago atè os rins , & a tunica exterior , que os veste , tenha o seu nascimento do Peritoneo, que he continuado com o fundo do estomago , naõ he para admirar que aggravados os rins com qualquer area , ou pedra , se gravassem , & irritassem tambem as partes , que com elles tem communicaçaõ , & correspondencia . E quanto ao adormecimento da perna direita , tambem lhe certifiquei que de nenhuma sorte procedia de veneno ; mas que certamente procedia de se apertar aquelle nervo , que se ramifica , & estende pelos musculos da perna , & que a tal compressaõ , & aperto procediaõ da dureza , peso , ou copia das areas , ou pedras ; & que era doutrina de Hippocrates , (1.) que tanto que alguma parte , ou vea se comprime de sorte , que os espiritos naõ tem passagem franca para se communicar , sente logo a tal parte hum adormecimento ; ou estupor ; por quanto os espiritos , & o influxo delles naõ póde estar parado sem damno consideravel do vivente. 2. Ouvidas estas razões, cobrou o doente animo, & resuscitou nelle a esperança de ter saude. Conhecida pois a natureza de taõ violenta , & repentina enfermidade , tomei a meu cargo o curallo , promettendo-lhe que antes de seis horas lhe tiraria a dor , com tal condiçaõ ao doente, porque como naquelle tempo os remedios Chymicos estivessem mal opinados entre
146° Obfervações Medicas Doutrinaes. todo o genero de veneno'; & como a vida he mui ama- vel,me fez logo chamar, livrando (depois de Deos) na minha affiftencia, & remedio a efperança da fua vida: & chegando eu à prefença do enfermo, o achei quali agonizando, tanto pela crueldade das dores, quanto pela defconfiança, & confternaçao do animo; & para o alentar, & fazer obedecer ao que lhe mandaffe , lhe affirmei com juramento que nenhuma das queixas , q padecia, procedia de veneno ; mas eraõ taõ fómente finaes proprios , & infeparaveis de dores nephriticas; porque como temos alguns nervos , que fe ramificao, & eftendem do eftomago ate os rins , & a tunica exte rior, que os vefte, tenha o feu nafcimento do Perito- .. neo, que he continuado com o fundo do eftomago, nao he para admirar que aggravados os rins com qual quer area, ou pedra , fe gravaffem , & irritaffem tam- bem as partes , que com elles tem communicaçao , & correspondencia. E quanto ao adormecimento da perna direita, tambem lhe certifiquei que de nenhu- ma forte procedia de veneno; mas que certamente pro- cedia de fe apertar-aquelle nervo, que fe ramifica, & eftende pelos mufculos da perna, & que a tal compref- fao, & aperto procediao da dureza, pefo, ou copia das areas , ou pedras ; & que era doutrina de Hippocrates, (1.) que tanto que alguma parte, ou vea fe compri- me de forte, que os efpiritos nao tem paffagem fran- ca para fe communicar, fente logo a tal parte hum adormecimento ; ou eftupor ; por quanto os efpiritos; & o influxo delles nao pode eftar parado fem damno confideravel do vivente. 2. · Ouvidas eftas razões, cobrou o doente animo, & refufcitou nelle a efperanca de ter faude. Conheci-" da pois a natureza de tao violenta , & repentina enfer- midade, tomei a meu cargo o curallo , promettendo -. lhe que antes de feis horas lhe tiraria a dor, com tal condiçao que avia de tomar hum remedio Chymico, que eu preparava por minhas mãos. Nao contentou a tal condiçaõ ao doente, porque como naquelle tem- po os remedios Chymicos eftiveffem mal opinados' entre
146* Obfervacoes Medicas Doutrinaes. todo o genero de veneno ; & coimoa vida he mui ama- vel,me fez logo chamar,livrando (depois de Deos) na minha affiftencia , & remedioaefperanca da fua vida: & chegando eu a prefenca do enfermo, o achei quafi agonizando, tanto pela crueldade das dores , quanto pela defconfianca, & confternaca do animo; & para o alentar, &fazer obedecer aoquelhe mandaffe,lhe affirmei com juramento que nenhuma das queixas , padecia, procedia de veneno; mas era ta'fómente finaes proprios & infeparaveis de dores nephriticas; porque como Rmos alguns nervos , que fe ramifica, & eftendemdo.eftonago ate os rins , & a tunica exte- rior , que os vefte, tenha o feu'nafcimento do Perito- . neo, que he continuado com ofundo do eftomago: nahe para ad'mirar que aggravados os rins com qual quer area, ou pedra , fe gravaffem, & irritaffem tam- bem as partes , que'com elles tem comimunicacaö , & perna direita, tambem lhe certifiquei que de nenhu- ma frte procediade veneno; mas que certamente pro- cediade fe apertar-aquelle nervo, que fe ramifica, & eftende pelos mufculos da perna, & que a tal compref- fa , & aperto procedia da dureza, pefo,ou copia das areas , ou pedras ; & queera doutrina de Hippocrates, (1.) que tanto que alguma parte, ou. vea fe compri- me de forte, que os efpiritos na tem paffagem fran- ca para fe communicar, fente logo a tal parte hum adormecimento ou eftupor ; por quanto os efpiritos; & o influxo delles na póde eftar paradofem damna confideravel do vivente. 2.. Ouvidas eftas razes, cobrou o doenteanimo & refufcitou nelle a efperanca de tér faude. Conheci- da pois a natureza de ta violenta , & repentina enfer- midade, tomei ameu cargo' curallo , promettendo- lhe que antes de feis horas lhe tirariaa dor, com tal condicaque avia de tomar hum remedio Chymico que eu preparava por minhas maos.. Na contentou a tal condica ao döente, porque como naquelle tem- po os remedios Chymicos eftiveffem mal opinados entre
146º Obfervações Medicas Doutrinaes. Do : todo o genero de veneno ; & comoa vida he miti amas * vel,mefezlogo chamar,livrando (depois de Deos) na minha affiftencia , & remedio a efperança da'fua vida: & chegando eu-à prefença do enfermo, e achei quafi o .. agonizando, tanto pela crueldade das dores, quanto oo pela defconfiança, & confternaçaô do animo ; & para º oalentar, & fazer obedecer ao que lhe mandaffe , lhe . afirmei com juramento que nenhuma das queixas, q padecia, procedia de veneno ;, masteraô ta6 fómente finaes proprios & infeparaveis de dores nephriticas; " « + porqgecomotêmosalgunsnervos , que feramificaõ, - -— &eftendemdo eftomago até os rins, & atunica exte« « <« rior, queosvefte, tenhãofeunafcimento do Perito- “ — », neo, que he continuado com o fundo do eftomago, . ' - : naõ he para admirar que aggravados os rins com qual -- É ooo - querarea, ou pedra , fe gravaflem, & irritaflem tam-' bem as partes , que "com elles tem cominunicaçaõô , & correfpondencia. E quanto ao adormecimento da . « — perna direita, tambemlhe certifiquei que de nenhu- ma fórte procediade veneno;mas que certamente pro-. cedia dee apertar-aquelle nervo, que fe ramifica, & eftende pelos muículos da perna,ºB que a tal compref- o - faôó, & aperto procediaô dá dureza, pefo, ou copiadas | areas, ou pedras ; & que eta doutrina de Hippocrates; | | (1.) que tanto que alguma parte, ou vêa fecompri- me deforte, que os efpiritos naó tem paflagem fran- ca para' fe communicar, fente logo a tal partehum - adormecimento; ou eftupor; por quanto os efpiritos; & oinfluxo delles naõ pode eftar parado fem damno confideravel do vivente. Pt 2. «Ouvidas eftas razões, cobrou o doentéanimo, & refofcitounelle a efperança de tér faude. Conheci-=" da pois a natureza de taô violenta , & repentina enfer- midade, tomei ameu cargo qcurallo , promettendo-. . —. lhe queantesdefeis horas lhetirariaador, comtal E condiçaó que avia de tomar hum remedio Chymico, : 2 que eu preparava per minhas mãos.. Naó contento? o a tal condiçaô ao doente, porgue como naquelletem- po os remedios Chymicos eitivellem mal opinados" . Do ! entre
146° Observaçones Medicas Doutrinaes. todo o genero de veneno; & como a vida he mui ama- vel, me fez logo chamar,livrando (depois de Deos) na minha assistencia, & remedio a esperança da sua vida: & chegando eu à presença do enfermo, o achei quasi agonizando , tanto pela crueldade das dores , quanto pela desconfiança , & consternaçaon do animo ; & para o alentar, & fazer obedecer ao que lhe mandasse, lhe affirmei com juramento que nenhuma das queixas, que padecia, procedia de veneno; maseraô tao somente sinaes proprios, & inseparaveis de dores nephriticas; porque como mos alguns nervos, que se ramificaon, & estendem do estomago atè os rins, & a tunica exte- rior, que os veste , tenhà o seu nascimento do Perito- neo, que he continuado com o fundo do estomago, naon he para admirar que aggravados os rins com qual¬ quer area, ou pedra, se gravassem, & irritassem tam¬ bem as partes, que com elles tem cominunicaçaon, & correspondencia. E quanto ao adormecimento da perna direita, tambem lhe certifiquei que de nenhu¬ ma sorte procedia de veneno; mas que certamente pro- cedia de se apertar-aquelle nervo, que se ramifica , & estende pelos musculos da perna, & que a tal compres- saon , & aperto procediaon dam dureza, peso, ou copia das areas, ou pedras; & que era doutrina de Hippocrates, (1.) que tanto que alguma parte, ou vêa se compri- me de sorte, que os espiritos nao tem passagem fran- ca para se communicar, sente logo a tal parte hum adormecimento; ou estupor; por quanto os espiritos; & o influxo delles naon pode estar parado sem damno consideravel do vivente. 2. Ouvidas estas razones, cobrou o doente animo, & resuscitou nelle a esperança de ter saude. Conheci- da pois a natureza de taon violenta, & repentina enfer¬ midade, tomei a meu cargo q curallo, promettendo-. lhe que, antes de seis horas lhe tiraria a dor, com tal condiçaon que avia de tomar hum remedio Chymico, que eu preparava por minhas manos. Naon contentou a tal condiçaon ao doente , porque como naquelle tem- po os remedios Chymicos estivessem mal opinados entre
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Observaçaõ XXIV. 147 entre os Portuguezes , porque os naõ conheciaõ , foi o mesmo fallarlhe em remedio Chymico , que se lhe dissera que lhe queria dar hum bocado de solimaõ, ou de resalgar ; & amedrontado com o nome do remedio , o naõ quiz tomar , & por mais que eu lhe affirmei que era segurissimo , & quasi milagroso , me respondeo que se contentava com seguir o conselho do seu Medico , o qual lhe tinha dito que as sangrias , & ajudas , & algũs remedios conhecidos de todos o aviaõ de livrar do perigo. Alguns impulsos tive de deixar ao doente , & despedirme logo ; porque quem naõ obedece ao que lhe manda o Medico , mostra que confia pouco nelle : & diz Galeno , (2.) que aquelle Medico cura mais doentes, em quem mais doẽtes confiam; mas porque sempre tive grãde respeito aos Doutores mais velho, naõ me quiz dar por sentido da repulsa do meu voto, como aconselha seneca; (3.) antes quiz ver (como de palanque) em que parava aquella doença nas mãos alheyas : mas sem embargo que o doente obedeceo à risca aos preceitos do seu Medico , nem por isso teve alivio , antes de hora em hora peyoravão as queixas com taõ incomparavel excesso , que chegou a dizer que os tormentos do inferno naõ podiaõ ser mayores que os que elle padecia,. & que a Medicina era huma Arte enganosa, & desnecessaria no mundo , pois nenhum remedio della lhe tinha aproveitado : lembroulhe entaõ a promessa que eu lhe avia feito, & com as lagrimas nos olhos me pedio lhe quizesse dar o remedio , em que lhe tinha fallado , porque estava resoluto a obedecerme em tudo, o que lhe ordenasse : & suposto eu estava escandalizado pelo desprezo que fez do meu conselho, pode tanto comigo acompaixaõ de o ver em taõ grande aperto , que me esqueci da raiva , que contra elle tivera , & assim lhe dei às seis horas do dia humas colheres de caldo de frangaõ , em que misturei vinte grãos de pò de quintilio : o qual remedio como dizem gravissimos Authores, (4.) he o melhor que ha para tirar estas dores , vencer os adormecimentos , q da tal causa procederem : & foi taõ grande
Obfervação XXIV. 147 entre os Portuguezes, porque os naő conheciaõ, foi o mefmo fallarlhe em remedio Chymico, que fe lhe differa que lhe queria dar hum bocado de folimaõ, ou de rofalgar ; & amedrontado com o nome do reme- dio, o nao quiz tomar, & por mais que eu lhe affir+ mei que era fegurifimo, & quafi milagrofo, me ref- pondeo que fe contentava com feguis o confelho do feu Medico, o qual lhe tinha dito que as fangrias, &. ajudas, & algus remedios conhecidos de todos o aviao de livrar do perigo. Alguns impulfos tive de deixar ao- doente, & defpedirme logo; porque quem nao obe- dece ao que lhe manda o Medico, moftra que confia pouco nelle : & diz Galeno, (2. ) que aquelle Medico . cura mais doentes, em quem mais doêtes confiam; mas porque fempre tive grade refpeito aos Doutores mais velhos,nao me quiz dar por fentido da repulfa do meu voto, como aconfelha Seneca; (3.) antes quiz ver (co- mo de palanque ) em que parava aquella doença nas mãos alheyas : mas fem embargo que o doente obede- ceo à rifca aos preceitos do feu Medico, nem por iffo teve alivio , antes de hora em hora peyoravão as quei- "xås com' tao incomparavel exceffo, que chegou a di- zer que os tormentos do inferno nao podiaõ fer mayo- res que os que elle padecia ,.& que a Medicina era hu- ma Arte enganofa, & defneceffaria no mundo, pois nenhum remedio della lhe tinha aproveitado : lem- broulhe entao a promeffa que eu lhe avia feito, & com as lagrimas nos olhos me pedio lhe quizeffe dar o re- medio, em que lhe tinha fallado, porque eftava re- foluto a obedecerme em tudo', o que lhe ordenaffe : & fuppofto eu eftava elcandalizado pelo defprezo que fez do meu confelho, pode tanto comigo acompaixão de o ver em tao grande aperto , que me efquecida rai- va, que contra elle tivera, & affim lhe dei as feis horas do dia humas colheres de caldo de frangaõ, em que mifturei vinte grãos de pò de quintilio : o qual reme- dio, como dizem graviffimos Authores, (4.) he o me- lhor que ha para tirar eftas dores , vencer os adorme- cimentos, q de tal caufa procederem : & foi tao gran- de .- -
Qbfervaca& .XXIV: :: 147 entre. Qs: Portuguezes, porque os na tonheciaö, foi mefmo fallarlheem remedio Chymico, que fe ihe differa que lhe queria dar hum bocado de folima, ou de rofalgar ; & amedrontado com o nome do reme- dio, o na quiz tomar, & por mais que eu lhe affr- mei que era feguriffimo, & quafi milagrofo, me ref- pondeo que fe contentava com feguir o confelho do Teu Medico, o qual lhe tinha dito que as fangrias, &. ajudas, & algús remedios conhecidos de todos o avia de livrar do perigo. Alguns impulfos tive de deixar ao doente,& defpedirme logo; porque quem naobe- dece ao que lhe mandao Medico, moftra que confia pouco nelle: & diz Galeno, (2.) que aquelle Medico cura mais doentes,em quem mais doétes confiam;as porque fempre tive grade refpeito aos Doutores mais velhos,na me quiz dar pör fentido da repulfa doméu mo de palanqué): em que parava.aquella doenca nas : maos alhéyas : mas femrembargo que odoente obede- ceo a rifca aospréceitos do feu Medico, nem por iffo teve alivio, antes dehora em hora peyoravao as quei- xas com ta incomparavelexceffo, que.chegou a di- zer que os tormentos do inferno naó podia fer mayo- res queos que elle padecia ,.& que a Medicina era hu- ma Arteenganofa, & defneceffaria no mundo, pois nenhum remedio. della lhe tinha aprovéitado : lem- broulhe:enta a promeffa.que eu lhe aviafeito,& com aslagrimas nos &lhos me pedio lhe quizeffe dar o re- medio.,: em que lhe: tinha fallado, porque.eftava re- foluto a obedecerme em tudo, o que.lhé ordenaffe : & fuppofto.cu eftava elcandalizado.pelo defprezo que fez do meu confelho, pode tanto.comigaacompaixa de o ver em ta grande aperto , que me efqueci da rai. va, que contra elle tivera, & affim lhe dei as feis horas do dia humas colheres de caldo: de frangao, em que mifturei vinte graos de po de quintilio : oqual reme- dio , como dizem graviffimos Authores, (4.) he o me- Jhor que ha para tirar eftas dores , vencer osadorme- cimentos., de tal. caufa procederem : & foi ta gran- de
Obfervação - XXIV. .. 147 etitre qs Portuguezes, porque os naó conheciaõ, foi o imeímo fallarilte em râmedio Chymico, que felhe differa que lhe queria dar hum bocado de folimaõ, ou ' derofalgar; & ammedrontado com o nome do reme- dio, o naô quiz tomar , & por mais que eu lhe affirs . mei que era feguriflimo, & quafi milagrofo, me ref= pondeo que fe contentava com feguig o confelhodo Teu Medico, o qual lhe tinha dito que as fangrias, & ajudas, & algús remedios conhecidos de todos o aviao de livrar do perigo. Alguns impulfos tive de deixar ao doente , & defpedirme logo ; porque quem naóobe» dece ao que lhe manda o Medico, moftra que confia : pouco nelle : & diz Galeno, (2.) que aquelle Mediço cura mais doentes,em quem mais doêtes confiam;tinas ' porque fempre tive gráde ref peito aos Doutores mais velhos,naô me quiz dar por fentido da repulfa do men | voto, como aconfelha Seneca; (3.) antes quiz ver (co- mo de palanque ) em que parava aquella doença nas * : - mãosalhéyas: mas fem embargo que o doente obede- ceo à rifea aos préceitos do feu Medico, nem por iflo tevealivio , antes de hora em hora peyoravão as quei- "xãs com' taó incomparavel exceflo, que chegou a di- ger que os tormentos do inferno naô podiaõ fer mayo- res que-os que elle padecia ,.& que a Medicina era hu- O. ma Arteenganofa, & defneceffaria no mundo, pois dr . nenhum remedio della lhe tinha aprovéitado: lem- " broulhe.entaô a promeffa que eu lhe avia feito,& com as lagrimas nos alhos me pedio lhe quizeíle dar ore» . medio, em que lhe: tinha fallado, porque eftava re- folutoa obedecerme em tudo ,.o que lhê ordenaífe: & Tfuppotto eu eftava elcandalizado pelo defprezo que fez do meu confelho, pode tanto-comiga acompaixaô deo ver em taó grande aperto , que mê elquecida rai- va, que contra elle tivera, & aflim lhe dei às feis horas 'do dia humas colheres de caldo: de frangaô, em que mifturei vinte grãos de pô de quintilio : oqual reme- dio ,.como dizem gravifimos Áuthores, (4.) he o me- Jhor que há para tirar eftas dores , véncer os adorme- * cimentos, dq de ral caufa procederem: & foi taô gran ' : a. res Os à "
147 Observaçao XXIV. entre os Portuguezes, porque os naon conheciaon, foi o mesmo fallarlhe em remedio Chymico, que se lhe dissera que lhe queria dar hum bocado de solimaon, ou de rosalgar; & amedrontado com o nome do reme- dio, o naon quiz tomar, & por mais que eu lhe affir¬ mei que era segurissimo, & quasi milagroso, me res¬ pondeo que se contentava com seguis o conselho do seu Medico, o qual lhe tinha dito que as sangrias, & ajudas, & alguns remedios conhecidos de todos o aviaon de livrar do perigo. Alguns impulsos tive de deixar ao doente , & despedirme logo; porque quem nao obe- dece ao que lhe manda o Medico, mostra que confia pouco nelle: & diz Galeno, (2.) que aquelle Mediço cura mais doentes, em quem mais doëtes consiam; mas porque sempre tive grandę respeito aos Doutores mais velhos, naon me quiz dar por sentido da repulsa do meu voto, como aconselha Seneca; (3.) antes quiz ver (co- mo de palanque) em que parava aquella doença nas mamos alheyas: mas sem embargo que odoente obede¬ ceo à risca aos preceitos do seu Medico, nem por isso teve alivio, antes de hora em hora peyoravao as quei- xâs com tao incomparavel excesso, que chegou a di¬ zer que os tormentos do inferno naon podiaon ser mayo¬ res que os que elle padecia, & que a Medicina era hu- ma Arte enganosa, & desnecessaria no mundo, pois nenhum remedio della lhe tinha aproveitado: lem¬ broulhe entaon a promessa que eu lhe avia feito, & com as lagrimas nos olhos me pedio lhe quizesse dar o re¬ medio, em que lhe tinha fallado, porque estava re¬ soluto a obedecerme em tudo, o que lhè ordenasse : & supposto eu estava escandalizado pelo desprezo que fez do meu conselho, pode tanto comigo acompaixaon de o ver em taon grande aperto , que mè esqueci da rai- va, que contra elle tivera, & assim lhe dei às seis horas do dia humas colheres de caldo de frangaon, em que misturei vinte granos de pò de quintilio: oqual reme¬ dio, como dizem gravissimos Authores, (4.) he o me¬ Ihor que ha para tirar estas dores, vencer os adorme¬ cimentos, quae de tal causa procederem: & foi taon gran¬ de
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148 Observações Medicas Doutrinaes. de a quantidade de coleras que evacuou por ambas as vias , que antes de passar hũa hora, reconheceo notavel melhoria ; mas porque ainda restavaõ alguns vestigios de dor , ordenei tomasse huma ajuda feita de cinco onças de cozimento de frangaõ , rim de vacca , & malvas , a que ajuntei huma onça de diaphenicaõ, duas de lambedor violado , huma gema de ovo , & huma onça de terebinthina de beta , lavada em agua de malvas , atè se fazer bem branca : porque naõ he dizivel a virtude , que esta ajuda tem para as colicas nephriticas : & para alimpar os rins das areas , & humores viscosos lhe fiz tomar tres vezes , em dias alternado , a seguinte conserva , que he excellentissima. De polpa de canafistula tirada de fresco meya onça , de ruibarbo polvorizado hum escropulos , de cremores de tartaro verdadeiros dous escropulos , misturese tudo, & se tome em jejum ; & passadas tres horas o fiz jantar ; & foi taõ maravilhoso o successo deste remedio, que viveo 23. annos depois desta cura com boa saude. 3. Innumeraveis dores nephriticas curei presentaneamente com os pòs de quintilio , desatando vinte grãos delle em tres onças de caldo de gallinha , ou em tres onças de agua commua ; ordenandolhes que naõ comessem , nem bessem cousa alguma , em quanto a dor perseverasse , ou ao menos em quanto naõ passassem vinte horas ; porque na opinião de Thomas Rodriguez da Veiga , (4.) & na minha experiencia, hum dos melhores remedios que ha ( depois dos pòs de quintilio ) paraque as dores nephriticas , & colicas se tirem , ou naõ cresçaõ , he a abstinencia do comer , & beber ; & os que fizerem o contrario , experimentaráõ muito à sua custa o grande damno , que o comer lhes faz , acrescentando as dores ao galarim. Alguns doentes tive , que naõ quizeraõ tomar o quintilio por medo dos vomitos que provoca ; aos quaes curei dando-lhes quatro onças de oleo de amendoas doces tirado sem fogo , em que mandei soltar duas onças de manná escolhido. Finalmente outros doentes tive com semelhantes dores , que naõ podendo melhorar com os so
148 Observações Medicas Doutrinaes. de a quantidade de coleras que evacuou por ambas as vias, que antes de paffar hua hora , reconheceo nota. vel melhoria; mas porque ainda reftavao alguns vef- tigios de dor , ordenei tomaffe huma ajuda feita de . cinco onças de cozimento de frangaõ, rim de vacca , . & malvas, a que ajuntei huma onça de diaphenicao, duas de lambedor violado, huma gema de ove, & hu- ma onça de terebinthina de beta, lavada emagua de malvas , atèfe fazer bem branca ; porque nao he dizi- vel a virtude, que efta ajuda tem para as colicas ne- phriticas : & para alimpar os rinsdas areas , & humo- res vifcofos lhe fiz tomar tres vezes, em dias alterna- dos, a feguinte conferva, que he excellentiffima. De polpa de canafiftula tirada de frefco meya onça, de ruibarbo polvorizado hum efcropulo, de cremores de tartaro verdadeiros dous efcropulos , mifturefe tudo, & fe tome em jejum ; & paffadas tres horas o fiz jan- tar ; & foi tao maravilhofo o fucceffo defte remedio, que viveo 23. annos depois defta cura com boa faude. 3. Innumeraveis dores nephriticas curei prefen- taneamente com os pos de quintilio , defatando vinte grãos delle em tres onças de caldo degallinh'a, ou em tres onças de agua commua; ordenandolhes que nao comeffem, nem beffem coufa alguma, em quanto a dor perfeveraffe, ou ao menos em quanto nao paffaf- fem vinte horas ; porque na opiniao de Thomas Ro .. driguez da Veiga, (4.) & na minha experiencia, hum dos melhores remedios que ha ( depois dos pòs de quintilio ) paraque as dores nephriticas, & colicas fe tirem , ou nao crefcao, hea abftinencia do comer , & beber ; & os que fizerem o contrario , experimentarád muito à fua cafta o grande damno, que o comer lhes. faz , acrescentando as dores ao galarim. Alguns doen- · tes tive, que nao quizerao tomar o quintilio por mer do dos vomitos que provoca ; aos quaes curei dando- lhes quatro onças de oleo de amendoas doces tirado fem fogo , em que mandei foltar duas onças de man- na efcolhido. Finalmente outros doentes tive com fe- melhantes dores., que nao podendo melhorar.com os fo- -- - .
14* Obfervacoes Medicas Doutrinaes. de a quantidade de coleras que evacuou por ambas as vias , que antes de paflar hua hora,reconheceo nota. vel melhöria; mas porque ainda reftava alguns vef- tigios de dor, ordenei tomaffe huma ajuda feita da cinco oncas de cozimento defranga, rim de vacca , & malvas, a que ajuntei huma.onca de diaphenica, duas de lambedor violado, huma gema de ove, & hu- ma.onca de terebinthina de.beta, lavadaemagua de malvas, atefe fazer bem branca ; porque na he dizir vel a :virtude, que efta ajuda tem para as colicas ne. phriticas : & para alimpar os rinsdas areas ,: & humo- res vifcofos lhe fiz tomar tres vezes, em dias alterna dos, a feguinte conferva, que he excellentiffima. De polpa de canafiftula tirada de frefco meya onca, d ruibarbo polvorizado hum efcropulo, de cremores de. tartaro verdadeiros dous efcrapulos , mifturefe tudo, & fe tome emjejum ; & paffadas tres horaso fiz jan- .tar, &foi ta maravilhofo o fucceffo defte remedio, que viveo 23. annos depois defta cura com boa faude. 3. Innumeraveis doresnephriticas curei prefen- taneamente com os pos de,quintilio , defatando vinte graos delle em tres oncas de caldo degallinha, ou em tres oncas de aguacommua; ordenandolhes que na comeffem, nem beffem coufa alguma,cm quanto a dor perfeveraffe, ou ao menos em quanto naö paffaf- fem vinte horas ; porque na opiniade Thomas Ro- . driguez da Veiga,(4.)& na minha experiencia, hum dos melhores remedios que ha ( depois dos:pos de quintilio ) paragueas dores nephriticas, & colicas.fs tirem,eu na crefca, hea abftinencia docomer , & beber ; & ós que fizerem o contrario, experimenrara muito afua cuftaogrande damno, que o comer lhes faz , acrefcentando as dores ao galarim.Alguns doen- tes tive, que naquizera tomar o quintilioporne Thes quatro ongas de oleo de amendoas doces tirado fem fogo, em que mandei foltar duas oncas de:man- na etco lhido. Finalmenteoutros doentes tive com fe- melhantes dores., que na podendamelhorar.com os 10
“tigios de dor, ordenei tomaíle huma ajuda feira de * rul — grãosdelle emtres onças de caldo degallinha, ou ém - das melhores remedios que ha ( depois dos:pôs de — muito àfuacnftao grande damno, que o comer lhes. 'testive, que naó quizeraó tomar o quintilio por me” * dhes quatro onças de oleo de amendoas doces tirado 148 Obfervações Medicas Dóutrinaes. de a quantidade de coleras que evacuou por ambas as “vias, que antes de paflar ha hora,treconheceo noras vel melhoria; mas porque ainda reftavao alguns vefz einco onças de cozimento de frangaõ, rimde vacca , & malvas , a que ajuntei huma onça de diaphenicaõ, duas de lambedor violado, huma gema de ovo, & hu- ma onça de terebinthina de beta, lavada emagua de malvas , atôfe fazer bem branca ; porque naô he dizi- — vel avirtude, que efta ajuda tem para as colicas ne- | phriticas : & para alimpar os rinsdas areas , & humo- res viícofos lhe fiz tomar tres vezes , em dias alterna- dos , 4 feguinte conferva, que he excellentiflima. De polpa de canafiftula tirada de frefco meya onça, de barbo polvorizado hum efcropulo, de cremores de. tartaro verdadeiros dous kr ulos , mifturefe tudo, & le tome emjejum; & paffa as tres horas o fiz jan- tar; & foi taô maravilhofo o fucceffo deite remedio, que viveo 23. annos depois defta cura com boa fanude. - 3. Innumeraveis doresnephriticas curei prefen» taneamente com os pôs de quintilio , defatando vinte tres onças de agua commua ; ordenandolhes que naã comeflem, nem beflem coufa alguma, em quanto a dor perfeverafle, ou ao menos em quanto naô páflaf. 'fem vinte horas; porque na opiniao de T'homas Ro.. driguez da Veiga, (4.) & na minha experiencia, hum quintilio ) paraqueas dores nepariticas , & colicas fg tirem , eu naó crefçaô, hea abitinencia do comer , & beber ; & 6s que fizerem o contrario , experimenrarãã faz , acrefcentahdo as dores ao galarim. Alguns doen+ do dos vomitos que provoca ; aos quaes curei dandor fem fogo , em que mandei foltar. duas onças He man- ná efcolhido. Finalmente outros doentes tive com fe-. melhantes dores, que naô podendo melhorar comos: : '
148 Observaçones Medicas Doutrinaes. de a quantidade de coleras que evacuou por ambas as vias, que antes de passar hua hora, reconheceo nota- vel melhoria; mas porque ainda restavaon alguns ves¬ tigios de dor, ordenei tomasse huma ajuda feita de cinco onças de cozimento de frangaon, rim de vacca, & malvas, a que ajuntei huma onça de diaphenicao, duas de lambedor violado, huma gema de ovo, & hu- ma onça de terebinthina de beta, lavada em agua de malvas, atè se fazer bem branca; porque naó he dizi- vel a virtude, que esta ajuda tem para as colicas ne- phriticas: & para alimpar os rins das areas, & humo¬ res viscosos lhe fiz tomar tres vezes, em dias alterna¬ dos, a seguinte conserva, que he excellentissima. De polpa de canafistula tirada de fresco meya onça, de ruibarbo polvorizado hum ęscropulo, de cremores de tartaro verdadeiros dous escropulos, misturese tudo, & se tome em jejum; & passadas tres horas o fiz jan¬ tar; & foi taon maravilhoso o successo deste remedio, que viveo 23. annos depois desta cura com boa saude. Innumeraveis dores nephriticas curei presen¬ taneamente com os pòs de quintilio, desatando vinte gramos delle em tres onças de caldo de gallinha, ou em tres onças de agua commua; ordenandolhes que nao comessem, nem bessem cousa alguma, em quanto a dor perseverasse, ou ao menos em quanto nao passas- sem vinte horas; porque na opiniaon de Thomas Ro¬ „driguez da Veiga, (4.) & na minha experiencia, hum dos melhores remedios que ha (depois dos pòs de quintilio) paraque as dores nephriticas, & colicas se tirem, ou naon cresçaon, he a abstinencia do comer, & beber; & os que fizerem o contrario, experimentaraò muito à sua custa o grande damno, que o comer lhes faz, acrescentando as dores ao galarim. Alguns doen¬ tes tive, que nao quizeraon tomar o quintilio por me¬ do dos vomitos que provoca; aos quaes curei dando- lhes quatro onças de oleo de amendoas doces tirado sem fogo, em que mandei soltar duas onças de man- na esco lhido. Finalmente outros doentes tive com se- melhantes dores, que naon podendo melhorar com os so¬
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Observaçaõ XXV. 149 sobreditos remedios , cobràraõ saude com o seguinte banho. Tomem dous arrateis de amendoas doces, pizemse muito bem , & se cozaõ em dous almudes de agua , & deitando este cozimento dentro de hũa tina, lhe misturem seis almudes de agua fria , & se misture hũa com outra muito bem, de tal sorte , que fique moderadamente quente , & dentro neste banho ordenei q estivesse o doente hũa hora , porque com semelhantes banhos tenho feito curas maravilhosas , como os curiosos poderáõ ver na minha Polyanthea da segunda impressaõ, trat. 2. cap. 87. fol. 551 de num. 12. até 16. aonde refiro (para credito da minha verdade) os nomes de alguns doentes, que curei com os ditos banhos por modo de milagre. OBSERVAÇAM XXV De huma dor de estomago , e ventre , acompanhada com febre , ourinas muito vermelhas , fastio excessivo , e repetidos vomitos de humor verde , que desprezando a muitos remedios singulares , só com huma purga ordinaria , e com as pilulas de hiera de Pachio , e hum especifico estomachico , que agora ensino a fazer em serviço do bem commum , sarou radicalmente . 1. ENganaõse os que tem para si que as ourinas naõ podem ser muito vermelhas por outra causa mais que por febres ardentes , ou por abundancia de coleras , ou por inflammações interiores ; porque se a vermelhidaõ das ourinas procedesse sómente de abundancia de coleras , amargariaõ ; e como a experiencia mostra que naõ amargaõ , antes saõ salgadas , bem se deixa ver que naõ saõ vermelhas só por copia das coleras . Nem tambem saõ vermelhas só por causa das febres ardentes , ou de inflammaçoens interiores , que fazendo circular o sangue com mais arrebatado movimneno , derretem mais porçaõ de partes sulphureas , e salinas , que misturandose com os soros , fazem as ourinas acesas ; porque se só por estas
Obfervação XXV. 149 fobreditos remedios, cobrarao faude com o feguinte banho. Tomem dous arrateis de amendoas doces, pi- zemfe muito bem, & fe cozao em dous almudes de agua, & deitando efte cozimento dentro de hűa tina, lhe mifturem feis almudes de agua fria, & fe mifture hűa com outra muito bem, de tal forte, que fique mo- deradamente quente, & dentro nefte banho ordenei q eftiveffe o doente hua hora, porque com femelhan- tes banhos tenho feito curas maravilhofas, como os curiofos poderáõ ver na minha Polyanthea da fegunda impreffao, trat. 2. cap. 87. fol. 55 1 de num. 12. atè 16. aonde refiro (para credito da minha verdade ) os no- mes de alguns doentes, que curei com os ditos banhos por modo de milagre. OBSERVAÇAM XXV. De buna dor de eftomago, & ventre , acompanhada com. febre , ourinas muito vermelhas , faftio exceffivo , & repetidos vomitos de humor verde, que defprezando a muitos remedios fingulares, fó com huma purga ordi- . naria, & com as pilulas de biera de Pachio, & bum especifico eftomathico, que agora enfino a fazer em fer- viço do bem commum , farou radicalmente. I. E Nganaofe os que tem para fi que as ouri- nas nao podem fer muito vermelhas por outra caufa mais que por febres ardentes, ou por abun+ dancia de coleras, ou por inflammações interiores; porque fe a vermelhidão das ourinas procedeffe fő+ mente de abundancia de coleras , amargariaõ ; & co- mo a experiencia moftra que nao amargao, antes fao falgadas, bem fe deixa ver que nao fao vermelhas f6 por copia de coleras. Nem tambem fao vermelhas fó por caufa das febres ardentes, ou de inflammaçoens interiores, que fazendo circular o fangue com mais arrebatado movimento , derretem mais porçaõ de partes fulphureas, & falinas , que mifturandofe com os foros , fazem as ourinas acefas ; porque fe fo por ef- tas
Obfervacao: XXV.: 149 fobreditos renedios, cobrarafaude com o feguinte banho. Tomem dous arrateis de amendoas doces, pi- zemfe muito bem, & fe coza em dous aiimudes de agua, & deitando efte cozinento dentrode hua tina, lhe miftürem feis almudes de agua fria, & fe mifture hua com outra muito bem, de tal forte, que fique mo- deradamentequente, & dentronefte banho ordenei q eftiveffe o doente hua hora , porque com femelhan- tes banhos tenhofeito curas naravilhofas, como os curiofos poderäo ver na minha Polyanthea da fegunda impreffaö, trat. 2. cap. 87. fol. 551 de num. 1 2. até 16. aonde refiro (para credito da minha verdade ) os no- mes de alguns doentes, que curei com os ditos banhos por modo de milagrc. OBSERVACAM 1 xxy. De buna dor de eftomago, & ventre , acoinpanbada com. febre; ourinas muito vermclbas, faftio exceffivo , s repetidos vomitos de bumor verde, que defprezando a muitos remediosfingulares, Jó com buma purga ordi- naria, com as pilulas de biera de Pachio, d bum efpecifico eftomathico, que agora enfeno a fazer emfer- viso do bem commim , Jarou radicalmente. Nganaofe os que tem para fi que as ouri- nas na podein fér muito vérimelhas por outra caufa mais que por febres ardentes,ou por abun- dancia de coleras, ou por inflammacöes interiores3 porque fe a vermélhida das ourinas procedeffe:f6 ménte de abundancia de coleras , amargaria ; & co moa experiencia moftra que na amargá, antes fa falgadas, bem fe deixa ver que nao faö vermelhas f6 por copia de coleras. Nem tambem fao vermelhas f6 porcaufadas febres ardentes, ou de inflammacoens interiores, que fazendo circular ofangue com mais arrebatado novimento , derretem mais porca de partes fulphureas , & falinas , que mifturandofe coin tas
a. Oblervaçõó XXXV: — 15 fobreditos remedios, cobràraô faude com o feguintê banho. Tomem dous arrateis de amendoas doces, piº zemfe muito bem , & fe cozao em dous almudes de agua, & deitando efte cozimento dentro de hãa tina, lhe mifturem feis almudes de agua fria , & fe mifture hãa com outra muito bem, de tal forte, que fique mo- deradamente quente , & dentro nefte banho ordenei 4 eftiveile o doente hãa hora , porque com femelhan- * tes banhos tenho feito auras maravilhofas, como os curiofos poderá ver na minha Polyanthea da fegunda imprefTaõ, trat. 2. cap. 87. fol. 551 denum. 12. atê 16. aonde refiro (para credito da minha verdade ) os no* mes de alguns doentes, que curei com os ditos banhos por modo de milagre. «OSSOeDS6 00 a SS ASS Co ao 3500 ao SÓ ta al 5 00 dl S SO do SS En E SOS DE SO aSEOS ó OBSERVAÇAM XXXV. De huma dor de eRomago, & ventre , aco mpanhada com. Jebre, ourinas muito vermelhas , faftio exceffivo , & . repetidos vomitos de bumor verde, que defbrezando a muitos remedios fingulares , [ó com huma purga ordi- nária, & com as pilulas de biera de Pachio,& hum — - . elbecifico eftomarhico, que agora enfino a fazer em fer" « “viçodo bem commium, farou radicalmente. 1. E Nganaófe os que tem para fi que as ouri* : nas naó podem fer muito vermelhas por outra caufa mais que por febres ardentes,ou por abun- dancia de coleras, ou por inflammações interiores; porque fe a vermelhidaô das ourinas procedefle: fó: mente de abundancia de coleras , amargariaô ; & cos mo experiencia moltra que naô amargãõ, antesfaõ.. falgadas , bem fe deixa ver que naó faó vermelhas fó . por copia de coleras. Nem tambem faó vermelhas fó por caufa das febres ardentes, ou de inlammaçoens interiores, que fazendo circular o fangue com mais arrebatado movimento , derretem mais porçaó de partes fulphureas ; & falinas , que mifturandofe com os foros, fazem as ourinas acefas ; porque feló por ef. ' 1 7 tas
149 Observaçaon XXV sobreditos remedios, cobràrao saude com o seguinte banho. Tomem dous arrateis de amendoas doces, pi¬ zemse muito bem, & se cozaô em dous almudes de agua, & deitando este cozimento dentro de hua tina, lhe misturem seis almudes de agua fria, & se misture huma com outra muito bem, de tal sorte, que fique mo¬ deradamente quente, & dentro neste banho ordenei que estivesse o doente hua hora , porque com semelhan- tes banhos tenho feito curas maravilhosas, como os curiosos poderaon ver na minha Polyanthea da segunda impressao, trat. 2. cap. 87. fol. 551 de num. 12. atè 16. aonde refiro (para credito da minha verdade ) os no¬ mes de alguns doentes, que curei com os ditos banhos por modo de milagre. OBSERVAQAM XXV. De humna dor de estomago, & ventre, acompanhada com febre, ourinas muito vermelhas, fastio excessivo, & repetidos vomitos de humor verde, que desprezando a muitos remedios singulares, so com huma purga ordi¬ naria, & com as pilulas de hiera de Pachio, & hum especifico estomachico, que agora ensino a fazer em ser- viço do bem commum, sarou radicalmente. Nganaonse os que tem para si que as ouri¬ 1. nas naon podem ser muito vermelhas por outra causa mais que por febres ardentes, ou por abun¬ dancia de coleras, ou por inflammaçones interiores; porque se a vermelhidao das ourinas procedesse so¬ mente de abundancia de coleras, amargariao; & co- mo a experiencia mostra que naon amargaon, antes saon salgadas, bem se deixa ver que nao sao vermelhas só por copia de coleras. Nem tambem sao vermelhas só por causa das febres ardentes, ou de inflammaçoens interiores, que fazendo circular o sangue com mais arrebatado movimento, derretem mais porçaô de partes sulphureas, & salinas, que misturandose com os soros, fazem as ourinas acesas; porque se so por es¬ tas
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150 Observações Medicas Doutrinaes. tas causas tivessem a dita cor , nem nas hydropesias , nem nas dores de colica , nem nas cruezas de estomago , e das veas appareceriaõ vermelhas , pois nestas doenças pela mayor parte naõ ha febre ardente , nem inflammaçaõ interior , nem circulaçaõ do sangue impetuosa ; comtudo vemos cada dia , que assim nas hydropesias , como nas colicas , e febres , que procedem de cruezas , saõ mui córadas as ourinas , e que se fazem algumas vezes vermelhas pela fraqueza do figado , dos rins , ou das veas , que naõ podendo apartar o sangue dos soros , os deixaõ ir juntos , como vemos nos hydropicos . Outras vezes se fazem vermelhas pela copia de cruezas , que enchendo os intestinos , naõ deixaõ sahir os excrementos , como vemos nas dores de colica . Outras vezes se fazem vermelhas pela fraqueza do estomago contrahida de largas enfermidades , ou de muito trabalho : nos quaes casos quem ( levado da vermelhidaõ das ourinas ) sangrar aos doentes , fará hum erro da mayor grandeza . E porque naõ cuide alguem que este dito he apocrifo , ou livremente proferido , me permittaõ que em confirmaçaõ desta verdade refira o seguinte caso , que nem será desagradavel o relatarse , nem deixará de ser util o saberse. 2. O Reverendo Padre Fr. Francisco , Religioso Carmelita Calçado , estando para fazer huma viagem ao Brasil com o cargo de Secretario do Padre Fr. Matheus , Provincial que hia ser da dita Ordem , antes de se embarcar acudio a muitos negocios , que o cansaraõ de maneira , que cahio em huma febre , fastio , e lassidaõ de todo o corpo : ao quaes symptomas sobrevieraõ humas ourinas muito vermelhas , e acesas ; e como a febre , e as mais queixas referidas tivessem o seu principio do excessivo trabalho , lhe ordenei que deixasse os negocios , e que naquelle dia tomasse duas ajudas purgativas , feitas de cinco onças de assucar mascavado , e meya onça de diaprunis , obrou com ellas copiosamente ; mas nem por isso sentio alivio , antes peyorou de sorte , que o mandei sangrar oito vezes ; porèm foraõ as sangrias taõ infelicemente succedidas ,
iso Obfervações Medicas Doutrinaes. tas caufas tiveffem a dita cor, nem nas hydropefias, nem nas dores de colica, nem nas cruezas de eftoma- go, & das veas appareceriaõ vermelhas, pois neftas doenças pela mayor parte naõ ha febre ardente, nem inflammaçaõ interior , nem circulaçaõ do fangue im- petuofa ; comtudo vemos cada dia, que affim nas hy- dropefias, como nas colicas, & febres , que proce- dem de cruezas , fao mui córadas as ourinas , & que fe fazem algumas vezes vermelhas pela fraqueza do fi- gado, dos rins , ou das veas, que naõ podendo apartar o fangue dos foros , os deixao ir juntos , como vemos nos hydropicos. Outras vezes fe fazem vermelhas pe- la copia de cruezas, que enchendo os inteftinos, na deixao fahir os excrementos, como vemos nas dores de colica. Outras vezes fe fazem vermelhas pela fra- queza do eftomago contrahida de largas enfermida- `des , ou de muito trabalho : nos quaes cafos quem (le- vado da vermelhidão das ourinas ) fangrar aosdoen- tes , fará hum erro da mayor grandeza. E porque nao cuide alguem que efte dito he apocrifo, ou livremente proferido , me permittaõ que em confirmaçaõ defta verdade refira o feguinte cafo, que nem fera defagra- davel o relatarfe, nem deixará de fer util o faberfe. 2. O Reverendo Padre Fr. Francisco , Religiofo Carmelita Calçado, eftando para fazer huma viagem ao Brafil com o cargo de Secretario do Padre Fr. Ma- theus, Provincial que hia fer da dita Ordem , antes de fe embarcar acudio a muitos negocios, que o canfarao de maneira, que cahio em huma febre, faftio , & lafi- dao de todo o corpo : aos quaes fymptomas fobrevie+ rao humas ourinas muito vermelhas , & acefas ; & co- mo a febre, & as mais queixas referidas tiveffem o feu principio do exceffivo trabalho, lhe ordenei que dei- xaffe os negocios, & que naquelle dia tomaffe duas ajudas purgativas , feitas de cinco onças de aflucar mafcavado, & meya onça de diaprunis, obrou com ellas copiofamente ; mas nem por iffo fentio alivio, antes peyorou de forte, que o mandei fangrar oito ve- zes ; porém forao as fangrias tao infelicemente fucce- didas 1
so Obfervacoes Medicas Doutrinaes tas caufas tiveffem a dita cor , nem nas hydropefias, nem nas dores de colica, nem nas cruezas de eftoma- go, & das veas appareceria vermelhas, pois neftas: doencas pelamayor parte na ha febre ardente, nem inflammaca interior , nem circulaca do fangue im petuofa; comtudo vemos cada dia , que affim nas hy- dropeffas, como nas colicas, & febres , que proce- dem de cruezas , fa mui c6radas as ourinas , & que fe fazem algumas vezes vermalhas pela fraquezado fi- gado, dos rins , ou das veas , que naö podendo apartar o fangue dos foros, os deixao ir juntos, comovemos nos hydropicos. Outras vezes fe fazem vermelhas pe- la copia de cruezas , que enchendo os inteftinos , na deixa fahir os excrementos, comovemos nas dores de colica. Outras vezes fe fazem vermelhas pela fra-- queza do eftomago contrahida de largas enfermida- des , ou de muito trabalho : nos quaes.cafos quem (le- vado da vermelhida das ourinas ) fangrar aosdoen. .tes, fara hum erro da mayor grandeza. E porque na cuide alguem que efte dito he apocrifo, ou livremente proferido , me permittaque em confirmaca defta verdade refira ofeguinte cafo, que nem.fera defagra- davel o relatarfe, nem deixara de fer util o faberfe. O Reverendo Padre Fr. Francifco , Religiofo Carmelita Calcado, eftando parafazer huma viagem ao Braffl com o cargo de Secretario do PadreFr. Ma- theus, Provincial que hia fer da dita Ordem , antes de fe embarcar acudia muitos negocios, que o canfara de maneira, que cahio em huma febre, faftio , & laff- dade todoocorpo : aos quaes fymptomas fobrevie ra humas ourinas muito.vermelhas, & acefas , & co- mo a febre, & as mais queixas referidas tiveffem o feu principio do exceffivo trabalho, lhe ordenei que dei- xaffe os negocios, & que naquelle dia tomaffe dua$! ajudas purgativas ; feitas de cinco oncas de affucar mafcavado, & meya Onca de diaprunis, obrou com antes peyorou de forte, que o mandei fangrar oito ve- zes ; porem foraas fangrias ta infelicemente fucce- didas
150 Obfervações Medicas Doutrinaes. tas caufas tiveflem a dita cor, nem nas hydropelias, nem nas dores de colica , nem nas cruezas de eltoma+- go , & das veas appareceriaô vermelhas, pois neftas doenças pela mayor parte naóô ha febre ardente, nem inflammaçaõ interior , nem circulaçaó do fangue im- petuofa ; comtudo vemos cada dia , que aflim nas hy- dropefias, como nas coliças, & febres , que proce- dem de cruezas , faó mui córadas as ourinas , & que fe fazem algumas vezes vermelhas pela fraquezado fi- gado , dos rins , ou das veas , que naó podendo apartar o fangue dos foros , os deixaó ir juntos , como vemos nos hydropicos. Outras vezes fe fazem vermelhas pe- la copia de cruezas , que enchendo os inteftinos , naõ - deixaô fahir os excrementos , como vemos nas dores de colica. Outras vezes fe fazem vermelhas pela fra-- tueza do eftomago contrahida de largas enfeirmida- des , ou de muito trabalho: nos quaes cafos quem (le- vado da vermelhidaõ das ourinas ) fangrar aosdoen- tes , fará hum erro da mayor grandeza. E porque naõ cuide alguem que efte dito he apocrifo, ou livremente proferido , me permittaó que em confirmaçao defta verdade refira o feguinte cafo , que nem ferá defapra- davel o relatarfe, nem deixará de fer util o faberfe. 2. O Reverendo PadreFr, Francifco, Religiofo Garmelita Calçado, eftando para fazer huma viagem ao Brafil com o cargo de Secretario do Padre Fr. Ma- theus, Provincial que hia fer da dita Ordem , antes de fe embarcar acudio a muitos negocios, que o canfáraõ de maneira, que cahio em huma febre , faftio , & laflis daõde todo o corpo : aos quaes fymptomas fobrevies raô humas ourinas muito vermelhas , & acefas ; & co“ moafebre, & asmais queixas referidas tiveflem o feu - prineipio do exceffivo trabalho, lhe ordenei que dei- xafle os negócios, & que naquelle dia tomaíle duas ajudas purgativas ; feiras de cinco onças de aflucar malcavado, & meya ónça de diaprunis , obron com ellas copiofamente ; mas nem por iflo fentio alivio, antes peyorou de forte, que o mandei fangrar oito vez zes; potêm foraõas fangrias taóinfelicemente fucce- didas — —
150 Observaçones Medicas Doutrinaes. tas causas tivessem a dita cor, nem nas hydropesias, nem nas dores de colica, nem nas cruezas de estoma- go, & das veas appareceriaon vermelhas, pois nestas doenças pela mayor parte naon ha febre ardente, nem inflammaçaon interior, nem circulaçaon do sangue im¬ petuosa; comtudo vemos cada dia, que assim nas hy¬ dropesias, como nas coliças, & febres, que proce¬ dem de cruezas, saon mui coradas as ourinas, & que se fazem algumas vezes vermelhas pela fraqueza do fi¬ gado, dos rins, ou das veas, que nao podendo apartar o sangue dos soros, os deixao ir juntos, como vemos nos hydropicos. Outras vezes se fazem vermelhas pe¬ la copia de cruezas, que enchendo os intestinos , nao deixaon sahir os excrementos, como vemos nas dores de colica. Outras vezes se fazem vermelhas pela fra- queza do estomago contrahida de largas enfermida¬ des, ou de muito trabalho: nos quaes casos quem (le- vado da vermelhidaon das ourinas ) sangrar aos doen- tes, fará hum erro da mayor grandeza. E porque naon cuide alguem que este dito he apocrifo, ou livremente proferido, me permittaon que em confirmaçaon desta verdade refira o seguinte caso, que nem serà desagra- davel o relatarse, nem deixará de ser util o saberse. 2. O Reverendo Padre Fr. Francisco , Religioso Garmelita Calçado, estando para fazer huma viagem ao Brasil com o cargo de Secretario do Padre Fr. Ma¬ theus, Provincial que hia ser da dita Ordem, antes de se embarcar acudio a muitos negocios, que o cansaraon de maneira, que cahio em huma febre , fastio , & lassi- daon de todo o corpo: aos quaes symptomas sobrevie¬ raon humas ourinas muito vermelhas, & acesas; & co¬ mo a febre, & as mais queixas referidas tivessem o seu principio do excessivo trabalho, lhe ordenei que dei¬ xasse os negocios, & que naquelle dia tomasse duas ajudas purgativas, feitas de cinco onças de assucar mascavado, & meya onça de diaprunis, obrou com ellas copiosamente; mas nem por isso sentio alivio, antes peyorou de sorte , que o mandei sangrar oito ve- zes; porem foraon as sangrias taon infelicemente succe¬ didas
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Observaçaõ XXV. 151 didas , que cahio em outra queixa mais penosa , porque o assaltàraõ dores de estomago taõ grandes , e intoleraveis , que perdia o juizo : deste excesso entendi que as taes dores procediaõ de copia de flatos , a que as cruezas deraõ causa , e para remedio de huma , e outra queixa lhe aconselhei bebesse agua cozida com macella , que para vencer dores de estomago , e de colica flatuosa he efficacissima , como certificaõ muitos Authores , (1.) e eu observei em hum Religioso Franciscano , que depois de padecer dous annos dores continuas de estomago , se livrou totalmente dellas com beber a dita agua ; mas como ella no caso presente nenhum proveito fizesse , entendi que as taes dores procediaõ de materias mordazes , e acido-salinas que picavaõ , e estimulavaõ as tunicas do estomago , e fundado nesta razonavel conjectura , me pareceo acertado darlhe huma purga , paraque evacuados os taes humores , o livrasse de taõ grande martyrio : porèm no mesmo dia , em que eu determinava darlhe a purga , crescèraõ tanto as dores , a febre , e o incendio das aguas , que tive medo de purgallo sem conselho de alguns Medidos mais experimentados : e como o doente visse que eu appellava a sua causa para outros Juizes , entendeo que mais era politica , e razaõ de estado , ( por elle ser hum Religioso grave ) do que medo , nem falta de ciencia ; e como assentasse nesta presumpçaõ , e tivesse de mim grande conceito , naõ quiz admitir outros votos , com que me foi preciso tomar sobre mim todo o peso da enfermidade ; resolvime a continuar com as sangrias , porque a febre , as dores de estomago , e o incendio das aguas continuavaõ : mas ( Deos nos livre ) fizeraõ tal estrago as que novamente mandei fazer , como se fosse o mais presentaneo veneno , porque àlem de acrescentarem as dores , e as ancias , lhe sobrevieraõ huns vomitos de humor taõ verde , que parecia çumo de ervas . 3. Neste conflicto entrei em diversas considerações : hũas vezes me parecia que a materia verde , que o doente vomitava , tinha por causa a grande quantidade
Obfervaçab XXV. didas , que cahio em outra queixa mais penofa, por- que o affaltàraõ dores de eftomago taõ grandes , & in- toleraveis, que perdia o juizo : defte exceffo entendi que as taes dores procediao de copia de flatos, a que as cruezas derao caufa, & para remedio de huma , & ou- tra queixa lhe aconfelhei bebeffe agua cozida com macella, que para vencer dores de eftomago, & de colica flatuofa he efficaciffima, como certificaõ mui- tos Authores , (1.) & eu o obfervei em hum Religiofo Francifcano, que depois de padecer dous annos dores continuas de eftomago, fe livrou totalmente dellas com beber a dita agua ; mas como ella no cafo prefen- te nenhum proveito fizeffe , entendi que as taes dores procediao de materias mordazes, & acido-falinas que picavaõ , & eftimulavao astunicas do eftomago; & fundado nefta razonavel conjectura, me pareceo acer- .tado darlhe huma purga, paraque evacuados os taes humores, o livraffe de tao grande martyrio : porem no mefmo dia, em que eu determinava darlhe a pur- ga , crefcerao tanto as dores, a febre, & o incendio das ·aguas , que tive medo de purgallo fem confelho de al- guns Medicos mais experimentados : & como o doen- te viffe que eu appellava a fura caufa para outros Juizes, entendeo que mais era politica, & razao de eftado, {por elle fer hum Religiofo grave ) do que medo, nem falta de ciencia; & como affentaffe nefta prefumpçao, & tiveffe de mim grande conceito, nao quiz admittir outros votos , com que me foi precifo tomar fobre mim todo o pefo da enfermidade ; refolvime a conti- nuar com as fangrias, porque a febre, as dores de efto- mago, & o incendio das aguas continuavaõ: mas(Deos nos livre ) fizerao tal eftrago as que novamente man- dei fazer , como fe foffe o mais prefentaneo veneno, porque àlem de acrescentarem as dores , &, as ancias, The fobrevierao huns vomitos de humor tao verde, que parecia cumo de ervas. 3. Nefte conflicto entrei em diverfas confidera- ções : hűas vezes me parecia que a materia verde, que :o doente vomitava, tinha por caufa a grande quanti- dade
Obfervaca6. XXV. isr didas, que cahio em outra queixa mais penofa, por- que o affaltara dores de eftoimago ta grandes , & in- toleraveis, que perdia ojuizo:defte exceffo cntendi que as taes dores procedia de copia de flatos, a que as cruezasderao caufa, & pararemedio de huma , & ou- :tra queixa lhe aconfelhei bebeffe agua cozida com macella, que para vencer dores de eftoinago, & de colica flatuofa he efficaciffima, como certifica mui- tos Authores , (1.) & eu o obfervei em hum Religifo Francifcano, que depois de padecer dous annos dores continuas de eftomago, fe livrou totalmente dellas com beber a dita agua ; mas como ella no cafo prefen- te nenhum proveitofizeffe, cntendi que as taes dores procedia de materias mordazes, & acido-falinas que picaya , & eftimulava astunicas do eftomag, & : fundado nefta razonavel conjectura,me pareceo acer- tado darlhe huma purga, paraque evacuados os tacs humores, o livraffe de ta grande martyrio : porem . no mefmodia, emqueeu determinava darlhe a pur- -aguas ; que tive medo de purgallo fem confelho de al- 'guns Medicos mais experimentados : & comoo doen- te viffe que eu appellava a fura caufa para outros Juizes, entendeo que mais era politica, & raza de eftado, (por elle fer hum Religiofo grave) do que medo, nein falta de ciencia; & como affentafle nefta prefumpcao, & tiveffe de mim grande conceito , niao quiz admittir :outros votos , com. que me. foi precifo tomar fobre mimtodoo pefo. daenfermidade ; refolvime a conti- nuar com as fangrias, porque a febre, as dores de éfto- : mago,& o incendio das aguas continuava: más(Deos :nos livre ) fizerao taleftrago as que novainente man- dei fazer , como fe foffe o mais.prefentaneo venerio, porque alemde acrefcentaremas dores , & as ancias, fhe fobreviera huns vomitos de humor ta verde que parecia cumo deervas: .: 3: . Nefte conficto.entrei em diverfas confidera- coes : huasvezes me parecia quea materia verde, que :o doente vomitava , tinha por caufa a grande quanti- dade.
| | Obletvaçãaob” XXV. ist didas, due cahio em outra queixa mais penofa , por- . queoaflaltãraô dores de eltomago taô grandes , &in- toleraveis, que perdia o juizo :defte exceflo entendi que as taes dores procediaó de eppia de flatos , a que as cruezas deraô caufa, & para remedio de huma ; & ou“ tra queixa lhe aconfelhei bebefle agua cozida com macella, que para vencer dores de eftomago, & de colica flatuofa he efficaciflima, como certificaô mui- tos Authores , (1.) & en o obferveiem him Religiofo Francifcano, que depois de padecer dous annos dores continuas de eftomago, fe livrou toralmente dellas com beber a dita agua ; mas como ella no cafo prefén- te nenhum proveito fizefle, entendi que as taes dores procediaõ de materias mordazes , & acido-falinas que picayao , & eftimulavaô astunicas do eltomago; & :fundado nefta razonavel conje&tura,me pareceo acer: tado darlhe huma purga, paraque evacuados os taes humores , o livrafle de taô grande martyrio : porém no meímo dia, em que eu determinava darlhe a pur- ga, crefcêraô tanto as dores, a febre, & o incendio das "aguas ; que tive medo de purgallo fem confelho de al- guns Medicos mais experimentados : & como-o doen- te vifle que eu appellava 4 fima caufa para outros Juizes, . —entendeo que fais era politica, & razao de eftado, «+ (por elle ferhum Religiofo grave ) do que medo, nem falta de ciencia; & como aflentafle nefta prefumpçaõ, & tivelle de mim grande conceito , H1aó quiz admitrir outros votos , com que ne foi precifo tomar fobre imimtodo o pefo da enfermidade ; refolvime acontiz o nuar com as fangrias, porquea febre; às dores de efto< | à mago,8& 6 incendio das aguas continuavaõo: más(Deos nos livre ) fizeraõ tal eftrago às que novamente man- dei fazer , como fe fofle o mais prefentaneo venerio, -porque àlem de acrefcentatemas dores, &,as atícias, : The tobrevieraô huns vomitos de humor taó verde ; - que parecia çcumo de ervás. : — 3. Nefteconfitoentrel em diverfas confidera- . «ções: htias vezes tie parecia que a materia verde, que : :odoente vomitava, tinha por caufa a grande quanti : ; E dade | ' Li EA ———
Observaçab XXV 151 didas, que cahio em outra queixa mais penosa, por¬ que o assaltàraon dores de estomago taon grandes, & in- toleraveis, que perdia o juizo: deste excesso entendi que as taes dores procediaon de copia de flatos, a que as cruezas deraon causa, & para remedio de huma, & ou¬ tra queixa lhe aconselhei bebesse agua cozida com macella, que para vencer dores de estomago, & de colica flatuosa he efficacissima, como certificaon mui¬ tos Authores, (1.) & eu o observei em hum Religioso Franciscano, que depois de padecer dous annos dores continuas de estomago, se livrou totalmente dellas com beber a dita agua; mas como ella no caso presen¬ te nenhum proveito fizesse, entendi que as taes dores procediaon de materias mordazes, & acido-salinas que picayaon, & estimulavaon as tunicas do estomago, & fundado nesta razonavel conjectura, me pareceo acer- tado darlhe huma purga, paraque evacuados os taes humores, o livrasse de taô grande martyrio: porèm no mesmo dia, em que eu determinava darlhe a pur¬ ga, crescèraon tanto as dores, a febre, & o incendio das aguas, que tive medo de purgallo sem conselho de al¬ guns Medicos mais experimentados: & comoo doen¬ te visse que eu appellava a sua causa para outros Juizes, entendeo que mais era politica, & razaô de estado, (por elle ser hum Religioso grave) do que medo, nem falta de ciencia; & como assentasse nesta presumpęao, & tivesse de mim grande concelto, naon quiz admittir outros votos, com que me fol preciso tomar sobre mim todo o peso da enfermidade; resolvime a conti¬ nuar com as sangrias, porque a febre, as dores de esto¬ mago, & o incendio das aguas continuavaon: mas (Deos nos livre) fizeraon tal estrago as que novamente man¬ dei fazer, como se fosse o mais presentaneo veneno, porque àlem de acrescentarem as dores, &, as aficias, lhe sobrevieraon huns vomitos de humor tao verde, que parecia çumo de ervas. 3. Neste conflicto entrei em diversas considera¬ çones: humas vezes me parecia que a materia verdè, que o doente vomitava, tinha por causa a grande quanti¬ dade
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152 Observações Medicas Doutrinaes. dade de humor azedo , que no intestino Duodendo se misturava , com o succo pancreatico , e lhe fazia naõ só aquella cor do mesmo modo que o vinagre deitado em hum vaso de prata o faz verde , mas excitava no dito intestino , e no ventre taes dores , e vomitos , e levado deste discurso entendia , que o verdadeiro remedio aviaõ de ser os absorbentes antacidos muito repetidos . Outras vezes me parecia que o humor verde era colera porracea , gèrada do grande incendio do figado , e entranhas naturaes : e confirmavame neste parecer , pela grande vermelhidaõ das ourinas ; e por consequencia assentava comigo que nenhum remedio avia de aproveitar tanto para as sobreditas queixas , como as sangrias repetidas , e applicaçaõ dos medicamentos refrigerantes . Outras vezes me parecia que o humor verde , as dores de estomago , a vermelhidaõ das ourinas , e os mais symptomas que o doente padecia , procediaõ de fraqueza , e diminuiçaõ do calor natural exhaustado com os cuidados , trabalhos , vigias , dores , e fastios , que o dito Religioso avia tido ; e que as sobreditas queixas de nenhuma sorte procediaõ de sobra de calor , antes de falta delle : o que se deixava conhecer nas paredes , e lugares humidos , que se o Sol os naõ aquenta , e enxuga com o calor dos seus rayos , se enchem de limos , e musgos verdes ; donde certamente se confirma que a humidade , e falta de calor procedem as verduras : assim que assentei firmemente com Amato Luʃitano , (2.) que os vomitos verdes , as ourinas vermelhas , e as dores do estomago procediaõ de frialdade da phlegma tinta com a dita verdura ; e acabei de confirmar isto , vendo que quanto mais o sangrava , e mais remedios frios lhe fazia , tanto peyor se achava . 4. Isto assim considerado , julguei que era conveniente suspender as sangrias , e os outros remedios ; antes em lugar delles ordenei tomasse a purga seguinte . Em quatro onças de cozimento fresco cordeal , com duas oitavas de folhas de sene , deitei de infusaõ dous escropulos de agarico trociscado , e meya onça de catho
152 Observações Medicas Doutrinaes. dade de humor azedo, que no inteftino Duodeno fe mifturava,com o fucco pancreatico, & lhe fazia nao fo aquella cor do mefmo modo que o vinagre deitado .em hum vafo de prata o faz verde, mas excitava no dito inteftino, & no ventre taes dores, & vomitos., & levado defte difcurfo entendia, que o verdadeiro re- medio aviao de fer os abforbentes antacidos muito re- petidos. Outras vezes me parecia que o humor verde 'era colera porracea, gèrada do grande incendio do fi- gado, & entranhas naturaes : & confirmavame nefte parecer , pela grande vermelhidao das ourinas; & por confequencia affentava comigo que nenhum remedio avia de aproveitar tanto para as fobreditas queixas, como as fangrias repetidas, & applicaçao dos medi- camentos refrigerantes. Outras vezes me parecia que o humor verde , as dores de eftomago , a vermelhidão das ourinas, & os mais fymptomas que o doente pa- decia , procediaõ de fraqueza, & diminuiçaõ do calor natural exhauftado com os cuidados, trabalhos, vi- gias , dores, & faftios , que o dito Religiofo avia tido; & que as fobreditas queixas de nenhuma forte proce- diao de fobra de calor, antes de falta delle : o que fe deixava conhecer nas paredes, & lugares humidos, que fe o Sol os nao aquenta, & enxuga com o calor dos feus rayos, fe enchem de limos, & mufgos ver- des; donde certamente fe confirma que da humidade, & falta de calor procedem as verduras: affim que af- fentei firmemente com Amato Lufitano, (2.) que os vomitos verdes , as ourinas vermelhas, & as dores de eftomago procediao de frialdade da phlegma tinta com a dita verdura;& acabei de confirmar ifto, vendo que quanto mais o fangrava, & mais remedios frios lhe fazia, tanto peyor fe achava. 4. Ifto affim confiderado, julguei que era conve- niente fufpender as fangrias, & os outros remedios; antes em lugar delles ordenei tomaffe a purga feguin- te.Em quatro onças de cozimento frefco cordeal,com duas oitavas de folhas de fene , deitei de infufao dous cfcropulos de agarico trocifcado , & meya onça de catho- -- 4 :
132 Obfervacoes Medicas Doutrinaes. dade dehumor azedo, que nointeftino Duoden fe mifturava,com o fucco pancreatico,& lhe fazia na f aquella cor do mefmo modo que o vinagre deitado em hum vafo deprata ofaz verde, masexcitava no dito inteftino,& no ventre taes dores, & vomitos., & levado defte difcurfo entendia, que o verdadeirore- medio avia de fer os abforbentes antacidos muito re- petidos. Outras vezes me parecia que o humor verde era colera porracea , gerada do grande incendio do f- gado , & entranhas naturaes : & confirmavame nefte parecer , pela grande vermelhida das ourinas; & por confequencia affentava comigo que nenhum remedio avia de aproveitar tanto para as fobreditas queixas, como as fangrias repetidas, & applicaca dos medi- camentos refrigerantes. Outras vezes me parecia que o humor verde, as dores de eftomago , a vermelhida das ourinas, & os mais fymptomas que o doénte pa- decia , procedia de fraqueza, & diminuica do calor natural exhauftado com os cuidados, trabalhos, vi- gias , dores, & faftios, que o dito Religiofo avia tido; & que as fobreditas queixas de nenhuma forte proce- dia de fobrade calor, antes de falta delle : o quefe deixava conhecer nas paredes, & lugares humidos, que fe oSol os naaquenta, & enxuga com ocalor dos feus rayos, fe enchem de limos, & mufgos ver- . des; donde certamente fe confrma que da humidade, & falta de calor procedem as verduras: affim que af fentei firmemente com AmatoLufitano., (2.) que os vomitos verdes, as ourinas vermelhas, & as dores do eftomago procedia de frialdade da phlegma tinta com a dita verdura;& acabei de confirmar ifto, vendo que quanto mais o fangrava, & mais remedios frios The fazia, tanto peyor feachava. 4. Ifto affim confiderado , julguei que era conve- niente fufpender as fangrias, & os outros remedios; antes e'm lugar delles ordenei tomaffe a purga feguin- te.Em quatro oncas de cozimento frefco cordeal,com duas oitavas de folhas de fene, deiteide infufadous cfcropulos de agarico trocifcado , & meya onca de catho-
152 Obfervações Medicas Doutrinaes. dade de humor azedo, que nointeftino Duodeno fe : miflturava,com o fucco pancreatico,& lhe fazia nao fó aquella-cor do mefmo modo que o vinagre deitado . em hum vafo deprata ofaz verde, mas excitava no dito inteftino , & no ventre taes dores, & vomitos,, & levado defte difeurfo entendia, que o verdadeiro re- . medio aviaó de fer os abforbentes antacidos muito re- petidos. Outras vezes me parecia que o humor verde “era colera porracea, gerada do grande incendio do fi- gado , & entranhas naturaes : & confirmavame nefte. parecer , pela grande vermelhidaô das ourinas; & por confequencia aflentava comigo que nenhum remedio avia de aproveitar tanto para as fobreditas queixas, como as fangrias repetidas, & applicaçaõó dos medi- camentos refrigerantes. Outras vezes me parecia que o humor verde , as dores de eftomago , a vermelhidaõ das ourinas, & os mais f(ymptomas que o doente pa- decia , procediaô de fraqueza, & diminuiçaô do calor natural exhauftado com os cuidados, trabalhos, vi- gias , dores , & faítios, que o dito Religiofo aviatido; & que as fobreditas queixas de nenhuma forte proce- diaô de fobra de calor, antes de falta delle: o que fe deixava conhecer nas paredes, & lugares humidos, que fe oSol os naó aquenta, & enxuga como calor dos feus rayos , fe enchem de limos, & muígos ver. des; donde certamente fe confirma que da humidade, & falta de calor procedem as verduras: afim que af- fentei firmemente com Amato Lufitano, (2.) que os vomitos verdes , as ourinas vermelhas, & as dores de eftomago procediaõ de frialdade da phlegma tinta com a dita verdura; & acabei de confirmar ifto, vendo Te quanto mais o Qangrava, & mais remedios frios lhe fazia , tanto peyor feachava. 4. If&oallim confiderado, julguei que era conve- niente fufpender as fangrias ; & os outros remedios; antes em lugar delles ordenei tomafíle a purga feguin- te.Em quatro onças de cozimento frefco cordeal,com duas oitavas de folhas de fene , deitei de infufaô dous elcropulos de agárico trocifeado , & meya onça de ! | cartho- | | qu a cantam
152 Observaçones Medicas Doutrinaes. dade de humor azedo, que no intestino Duodeno se misturava, com o succo pancreaticò, & lhe fazia naon só aquella cor do mesmo modo que o vinagre deitado em hum vaso de prata o faz verde, mas excitava no dito intestino, & no ventre taes dores, & vomitos, & levado deste discurso entendia, que o verdadeiro re- medio aviaon de ser os absorbentes antacidos muito re¬ petidos. Outras vezes me parecia que o humor verde era colera porracea, gèrada do grande incendio do fi- gado, & entranhas naturaes. & confirmavame neste parecer, pela grande vermelhidaon das ourinas; & por consequencia assentava comigo que nenhum remedio avia de aproveitar tanto para as sobreditas queixas, como as sangrias repetidas, & applicaçaon dos medi¬ camentos refrigerantes. Outras vezes me parecia que o humor verde , as dores de estomago , a vermelhidaon das ourinas, & os mais symptomas que o doente pa¬ decia, procediaon de fraqueza, & diminuiçaon do calor natural exhaustado com os cuidados, trabalhos, vi¬ gias, dores, & fastios, que o dito Religioso avia tido; & que as sobreditas queixas de nenhuma sorte proce- diao de sobra de calor, antes de falta delle : o que se deixava conhecer nas paredes, & lugares humidos, que se o Sol os nao aquenta, & enxuga com o calor dos seus rayos, se enchem de limos, & musgos ver- des; donde certamente se confirma que da humidade, & falta de calor procedem as verduras: assim que as¬ sentei firmemente com Amato Lusitano, (2.) que os vomitos verdes, as ourinas vermelhas, & as dores do estomago procediao de frialdade da phlegma tinta com a dita verdura; & acabei de confirmar isto, vendo que quanto mais o sangrava, & mais remedios frios Ihe fazia, tanto peyor se achava. 4. Isto assim considerado, julguei que era conve¬ niente suspender as sangrias, & os outros remedios; antes em lugar delles ordenei tomasse a purga seguin- te. Em quatro onças de cozimento fresco cordeal, com duas oitavas de folhas de sene, deitei de infusaon dous escropulos de agarico trociscado, & meya onça de catho¬
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Observaçaõ XXV. 153 catholicaõ atado em ligadura , e coandose depois de doze horas , ajuntei a esta bebida duas onças de xarope Rey . Com esta medicina teve o doente notavel melhoria ; mas porque ainda sentia alguns desejos de vomitar , e as ourinas naõ acabavaõ de tomar a cor natural , me pareceo darlhe , em tres dias interpolados , as pilulas de hiera de Pachio em quantidade de quatro escropulos , porque verdadeiramente saõ milagrosas para repurgar o estomago , e confortallo . Finalmente lhe aconselhei tomasse , em seis dias successivos , o meu Especifico estomachico , que tive muitos annos em segredo , mas por fazer este serviço à Republica , o quero revelar agora na fórma seguinte : Tomai de raizes de Jaro feitas em talhadinhas delgadas huma onça , metaõse em huma tigela vidrada cheya de vinho branco , e se deixem estar de infusaõ por espaço de doze horas ; passadas ellas , se deite fóra o vinho , e tornem a encher a tigela com outro tanto licor , e tornem a estar de infusaõ outras doze horas ; & passadas ellas , se deite fóra o vinho , e sequem as raizes à sombra , e entaõ tomem das sobreditas raizes assim preparadas meya onça , das tunicas interiores das muelas das gallinhas seccas ao sol duas oitavas e meya , de olhos de caranguejos preparados quatro oitavas , de galanga , canela , e sal de losna , de cada cousa destas dous escropulos , tudo se faça em pò subtil , e deste dem ao doente dous escropulos por cada vez , desatados em caldo de perdiz , ou de gallinha , ou em hua colher de xarope de cascas de cidra , ou em duas colheres de vinho tinto . Faltaõme palavras para dizer o grande proveito , q estes remedios fizeraõ ; porque dentro de doze dias se tiràraõ os vomitos , as dores , a febre , e o fastio ; e o q he mais , se reduziraõ as ourinas à sua cor natural , estando atè aquelle tepo vermelhas como sangue . 5. Daqui aprendaõ os Medicos modernos , que nem sempre que virem ourinas mui vermelhas , ou vomitos de humor verde , cuidem que procedem de quetura : e saibaõ que em taes casos he erro da primeira grandeza o sangrar , ou applicar remedios frios ; porque nas
Observação XXV. catholicao atado em ligadura, & coandofe depois de doze horas , ajuntei a efta bebida' duas onças de xaro- pe Rey. Com efta medicina teve o doente notavel me- lhoria; mas porque ainda fentia alguns defejos de vo- mitar, & as ourinas nao acabavaõ de tomar a cor na- tural , me pareceo darlhe, em tres dias interpolados, as pilulas de hiera de Pachio em quantidade de qua- tro efcropulos, porque verdadeiramente fao milagro- fas para repurgar o eftomago, & confortallo. Final- mente lhe aconfelhei tomaffe, em feis dias fucceffivos, o meu Efpecifico eftomachico, que tive muitos annos em fegredo, mas por fazer efte ferviço à Republica, o quero revelar agora na forma feguinte: Tomai de rai- zes de Jaro feitas em talhadinhas delgadas huma on- ça, metaofe em huma tigela vidrada cheya de vinho branco , & fe deixem eftar de infufao por efpaço de doze horas ; paffadas ellas, fe deite fora o vinho, & tornem a encher a tigela com outro tanto licor, & tor- nem a eftar de infufaq outras doze horas, & paffadas ellas , fe deite fora o vinho, & fequem as raizes à fom- bra, & entao tomem das fobreditas raizes affim pre- paradas meya onça, das tunicas interiores das muelas das gallinhas feccas ao fol duas oitavas & meya, de olhos de caranguejos preparados quatro oitavas, de galanga, canela, & fal de lofna, de cada coufa deftas dous efcropulos, tudo fe faça em pò fubtil, & defte dem so doente dous efcropulos por cada vez, defatados em caldo de perdiz , ou de galinha, ou em hua colher de xaropede cafcas de cidra, ou em duas colheres de vi- nho tinto. Faltaome palavras para dizer o grande pro- veito, g'eftes remedios fizerao; porque dentro de doze dias fe tirarao os vomitos, as dores, a febre, & o faftio; & o q he mais, fe reduzirao as ourinas à fua cor natu- ral, eftando atè aquelle tepo vermelhas como fangue. 5. Daqui aprendaõ os Medicos modernos, que nem fempre que virem ourinas mui vermelhas, ou vo- Smitos de humor verde, cuidem que procedem de qué- tura: & faibao que em taes cafe heerro da primeira grandeza o fangrar,ou applicar remedios frios; porque nas : :
.Obfervaca6 XXV: catholica atado em ligadura, & coandofe depois de doze horas ; ajuntei a tfta bebida' duas oncas de xaro- pe Rey.Com efta medicina teve odoente notavel me- horia ; mas porque aindafentia alguns defejos de vo- mitar, & as ourinas na acabavaode tomar a cor na- tural , me pareceo darlhe, em tres dias interpolados, as pilulas de hiera de Pachio em quantidade de qua- tro efcropulas, porque verdadeiramente fa milagro- fas para repurgar oeftomago, & confortallo. Final. nente lhe aconfelhei tomaffe, em feis dias fucceffivos, o meu Efpecifico eftomachico, que tive muitos annos sm fegredo, mas por fazer efte fervico & Republica, o quero revelar agora na fórma feguinte: Tomai derai- zes de Jaro feitas em talhadinhas delgadas huma on. pa, metafe em huma tigela vidrada cheya de vinho branco, & fe deixem eftar de infufa por efpaco de dozehoras, paffadas éllas, fe deite fóra vinho, & tornem a encher a tigela com outro tantolicor, & tor- nem aeftar de infufa outras doze horas, & paffadas ellas , fe deite fora o vinhg, & fequem as raizes a fom-. bra, &. entao tomem das fobreditas raizes affim pre- paradas meya onca:, das tunicas interiores das muelas das gallinhas féccas aofol duas oitavas & meya, de olhos decaranguejos preparados quatro oitavas, de galanga,.canela, & fal delofna, de cadacoufa deftas dous efcropulos,tudofe facaem p fubtil,& defte dem ao doente dous efcropulos por cada vez, defatados em caldo de perdizssu:de gallinha, ou em hua colher de xaropede eafcasdé cidra, ou émduas colheres de vi-. nhotinto. Faltaome palavras para dizer o grandepro- ueito,q'efres remedios:fizeraö;porque dentrodedoze diasfe tiraraos yomitos, as dores, afebre, & o faftio; & o he;mais, fe redoziraoas ourinas a fua cor natu- .ral., eftando ate aquelle tepo vermelhas:como fangue. .: : 5. .. Daqui aprendao os Medicos modernos, que ..nem fempre que vir m ourinas mti yermelhas, ou vo- &mitosde humor yarda,cuidemqus procedem de qut- tura: & faiba queem taes caf s hecrro da primeira grandezao fangraróu applicar remedigs frios;porque nas.
Oblervação XXXV. 168 catholicaô atado em ligadura , & coandofe depois de doze horas ; ajuntei a eta bebida duas onças de xaro- e Rey.Com efta medicina reve o doente notavel me- horia ; mas porque ainda fentia alguns defejos de vo- mitar, & as ourínas naó acabavaôo detomar acorna- . tural, me pareceo darlhe, em tres dias interpoladas, as pilulas de hiera de Pachio gm quantidade de qua- tro efcropulos, porque verdadeiramente faó milagro- — fas para repurgar oeftomago, & confortallo. Final- mente lhe aconfelhei tomafíle, em feis dias fucceflivos, o meu Efpecifico eftomachico, que tive muitos ânnos "em fegredo, mas por fazer efte ferviço à Republica, o quero revelar agora na fórma feguinte: Tomas de rai- : mes deJaro feitas emralhadinhas delgadas huma on wa, meraófe em huma tigela vidrada cheya de vinho branco , & fedeixem eftar de infufaô por efpaço de doze horas; paffadas éllas, fe deite fóra o vinho, & tornem a encher a tigela com outro tanto licor, & tor- nemaceftar de infufaô outras doze horas , & paffadas . ellas , fe deite fóra q vinhg, & fequemas raizes à fom- bra, & entao tomem das fobreditas raizes afim pre- paradas meya onça, das tunicas interiores das muelas das gallinhas féccas aofol duas eitavas & meya, de olhos de caranguejos preparados quarro oitavas, de galanga canela, & fal de lofha , de cada coufa deftas dauselerapulos,tudo fe faça em pô fubril,& defte dem 20 doente dous efcropulos por cada vez, defarados em . çaldo de perdiz s qu'de gallinha, ob em hãa colher de xaropedd cafcasdecidra , ou em+indt colheres de vi. nhotinto. Faltaóme palavras ata dizer o grande pro- "geito, j'eftes remedios fizeraó;porque dentro de doze dias fetiráraõ os vomiros, as dores, a-febre, & o faítio; & o à hemais., fe reduzira6 as ourinas à fua cor natu- ral, eftando atê aquelle tépo vermelhas.como fangue. «5. Daquiaprtendaó os Medicos medernos, que nem fempre que virêm ourinas mui yermelhas, ou vo- mitosdê humor vesde, cuidem que procedem de quê- - tura: & faibaó que em taes cafe heerra da primeira grandeza o fángrarou applicar remedios fris; porque too. LN e nas: CA . oo | | cum . ' " í
153 Observaçao XXV. catholicaon atado em ligadura, & coandose depois de doze horas, ajuntei a esta bebida duas onças de xaro¬ pe Rey. Com esta medicina teve o doente notavel me¬ horia; mas porque ainda sentia alguns desejos de vo¬ mitar, & as ourinas naon acabavaon de tomar a cor na¬ tural, me pareceo darlhe, em tres dias interpolados, as pilulas de hiera de Pachio em quantidade de qua- tro escropulos, porque verdadeiramente saon milagro¬ sas para repurgar o estomago, & confortallo. Final¬ mente lhe aconselhei tomasse, em seis dias successivos, o meu Especifico estomachico, que tive muitos annos em segredo, mas por fazer este serviço à Republica, o quero revelar agora na forma seguinte: Tomai de rai¬ zes de Jaro feitas em talhadinhas delgadas huma on¬ ça, metaôse em humà tigela vidrada cheya de vinho branco, & se deixem estar de infusaon por espaço de doze horas; passadas ellas, se deite fóra o vinho, & tornem a encher a tigela com outro tanto licor, & tor nem a estar de infusaon outras doze horas, & passadas ellas, se deite fora o vinho, & sequem as raizes à som- bra, & entaon tomem das sobreditas raizes assim pre¬ paradas meya onça, das tunicas interiores das muelas das gallinhas seccas ao sol duas oitavas & meya, de olhos de caranguejos preparados quatro oitavas, de galanga, canela, & sal de losna, de cada cousa destas dous escropulos, tudo se faça em pò subtil, & deste dem ao doente dous escropulos por cada vez, desatados em caldo de perdiz, ou de gallinha, ou em huma colher de xarope de eascas de cidra, ou em duas colheres de vi¬ nho tinto. Faltaome palavras para dizer o grande pro¬ ueito, que estes remedios fizeraon; porque dentro de doze dias se tiraraon os vomitos, as dores, a febre, & o fastio; & o quae he mais, se reduziraon as ourinas à sua cor natu¬ ral, estando atè aquelle tempo vermelhas como sangue. 5. Daqui aprendaon os Medicos modernos, que nem sempre que virem ourinas mui vermelhas, ou vo¬ umitos de humor verde, cuidem que procedem de quem¬ tura: & saibaon que em taes cases he erro da primeira grandeza o sangrar, ou applicar remedios frios; porque nas
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154 Observações Medicas Doutrinaes. nas colicas , nas hydropesias, e nas debilidades do estomago procedidas de grande trabalho , ou de muito estudo , e luxuria , ou de doença prolongada , costumaõ as ourinas ser muito vermelhas , como dizem muitos Doutores ; (3.) e nestes casos taõ longe estaõ as sangrias de ser boas , que antes saõ damnosissimas ; porque ( peloque experimentei neste Religioso ) conheci que semelhantes vomitos , dores , e ourinas devem ser curadas com purgas , e com remedios quentes, & confortativos do estomago, & naõ com sangrias , nem remedio frios . 6. E se alguem duvidar que as ourinas se podem fazer vermelhas por causa das cruezas , lea a Galeno , (4.) o qual tratando da febre quotidiana , que he acompanhada de cruezas , diz as seguintes palavras : Nas febres quotidianas vem as ourinas brancas , delgadas, grossas , ou vermelhas . Sobre este ponto se veja o doutissimo Pedro Miguel de Heredia , (5.) e a Francisco Henriques de Villa Corta , (6.) os quaes concordaõ uniformemente que a cor vermelha das ourinas , nem sempre he ſinal de quentura , nem de sobegidaõ de sangue ; mas que algumas vezes he ſinal de frialdade , de crueza , e de debilidade ; nos quaes termos avaliaõ por erro o sangrar . 7. Semelhante caso a este observei no Padre Luis Dias , Cappellaõ das Almas na Igreja de Saõ Paulo , o qual quantos mais vomitos verdes tinha , e quantas mais sangrias lhe davaõ , e remedios frios lhe faziaõ , tanto mais as ourinas se accendiaõ ; e sendo eu chamado para ver a este doente , e conhecendo que as dores , os vomitos verdes , e as ourinas vermelhas procediaõ naõ de grande calor , como erradamente se presumia ; mas de copia de phlegmas de cor verde pela falta de quentura , o purguei logo com a sobredita purga , fazendolhe tomar , em seis dias alternados , as pilulas de hiera de Pachio , e seis interpolados o meu Especifico estomachico , e com estes remedios teve perfeitissima saude . 8. Na rua da Pelada , freguesia de Nossa Senhora dos
154 Obfervações Medicas Doutrinaes. nas colicas , nas hydropefias, & nas debilidades do ef". tomago procedidas de grande trabalho, ou de muito eftudo,& luxuria,ou de doença prolongada,coftumaõ as ourinas fer muito vermelhas, como dizem muitos Doutores ; (3. ) & neftes cafos tao longe eftao as fan- grias d'e fer boas, que antes fao damnofiffimas ; por- que (peloque experimentei nefte Religiofo ) conheci que femelhantes vomitos, dores , & ourinas devem fer curadas com purgas , & com remedios quentes , & confortativos do eftontago, & naõ com fangrias, nem remedios frios. 6. / Efe alguem duvidar que as ourinas fe podem. fazer vermelhas .por caufa das cruezas, lea a Galeno, (4. )o qual tratando da febre quotidiana, que he acom- panhada de cruezas , diz as feguintes palavras: Nos. febres quotidianas vem as ourinas brancas , delgadas, groffas, ou vermelhas. Sobre efte ponto fe veja o dou! tiffimo Pedro Miguel de Heredia, (5.) & a Francifco Henriques de Villa Corta, (6.) os quaes concordam uniformemente que a cor vermelha das ourinas, nem fempre he final de quentura, nem de fobegidao de fan- gue ; mas que algumas vezes he final de frialdade, de crueza, & de debilidade ; nos quaes termos avaliao por erro o fangrar. 7. Semelhante cafo a efte obfervei no Padre Luis Dias, Cappellaõ das Almas na Igreja de Sao Paulo, o qual quantos mais vomitos verdes tinha , & quantas mais fangrias lhe davao, & remedios frios lhe faziaõ, tanto mais as ourinas fe accendiao; & fendo en cha- mado para ver a efte doente, & conhecendo que as dores, os vomitos verdes , & as ourinas vermelhas procediao naõ de grande calor , como erradamente fe. prefumia ; mas de copia de phlegmas de cor verde pe- la falta de quentura, o purgueilogo com a fobredita purga , fazendolhetomar , em feis dias alternados, as pilulas de hiera de Pachio , & feis interpolados o meu, Efpecifico eftomachico, & com eftes remedibs teve. perfeitiffima faude. 8. Na rua da Pelada, freguefia de Noffa Senhora dos 1
154 Obfervacoes Medicas Doutrinaes. nas. colicas , nas hydropefias, & nas debilidades do ef. tomagoprocedidas de grande trabalho, ou de. muito eftudo,& luxuria,ou de doenca prolongada,coftuma as ourinas fer muito vermelhas, como dizem muitos Doutorés ; (3.) & neftes cafos ta longeefta as fan- grias de ferboas, que antes fa damnofiffimas ; por- que(peloque experimentei nefte Religiofo) conheci que femelhantes vomitos, dores, &ourinas devem fer curadas com purgas , & com remedios quentes , &. confortativos do eftontago, & naö com fangrias, nem remedios frios. 6. : E fealguem duvidar que as.ourinas fe podem fazer vermelhas por caufa das cruezas,.lea a Galeno (4.)o qual tratando da febre quotidiana,que he acom- panhada de cruezas , diz as feguintes palavras: Nas febres. quotidianas vem as ourinas brancas , delgadasj groffas, ou xrmelbas. Sobre efte ponto fe veja o dou? tiffimo Pedro Miguel de Heredia, (5.) & a Francifca Henriques de Villa Corta, (6.) os quaes concorda& uniformemente que a cor vermelha das ourinas, nem fempre he final de quentura,nem de fobegidaö defan-- gue ; mas que algumas vezes he final de frialdade, de crueza, & de debilidade ; nos quaes termos avalia por erroo fangrar. 7. Semelhante cafoa efte obfervei no Padre Luis. Dias, Cappella das Almas na Igreja de Sa Paulöj o qual quantos mais vomitos verdes tinha, & quantas mais fangrias lhe dava, & remedios frios lhe fazia tanto mais as ourinasfe accendiaö; & fendoéu cha- mado para ver a efte doente, & conhecéndo que as dores, os vomitos :verdes , & as.ourinas vermelhas procedia na de grande calor , como erradamente fe. prefumia , mas de copiadephiegmas de cor verde pe- la falta de quentura, purgueilogo com a fobredita. purga, fazendolhe tomar, em feis dias alternados, as pilulas deKiera de Pachio , & feis interpolados:o meu: Efpecifico eftomachico, & com eftes remedibs teve perfeitiffumafaude. 8.. Narua daPelada, freguefiade Noffa Senhora dos
154 Obfervações Medicas Doutrinaes. nas colicas , nas hydropefias, & nas debilidades doef=. = tomago procedidas de grande trabalho , ou de. muito eftudo,& luxuria,ou de doença prolongada,coftumas as ourinas fer muito vermelhas, como dizem muitos Doutorês; (3. ) & neftes cafos taô longe eftaô as fan. grias de fer boas, que antes faô damnofiffimas ; por que (pelo ue experimentei nefte Religiofo ) conheci ue femelhantes vomitos , dores , 8&ourinas devem r curádas com purgas , & com remedios quentes , &. confortativos do eftontago , & naõ com fangrias, nerm. remedios frios. | | ” SNS 6. . Efealguem duvidar que as ourinas fe podem fazer vermelhas .por caufa das cruezas , lea a Galenp; (4.)o qual tratando da febre quoridiana,que he acom- anhada de cruezas , diz as feguintes palavras: Nag. febres quotidianas vem as ourinas brancas , delgadas, rolas, vu 'termelhas. Sobre efte ponto feveja o dou tifimo Pedro Miguel de Heredia, (5.) & a Francifco Henriques de Villa Corta, (6.) os quaes concorda& uniformemente que a cor vgrmelha das ourinas , nem fempre he final de quentura,nem de fobegidaõ de fan- gue ; mas que algumas vezes he final de frialdade, de =, crueza, & de debilidade ; nos quaes termos avalia&. por erro o fangrar. se 7. Semelhante cafoa efte obferveino Padre Luis | Dias, Cappellaô das Almas ra Igreja de Saó Paulo, o qual quantos mais vomitos verdes tinha , & quantas — | mais fangrias lhe davaõ , & remedios frios lhe faziaõ, tanto mais as ottrinasfe accendiaõ; & fendo eu cha- mado para ver a éfte doente , & conhecendo que as dores, os vomitos verdes , & as ourinas vermelhas procediaõ naó de grande calor , como erradamente fe. prefumia ; mas de copia dephlegmas decorverdepe- | la falta de quentura, opurgueilogo com afobredita | | purga , fazendolhetomar, em feis dias alternados , as pilulas de biera de Pachio , & feifinterpolados.o meu; Efpecifico eftomachico, & com eftes remedibs teve perfeitiflimafaude. +» - Es + | . 8. “Naruada Pelada, freguefia de Noffa Senhora dos . ' ' a . | quam | es
154 Observaçones Medicas Doutrinaes. nas colicas, nas hydropesias, & nas debilidades do es¬ tomago procedidas de grande trabalho, ou de muito estudo, & luxuria, ou de doença prolongada, costumaon as ourinas ser muito vermelhas, como dizem muitos Doutorès; (3.) & nestes casos tao longe estaon as san- grias dè ser boas, que antes sao damnosissimas; por¬ que (peloque experimentei neste Religioso ) conheci que semelhantes vomitos, dores, & ourinas devem ser curadas com purgas, & com remedios quentes, & confortativos do estomago, & naon com sangrias, nem remedios frios. 6. E se alguem duvidar que as ourinas se podem fazer vermelhas por causa das cruezas, lea a Galeno, (4.)o qual tratando da febre quotidiana, que he acom- panhada de cruezas, diz as seguintes palavras: Nas, febres quotidianas vem as ourinas brancas, delgadas, grossas, ou hermelhas. Sobre este ponto se veja o dou¬ tissimo Pedro Miguel de Heredia , (5.) & a Francisco Henriques de Villa Corta, (6.) os quaes concordao uniformemente que a cor vermelha das ourinas, nem sempre he sinal de quentura, nem de sobegidaon de san- gue; mas que algumas vezes he sinal de frialdade, de crueza, & de debilidade; nos quaes termos avaliao por erro o sangrar. Semelhante caso a este observei no Padre Luis 7. Dias, Cappellaon das Almas na Igreja de Saon Paulo, o qual quantos mais vomitos verdes tinha, & quantas mais sangrias lhe davaon, & remedios frios lhe faziaon, tanto mais as ourinas se accendiaon; & sendo eu cha¬ mado para ver a este doente, & conhecendo que as dores, os vomitos verdes, & as ourinas vermelhas procediaon naon de grande calor, como erradamente se presumia; mas de copia de phlegmas de cor verde pe¬ la falta de quentura, o purguei logo com a sobredita purga, fazendolhe tomar, em seis dias alternados, as pilulas de hiera de Pachio, & seis interpolados o meu Especifico estomachico, & com estes remedibs teve perfeitissima saude. 8. Na rua da Pelada, freguesia de Nossa Senhora dos
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Observaçaõ XXV. 155 dos Martyres , curei semelhantes dores , e vomitos verdes , a hum homem , chamado Gaspar Ferreyra , sem o sangrar ; mas só com o purgar com hum cozimento cordel , em que infundi quatro oitavas de catholicaõ em ligadura , e lhe ajuntei , depois de coado , duas onças de xarope Rey , acabando esta cura com as pilulas de hiera de Pachio , que tomou seis vezes em dias alternados , em quantidade de quatro escropulos . 9. He de advertir , que tambem as ourinas sahem algumas vezes muito vermelhas por fraqueza do figado , dos rins ou das entranhas , ou por relaxaçaõ da boca das veas , como succede aos que andaõ muito tempo a cavallo , aos muito luxuriosos , e aos que estaõ muito sangrados ; nos quaes casos quem os sangra , os mata , porque se fazem hydropicos : como vi succeder a tres doentes , que deitando sangue pelo nariz de cor de lavadura de carne , e ourinas muito vermelhas , o sangràraõ contra o meu voto , e dentro de quinze dias se ſizeraõ hydropicos , e morrèraõ . 10. Naõ nomeyo aos tres sugeitos mortos por esta causa , porque se naõ saiba quaes foraõ os complices daquellas desgraças . E tornando ao fio desta Observaçaõ , digo que aos doentes , que ourinaõ sangue , ou ourinas ensanguentadas por fraqueza , ou laxidaõ das veas , lhes constumo acudir com confortativos exteriores de cozimento de balaustias , murta , maçãa de acipreste , cascas de romãs , de bolotas , e de castanhas , ordenandolhes que tomem noventa dias em jejum hum quartilho de leite de ovelhas acabado de mungir daquelle instante , porque deste modo tem toda a virtude ; e assim o aconselha Galeno (7.) fallando com os Medicos sobre o modo com que se deve tomar o leite : Guardareis , e observareis como grande preceito , e ley inviolavel , que o leite se tome acabado de mungir , estando o animal na presença de quem o ouver de tomar . E em outra parte diz : (8.) Metereis o animal , de que se ouver de tomar o leite, no mesmo aposento , em que o doente estiver , paraque se tome no mesmo instante, sem se meter tempo em meyo , porque se se esſriar , perde muita
: Obfervação . XXV. 155 dos Martyres, curei de femelhantes dores, & vomitos verdes,a hum homem,chamado Gafpar Ferreyra, fem o fangrar ; mas fó com o purgar com hum cozimen- to cordeal , em que infundi quatro oitavas de catholi- cao em ligadura ; & lhe ajuntei, depois de coado, duas onças de xarope Rey , acabando efta cura com as pi- lulas de hiera de Pachio, que tomou feis vezes em dias" alternados, em quantidade de quatro efcropulos. . 9. He de advertir, que tambem as ourinas fahem algumas vezes muito vermelhas por fraqueza do fi -: gado, dos rins, ou das entranhas, ou por relaxaçaõ das bocas das veas', como fuccede aos que andaõ mui- to tempo a cavallo; aos muito luxuriofos, & aos que eftao muito fangrados ; nos quaes cafos quem os fan- gra, os mata, porque fe fazem hydropicos : como vi fucceder a tres doentes , que deitandOfangue pelo na- riz de cor de lavadura de carne , & ourinas muito ver- melhas , o fangrarao contra o meu voto, & dentro de quinze diasfe fizerao hydropicos , & morrerao. 10. Nao nomeyo aos tres fugeitos mortos por ef- ta caufa, porque-fe nao faiba quaes foraõ os compli- ces daquellas defgraças. E tornando ao fio defta Ob- fervaçao, digo que àos doentes, que ourinao fangue, ou ourinas enfanguentadas por fraqueza, ou laxidao das veas, lhes coftumo acudir com confortativos ex- teriores de cozimento de balauftias , murta, maçãa de aciprefte , cafcas de romas, de bolotas, & de caf- tanhas .; ordenandolhes que tomem noventa dias em jejum hum quartilho de leite de ovelhas acabado de mungir daquelle inftante, porque defte modo tem to- da a virtude ; & affim o aconfelha Galeno (7.) fallan- do com os Medicos fobre o modo com que fe deve to- mar 'o leite : "Guardareis , & obfervareis como grande preceito , & ley inviolavel, que o leite fe tome acabado de mungir , eftando o animal na prefenga de quem o ouver de tomar. E em'outra parte diz : (8.) Metereis o animal, de que fe ouver 'de tomar o leite , no mesmo apofento, em que o doenteeftiver , paraque fe tome no mesmo inftante, fem fe meter tempo em meyo, porque fe fe esfriar , perde.
. Obfervacao :XXV. 1s s dos Martyres, curei de femelhantes dores, & vomitos verdes,a hum homem,chamado Galpar Ferreyra,ien ofangrar ; mas f6 com o.purgar com hum cozimen- ca em ligadura, & lhe ajuntei, depois de'coado, duas oncas de xarope Rey , acabandoefta cura com as pi- lulas de hiera de Pachio, que tomou feis vezes em dias* alternados, em quantidade de quatro efcropulos. 9. He de advertir , que tambem as ourinas fahem algumas vezes muito vermelhas por fraqueza do fi-: gado, dos rins, ou das entranhas, ou por relaxaca das bocas das veas, como fuccede aos que andao mui- to teinpo a cavallo, aos muito luxuriofos, & aos que efta muito fangrados , nos quaes cafos quem os fan- gra, os imata, porque fe fazem hydropicos : como vi fucceder a tres doentes , que deitand fangue pelo na- riz de cor de lavadura de carne, & ourinas muitover- melhas, fangraracontra o meu voto,& dentro de quinze dras fe fizera hydropicos , & morrera. 1o. Na nomeyo aos tres fugeitos mortos.pdr ef ta caufa, porque fe na faiba quaes fora os compli- Ces daquellas defgracas. E tornando ao fio defta Ob- fervaca, digo que áos doentes, queourina fangue, ou .ourinas enfanguentadas por fraqueza, ou laxida das veas, lhes.coftumo acudir com Confortativos ex- teriores de cozimento debalauftias, murta, macaa de aciprefte, cafcas de romas ,.de bolotas, & de caf- tanhas.; ordenandolhes que tomem noventa dias em jejum hum quartilho de leite de ovelhas. acabado de mungir daquelle inftante , porqué defte nodo tem to- da a virtude ; & affim o aconfelha Galeno(7.) fallan- do com os Medicos fobre o modo com que fe.deve to- mar oleite:Guardarcis, obfervarei como grande preceito , lcy inviolavel, que teitefe tone acabado de nungir , eftando o dnimal napre/enga de quem o ouver de tomar. E emoutra parte diz : (8.) Metereis o animal, de que fe ouver de tomar o leite, no.mefino apofent, em yue o ddentettftiver , par aque.fe tome no.mefmo inftante, Jémfe meter tempo em meyo, porquc. fefe esfriar ,perde.
| — : Obfervação -XXV. 158 dos Martyres, curei de femelhantes dores, & vomitos verdes,a hum homem,chamado Gafpar Ferreyra,fem “ofangrar; masfócom o purgar com hum cozimen- º to cordeal , em que infundi quatro oitavas de catholi- : | caô em ligadura ; & lhe ajuntei, depois de coado, duas onças de xarope Rey ; acabando efta cura com as pi- lulas de hiera de Pachio, que tomou feis vezesem dids* * o ' alternados, em quantidade de quatro efcropulos. 9. Hedeadvertir, que tambem as ourinas fahem —“, ' algumas vezes muito vermelhas por fraqueza do fi-' gado, dos rins, ou das entranhas, ou porrelaxaçao — e das bocas das veas, como fuccede aos que andaôó mui- : to tempo a cavallos aos muito luxuriofos, & aos que efjaô muito fangrados ; nos quaes cafos quem os fan- , gra, os mara, porque fe fazem hydropicos; como vi | «+ , « — fuccederatres doentes, que deitand8&fangue pelo na- . . Yizdecordelavaduradecarne, & ourinas muito Ver- ' —amelhas,ofangrâraó contra o meu voto, & dentro de quinze dras fe fizeraõô hydropicos , & morrêraõ. 10. Naônomeyoaostres fugeitos mortos pór ef- tacaula, porque fe naô fáiba quaes foraô os compli- |: cesdaquellas defgraças. E tornando do fio defta Ob- fervaçaô, digo que às doentes , que ourinaô fangue, ou .ourinas enfanguentadas por fraqueza, ou laxidaõ das veas, lhes coftumo acudir com conforrativos ex- teriores de cozimento de balaufítias ., murta, maçãa de aciprefte , cafcas de romãs , de bolotas, & de caf- tanhas; ordenandolhes que,tomem noventa dias em jejum hum quartilho de leite de ovelhas acabado de mungir daquelle inftante , porque defte nfodo tem to- da a virtude; & aflim o aconfelha Galeno (7.) fallan- do com os Medicos fobre o modo com que fe deve to- mar o leite :*Guardareis , & obfêrvaret como grande preceito & ley inviolavel, que o leite fe tome acabado de mungir , eftando o animal na prefênça de quem o ouver - de tomar. E em outra parte diz : (8.) Metereu o animal, "de quef ouver We tomar o leite , nome/ino apofento , em que o dbentete/liver , parague fe tome no mefino inftante, Leme meter tempo em meyo, porque fefe esfriar , Abe : Do JT. MU . ..
Observaçaon XXV. 155 dos Martyres, curei de semelhantes dores, & vomitos verdes, a hum homem, chamado Gaspar Ferreyra, sem o sangrar; mas só com o purgar com hum cozimen¬ to cordeal, ende que infundi quatro oitavas de catholi- caon em ligadura , & lhe ajuntei, depois de coado, duas onças de xarope Rey; acabando esta cura com as pi¬ lulas de hiera de Pachio, que tomou seis vezes em diás alternados, em quantidade de quatro escropulos. He de advertir, que tambem as ourinas sahem 9. algumas vezes muito vermelhas por fraqueza do fi¬ gado, dos rins, ou das entranhas, ou por relaxaçaon das bocas das veas, como succede aos que andaon mui to tempo a cavallo; aos muito luxuriosos, & aos que estaò muito sangrados; nos quaes casos quem os san¬ gra, os mata, porque se fazem hydropicos : como vi succeder a tres doentes, que deitandosangue pelo na- riz de cor de lavadura de carne, & ourinas muito ver- melhas, o sangràraon contra o meu voto , & dentro de quinze dias se fizeraon hydropicos, & morrèraon. 10. Naon nomeyo aos tres sugeitos mortos pór es¬ ta causa, porque se naon saiba quaes foraon os compli¬ ces daquellas desgraças. E tornando ao fio desta Ob servaçaon, digo que àos doentes, què ourinaon sangue, ou ourinas ensanguentadas por fraqueza, ou laxidad das veas, lhes costumo acudir com confortativos ex¬ teriores de cozimento de balaustias, murta, maçama de acipreste, cascas de romans, de bolotas, & de cas- tanhas; ordenandolhes que tomem noventa dias em jejum hum quartilho de leite de ovelhas acabado de mungir daquelle instante, porquè deste modo tem to¬ da a virtude; & assim o aconselha Galeno (7.) fallan do com os Medicos sobre o modo com que se deve to mar ò leite: Guardareis, & observareis como grande preceito, & ley inviolavel, que o leite se tome acavado de mungir, estando o animal na presença de quem o ouver de tomar. E em outra parte diz: (8.) Metereis o animal, de que se ouver de tomar o leite, no, mesmo aposento, em que o ddenteestiver, paraque se tome no mesmo instante, sem. se meter tempo em meyo, porque se se essriur, perde mn .
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156 Observações Medicas Doutrinaes. muita parte da sua virtude , e com facilidade se corrompe . OBSERVAÇAM XXVI. De huma surdez antiga , que por se desprezar no principio , tomou tanta posse , que quando se quiz curar , zombou das diligencias da Arte ; & sendo eu chamado , lhe appliquei alguns remedios taõ singulares , que dentro de vinte dias ouvio taõ claramente , como quando tinha saude mui perfeita . 1 . O Padre Luis Gomes , morador na rua da Adiça , freguesia de Saõ Pedro de Alfama , sem causa manifesta cahio em hum zunimento de ouvidos , & como nos princìpios naõ fizesse caso do tal achaque , cresceo de maneira com o tempo , que ficou surdo ; vendose o pobre Sacerdote neste estado , quando avia de buscar os Medicos mais doutos para que o curassem , chamou a hum barbeiro ignorante , o qual sem conhecer a causa do mal , nem donde procedia o atormentou com variedade de remedios barbaramente applicados ; & sem embargo que em castigo do seu deslumbramento , era justo que nenhum Medico letrado lhe quizesse acudir , nem encarregarse de hum caso taõ mal parado , por senaõ expor a risco de que lhe imputassem qualquer sinistro acontecimento ; comtudo por amor de Deos sofrem os homẽs muitas cousas , porque , como diz Glaubero , ( 1 . ) aonde falta o seu amor nenhuma cousa boa se póde esperar ; mas avendo-o , até aos estranhos , & peregrinos devemos acudir , como aconselha Hippocrates , ( 2 . ) sendo hum gentio . Assim que depois de tantos erros feitos me chamàraõ para curar a este enfermo , o qual vendose surdo , & sem esperanças de remedio , perdia a paciencia , e naõ sabia o que fizesse , nem com que Santo se pegasse paraque lhe valesse : pois o sentido de ouvir
156 Observações Medicas Doutrinaes. muita parte da fua virtude, & comfacilidade fecor- rompe. .OBSERVAÇAM XXVI. De huma furdez antiga , que por fe defprezar no princi- pio , tomou tanta poffe, que quando fe quiz curar.,; zombou das diligencias da Arte ; & fendo eu chamado, lhe appliquei alguns remedios tao fingulares, que den- tro de vinte dias ouvio tao claramente,como quando ti- nha faude mui perfeita. I. 0 Padre Luis Gomes, morador na rua day Adiça, freguefia de Sao Pedro de Alfa- ma", fem caufa manifefta cahio em hum zunimento de ouvidos, & como nos principios nao fizeffe cafo do. tal achaque, crefceo de maneira com o tempo , que fi- cou furdo ; vendofe o pobre Sacerdote nefte eftado, quando avia de bufcar os Medicos mais doutos para- que o curaffem', chamou a hum barbeiro ignorante, o qual fem conhecer a caufa do mal, nem donde pro- cedia, o atormentou com variedade de remedios bar- baramente applicados ; & fem embargo que em cafti- go do feu deslumbramento, era jufto que nenhum, . Medico letrado lhe quizeffe acudir, nem encarregar- fe d'e hum cafo tao mal parado, por fenao expor a rif- co de que lhe imputaffemi qualquer finiftro aconteci -. mento ; comtudo por amor de Deosfofrem os homes muitas coufas, porque, como diz Glaubero,(1.) aonde falta o feu amor nenhuma coufa boa fe pode efperar; mas avendo-o', até aos eftranhos , & peregrinos deve- mos acudir', como aconfelha Hippocrates,(2.) fendo. hum gentio. Affim que depois de tantos erros feitos me chamarao para curara efte enfermo, o qual ven- dofe furdo, & fem efperanças de remedio, perdia a paciencia, & naõ fabia o que fizeffe, nêm com que Santo fe pegaffe paraque lhe valeffe : pois o fentido de ouvir
1s6 Obfervacöes Medicas Doutrinacs. muita parte da fua virtude, comfacilidade fecor ronpe. O B S.E R V A'C A M XXVI.: De buma furdez antiga, que por fe defprezar no princi- pio , tomou tanta pofJe, que quando fe quiz curar. : zombou das diligencias da Arte ; fendo eu chamado, lbe appliquei álguns remedios ta fingulares , que den- tro de vinee dias ouvio ta.claraménte,como quando ti- nba faude mui perfeita. Padre Luis.Gomés, morador na rua da? ma, fem caufa manifefta cahio em hum zunimento de ouvidos, & como nos principios na,fizeffe cafo do tal achaque, crefceo de maneira com o tempo , que f- cou furdo,; vendofe o pobre Sacerdote nefteeftado, quando avia de bufcar os Medicos mais doutos para* queocuraffem, chamou a hum barbeiro ignorante, o.qual fem conhecer a caufa domal , nem donde pro- cedia, o atormentou com variedade de remedios bar- baramente applicados ; & fern embargo que em cafti- go do feu deslumbramento, era jufto que nenhum. Medico letradolhe quzeffe acudir, nemencarregar- co de que lhe imputaffemi qualquer finiftro aconteci-: mento ; cointudo por amor dé Deosfofrem os homés muitas coufas, porque,como diz Glaubero,(1.) aonde falta o fcu amor nenhuma coufa boa fe p6de efperar mas avendo-o, até aos eftranhos, & peregrinos deve- mos acudir, como aconfelha Hippocrates,(2.) fendo* hum gentio. Affim que depois de tantos erros feitos dofe furdo, &.fem efperancas de reniedio, perdia a paciencia, & na fabia o que fizeffe, n@m cm que Santo fe pegaffe paraquelhe valeffe : pois o fentido de .ouvir
156 Oblervações Medicas Doutrinaes. "muita parte da fua virtude, & comfacilidade fecors rompe. | co5S0> 03500 aos Sc anti Oo an Sá to ans 5Oo as Son SS OSSOS OS Sto Sto cdi Sm ºOBSERVAÇAM XXVI. De buma furdez antiga , que por fe defbrezar no princi- . pio , tomou tanta pole , que quando fé quiz curar, : ' * zomboudasdiligenciasda Arte; && fendo eu chamado, . lhe apbliquei alguns remedios tao fingulares «que dew-" o tro de vinte dias ouvio tao.claramênte,como quando ti- ec SO nha faude mui perfeita. S ao T. Padre Luis Gomés , morador na rua das o : AMliça, freguelfia de Saó Pedro de Alfa- ma", fem caufa manifefta cahio em hum zunimento de « — ouvidos, &como nos principios naõ fizefle cafo do. tal achaque , crefceo de maneira com o tempo, que fi- coufurdo ; vendofe o pobre Sacerdote nefte eltado, ' quando avia de bufcar os Medicos mais doutos para< . queocuraffem”, chamou a hum barbeiro ignorante; s Ooqualfíemconhêecer acaufadomal, nem donde pro* cedia, o atormentou com variedade de remedios bar- baramente applicados ; & fem embargo que em cafti-- : go do feu deslumbramento, era jufto que nenhum; «+ Medicoletradolhe quizeffe acudir, nemencarregar=" fede-hum cafo taó mal parado, por fenaõ expór a rif. co de que lhe imputaflemt qualquer finiftro aconteci=-- mento ; corhtudo por amor dê Deosfofrem os homês muitas coufas, porque,como diz Glaubero,(1.) aonde falta o feu amor nenhunta coufa boa fe póde elperar; . mas avendo-o, até aos eftranhos, & perêgrinos deves mos acudir, tomo aconfelha Hippocrates,(2.) fendo* hum gentio. Affim que depois de tantos erros feitos me chamãiraõ para curara efte enfermo , o qualven-, | dofe furdo, &lem efperanças de renfedio, perdia a paciencia, & naô fabia o que fizefle, nêm côm que Santo fe Pegaíle paraquelhe valeffe: pois o fentido de . : es E CG Ouvir . OU Sa
156 Observaçones Medicas Doutrinaes. muita parte da sua virtude, & com facilidade se cor¬ rompe. OBSERVAQAM XXVI. De huma surdez antiga, que por se desprezar no princi¬ pio, tomou tanta posse, que quando se quiz curar, zombou das diligencias da Arte; & sendo eu chamado, lhe appliquei alguns remedios tao singulares, que den¬ tro de vinte dias ouvio tao, claramente, como quando ti¬ nha saude mui perfeita. Padre Luis Gomes, morador na rua da Miça, freguesia de Saon Pedro de Alfa¬ ma', sem causa manifesta cahio em hum zunimento de ouvidos, & como nos principios naon fizesse caso do tal achaque, cresceo de maneira com o tempo, que fi- cou surdo ; vendose o pobre Sacerdote neste estado, quando avia de buscar os Mędicos mais doutos para- que o curassem, chamou à hum barbeiro ignorante, o qual sem conhecer a causa domal, nem donde pro- cedia, o atormentou com variedade de remedios bar- baramente applicados; & sem embargo que em casti- go do seu deslumbramento, era justo que nenhum¬ Medico letrado lhe quizesse acudir, nem encarregar- se de hum caso taon mal parado, por senaon expor a ris¬ co de que lhè imputassem qualquer sinistro aconteci¬ mento; comtudo por amor dê Deos sofrem os homens muitas cousas, porque, como diz Glaubero, (1.) aonde falta o seu amor nenhuma cousa boa se pode esperar; mas avendo-o, até aos estranhos, & peregrinos deve- mos acudir, como aconselha Hippocrates, (2.) sendo hum gentio. Assim que depois de tantos erros feitos me chamàraon para curara este enfermo, o qual ven- dose surdo, & sem esperanças de renedio, perdia a paciencia, & nao sabia o que fizesse, nem côm que Santo se pegasse paraque lhe valesse: pois o sentido de ouvir
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Observaçaõ XXVI. 157 ouvir he precisamente necessario tanto para a prudencia , quanto para aprender todas as boas artes ; pois por falta deste sentido parecem os homens parvos , & ignorantes , porque lhes faltaõ as portas por onde entraõ as doutrinas , & os conselhos ; & por isso disse Horacio , ( 3 .) que naõ ha homem taõ barbaro , & feroz, que naõ se amanse , & abrande , se der ouvidos a quem o ensine , & encaminhe . Nesta desconsolaçaõ o alentei , dizendo que eu sabia alguns remedios particulares , com que esperava o avia de restituir à sua antiga , & perfeita saude . Grande foi o alento , & confiança, que o doente cobrou com esta boa nova , & por isso se entregou nas minhas mãos paraque o curasse ; & para eu o fazer com acerto , puz grande cuidado em conhecer a causa da doença , porque conforme a ella se devem applicar os remedios . 2 . Muitas vezes procede a surdez de fluxo de humor colerico , que correo para os ouvidos : outras vezes procede de febres ardentes , ou malignas : outras vezes procede de algum tumor , callo , leicenço , verruga , ou outra qualquer cousa interior , ou exterior , que fecha o orgaõ auditorio : outras vezes ( & saõ as mais dellas ) procede de humores frios , & grossos , ou de intemperança fria , & humida . 3 . Se a surdez procede de fluxo de humor , que correo para os ouvidos , conhecese , se virmos que succede depois de faltarem alguns cursos , ou suor , a que a natureza era costumada : esta surdez se cura purgando, ou dando algum sudorifico para tornar a chamar a mesma evacuaçaõ , que faltou : se procede de febres ardentes , ou malignas , como vemos cada dia , conhecese , porque sobrevem a ellas , & se cura , curando a febre : se procede de inflammaçaõ do ouvido , conhecese , porque a dor he muito grande , & pulsatoria , & vem acompanhada com febre , & esta se cura com sangrias , & com todos os remedios , que pertencem às inflammações : se procede de algum tumor , callo , verruga , leicenço , ou outra qualquer cousa interior , conhecese com os olhos do Medico , & curase com as mãos
Obfervaçao . XXVI." 157 ouvir hie precifamente rieceffario tanto para à pruden- cia, quanto para argender todas as boas artes; pois por falta defte fentido.parecem oshomens parvos , & ignorantesy porque lhes faltao as portas por onde en -. traoas doutrinas, & os confelhos; & poriffo diffe Ho- racio; (3.) que naoha homem tag barbaro, & feroz .; · que nao fe amanfe; & abrande, fe der ouvidos a quem o enfine, & encaminhe. Nefta defconfolaçao o alen: tei, dizendo que. eu dabia alguns remedios particulat res , com que efperava o' avia de reftituir à fua antiga, & perfeita faude: Grande foi o alento 3 & confiança, que o doente cobrou com efta boa nova, & por iffo fe entregou nas minhas mãos paraque o curaffe; & para eu o fazer com acerto, puz grande cuidado em conhe- cer a caufa'da doença , porque conforme a ella fe de- vem applicar os remedios. 2. Muitas vezes procede a furdez de fluxo de hu- mor colerico, que correo para os ouvidos : outras ve- zes procede de febres ardentes, ou malignas : outras vezes procede de algum tumor, callo, leicenço , ver- ruga, ou outra qualquer coufa interior , ou exterior; que fecha o orgao auditorio : outras vezes ( & fao as mais dellas ) procede de humores frios , & groffos, ou de intemperança fria, & humida. 3. Se a furdez, procede de fluxo de humor, que correo para os ouvidos, conhecefe, fe virmos que fuc- cede depois de faltarem alguns curfos , ou fuor , a que à natureza era coftumada: efta furdez fe cura purgan- do, ou dando algum fudorifico para tornar a chamar a mefma evacuação:, que faltou : fe procede de febres ardentes, ou malignas, como vemos cada dia , conhe- cefe , porque fobrevem a ellas, & fe cura, curando a febre : fe procede de inflammaçao do ouvido, conhe- cefe, porque a dor he muito grande, & pulfatoria, & vem acompanhada com febre, & efta fe cura com fan+ grias, & com todos'os remedios, que pertencem às in- . flammações : fe procede de algum tumor , callo , ver- . ruga, leicenco, ou outra qualquer coufa interior , co- nhecele com os olhos do Medico, & curafe com as mãos
. + Obfervacao.- XXVI. - 157 uvir fe precifamente'rieceffario tantopara a pruden- cia,quanto para apender todas as boas.artes; pois por faladefte feritidoparecem:oshomens parvos , & ignorantes, porqae Ihes faltaó as:portas por öde en.. traöasdautrinas, & os confelhos, & por iffo diffe Ho- racio:; (3:.)que naha homem.taa barbaro, & feroz; que naófe amanfe,&abrandé, feder ouvidos a quem o enfine:, & :encaminhe. Nefta dtfconfolaca5 o alen: tei,, dizendo que.eufabia algns.remedios:particulat res , com que efperavaoaviade reftituir:a fua antiga, & perfeita faude:..Grande foi oalento3 &:confianca' que o doente cobrou:com efta boa nova , & por iffo fe entregou nas minhas maos paraqueocuraffe ; & para eu o fazer: com acerto, puz grande cuidado ém conhe- cer a caufa'da doenca , porque conforme a ella fe de- vem ayplicar os remedios. Muitas vezes.procede a furdez de fluxo de hu- 2.. mor colerico , que'correo para os ouvidos : outras ve- zes procede defebres ardentes, oumalignas : outras vezes procede de algum tumor , callo, leicengo, ver- ruga, .ou outra qualquer coufa interior , ou exterior, quefechaoorgaöauditorio: outras vezes (& fa as mais dellas ) procede de humores frios , & groffos, ou de intemperancafria, & humida. 3:. Se a furdez: procede de fuxode humor, que Correo para os ouvidos, conhecefe, fe virmos que fuc- cede depois de faltarem alguns curfos , ou fuor , a que a natureza era coftumada: efta furdez fe cura purgan- do, ou dando algum fudorifico. para tornar a chamar a mefma evacuaca:,:quefaltou : fe procede de febres ardentes, ou malignas; como vemos cada dia , conhé- cefe,porque fobrevem a ellas, &fe cura,:curando a febre : fe procede de inflammaca do ouvido, conhe- cefe, porque ador he muito grande , & pulfatoria, & veim acompanhada com febre, & efta fe cura com fan grias, & com todos'os remedios, que pertencem as in- Alammacoes : fe procede de algum tumor , callo , ver- ruga, leicenco, ou outra qualquer coufa interior , co- nhecefe.com os olhos do Medico, & .curafe com as maos
esmo Obfervaçãoo XXVISO 147 onvit Tie precifamente rieceffario tanto para à pruden- cia quanto para aryender todas as boas artes; pois por faltadefte (eritido-parecem-os homens parvos y & ignorantes; porquelhes falta -dsuportas por oitde er. traóoasdaeútrinas, & os copfelhos; & por iflo difle Ho- racio; (3.) que naó-ha homem: .vaã barbaro; & feroz; : que nai fe amante; & abrande , fedter ouvidos a quem o enfine,, & encaminhe. Nefta diefconfolaça6 o alen- tei dizéndo que. eutabia algnris remedios particular tes, com que efperavá o avia de reftituir:à fma antiga, & petfeita faude:. Grande foi 0-alento ;& confiança, que o doente cobrou-com efta boa nova, & periflo fe entregou nas minhas mãos paraque o eurafle ; & para eu o fazer. com acerto, uz grande cuidado em conhe- cer a caufa lá doença , porque conforme:a ella fe de- vemapplicar os remedios. E : - 2. “Muiras tezes.procede a furdez de fluxo de huz mor calerico , que correo para os ouvidos - outras vez zes procede defebres ardentes, ou malignas: outras vezes procede de algum tumor , callo, leicenço, ver= ruga, ou outra qualquer coufa interior, ou exterior; quefechao orgao auditorio: outras vezes ( & faó as mais dellas ) procede de humores frios , & groflos; ou de intemperançadria, & humida. | CNN 3. Sea furdez procede de fluxo de humor, que : correo pára-os ouvidos, conhecefe, fe virmos que fuc- cede depois de faltarem alguns curfos , ou fuor , a que à natureza era coftumada ; efta furdez fe cura purgan- do , ou dando algum fudorifico. para tornar a chamar a mefima evacuaçaõ:,que faltou: fe procede de febres ardentes, ou malignas, como vêmos cada dia , conhe- cefe , porque fobrevema ellas ,'& fe cura , curando a febre fe procede de inlammaçaõ do ouvido, conhe» cefe, porque a dor he muito grande , & pulfaroria, & vem acompanhada com febre , & efta fe cura com fan= grias, & com todos'os remedios, que pertencem às in- flammações: fe procede de algum rumor , callo , ver- : ruga, leicenço, ou outrá qualquer coufa interior , co- nhecele com os elhos do Medico, & curafe comas mãos ESTADO oo
Observaçao XXVI. 157 ouvir he precisamente necessariò tanto para à pruden¬ cia, quanto para aprender todas as boas artes; pois por falta deste sentido parecem oschomens parvos, & ignorantes;, porque lhes faltaon as portas por onde en¬ traon as doutrinas, & os conselhos; & por isso disse Ho¬ racio, (3.) que naon fia homem taque barbaro, & feroz, que naon se amanse, & abrande, se der ouvidos a quem o ensine, & encaminhe. Nesta desconsolaçao o alen¬ tei, dizendo que eusabia alguus remedios particulat res, com que esperavâ o avia de restituir à sua antiga, & perfeita saude: Grande foi o alento; & confiança, que o doente cobrou com esta boa nova , & por isso se entregou nas minhas manos paraque o curasse; & para eu o fazer com acerto, puz grande cuidado em conhe¬ cer a causa da doença, porque conforme a ella se de- vem applicar os remedios. 2. Muitas vezes procede a surdez de fluxo de hu¬ mor colerico, que correo para os ouvidos: outras ve¬ zes procede de febres ardentes, ou malignas: outras vezes procede de algum tumor, callo, leicenço, ver- ruga, ou outra qualquer cousa interior, ou exterior, que fecha o orgao auditorio: outras vezes (& sao as mais dellas) procede de humores frios, & grossos, ou de intemperançafria, & humida. 3. Se a surdez procede de fluxo de humor, que correo para os ouvidos, conhecese, se virmos que suc¬ cede depois de faltarem alguns cursos, ou suor, a que à natureza era costumada: esta surdez se cura purgan¬ do, ou dando algum sudorifico para tornar a chamar a mesma evacuaçaon, que faltou: se procede de febres ardentes, ou malignas, como vemos cada dia, conhé¬ cese, porque sobrevem a ellas, & se cura, curando a febre : se procede de inflammaçaon do ouvido, conhe- cese, porque a dor he muito grande , & pulsatoria , & vem acompanhada com febre, & esta se cura com san¬ grias, & com todos'os remedios, que pertencem às in¬ flammaçones: se procede de algum tumor, callo, ver- ruga, leicenço, ou outrà qualquer cousa interior, co- nhecese com os olhos do Medico, & curase com as maos
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158 Observações Medicas Doutrinaes. mãos do Cirugiaõ : se procede de algumas bostellas , ou leicenços , que avia na cabeça , & se recolhèraõ , como já vi , todo o remedio consiste em purgar , & abrir fontes , ou causticos na mesma parte : se finalmente procede de humores frios , & humidos , ou de semelhante destemperança , conhecese pelo temperamento do doente , pela vida que teve , pelos ares em que assiste : & como o sobredito Sacerdote fosse sujeito a fluxões catarrhosas , & vivesse em bairro taõ humido , como he o de Alfama , entendi q a surdez procedia dos humores frios , & grossos , que na cabeça redundavaõ ; os quaes humedecendo a membrana Meringe ( chamada vulgarmente Tympano ) fazião a surdez : porq para ouvir se requere no orgão auditorio hũa bem proporcionada secura , & q a Meringe esteja estendida , & naõ froxa , ou bamba : porque assim como se o couro de hũ tambor se molha , logo afroxa , & naõ faz som capaz de excitar os animos ; da mesma sorte se a membrana Meringe se humedece , & afroxa mais do que he razaõ , por causa de algum humor , que nella cahio , naõ póde o tal homem perceber as vozes do q com elle fallarem . 4 . Assentado pois que a causa da sobredita surdez eraõ os humores frios , & lymphaticos , que na cabeça se geravaõ , ou a ella de outras partes vinhaõ , era preciso preparar os taes humores com os seguintes xaropes , que mandei tomar em cinco dias successivos pela manhãa , & à noite na fórma seguinte . Tomem de folhas de betonica , & de cardo santo , de semente de funcho , & de cabeças de hyssopo , de cada cousa destas hum punhado , cozãose em vaso de barro com tres quartilhos de agua commua , & coada ella , ajuntém a cada quatro onças deste cozimento huma onça de xarope de rosmaninho , & outra de oximel . Acabados de tomar os taes xaropes , purguei os humores com a seguinte bebida . Em quatro onças de cozimento fresco cordeal com duas oitavas de folhas de sene , & hum escropulo de semente de funcho fiz infundir dous escropulos de bom agarico trociscado , & quatro onças de conserva Alexandrina ; & coandose tudo com forte ex -
158 Observações Medicas Doutrinaes. mãos do Cirurgiaõ: feprocede de algumas boftellas, ou leicencos , que avia na cabeça, & fe recolherao, como já vi, todo o remedio confifte em purgar ; & abrir fontes, ou caufticos na mefma parte : le final- mente procede de humores frios, & humidos, 'ou de femelhante deftemperança, conhecefe pelo tempera- mento do doente, pela vida que teve, pelos ares em que affifte : & como o fobredito Sacerdote foffe fujeito a fluxoes catarrhofas , & viveffe em bairro tao humido, como he o de Alfama, entendi q a furdez procedia dos humores frios, & groffos, que na cabeça redundavao; os quaes humedecendo a membrana Meringe ( cha- mada vulgarmente Tympano ) fazião a furdez : porq para ouvir fe requere no orgão auditorio huabem pro- porcionada fecura, & q a Meringe efteja eftendida, & nao froxa, ou bamba: porque affim como fe o couro de hu tambor fe molha, logo afroxa, & nab faz fom capaz de excitar os animos; da mefma forte fe a membrana Meringe fe humedece, &afroxa mais do que he razao por caufa de algum humor, que nella cahio, nao podeo tal homem perceber as vozes dos q com elle fallarem. 4. Affentado pois que a caufa da fobredita furdez erao os humores frios , & lymphaticos, que na cabeça fe geravao, ou a ella de outras partes vinhaõ , era pre- · cifo preparar os taes humores com os feguintes xaro- pes , que mandei tomar em cinco dias fucceffivos pela manhãa, & à noite na forma feguinte. Tomem de fo- lhas de betonica , & de cardo fanto, de femente de' funcho, & de cabeças de hyffopo, de cada coufa def. tas hum punhado, cozaofe em vafo de barro com tres quartilhos de agua commua, & coada ella, ajuntem a cada quatro onças defte cozimento huma onça de xarope de rofmaninho, & outra de oximel. Acabados de tomar os gaes xaropes , purguei os humores com a 'feguinte bebida. Em quatro onças de cozimento fref- co cordeal com duas oitavas de folhas de fene, & hum efcropulo de femente de funcho fiz infundir dous ef- cropulos de bom agarico trocifcado, & quatro onças de conferva Alexandrina; & coandofe tudo com forte ex- ----
138. Obfervacoes.Medicas Doutrinac$ maos do Cirurgia:: fe procede dealgumas boftellasy ou leicencos , que avia na cabeca, & ferecolheray como jä vi, todo o.remedio confifte em purgar , & abrir fontes, ou caufticos na mefma parte: fe final-. 'mente procede de humores frios, &humidos, ou de femelhante deftemperanca, conhecefe pelo tempera- como he o de Alfama,entendi a furdez procedia dos humores frios, & groffos, que na cabeca redundavaö; os quaes humedecendo a nembrana Meringe. ( cha- mada vulgarmente Tympano ) faziaoa furdez : pora para ouvir fe requere noorgaoaudirorio húabeni pro- naö froxa,ou bamba: porque affim como fe o couro de de excitar os animos; da mefina forte fe a membrana Meringe fé humedece,&afröxa mais do que he razaöj por caufa de algum humor,que nella cahio;na póde tal homem perceber as vozes dos q com elle fallarém: 4. Affentado pois que a caufa da fobredita furdez eraö os humores frios , & lymphaticos, quc na cabeca fc geravaö, ou a ella de outras partesvinha , era pre- - cifo preparar os taes humores com osfeguintes xaro- pes , que mandei tomar em cinco dias fucceffivos pela. manhaa, & anoite na forma feguinte. Tomem de fo- Ihas de betonica , & de cardofanto, de feménté de: funcho, & de cabecas dehyffopo, decada coufa def tas hum punhado, cozaöfe em vafo debarro com tr&? quartilhos de agua commua, & coadaella, ajuntém a cada quatrooncas defte cozimento huma onca de xarope de rofmaninho,& outra de oximel. Acabados feguinte bebida. Em quatro oncas de cozimento fref- co cordeal com duas oitavas de folhas de fene, & hum efcrapulo de femente de funcho fiz. infundir dous ef- cropulos de bom agarico trocifcado, & quatro oncas de conferva Alexandrina ; & coandofe tudo comforte ex-
158 Obfervações Medicas Doutrinaes. mãos do Citurgiaô:. feprocede de algumas boftellas, ou leicenços , que avia na cabeça , & le recolhêraõ, como já vi, todo ó remedio confifte em purgar , & abrir fontes , ou cauíticos na mefma parte: le final. mente procede de humoresftios , & humidos, ou de femelhante deftemperança, conhecefe pelo tempera. mento do doente, pela vida que teve, pelos ares em que aflifte: & como o fobredito Sacerdote fofTé fujeito à - fluxões catarrhofas , & vivefle em bairro raóhumido, como he o de Alfama, entendi j a furdez procedia dos humores frios, & groflas, que na cabeça redundavaõ; os quaes humedecendo à membrana Meringe ( cha“ mada vulgarmente Tympano ) fazião a furdez : porq para ouvir fe requere no orgão audirtorio húabem pro: porcionada fecura , & q a Meringe efteja eftendida, & naó froxa,ou bamba: porque aflim como fe o couro de hã tambor fe molha, logo afroxa,& na6 faz fom capaz de excitar os animos; da melma forte fe a membranãà Meringe fe humedece,&afroxá mais do que he razaõ;; por caufa de algum humor, que nella cahio;naô pódeo tal homem perceber as vozes dos á com elle fallarem. 4. Aflentadopois que a caufada fobredita furdez ' eraó 05 humores frios , & lymphaticos, que na cabeça. fe geravaó:, oua ella de outras partes vinhaõ ,erapre-” * cilo preparar os taes humores como os feguintes xaro-. pes , que mandei tomar em cinco dias fucceflivos pelas manhãa , & à noite na fórma feguinte. Tomem de fo-* lhas de betonica , & de cardo fanto, de femente de" funcho , & de cabeças de hyflopo, decada coufa def tas hum punhado, cozaófe em vafo debarro com tres" quartilhos de agua cómmua , & coada ella , ajuntéem a cada quatro onças defte cozimento huma onça de xarope de rofmaninho, & outra de oximel. Acabados de tomar os gaes xaropes , purguei os humores com a feguinte bebida, Em quatro onças de cozimento fref- co cordea!l com duas oitavas de folhas de fene, & hum efcropulo de femente de funcho fiz. infundir dous ef. croplos de bom agarico trocifeado , '& quatro onças de conferva Alexandrina ; & coandofe tudo com forte ex-
158 Observaçones Medicas Doutrinaes. mamos do Cirurgiaon: se procede de algumas bostellas, ou leicenços, que avia na cabeça, & se recolhèrao, como ja vi, todo o remedio consiste em purgar, & abrir fontes, ou causticos na mesma parte: se final¬ mente procede de humores frios, & humidos, ou de semelhante destemperança, conhecese pelo tempera- mento do doente, pela vida que teve, pelos ares em que assiste: & como o sobredito Sacerdote fosse sujeito a fluxones catarrhosas, & vivesse em bairro tao humido, como he o de Alfama, entendi quae a surdez procedia dos humores frios, & grossos, que na cabeça redundavao; os quaes humedecendo a membrana Meringe (cha¬ mada vulgarmente Tympano) faziamo a surdez: porque para ouvir se requere no orgamno auditorio huma bem pro¬ porcionada secura, & que a Meringe esteja estendida, & naon froxa, ou bamba: porque assim como se o couro de hum tambor se molha, logo afroxa, & nañe faz som capaz de excitar os animos; da mesma sorte se a membrana Meringe se humedece, & afroxa mais do que he razaon, por causa de algum humor, que nella cahio, naon pode o tal homem perceber as vozes dos que com elle fallarem. 4. Assentado pois que a causa da sobredita surdez eraon os humores frios, & lymphaticos, que na cabeça se geravao, ou a ella de outras partes vinhaon, era pre- ciso preparar os taes humores com os seguintes xaro¬ pes, que mandei tomar em cinco dias successivos pela manhana, & à noite na forma seguinte. Tomem de fo- lhas de betonica, & de cardo santo, de semente de funcho, & de cabeças de hyssopo, de cada cousa des- tas hum punhado, cozaonse em vaso de barro com tres quartilhos de agua commua, & coada ella, ajuntem a cada quatro onças deste cozimento huma onça de xarope de rosmaninho , & outra de oximel. Acabados de tomar os taes xaropes, purguei os humores com a seguinte bebida. Em quatro onças de cozimento fres- co cordeal com duas oitavas de folhas de sene, & hum escropulo de semente de funcho fiz infundir dous es- cropulos de bom agarico trociscado, & quatro onças de conserva Alexandrina; & coandose tudo com forte ex¬
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Observaçaõ XXVI. 159 expressaõ , desatei neste licor duas onças de xarope Rey , & dous escropulos de cremores de tartaro verdadeiros . Digo verdadeiros , porque a ambiçaõ de alguns homes tem hoje chegado a tal excesso , que falsificaõ muitos remedios , sem se lembrarem da conta que haõ de dar a Deos das vidas , que por sua causa se perderem. Naõ he isto queixa só minha , por se venderem neste Reyno muitos remedios com o nome de meus , que o naõ saõ ; tambem Riverio ( 4 . ) se queixava de aver esta falsidade em os cremores de tartaro . E entaõ ordenei que tomasse alternadas vezes as pilulas seguintes . Tomai de massa de pilulas sine quibus aureas , & Cochias , de cada cousa destas duas oitavas , de extracto de helleboro negro , & de colocintidas , de cada cousa destas huma oitava , de tartaro vitriolado , & de diagridio sulphurado , de cada cousa destas dous escropulos , tudo se misture muito bem , & desta massa se formem pilulas , de que fiz tomar ao doente dous escropulos por cada vez , & obràraõ com tanta felicidade , como eu esperava , porque saõ quasi milagrosas para todos os achaques da cabeça ; com tal condiçaõ , que se tomem nove , ou dez vezes em dias alternados . 5 . Depois que com estas pilulas purguei ao doente as vezes referidas , seguindo nisto o conselho de Massaria , ( 5 . ) & de outros Authores , que mandaõ repetir as purgas muitas vezes , & que essas sejaõ as mais efficazes , quando as doenças saõ rebeldes , ou estaõ em parte mui distante , & profunda , porque de outra sorte dandose poucas vezes os remedios , ou sendo taõ leves , que naõ cheguem com a sua virtude aonde està a enfermidade , naõ se consegue a saude , & ficaõ os doentes como estavaõ de antes . Para lhe confortar a cabeça , lhe mandei fazer o seguinte cozimento capital . Tomem de folhas de cardo santo , de orgevaõ , betonica , salva , manjerona , rosmaninho , hyssopo , & segurelha , de cada cousa destas huma maõ cheya , de enxofre sutilmente polvorizado tres onças , tudo junto se ferva a fogo moderado , com quatro canadas de vinho branco em panela de barro , & com hum jarro se
159 Obfervaçao XXVI. expréffao, defatei nefte licor duas onças de xarope Rey , & dous efcropulos de cremores de tartaro ver- dadeiros. Digo verdadeiros , porque a ambiçaõ de alguns homes tem hoje chegado a tal exceffo, que fal- fificao muitos remedios , fem fe lembrarem da conta que haõ de dar a Deos das vidas, que por fua caufa fe perderem. Nao he ifto queixa fó minha , por fe vende- rem nefte Reyno muitos remedios com o nome de meus , que o nao fao ; tambem Riverio (4.) fe queixa- va de aver efta falfidade em os cremores de tartaro. E entaõ ordenei que tomaffe alternadas vezes as pilulas Seguintes. Tomai de maffa de pilulas fine quibus au- reas , & Cochias, de cada coufa deftas duas oitavas, de extracto de helleboro negro , & de colocintidas, de cada coufa deftas huma oitava, de tartaro vitriolado, & de diagridio fulphurado, de cada coufa deftas dous efcropulos , tudo fe mifture muito bem , & defta maf- fa fe formem pilulas , de que fiz tomar ao doente dous efcropulos por cada vez , & obrarao com tanta felici- dade, como eu efperava, porque fao quafi milagrofas para todos os achaques da cabeça; com tal condiçaõ, que fe tomem nove , ou dez vezes em dias alternados. 5. Depois que com eftas pilulas purguei ao doen- te as vezes referidas , feguindo nifto o confelho de Maffaria, (5.) & de outros Authores, que mandao re- petir as purgas muitas vezes , & que effas fejao as mais efficazes, quando as doenças fao rebeldes, ou eftaõ em parte mui diftante , & profunda , porque de outra for- te dandofe poucas vezes os remedios, ou fendo tao les ves , que nao cheguem com a fua virtude aonde eftà a enfermidade, nao fe confegue a faude, & ficao os doentes como eftavaõ de antes. Para lhe confortar a cabeça, lhe mandei fazer o feguinte cozimento capi- tal. Tomem de folhas de cardo fanto , de orgevao, be- tonica, falva, manjerona, rofmaninho, hyffopo, & fegurelha, de cada coufa deftas huma mao cheya, de enxofre futilmente polvorizado tres onças , tudo jun- to fe ferva a fogo moderado, com quatro canadas de vinho branco em panela de barro, & com hum jarro fe :
Obfervacao XXVI. 159 txpréffa, defatei nefte licor duas oncas dexaröpe Rey , & dous efcropulos decrenores de tartaro ver- dadeiros. Digo verdadeiros , porque a ambica de alguns homés tem hoje chegado a tal exceffo, que fal- fifca muitos remedios , iem fe lembrarem daconta que ha.de dar a Deos das vidas , que porfua caufa fe perderem. Na he ifto queixa f6 ininha , por fe vende- rem nefteReynomuitos remedios com o nome de meus , que o na fa ; tambem Riverio (4.) fe queixa va de aver efta falfidade em os cremores de tartaro: E entao ordenei quc tomaffe alternadas vezes as pilulas feguintes. Tomai de maffa de pilulas fine quibus au- reas,& Cochias, de cada coufa deftas duas oitavas, de extracto de helleboro negro, & de colocintidas, da cada coufa deftas huma oitava, de tartaro vitriolado, & de diagridio fulphurado, de cada coufa deftas dous efcropulos , tudo fe mifture muito bem , &.defta maf- fa fe formem pilulas , de que fiz tomar ao doente dous efcropulos por cada vez,& obraraö com tantafelici- dade, como cu efperava, porque fa quafi milagrofas paratodos os achaques da cabeca ; com tal condica que fe tomem nove, ou dez vezes em dias alternados. 5. Depois que com eftas pilulas purguci ao doen- te as vezes referidas , feguindo nifto o confelho de Maffaria, (5.) & de outros Authores, que mandaö re- petir as purgas muitas vezes , & que effas fejaö as mais efficazes, quando as doencas fa rebeldes,ourefta em parte mui diftante , & profunda , porque de outrafor- te dandofe poucas vezes os remedios , ou fendo tao le- ves, que na chéguem com a fua virtude aonde efta a enfermidade, na fe confegue a faude, & ficaos doentes cono eftava de antes. Para lhe confortar a cabeca, lhe mandei fazcr o feguinte'cozimento capi- tal. Tomemde folhas de cardo fanto , de orgeva, be- tonica, falva, manjerona, rofmaninho, hyffopo, & fegurelha, de cada coufa deftas huma ma chéya, de cnxofre futilmente polvorizado tres oncas , tudo.jun- to fe ferva a fogomoderado , com quatro canadas de vinho branco cm panela de barro , & com hum jarro fe : &is
co Obfertvação XXVI. sao expréffaõ, defatei nefte licor duas onças de xárópe Rey, & dous efcropulos de cremores de tartaro vera dadeiros. Digo verdadeiros , porque a ambiçaõ de alguns homês tem hoje chegado a tal exceflo, que fal- ' fifcaõ muitos remedios , tem fe lembrarem da conta que haó de dar a Deos das vidas , que por fua caufa fe perderem. Naóõ heifto queixa fó minha , por fe vende- rem nefte Reyno muitos remedios com o nome de meus , que o naô faô ; tambem Riverio (4.) fe queixa-. va de aver efta falfidade em os cremores de tarraro: E enta6 ordenei que tomaíle alternadas vêzes as pilulas feguintes. Tomai de maffa de pilulas fine quibus au- reas , & Cochias, de cada coula deftas duás oitavas, de extracto de helleboro negro , & de colocintidas, de cada coufa deftas huma oitava , de tartato vitriolado; & de diagridio fulphurado , de cada coufa deftas dous elcropulos , tudo fe mifture muito bem , & defta maf: fa fe formem pilulas , de que fiz tomar ao doente dous efcropulos por cada vez , & obràraô com tanta felicia dade, como eu efperava , porque faô quafi milagrofas paratodos os achaques da cabeça; com tal condiçaõ, que fe tomem nove , ou dez vezes em dias alternados. 5. Depois quecomeftas pilulas purguei ao doen- te as vezes referidas , feguindo nifto o confelho de Maflaria, (5.) & de outros Authores, que manda6 re“ petiras purgas muitas vezes , & que fas fejaó as mais efficazes, quando as doenças laô rebeldes,ou'eftaô em parte mui diftante , & profunda, porque de outra for- te dandofe poucas vezes os remedios, oufendo taó les ves, que naó cheguem com a fuá virtude aonde eftà a enfermidade , naô fe confegue a faude, & ficaõ os ' doentes como eltavaõ de antes. Para lhe confortar à cabeça, lhe mandei fazer o feguinte cozimento capi- tal. Tomem de folhas de cardo fanto , de orgevaõ; be- tonica , falva, manjerona , rofmaninho; hyffopo, & fegurelha , de cada coufa deftas huma maô cheya, de enxofre futilmente polvorizado tres onças , tido jun- to fe ferva a fogo moderado , com quatro canadas de vinho branco em panela de barro , & com hum jarro IC E ATA NENE O ECA :
Observaçaon XXVI. 159 expressaon, desatei neste licor duas onças de xarope Rey, & dous escropulos de cremores de tartaro ver- dadeiros. Digo verdadeiros, porque a ambiçaon de alguns homens tem hoje chegado a tal excesso, que fal- sificaon muitos remedios, sem se lembrarem da conta que hao de dar a Deos das vidas, que por sua causa se perderem. Naon he isto queixa so minha, por se vende¬ rem neste Reyno muitos remedios com o nome de meus, que o naon saon; tambem Riverio (4.) se queixa ra de aver esta falsidade em os cremores de tartaro. E entaon ordenei que tomasse alternadas vezes as pilulas seguintes. Tomai de massa de pilulas sine quibus au¬ reas, & Cochias, de cada cousa destas duas oitavas, de extracto de helleboro negro , & de colocintidas, de cada cousa destas huma oitava, de tartaro vitriolado & de diagridio sulphurado, de cada cousa destas dous escropulos, tudo se misture muito bem, & desta mas¬ sa se formem pilulas, de que fiz tomar ao doente dous escropulos por cada vez, & obràraon com tanta felici¬ dade, como eu esperava, porque saon quasi milagrosas para todos os achaques da cabeça; com tal condiçaon, que se tomem nove, ou dez vezes em dias alternados. 5. Depois que com estas pilulas purguei ao doen- te as vezes referidas , seguindo nisto o conselho de Massaria, (5.) & de outros Authores, que mandao re petir as purgas muitas vezes, & que essas sejaon as mais efficazes, quando as doenças saon rebeldes, ou estaon em parte mui distante , & profunda, porque de outra sor- te dandose poucas vezes os remedios, ou sendo taon le- ves, que naô chèguem com a sua virtude aonde està a enfermidade, nao se consegue a saude, & ficaon os doentes como estavaon de antes. Para lhe confortar a cabeça, lhe mandei fazer o seguinte cozimento capi¬ tal. Tomem de folhas de cardo santo, de orgevao, be- tonica, salva, manjerona, rosmaninho, hyssopo, & segurelha, de cada cousa destas huma maon cheya, de enxofre sutilmente polvorizado tres onças, tudo jun¬ to se ferva a fogo moderado, com quatro canadas de vinho branco em panela de barro, & com hum jarro se 67
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